Mostrando postagens com marcador ELINE RENNÓ. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador ELINE RENNÓ. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

A CIDADANIA, A MEDICINA E O TRIBUTO À CRIANÇA

BILAC AOS ESTUDANTES DA FACULDADE DE MEDICINA DE SÃO PAULO


“[...] Falo-vos, como poeta, e como velho e impenitente estudante. Como poetas, e como futuros médicos, meus jovens irmãos, amai o Brasil, e daí assistência à pátria enferma!

Conheceis, ou conhecereis, entre os casos clínicos, que vistes ou vereis, uma das mais terríveis desgraças do organismo humano, a mais cruel, talvez, de todas as misérias físicas. Um leve endurecimento, a princípio, e uma ligeira corrosão na pele ou na mucosa; em seguida, o alargamento e a penetração do núcleo destruidor; o tumor lançando raízes envenenadoras, polvo hediondo, dilatando e aferrando os seus tentáculos vorazes, mordendo e triturando os tegumentos, roendo e comendo os tecidos; e a marcha fatal e implacável da ruína, desfazendo as carnes em sânie; e o mal sem cura infiltrando-se em todo o corpo; e o visual letal intoxicando todo o sangue, mirrando e extinguindo a força; e, enfim, o marasmo, a agonia e a morte. É o cancro.

Ora, este flagelo do organismo físico existe também no organismo social. As sociedades, como os indivíduos, são às vezes devastadas por essa mesma doença, de sintomas idênticos, de marcha igualmente assustadora, de conseqüências igualmente funestas. É a mesma voracidade, o mesmo enraizamento, a mesma infecção, a mesma discrasia, o mesmo depauperamento, a mesma destruição. Este carcinoma da estrutura moral é a indiferença; e os seus tentáculos ferozes insinuando-se, verrumando, terebrando, infeccionando, ressumando uma baba viscosa, e mortífera, desagregando e devorando a presa, são a fraqueza da alma, o desânimo, o egoísmo, a autolatria, o amor exagerado do luxo e do dinheiro, a falta de patriotismo e o aniquilamento do caráter próprio pelo desdém dos interesses sagrados da comunhão.

Alguns sintomas deste morbo ignóbil já se manifesta em várias zonas do grande corpo brasileiro. Se, em dois ou três Estados da União, o trabalho, a instrução e o ideal ainda reagem e vencem, esses mesmos Estados devem ser os mais interessados no perigo, e devem ser os primeiros defensores da federação em perigo. Sabeis que a manifestação cancerosa nunca terá efeitos desastrosos locais, uma vez que o vírus, veiculado pelo sangue, fatalmente se espalha e irriga e contamina toda a economia vital.

Lutemos todos! Reajamos e trabalhemos todos! Se para o carcinoma físico ainda não se descobriu, apesar do paciente labor e da heróica tenacidade dos sábios, um remédio seguro, para o outro, moral e social, existe e sempre existiu o específico infalível, o antídoto facial, ao alcance de todos, a um tempo profilático e regenerador, preventivo e curativo: a crença individual, o entusiasmo pessoal, a coragem cívica, que é a salvaguarda da coletividade, a manutenção e a grandeza da pátria.

Para combater e prevenir a diátese cancerosa física, vai certamente aparecer um salvador amanhã; e esse talvez seja um de vós, quem sabe? Porque é possível que, entre vós, estudantes de Medicina, já exista, em gérmen, um Jenner, um Pasteur, um Chagas. Mas, para debelar a diátese, que ameaça a nacionalidade brasileira, cada um de vós já é um médico perfeito, um inventor benéfico, um salvador providencial.

Concito-vos, como já concitei os vossos irmãos da Faculdade de Direito, e como concito todas as almas do Brasil, para a campanha do entusiasmo e da fé.

Cultivais, desenvolvei, acendrai o vosso patriotismo! E pregai o patriotismo aqui, e lá fora, nas bancadas das aulas, nos laboratórios, nas salas do hospital, nas ruas, nos lares em que nascestes e em que vos educastes, nos lares novos que construireis e em que o vosso afeto frutificará em novos brasileiros!

Futuros médicos para os corpos, sede médicos também para as almas, para a grande alma do Brasil! O Brasil carece de uma nova terapêutica moral e de uma nova cirurgia audaz...

Deus abençoe a vossa bondade e a vossa energia!”
(OLAVO BILAC, in Últimas Conferências e Discursos. – Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1924, página 123).

Mais uma IMPORTANTE, CÍVICA e também OPORTUNA contribuição para o nosso trabalho de MOBILIZAÇÃO PARA A CIDADANIA E QUALIDADE, vem de artigo publicado no Jornal ESTADO DE MINAS, edição de 14 de fevereiro de 2011, Caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de ELINE RENNÓ, Coordenadora da pós-graduação em psicoterapia de família e casal da PUC-Minas, que merece INTEGRAL transcrição:

“Tributo à criança

Toda criança nasce com uma reserva de confiança básica, o que lhe permite o direito de prestar lealdade ao adulto, inclusive aos seus caprichos mais perversos. A lealdade da criança é “invisível” e, às vezes, “cindida” (B. Nagi, 1973), quando as exigências de um de seus pais são maiores, custando-lhe sacrifícios pessoais e danos emocionais à sua existência. Como qualquer ser humano, na busca de padrões de justiça e fidelidade, a criança que sofre explorações em sua vida, uma vez adulta, tende a passar para a geração seguinte os débitos e os créditos desbalanceados da sua geração, somados aos das gerações anteriores à sua. Caso o balanceamento contábil não seja feito em cada geração, a reserva de confiança se esgota e a esperança tende ao declínio. O “livro ético”, que não está escrito e sim vivido por meio das relações familiares, revela a dinâmica de um grupo familiar, de uma cultura, de uma sociedade, no tempo e na história. O mesmo raciocínio se aplica às relações políticas, econômicas e sociais. A contabilidade de cada nação precisa estar em dia. Pela esperança.

Os crimes de exploração e abusos cometidos contra a criança por seus próprios pais e parentes, por educadores e cuidadores instititucionais que não conseguem equilibrar os padrões herdados das gerações anteriores são alarmantes e frequentes, aumentando o número de processos jurídicos, como o absurdo da alienação parental. O controle do mundo infantil pelo adulto se deve à ênfase sobre a racionalidade que mistificou e suprimiu um aspecto importante da vida nesta fase: o caráter fluido, ambíguo, contraditório e caótico da criança. Benjamin (1984) reafirma sempre a noção de especificidade da vida infantil e juvenil, que não representa uma miniatura do mundo adulto. Para ele, o ser humano de pouca idade constrói seu próprio universo, incluindo lances de pureza e ingenuidade, agressividade, resistência e perversidade. Segundo Benjamin, a criança não pensa de forma cartesiana, ela usa o “método do desvio”: seu pensamento vai, para, espera, toma fôlego, vai de novo. Não que a criança seja soberana, ou solitária. Seu comportamento é função de luta de classes, suas atitudes se enraízam em contextos coletivos histórico-sociais. Para o autor, as crianças “fazem a história a partir do lixo da história” e se aproximam dos “inúteis”, dos “inadaptados” e dos “marginalizados” (Benjamin, 1984).

Quando uma criança faz e refaz um movimento com o seu corpo, ela se impressiona consigo mesma e impressiona o outro, reinventa seu corpo e a si mesma. Congrega, nesse instante suspenso, em simultaneidade, passado e presente, encarnando o seu tempo de infância. Na repetição dos gestos, dos saltos, a criança atualiza seu presente e permite um momento de redenção do adulto, no “tempo denso” que rompe o continuum da história homogênea. Se a criança é capaz de narrar histórias a partir de seus movimentos, metodologicamente se põe a questão para pensar as histórias que estão sendo narradas pelas suas impressões corporificadas. As impressões e expressões corporificadas das crianças são, portanto, figuras de narração (Rennó, 2001). Se considerarmos o adulto como o insípido e o incapaz de fazer cumprir os sonhos, as expectativas da infância, sua provável redenção, ou salvação, poderá estar no olhar atento sobre a narrativa da criança? Se considerarmos o adulto como o desmemoriado, dois caminhos serão possíveis para refrescar-lhe a memória: ou ele se entrega à busca de sua origem pessoal, atravancada a objetos e pessoas, rendendo-se ao culto individual; ou ele se entrega a um trabalho coletivo para buscar novas formas de estabelecer relações com a infância, alcançando sua própria redenção.

Entre as tarefas possíveis, para um trabalho coletivo de ecologia social e mental, estão novas formas de conceber as relações com a infância. É preciso tomar consciência de que é necessário mudar o estado de coisas atual, modificando a programação dos espaços construídos, em razão das transformações institucionais e funcionais que o futuro reserva à criança (Guattari, 1992). Para um “olhar depurado”, a relação com o tempo, com os elementos, com as formas vivas ou inanimadas, a morte, o desejo são novos, inesperados, miraculosos. Cabe a nós reengendrar essa “subjetividade em estado nascente” por meio da restauração de uma “cidade subjetiva” que engaja os níveis mais singulares da pessoa com os níveis coletivos. Trata-se do porvir do planeta e da biosfera (Guattari, 1992).

Como depurar o olhar, como restaurar a cidade subjetiva, como alcançar a redenção do adulto para que ele restabeleça novas relações com a criança? As recomendações teórico-metodológicas contemporâneas da terapia de família sustentadas pela epistemologia sistêmico-cibernética apontam para a necessidade de outras tarefas do psicólogo no exercício intersubjetivo da clínica com a família, como também em sistemas amplos e complexos, aqueles que entrelaçam a vida das pessoas, tais como as organizações, a escola, as instituições, o Estado. Ao se perguntar sobre o significado dos comportamentos dos adultos, no salto flutuante que muda a concepção, a ideia sobre o que é justiça, fidelidade e lealdade, visando à organização de novas experiências, por meio da narrativa da criança e do adulto, é possível reconstruir esse significado, renovando a confiança e a esperança de uma família, de uma sociedade, de um país.”

Como conclama o poeta BILAC: “... amai o Brasil, e dai assistência à pátria enferma!”...

E ainda ampliando ou contextualizando seus “casos clínicos”, o CARCINOMA DA ESTRUTURA MORAL continua a INDIFERENÇA, principalmente a resistência em se ter a EDUCAÇÃO como PRIORIDADE ABSOLUTA da ação de GOVERNO; e outros TENTÁCULOS FEROZES... são a VIOLÊNCIA e a CRIMINALIDADE, o ABISMO cada vez maior entre os mais RICOS e os mais POBRES, as DOENÇAS, o ANALFABETISMO, a INFLAÇÃO, a CORRUPÇÃO, o DESPERDÍCIO, a DÍVIDA PÚBLICA, a INFIDELIDADE PARTIDÁRIA, o ABUSO DO PODER ECONÔMICO, chagas como o CORONELISMO, o PATRIMONIALISMO, o ASSISTENCIALISMO, o CLIENTELISMO, o PATERNALISMO, o CORPORATIVISMO, o desapreço pelas POLÍTICAS PÚBLICAS...

Porém, NADA, absolutamente NADA arrefece nosso ÂNIMO, e mais nos MOTIVAM e nos FORTALECEM nesta grande CRUZADA NACIONAL pela CIDADANIA E QUALIDADE, visando à construção de uma NAÇÃO verdadeiramente JUSTA, ÉTICA, EDUCADA, QUALIFICADA, LIVRE, DESENVOLVIDA e SOLIDÁRIA, que possa PARTILHAR suas EXTRAORDINÁRIAS RIQUEZAS e POTENCIALIDADES com TODOS os BRASILEIROS e com TODAS as BRASILEIRAS, especialmente no horizonte de INVESTIMENTOS BILIONÁRIOS previstos para eventos como a COPA DO MUNDO DE 2014, a OLIMPÍADA DE 2016 e os projetos do PRÉ-SAL, segundo as exigências do SÉCULO XXI, da era da GLOBALIZAÇÃO, da INFORMAÇÃO, do CONHECIMENTO, das NOVAS TECNOLOGIAS, da SUSTENTABILIDADE e de um mundo da PAZ e FRATERNIDADE UNIVERSAL...

Este é o nosso SONHO, o nosso AMOR, a nossa LUTA, a nossa FÉ e a nossa ESPERANÇA!...

O BRASIL TEM JEITO!...