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segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

A CIDADANIA, A EDUCAÇÃO E O ÓBVIO QUE NÃO É ÓBVIO

Mais uma IMPORTANTE e PEDAGÓGICA contribuição para o nosso trabalho de MOBILIZAÇÃO PARA A CIDADANIA E QUALIDADE vem de artigo publicado no Jornal ESTADO DE MINAS, edição de 13 de fevereiro de 2010, Caderno PENSARBRASIL, páginas 6 a 9, de autoria de CLÁUDIO DE MOURA CASTRO, que é economista com mestrado pela Universidade de Yale e pós-doutorado pela Universidade de Vanderbilt. Foi diretor-geral da Capes e chefe da Divisão de Programas Sociais do BID. Atualmente, é presidente do Conselho Consultivo das Faculdades Pitágoras, cujo trabalho merece INTEGRAL transcrição:

“DOSSIÊ EDUCAÇÃO

O ÓBVIO QUE NÃO É ÓBVIO


CONTRADIÇÕES DE UM PAÍS QUE PRIORIZOU O ENSINO SUPERIOR ANTES DA FORMAÇÃO BÁSICA REDUNDAM EM BAIXA QUALIDADE E COBRAM MAIOR INVESTIMENTO ESTATAL

A palavra “óbvio” esconde uma contradição em termos. Digo: “É obvio que a prioridade deveria ser para o ensino fundamental”. Mas, obviamente, não é óbvio. Se fosse realmente óbvio, não precisaria dizer que é óbvio. Quando dizemos que algo é óbvio, é justamente porque não o é. De fato, tal é o caso com o ensino fundamental. Obviamente, deveria ser a primeira e única prioridade. Mas não é.

É péssima a qualidade do nosso ensino fundamental. Há indicadores que documentam de forma indisputável a sua fragilidade. Além disso, passou muito tempo antes que conseguíssemos matricular na escola toda a faixa etária de 7 a 10 anos.

Nosso ensino fundamental tinha um papel subalterno em nossa sociedade. Mas isso pouco nos prejudicava, diante do parque produtivo brasileiro, onde se podia produzir razoavelmente bem com uma força de trabalho minimamente educada. Hoje isso é impossível.

Quais são as prováveis causas da má qualidade da sala de aula? De que fraquezas congênitas padecem as escolas?

Há uma grande lista de mazelas. Não obstante, o maior obstáculo impedindo a melhoria da qualidade é a percepção, por parte da sociedade brasileira, de que a escola está bem. Os pais querem vagas, o sistema oferece vagas para todos. Os pais não percebem deficiência graves na qualidade. Não há crise. Não há uma dinâmica que impulsione o sistema a vencer as barreiras que impedem a melhoria da qualidade.

DESENCONTROS DE UMA SOCIEDADE ELITISTA

O Brasil tem uma trajetória educacional surpreendente. Já foi medíocre em todos os azimutes. De fato, em matéria de educação, por mais de quatro séculos, o país teve pouco ou quase nada a mostrar.

Curiosamente, os primeiros grandes saltos começaram pelo topo do edifício. Crescemos e fizemos bonito no alto da pirâmide. Avançamos na pós-graduação e na ciência, antes de cuidar dos alicerces.

Vale a pena uma olhada rápida na nossa trajetória recente na ciência. Faz algum tempo foi feita uma busca sistemática nos periódicos internacionais indexados. Na década de 1950 não havia um só artigo de pesquisadores brasileiros publicados em periódicos científicos de primeira linha. Somente a USP escapava desse perfil de mediocridade.

Na década de 60, desencadeia-se um processo acelerado de criação de universidades federais, construção de campus belíssimos e o início do envio de brasileiros para fazer sua pós-graduação no exterior. Em seguida, criamos, em ritmo acelerado, mestrados e doutorados de excelente qualidade.

A cada ano, formamos mais de 10 mil doutores e próximo de 40 mil mestres em nossas universidades. É um volume substancial, mesmo comparado com o Primeiro Mundo.

Os resultados não poderiam ser mais espetaculares. Em menos de meio século, o país sai do quase zero e torna-se o 13º maior produtor de pesquisas (publicadas nos melhores periódicos internacionais). Note-se a quase total ausência de outros países do Terceiro Mundo na lista dos maiores produtores (só Índia e, mais recentemente, os países da órbita chinesa).

Chegamos a uma situação paradoxal. Nossas mercadorias correspondem a pouco mais de 1% das exportações mundiais. Em contraste, somos responsáveis por 2% da ciência mundial. Ou seja, somos maiores exportadores de pesquisa do que de mercadorias. Para um país que praticamente começa do zero na ciência, é um resultado extraordinário. Exibimos uma das taxas mais elevadas de crescimento da pesquisa publicada.

A grande contradição é que fizemos isso tudo tendo como pano de fundo estatísticas deploráveis de educação básica.Temos ciência de Primeiro Mundo. Em contraste, em matéria de educação básica, pertencemos aos rincões mais atrasados do Terceiro Mundo (até recentemente, éramos piores do que Bolívia, Equador e Paraguai).

Tão estranho desempenho parece ser o resultado de um elitismo atávico do país. Como nota Maria Luiza Marcílio, em História da escola em São Paulo e no Brasil (Imprensa Oficial de SP, 2005), nossas primeiros escolas eram de nível médio. As primárias não eram prioritárias, pois as elites contratavam preceptores para as primeiras letras dos filhos. É exatamente o oposto do que estava acontecendo na Europa e na América do Norte, onde se alarga a matrícula nas escolas primárias. Nossas primeiras faculdades, criadas por dom João, vêm um século antes do ensino público de nível básico.

Por que investimos pesadamente na criação de uma rede exuberante de universidades federais, em uma data em que apenas tínhamos um pouco mais da metade da nossa infância entrando na escola?

A resposta está na história e na sociologia. As explicações passam ao largo das distinções entre governo civil e militar, entre direita e esquerda. O elitismo é da sociedade brasileira e não desse ou daquele segmento.

CINCO SÉCULOS PARA UNIVERSALIZAR A ESCOLA

Em meados do século 19, completa-se na Europa o processo de matricular em escolas toda a infância na idade correspondente, um processo que começara no século 17. Uruguai e Argentina iniciam, no mesmo período, um grande movimento para levar toda a sua juventude à escola. Até o fim daquele século, o estado de São Paulo nem sequer tinha uma rede de escolas públicas.

O Brasil é retardatário no desenvolvimento de suas escolas. De fato, quando examinamos estatísticas de escolaridade da população como um todo, ainda estamos abaixo do Paraguai e da Bolívia, apesar do enorme crescimento nos últimos anos.

Na entrada do século 20 tínhamos por volta de 80% de analfabetismo. Sintomaticamente, Portugal tinha uma proporção pouco melhor do que a nossa.

Somente na década de 1990 conseguimos universalizar o acesso à escola e a presença nela da população de 7 a 14 anos. Diante do atraso anterior, foi um feito extraordinário, pela velocidade em que sucedeu. Mas não podemos deixar de registrar o fato de que, meramente, nos igualamos aos países latino-americanos mais modestos.

Seja como for, se antes tínhamos uma educação que era pouca e fraca, agora já não é tão pouca. Com a universalização da entrada e da permanência na escola até 14 anos, aumentam as graduações no fundamental, cresce aceleradamente o médio e viramos o milênio com taxas de crescimento muito elevadas no superior. Nesse nível, por falta de alunos, persistia por duas décadas uma quase estagnação da matrícula.

A batalha da quantidade foi vencida. Levou 500 anos – o que é uma constatação lastimável. Mas na década de 1990, finalmente, o ensino básico conseguiu vencer as barreiras que outros países haviam vencido com séculos de anterioridade.

INDICADORES DE QUALIDADE VERGONHOSOS

Apesar do espetacular sucesso dos anos recentes na universalização do ensino inicial, não conseguimos resolver o desafio da qualidade.

É bem verdade, resolvemos o problema de medir a qualidade. Temos toda as ferramentas para ficar sabendo como estamos: o Saeb, a Prova Brasil, O Ibdeb e o Enem. São testes que satisfazem a todos os critérios usuais de confiabilidade, precisão e lisura na aplicação. Agora sabemos, com segurança, como anda a qualidade da nossa educação. Merece, pois, confiança a triste constatação de que é muito deficiente essa qualidade.

O Saeb, aplicado à quarta série do fundamental, mostra que 54% dos alunos não foram plenamente alfabetizados. Essa é uma etapa a ser vencida ao fim da primeira série por praticamente todos os alunos. Ou seja, ao cabo de quatro anos, mais da metade dos alunos não aprendeu a ler. O Pisa mostra que o Brasil está entre os países mais fracos em matéria de educação, dentro de um grupo que hoje engloba 50 nações.

Como a leitura é a principal ferramenta da escola, metade dos alunos não tem o instrumento de que precisariam para ser educados. É o pior dos mundos.

Não há nenhuma notícia ruim no país cuja gravidade se compare com essa. Nem violência, nem desemprego, nem os coeficientes de Gini mostram um quadro tão negativo e alarmante.

EDUCAÇÃO BÁSICA DEVERIA SER PRIORIDADE

Diante dessa barragem de notícias ruins, é difícil evitar a conclusão de que o nosso ensino inicial deveria ser a única prioridade para o país. Não apenas como prioridade dentro da educação, mas como prioridade nacional.

São aprendizados simples: ler, entender o que está sendo escrito, escrever, usar números e resolver problemas. Nada mais. Diante do estado de emergência em que se encontra nosso ensino, não pode haver outras prioridades dentro da escola. O resto ou não é prioridade, ou é tudo mais que vem espontaneamente junto com a escola de qualidade.

Com certa segurança, podemos identificar o cerne das dificuldades.

Nossos professores nem dominam os conteúdos que ensinam, nem aprenderam a dar aula.

Não há prestação de contas (accountability) em nenhum nível. Nem professores, nem diretores, nem secretários de educação prestam contas dos resultados.

A comunidade dos educadores não acredita em educação baseada em evidência. Os gurus da educação pontificam em espaços intergalácticos, com olímpico desprezo pela evidência empírica e pela crescente abundância de pesquisas benfeitas.

Os recursos dedicados pelo Estado à educação básica correspondem, por aluno, a um décimo daqueles dedicados ao ensino superior público.

Nas escolas dos países bem-sucedidos em matéria de educação, vemos profissionalismo, foco no essencial e métodos simples, mas bem dominados pelos professores. O que falta em malabarismos intelectuais e teorias sobra em persistência e seriedade.

Em contraste, nossa educação é vista como uma sequência de atos heróicos. É o primado dos elementos afetivos, do desejo ingênuo de criar utopias, de aplicar teorias rarefeitas de da busca de soluções complicadas.”

Eis, pois, páginas que nos MOTIVAM e nos FORTALECEM nesta grande CRUZADA NACIONAL pela EDUCAÇÃO, CIDADANIA e QUALIDADE, única via que nos levará à construção de uma NAÇÃO verdadeiramente JUSTA, ÉTICA, LIVRE, DESENVOLVIDA e SOLIDÁRIA, que permita a PARTILHA de nossas EXTRAORDINÁRIAS RIQUEZAS com TODOS os BRASILEIROS e com TODAS as BRASILEIRAS e, mais ainda, no horizonte dos INVESTIMENTOS BILIONÁRIOS previstos para eventos como a COPA DO MUNDO DE 2014, a OLIMPÍADA DE 2016 e dos projetos relacionados com o PRÉ-SAL.

Este é o nosso SONHO, a nossa LUTA, a nossa FÉ e nossa ESPERANÇA!...

O BRASIL TEM JEITO!...