“Direito
internacional e os conflitos mundiais
Até a Segunda Guerra
Mundial, as preocupações e atenções dos países e, por consequência, do direito
internacional eram, fundamentalmente, a coexistência pacífica entre as nações e
a manutenção da paz e da segurança internacionais. Depois, com a diminuição, ou
quase desaparecimento das guerras entre Estados, as atenções se voltaram para a
cooperação econômica e assumiram papel de relevo, em nível global, as
organizações internacionais de cooperação e integração econômica, tais como a
União Europeia, o Nafta, a Comunidade Andina de Nações, o Mercosul e a Asean,
entre outras.
Não
obstante os avanços em direção à paz e os esforços no sentido da distribuição
da riqueza, a vida não ficou melhor para ninguém, em nenhum lugar do mundo. As
guerras e disputas entre nações deram lugar aos conflitos internos, e pelas
razões mais abjetas como a cor da pele, as crenças religiosas, políticas,
ideológicas, assim como pertencer a grupos, tribos e etnias diferentes e
rivais, ou simplesmente por estar do outro da rua no momento errado.
De
1989 a 2013, o número de mortes aumentou expressivamente no Sul e Centro da
Ásia, assim como na África Subsaariana, no Norte e Leste da África e também na
Europa e nas Américas. A violência, não apenas sexual, contra mulheres acima
dos 15 anos cresceu desmesuradamente, não apenas na Índia e Brasil, mas,
especialmente, na Etiópia, Peru, Bangladesh, Tanzânia, Tailândia, Namíbia,
Servia, Montenegro e no Japão. Em todos os países da África Central ainda há
registros de mutilação genital feminina de crianças a partir dos 2 anos. Muitas
morrem em decorrência das infecções e doenças que se instalam nas feridas. E
isso tudo bem debaixo dos nossos olhos.
O
abuso sexual contra meninos é também um motivo de preocupação. O clima geral de
impunidade na grande maioria dos países, especialmente na África e no Oriente
Médio, e de vácuo no Estado de direito afetam e comprometem a denúncia da
violência e abuso sexual contra crianças às autoridades e, por conseguinte, a
condenação dos perpetradores. De acordo com relatório da ONU, de julho de 2009,
os autores desses crimes estão ligados ao poder local (ao governo), são eleitos
pelo povo, são policiais, militares, assim como membros de grupos armados
ilegais e de gangues criminosas.
No
Afeganistão, Paquistão, Iraque e países vizinhos, escolas e seus equipamentos
são queimados. Quando não queimados ou destruídos dá-se o fechamento forçado ou
o uso das instalações para fins de guerra interna. Ataques, combates e
explosões de engenhos improvisados nas proximidades de prédios escolares e
ataques de militares e ameaças contra os alunos e o pessoal docente têm
aumentado de 2010 para cá. Esses incidentes são largamente perpetrados por
grupos de oposição aos governos, como também por elementos conservadores em
comunidades que se opõem à educação de meninas e mulheres.
Não
bastasse, atos criminosos são praticados contra os órgãos de ajuda humanitária
(internos e internacionais), cujo objetivo é justamente atender as crianças e
os civis detidos em campos de prisioneiros, ou os refugiados que se socorrem do
país vizinho. O uso de técnicas duras de interrogatório e confissão forçada de
culpa ainda são os recursos mais usados em grande parte dos países, tanto pela
polícia quanto pelos grupos de guerrilhas.
Relatório
de 2010 da ONU revela que gangues da América Central estão cada vez mais
transnacionais. Acredita-se que entre 8 mil e 10 mil membros dessas gangues
operam em 38 estados dos EUA. Mais de 1,8 mil de seus membros foram presos nos
Estados Unidos desde 2005. Em um caso recente, os líderes de uma gangue foram
acusados de ordenar o assassinato de pessoas, nos EUA, a partir de sua cela na
prisão de El Salvador.
A
violência no México e no Brasil não é apenas uma ameaça aos seus nacionais, é
um questão de segurança internacional que atinge a todos. A criminalidade
relacionada com os cartéis é um desafio que a polícia, nos dois países (e em
outros latino-americanos), não encontra os meios para debelar.
Relatório
econômico da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico
(OCDE), de 2013, revela que as políticas dos últimos anos posicionaram bem os
países em desenvolvimento em termos de resultados macroeconômicos e
financeiros. Porém, o crescimento econômico continua insuficiente e ainda resta
muito a ser feito para tornar a vida das pessoas mais digna e segura. Não há
outro caminho para acelerar a produtividade e melhorar as condições de vida das
camadas mais desfavorecidas senão diminuir a criminalidade. Para tanto, são
necessárias reformas de âmbito institucional, já que muitos dos problemas estão
relacionados entre si.
Essas
necessidades são de conhecimento de todos nós. Não há saída sem reformas
imperiosas visando o fortalecimento da educação, ao desenvolvimento de
habilidades e do empreendedorismo, à redução da regulamentação comercial e da
concorrência e à melhoria da legislação e do combate à corrupção, ao
narcotráfico e à impunidade.
Como
se vê, mesmo com todos esses avanços e o fortalecimento do direito e das
relações internacionais, o século 21 trouxe consigo a crise dos direitos
humanos. O mundo ficou chocado por pouco tempo depois da tentativa de
assassinato de Madala Yousafzai – símbolo global da luta de todas as meninas
pela educação (em janeiro de 2013) – pelos fundamentalistas islâmicos. Contudo,
de lá para cá a situação não melhorou e as pessoas continuam morrendo naquela
parte do mundo e em muitas outras. E morrem simplesmente por não estar
alinhadas com aqueles que naquele momento têm as armas na mão, e ousam desafiar
preceitos, dogmas, ideologias ou, simplesmente, por pensar e ser diferente.”
(MARISTELA
BASSO. Advogada, professora de Direito Internacional da Universidade de São
Paulo (USP), em artigo publicado no jornal ESTADO
DE MINAS, edição de 14 de fevereiro de 2014, caderno DIREITO & JUSTIÇA, página 3).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição,
caderno OPINIÃO, página 9, de
autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE
AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente
integral:
“Verdade,
bem e liberdade
A perda do laço
essencial entre verdade, bem e liberdade na cultura contemporânea é a
explicitação do caos moral que vai afundando a sociedade em acontecimentos
assustadores. Os fenômenos em torno de violências, justiça com as próprias
mãos, corrupção, fundamentalismos, entre outros, são resultado da perda deste
laço fundamental. Sua recuperação é um longo caminho a percorrer. Sua urgência
deve motivar os mais variados segmentos da sociedade, desde o recôndito da
privacidade familiar, passando pelas igrejas e escolas, até ações
governamentais em diferentes níveis, em um investimento mais consistente e
permanente.
O dia
a dia da sociedade sem comprometimento com a verdade, o bem o autêntico sentido
de liberdade pode trazer comprometimentos irreversíveis. O que se vê é um
crescente processo de desumanização, com graves consequências para a vida, de
todos e impactos na formação dos mais jovens. Assim, a ausência do laço
essencial entre verdade, bem e liberdade impede que sejam dados novos passos no
presente e também engessa a sociedade do amanhã. Muitos se acostumam com os
relatos de violência nos noticiários e até, de certo modo, os esperam a cada
dia, cultivando o gosto pelo hediondo. Alguns se sentem privilegiados, por não
serem alvos ou vítimas, e se comportam como meros espectadores do caos que vai
se implantando na sociedade. No entanto, o aumento crescente dessa violência é
um risco para todos, mesmo para os que estão nos seus bunkers de defesa e
comodidades.
Não
basta apenas um olhar sociológico e estrategista sobre essa situação.
Providências e encaminhamentos advindos dessas análises são importantes.
Contudo, o essencial é trabalhar pelo recuperação da perda do laço essencial
entre verdade, bem e liberdade. Há, pois, uma questão de ordem moral pesando
sobre os ombros de todos nessa luta de recomposição da sociedade. Quando se
considera, por exemplo, o mundo da política, a luta por reforma política,
obviamente que não basta legislar de modo novo e diferente, embora necessário. É
prioritário poder contar com homens e mulheres à altura de exercícios cidadãos,
superando o comum de fazer da política um canal para atendimentos de interesses
partidários e de grupos endinheirados.
Os
atrasos na sociedade são incontáveis, atingindo as instituições na sua
identidade e missão, desfigurando o sentido de cidadania que se sustenta na
verdade, no bem e na vivência autêntica da liberdade. O investimento
prioritário, portanto, é na ordem moral. Essa ordem não se enquadra na
permissividade de posicionamentos religiosos, políticos e sociais, nem nos
rigores fundamentalistas dos que se elegem como os iluminados e donos da
verdade. Urge um investimento permanente e consistente na ordem moral. Do contrário,
não se vai conseguir debelar o processo que está levando a sociedade a resvalar
na direção de um caos maior.
Que
absurdos ainda não foram presenciados? Repassar essa lista até desanima. A sensibilidade
moral é o remédio para combater o que o papa Francisco chama de globalização da
indiferença e o veneno da idolatria do dinheiro. A sociedade, por falta de
aprofundado sentido moral, está sendo, passo a passo, conduzida por diferentes
tiranias. Da tirania nascida da ganância que gera a insaciabilidade das
riquezas àquelas novas tiranias, invisíveis, às vezes virtuais, que impõem suas
leis e suas regras, cristalizando grupos radicais, de todo tipo, até
religiosos, contribuindo na complicação que a sociedade contemporânea está
vivendo.
A
verdade, o bem e a liberdade, como laço essencial da moralidade, devem ser o
horizonte inspirador cotidiano de ações, programas e testemunho individual, em
casa, na igreja, na escola, nas empresas, nas ruas, em todo lugar. É preciso libertar
a sociedade contemporânea dos excessos de uma cultura em que cada um pretende
ser portador de uma verdade subjetiva própria. Razões meramente políticas não
inspirarão ações condizentes, neste momento, na busca urgente de soluções para
mudar os cenários de exclusão e desigualdades, fontes de violências e disputas
que se travam até mesmo sem se ter certeza a respeito de qual bandeira se está
defendendo.
As
reações violentas tenderão a crescer por parte dos excluídos do sistema social
e econômico, que é injusto na sua raiz. O avanço na direção de indispensável
equilíbrio, para não inviabilizar a sociedade, supõe a convicção de que é
preciso investir sempre e em todos os níveis na recuperação da força moral.
Cada cidadão deve ser depositário dessa força, fazendo com que a sociedade
redescubra que seu sustento e progresso dependem do respeito incondicional à
verdade, o compromisso com o bem moral e a permanente aprendizagem quanto à fragilidade e limites da liberdade
humana.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes,
incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise
de liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas
educacionais, governamentais, jurídicas,
políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de
modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente
desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade –, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade
absoluta de nossas políticas públicas;
b) o
combate, implacável e sem trégua,
aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária
ordem; III – o desperdício, em todas
as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos,
indubitavelmente irreversíveis;
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e
insuportável desembolso de cerca de R$ 1
trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos
(apenas com esta rubrica, previsão de R$ 639 bilhões), a exigir igualmente uma
imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...
Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão
descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a
nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta
a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores
como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); a educação;
a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos
sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana
(trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às
commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência
social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas;
polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência,
tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações;
qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –,
transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade,
produtividade, competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada,
qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa
partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e
potencialidades com todas as
brasileiras e com todos os
brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos
e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do
PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da
globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do
conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um
possível e novo mundo da justiça, da
liberdade, da paz, da igualdade – e com
equidade –, e da fraternidade
universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...
O
BRASIL TEM JEITO!...