sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A CIDADANIA, A DEVOÇÃO E A CULTURA DO EGOÍSMO (53/7)

(Novembro = mês 53; faltam 7 meses para a Copa do Mundo)

“Devoção é um estado que desenvolve em nós a gratidão verdadeira
        
         A devoção é um estado interior precioso para o crescimento da alma, um estado de disponibilidade ao que vem do Alto, estado em que se busca atrair do universo o que há de melhor. Ao contrário do que muitos pensam, não é uma atitude passiva, nem receptividade meramente emocional aos níveis superiores do ser. Nesse estado ficamos esquecidos de nós mesmos e somos movidos pela fé.
         A devoção é uma chama interna. Conduz-nos a condições vibratórias cada vez mais sutis. Faz-nos prosseguir, apesar dos embates da vida. Com ela avançamos sempre, mesmo em períodos difíceis.
         Para muitas pessoas, a devoção pode ter início na religiosidade externa. Aos poucos vai amadurecendo e levando a personalidade a buscar a alma, a amá-la. Em graus mais avançados, leva a alma a amar o espírito e a aprofundar esse amor. O amadurecimento da devoção não é, pois, um processo apenas humano.
         Um verdadeiro devoto nunca destoa do resto das pessoas, pois procura não se diferenciar nos aspectos externos da vida, para não chamar atenção sobre si. Ele sabe que quanto mais igual for aos demais, mais passará despercebido.
         Ao cultivar essa atitude, a devoção permeia-lhe a existência e a transforma de maneira imperceptível. O verdadeiro devoto não almeja distinções nem reconhecimento. Distinções e reconhecimento podem até incomodá-lo, pois ele sabe que aquilo pelo que é reconhecido não lhe é devido e provém do seu objeto de devoção. Sabe que ele próprio nada merece e que tudo de positivo que expressa te origem no Alto.
         Um devoto não precisa fugir da vida nem se resguardar dela, mas perceber e observar o que acontece ao redor e, por meio da inspiração, saber que aderir e em que grau fazê-lo.
         É no interior do seu próprio ser que o devoto se apoia. Nada espera do mundo externo. Assim, para conservar-se em bom estado de ânimo e em harmonia independe de situações favoráveis. Encontra equilíbrio e estabilidade no objeto da sua devoção e não no que o cerca.
         O verdadeiro devoto é alegre. E essa alegria distende-lhe os músculos, fica estampada no seu rosto.
         Vivemos em um mundo material e, em geral, segundo leis da matéria. Tal situação foi bem descrita quando Paulo de Tarso disse que não fazia o bem que queria e sim o mal que não queria. Para compreendermos melhor esse mecanismo é bom distinguir devoção incondicional de devoção condicional. É comum que as pessoas demonstrem devoção  enquanto recebem o que lhes agrada e queiram perpetuar essa etapa. Mesmo tendo recebido tudo o que precisavam, na hora de se doarem apresentam restrições. Quem restringe sua doação diminui proporcionalmente os resultados e faz a chama da devoção extinguir-se.
         O desenvolvimento da devoção aumenta nossas capacidades. Enquanto a maior parte da humanidade perde energia falando, sentindo e pensando coisas supérfluas, a devoção ensina-nos a aplicar as capacidades em cada situação sem desperdícios.
         Manifestar devoção ativa já é, e si, uma graça. Os que têm essa devoção desenvolvem a gratidão, que lhes traz alegria e beleza verdadeiras.
         Assim, a gratidão do devoto difere da que têm as pessoas comuns. Enquanto a segunda é apenas o sentimento de quem recebeu um favor e gostaria de retribuí-lo, a primeira transcende tal sentimento.
         O devoto maduro manifesta gratidão por tudo, gratidão pela vida.”

(TRIGUEIRINHO, que é escritor, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 27 de outubro de 2013, caderno O.PINIÃO, página 20).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de FREI BETTO, que é escritor, autor de Calendário do poder (Rocco), entre outros livros, e que merece integral transcrição:

“Cultura do egoísmo
        
         É bem conhecida a parábola do bom samaritano (Lucas 10, 25-37), provavelmente baseada em uma história real. Um homem descia de Jerusalém a Jericó. No caminho, foi assaltado, espoliado, surrado e deixado à beira da estrada. Um sacerdote por ali passou e não o socorreu. A mesma atitude de indiferença teve o levita, um religioso. Porém, um samaritano – os habitantes da Samaria eram execrados pelos da Judeia –, ao avistar a vítima do assalto, interrompeu sua viagem e cobriu o homem de cuidados.
         Jesus narrou a parábola a um doutor da lei, um teólogo judeu que nem sequer pronunciava o vocábulo samaritano para não contrair o pecado da língua. E levou o teólogo a admitir que, apesar da condição religiosa do sacerdote e do levita, foi o samaritano quem mais agiu com amor, conforme a vontade de Deus.
         Na Itália, jovens universitários  expuseram à beira da estrada cartaz advertindo que, próximo dali, um homem necessitava ser urgentemente transportado a um hospital. Todos os motoristas eram parados adiante pela Polícia Rodoviária para responderem por que passaram indiferentes. Os motivos, os de sempre: pressa, nada tenho a ver com desconhecidos, medo de doença contagiosa ou de sujar o carro.
         Quem parou para acudir foi um verdureiro que, numa velha camionete, transportava seus produtos à feira. Comprovou-se que os pobres, assim como as mulheres, são mais solidários que os homens burgueses. Em uma escola teológica dos EUA, seminaristas foram incumbidos de fazer uma apresentação da parábola do bom samaritano. No caminho do auditório ficou estendido um homem, como se ali tivesse caído. Apenas 40% dos seminaristas pararam para socorrê-lo. Os que mais se mostraram indiferentes foram os estudantes advertidos de que não poderiam se atrasar para a apresentação. No entanto, se dirigiam a um palco no qual representariam a parábola considerada emblemática quando se trata de solidariedade.
         A solidariedade é uma tendência inata no ser humano. Porém, se não for cultivada pelo exemplo familiar, pela educação, não se desenvolve. A psicóloga estadunidense Carolyn Zahn-Waxler verificou que crianças começam a consolar familiares aflitos desde a idade de 1 ano, muito antes de alcançarem o recurso da linguagem.
         A forma mais comum de demonstrar afeto entre humanos é o abraço – dado em aniversários, velórios, situações de alegria, aflição ou carinho. Existe até a terapia do abraço. Segundo notícia da Associated Press (18/6/2007), uma escola de ensino médio da Virginia, EUA, incluiu no regulamento a proibição de qualquer contato físico entre alunos e entre alunos e professores. Hoje em dia, em creches e escolas dos EUA educadores devem manter distância física das crianças, sob pena de serem acusadas de pedofilia.
         As crianças e os grandes primatas – nossos avós na escala evolutiva – são capazes de solidariedade a pessoas necessitadas. É o que comprovou a equipe do cientista Felix Warneken, do Instituto Max Planck, de Leipzig, Alemanha (2007). Chimpazés de Uganda, que viviam soltos na selva, eram trazidos à noite ao interior de um edifício. Um animal por vez. Ele observava um homem tentando alcançar, sem sucesso, uma varinha de plástico através de uma grade. Apesar de seus esforços, o homem não conseguia pôr as mãos na varinha. Já o chimpazé ficava em um local de fácil acesso à varinha. Espontaneamente o animal, solidário ao homem, apanhava a varinha e entregava a ele.
         É bom lembrar que os chimpazés não foram treinados a isso nem recompensados por assim procederem. Teste semelhante com crianças deu o mesmo resultado. Mesmo quando a prova foi dificultada, obrigando crianças e chimpazés a escalar uma plataforma para alcançar a varinha, o resultado foi igualmente positivo. Em 16 de agosto de 1996, Binti Jua, gorila de 8 anos de idade, salvou um menino de 3 anos que caíra na jaula dos primatas no zoológico de Chicago. O gorila sentou em um tronco com o menino ao colo e o afagou com as costas da mão até que viessem buscar a criança. A revista Time elegeu Binti uma das “melhores pessoas” de 1996.
         Frente a tais exemplos, é de se perguntar o que a nossa cultura, baseada na competitividade, e não na solidariedade, faz com as nossas crianças e engendra que tipo de adultos. Os pobres, os doentes, os idosos e os necessitados que o digam.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais  livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

    b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;

    c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; turismo; cultura, esporte e lazer; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...