“Pequenas
lições para 2014
O ano que se inicia
será um dos mais competitivos das últimas décadas, principalmente na esfera
política. As razões apontam para o esgotamento do nosso modelo de fazer
política, a partir de velhas práticas de campanhas eleitorais. A impressão
final é a de que o retrato desfigurado está a merecer urgente retoque.
Fichas-sujas, por exemplo, não podem continuar no mapa eleitoral.
Os
ingredientes que entrarão na composição da nova tintura hão de absorver a
química de setores e categorias mais participativas, exigentes e dispostas a
enfrentar a resistência de defensores de obsoleta arquitetura política. A
coletividade parece descer do céu da abstração para ser uma força na paisagem.
O
curto dicionário abaixo poderá servir de baliza para milhares de candidatos na
tentativa de aprimorar suas relações com a comunidade nacional.
Estado
e nação – O Estado, infelizmente, está bastante distante da nação com que os
cidadãos sonham. A nação é a pátria que acolhe os filhos; é o hábitat onde as
pessoas constroem os pilares da existência. O Estado é a entidade
técnico-jurídica, com seu arcabouço de Poderes, pressionada por interesses
díspares e dividida por conflitos. Aproximar o Estado da nação, formando o
espírito nacional, constitui a missão basilar da política.
Representação
– A representação política é missão, não profissão. A política não é um balcão
de negócios. Um representante do povo se preocupa com metas, programas
permanentes, medidas estruturantes.
Identidade
– A identidade é a coluna vertebral de um político. É a soma de sua história,
de seu pensamento, de suas percepções e de seus feitos.
Discurso
– O discurso deve abrigar propostas concretas, viáveis, simples. E, sobretudo,
factíveis. A população dispõe de entidades que a representam. Resta ao político
procurar tal universo.
Grito
nas ruas – O grito das ruas faz-se ouvir nos espaços dos Poderes em todas as
instâncias. Expressam a vontade de uma nova ordem social e política. Urge abrir
os ouvidos e a mente para interpretar o significado de cada movimento.
Sabedoria
– Sabedoria não significa vivacidade. Mescla aprendizagem, compromisso,
equilíbrio, busca de conhecimentos, capacidade de convivência, racionalidade.
Não é populismo.
Transparência
– A era do esconderijo está agônica. Esconder (mal) feitos é um perigo. A
corrupção, mesmo dando sinais de sobrevida, é atacada em muitas frentes.
Grandes figuras foram (e continuarão a ser) punidas. O público e o privado
começam a ter limites controlados.
Simplicidade
– Despojamento, eis um apreciado conceito. Ser simples não é pegar crianças no
colo, comer cachorro-quente na esquina ou gesticular para famílias nas
calçadas. A simplicidade está no ato de pensar, dizer e agir com naturalidade.
Sem artimanhas nem maquiagens.
Lição
final do filósofo e sociólogo José Ingenieros: “Cem políticos torpes, juntos,
não valem um estadista genial”.”
(Gaudêncio
Torquato. Jornalista e professor (USP), em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 8 de
janeiro de 2014, caderno O.PINIÃO, página
19).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, mesma edição, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de FREI BETTO, que é escritor, autor de Calendário do poder (Rocco), entre
outros livros, e que merece igualmente integral transcrição:
“Ano
de mudanças
Eis um ano novo de
muitas expectativas. A primeira, evitar a volta da inflação. Felizmente não há
indício de que veremos o mesmo filme dos últimos meses do governo Sarney,
quando a inflação chegou à casa de 80% ao mês. O grave é que a especulação
acelera, a produção e as exportações caem, o crescimento do PIB diminui, as
privatizações se multiplicam, as desigualdades sociais se acentuam.
É o
ano de comemoração (= fazer memória) dos 50 anos do golpe que derrubou um
governo constitucionalmente eleito e instalou a ditadura militar, sem que o
paradeiro dos desaparecidos políticos tenha sido esclarecido, nem punidos
aqueles que torturaram, assassinaram, sequestraram em nome e sob a cobertura do Estado, em
especial das Forças Armadas.
Na falta de mais pão, teremos circo: a Copa do
Mundo. O Brasil entra manco, sem garra, com um time estressado pela obrigação
de fazer dinheiro. Acabou o futebol arte, os efeitos de Didi, os dribles de
Tostão, os avanços de Vavá, os gols de Pelé e o balé de Garrincha. Tudo indica
que a nossa Seleção vai bater o ponto como boa anfitriã e sair de crista baixa,
salvo um milagre, uma zebra que comprove que, em matéria de futebol, Deus
também é brasileiro.
Enfim,
este é o ano de passarmos o Brasil a limpo. No dia 5 de outubro, cada eleitor
irá às urnas escolher 7 novos servidores públicos: 1 deputado estadual, 1
federal, 1 senador, governador e vice, presidente e vice. Eis a chance de
extirpar das assembleias legislativas os deputados de bicheiros e de cartéis,
mais interessados em multiplicar o próprio salário que servir à população
carente.
Em
Brasília, poderemos passar uma vassoura geral, mandando para o lixo da história
deputados e senadores com muitos anos de mandato e pouco serviço, corrompidos
por empreiteiras e oligopólios, sem nenhuma visão do que seja cidadania e democracia.
Dos governos estaduais os eleitores deverão aposentar as velhas raposas que
sofrem de pleonexia – o apetite insaciável de poder, segundo Platão, que
entendia de política e de políticos.
O
quadro da sucessão presidencial ainda não está definido, mas eis a hora de
evitarmos que o Brasil volte a ser colônia dos EUA, que o salário mínimo seja
deteriorado e os programas sociais, que têm tirado milhões da miséria, sejam
engavetados em nome da redução de gastos públicos. É melhor um governo que seja
mãe dos pobres e pai dos ricos do que um que trate os pobres como madrasta
malvada e os ricos como bebês de colo, que precisam de toda atenção e cuidados.
As
eleições de outubro deverão confirmar o aperfeiçoamento da democracia, a
valorização da cidadania e, sobretudo, a política como resposta às urgentes
demandas sociais, como melhoria da educação, da saúde e do transporte público.
Um governo que ouse fazer reforma agrária, promover a desconcentração da renda
e redimensionar a dívida pública. Um governo que convoque uma Constituinte
exclusiva para a reforma política e faça cessar o desmatamento da Amazônia. Um
governo que abra os arquivos da ditadura em mãos das Forças Armadas e reduza a
desigualdade social. Sem isso o Brasil terá como futuro imediato o aumento da
violência e da miséria.
Temos
tudo para fazer de 2014 um novo ano feliz para a maioria do povo brasileiro. Vai depender de nossa
capacidade de mudar o que de ruim insiste em perdurar, renovar o que de
antipopular teima em se repetir e apoiar o que de bom significa transformar.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes,
incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise
de liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas transformações em nossas
estruturas educacionais, governamentais,
jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais,
de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente
desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação
universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3
anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o
imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade
na primeira série do ensino fundamental,
independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e
pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;
b) o
combate, implacável e sem trégua,
aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I - a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária
ordem; III – o desperdício, em todas
as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos,
inexoravelmente irreparáveis;
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e
insuportável desembolso de cerca de R$ 1
trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos
(apenas com esta rubrica, previsão de R$ 639 bilhões), a exigir igualmente uma
imediata, abrangente, competente e eficaz auditoria...
Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos
a falta de recursos diante de tão
descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a
nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a
credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores
como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); a educação;
a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos
sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana
(trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às
commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social;
segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia
federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência,
tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações;
qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –,
transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade,
produtividade, competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada,
qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que
possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e
potencialidades com todas as
brasileiras e com todos os
brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos
e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do
PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da
globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do
conhecimento, da inovação, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da
justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...
O
BRASIL TEM JEITO!...