quarta-feira, 1 de julho de 2015

A CIDADANIA, A ARTE DE APRENDER E EMPREENDER, A CRISE HÍDRICA E A CULTURA DA SUSTENTABILIDADE (11/13)

(Julho = mês 11; faltam 13 meses para a Olimpíada 2016)

“Aprender a empreender
        Complexidade, instabilidade, mudança: essas três palavras podem muito bem descrever o ambiente no qual nos encontramos na atualidade. Viver tem se transformado numa aventura na qual somos cada vez mais exigidos a dar o nosso melhor, a fazer a diferença, a agregar valor.
         Nesse contexto, quando é o tempo adequado para se começar a capacitação de uma pessoa? Onde é o local adequado e quem serão os elementos de transformação que levarão essa tarefa a efeito? Na minha experiência de 13 anos em lidar com jovens, tenho observado o crescimento da angústia que se expressa na urgência em definir entre os múltiplos caminhos para a construção de uma carreira. A carreira é posta diante dos jovens cada vez mais precocemente, exigindo que façam suas escolhas. Essa decisão, que se transforma no ponto de partida para toda uma vida, deve ser tomada aos 15, 16, no máximo, aos 17 anos!
         Recordo bem que, há cinco anos, na reta final para a escolha de que curso seguir, mais uma vez me deparei com a situação padrão: quase metade dos alunos ainda não sabia que curso escolher. Alguns, estimulados pela família, tendiam a certos cursos, outros, na falta de clareza, apoiavam-se nas escolhas dos melhores amigos. Outros ainda, perdidos em meio a tantas opções, vagavam em meio a um estado de total angústia. De repente, aparece aquela que parecia ser uma tendência inexorável: em cinco anos, faltariam ao país cerca de 200 mil engenheiros, necessários para tocar obras, gerir projetos e construir um país promissor. O que se viu foi uma debandada generalizada de alunos em direção aos diversos cursos de engenharia. Notei que, mesmo entre aqueles que já haviam se decidido, subitamente, mudaram seus rumos.
         Decisão frágil, baseada no externo, conduziu vasta parcela de alunos para um 2015 no qual uma grave crise paralisa obras e projetos e desemprega engenheiros, jogando na absoluta surpresa aqueles que já se imaginavam garantidos numa carreira de sucesso.
         Esse pequeno exemplo é adequado para esclarecer a importância em se preparar os jovens para realizarem suas escolhas profissionais em bases mais sólidas: não o externo, mas sim na sua dimensão interna, onde estão seus talentos, suas preferências e, exatamente por isso, suas maiores possibilidades de sucesso.
         O ensino do empreendedorismo, já no ensino médio, se propõe a preencher essa lacuna ao apoiar o aluno a assumir o protagonismo de sua própria história. A apresentação e a prática de comportamentos tais como a iniciativa e a proatividade, o comprometimento para com seus valores e ideais, a exigência de realizar com excelência tudo aquilo a que se propuser são exemplos pertinentes do que pode o ensino do empreendedorismo realizar na vida de um jovem capaz e interessado. Uma vez enraizados, esses comportamentos serão úteis para toda a vida, possibilitando a construção de uma carreira valorosa e útil, para si mesmo e para a sociedade que o cerca.”

(Carlos Ronan de A Braga. Professor, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 28 de junho de 2015, caderno O.PINIÃO, página 21).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 27 de junho de 2015, caderno PENSAR, página 2, de autoria de INEZ LEMOS, psicanalista, e que merece igualmente integral transcrição:

“Crise hídrica e

 NARCISISMO
        
         A lógica em que o uso da água foi inserida em nossa cultura é a lógica da mercantilização, do consumo exacerbado e do lucro. Há tempos a água deixou de ser recurso natural, um bem coletivo, para se transformar em mercadoria a ser vendida. No imaginário empresarial, é um produto a ser negociado como um objeto de consumo qualquer. O sucesso do capitalismo depende do quanto de fetiche e de ilusão consegue-se criar em torno de uma mercadoria. É quando a água abandona o valor de uso e incorpora o valor de troca. Ela circula na perspectiva da acumulação, o mundo dos negócios a utiliza para alavancar investimentos. É peça-chave nas empresas, dela dependem o capital, os meios de produção.
         A crise hídrica nos impõe um paradoxo: como conciliar conceitos e práticas sociais petrificados no discurso da rentabilidade e da ostentação, em que competição, cliente preferencial e patrimônio confrontam com o discurso da ética e da necessidade de economizar água? De repente, inicia-se o processo de deslocamento de posição: a água não deve mais ser vista como mercadoria rentável, seu uso deve ser racionado. O discurso agora é o da consciência social e da cidadania, pois se trata de um bem natural, de uso coletivo. Se educarmos as crianças no excesso e na lógica do desperdício, como enfrentar tal desafio? Na TV, logo depois de anúncios de sapatos e cosméticos, temos os órgãos responsáveis pela captação e distribuição da água solicitando que a população economize, poupe, não desperdice tão precioso recurso natural.
         Quando convocamos a população prestar atenção em seus hábitos, a investigar se eles estão adequados ao conceito de cidadania e ética, supomos que ela esteja sensibilizada para a questão. Mas isso não ocorre, pois não educamos as crianças em valores envolvendo significantes que instituem a prática de poupar, implicar, cuidar, prevenir, respeitar. Cuidar da água é prevenir, contraponto ao descaso com a natureza, rios, mananciais e florestas. Muitos nascem e crescem entre asfalto, condomínios e jardins artificiais, convivem com o arremedo da natureza e não percebem o quanto estão distantes da origem das coisas. Alienados do processo de produção das mercadorias, julgam normal usar e abusar.
         Para que possamos aderir ao apelo de usar água de forma racional, deveríamos ser sensibilizados para tal, pois racionar implica sacrifício, mudança de hábitos, abandonar o conforto e abraçar uma causa desconfortável, que pode gerar mal-estar. A subjetividade contemporânea não prevê felicidade na lógica da economia. O brasileira cresceu na cultura do desperdício, poupar não está em nossa agenda. Gostamos do excesso – e racionalizar água implica banhos rápidos, além de outras práticas que garantem menor consumo. Para tanto, é necessária a intervenção no corpo desejante, pois ações governamentais não podem ficar à mercê da boa vontade da população.
         Em Considerações atuais sobre a guerra e sobre a morte, Freud desconstrói a ideia de progresso e registra a descrença no ser humano em questões coletivas, questões que envolvem o bem social. Nesse momento, a esperança iluminista se desfaz: igualdade, liberdade e fraternidade. Diante da devastação provocada pela guerra e da banalização da morte, evidenciou-se o fracasso da razão universal, constatando-se que o exercício do mal estaria no centro da razão civilizada. Ao deparar com a presença da morte e do mal na orientação psíquica, Freud perde a ilusão que sustentava a dimensão simbólica da vida social. Ao constatar que a política não consegue dar conta das diferentes subjetividades, cunha a expressão “narcisismo das pequenas diferenças”. Ou seja: pouco se pode esperar de cada um quando se trata do bem-comum.
         Para que o cidadão assuma as campanhas de economia de água, ele deve ser mobilizado em novas posturas, aderir a restrições e limites sem sofrer. Poucos governos trabalham com prevenção e sensibilização, inserindo desde cedo o cidadão no princípio educativo. Quando a criança é educada convivendo com a frustração, quando os pais a deixam na falta, não tentam supri-la em tudo, ela aceita melhor as interdições e renuncia às pulsões de forma mais tranquila. Educar para a cidadania exige coragem dos pais em coibir excessos e caprichos dos filhos, conduzindo a criança a aceitar as restrições necessárias. Geralmente, nada se consegue quando a interdição ocorre sem que ela, desde pequena, tenha sido inserida na lei. É de pequeno que o corpo pulsional é contaminado pelas exigências do projeto civilizatório.
         Mal-estar, frustração e irritação são efeitos da renúncia pulsional. Há mal-estar quando temos que restringir demandas e caprichos. Quanto mais se educa o filho no excesso, permitindo e, muitas vezes, incentivando apelos descabidos, contribui-se para que o sofrimento se instale. O mal-estar contemporâneo é gestado no excesso de permissividade. A ausência de interdição explica a dificuldade dos pais em impor leis e limites. A sociedade de consumo explora a ausência da metáfora paterna. Permitir vende mais do que reprimir, o que ajuda a explicar a crise de autoridade, a crise na função paterna e materna.
         Quando o espaço privado entra em crise, o público também sofre as consequências. O declínio do poder paterno provoca o declínio do poder público. Quanto maior a ausência de intervenção pulsional, menor a chance de o cidadão aderir às campanhas de regulamentação e socialização do uso da água ou de outros recursos naturais. O pacto selado entre as famílias é o que garante o pacto na sociedade.
         Toda vez que surgem propostas que rompem com o imaginário social petrificado no individualismo consumista, exigindo ética no uso do espaço público, há desconforto e perda de gozo. Tudo o que fere a fantasia fálica de privilegiado e poderoso, significantes sustentados na ilusão de completude, provoca uma contratransferência, pois o indivíduo estabelece uma relação fálica (de poder) com o objeto – no caso, com a água. Gastar água ao bel-prazer é operar no gozo – quando o sujeito não quer saber, tampouco se implicar.
         A questão passa, então, pela necessidade de ativar no cidadão a consciência em relação ao uso racional da água. Como encetá-lo em práticas educativas adversas ao mundo da ostentação e acumulação patrimonialista? Educar na ética exige que a criança seja inserida na ordem simbólica que sustenta o enunciado. O discurso que predomina na sociedade de mercado não articula significantes que sustentam a lógica do bem comum, exigindo parcimônia nos hábitos. Educamos para o lucro, opulência e fartura. É quando a criança cresce vendo os adultos usando a água sem restrições: escovando os dentes com a torneira aberta, tomando banhos prolongados ou exigindo da faxineira lavar as calçadas.
         Toda mudança requer sacrifício, adesão a novos paradigmas. Como migrar da lógica da competição para a lógica da colaboração? Tornam-se necessárias rupturas internas, abandonar montagens perversas que debocham da metáfora paterna. Montagens cristalizadas em atos pouco transparentes e que não se ajustam às escolhas fundadas nos princípios de cidadania. Cultuar privilégios não é reivindicar ética, lisura no uso da coisa pública. Ao regular o uso da água, devemos dialogar com as subjetividades – operar com o simbólico desconstruindo a lógica objetiva, racional. Deslocar-nos da esfera do cliente para a esfera do cidadão: desviar o uso da água da lógica do mercado, em que o cliente bom é o que mais consome.
         Um novo cidadão há de surgir na defesa das causas públicas quando novas formas de subjetivação, distantes da razão cínica de sempre levar vantagem, forem contempladas. A retórica da ética e do bem comum é frágil e insuficiente diante do imperativo de gozo, quando o sujeito não quer perder nada, mudar nada, restringir nada! A forma como ele vai responder às demandas de racionalizar água dependerá de como foi inserido na ordem simbólica que prega ética no uso da coisa pública. Como mudar uma cultura, gestar outra concepção de mundo e intervir em práticas que envolvem narcisismo, desejo e pulsões? Nunca é tarde para reiniciar posturas decentes e cobrar responsabilidade dos envolvidos na questão.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas (enfim, 125 anos depois, a República proclama o que esperamos seja verdadeiramente o início de uma revolução educacional, mobilizando de maneira incondicional todas as forças vivas do país, para a realização da nova pátria; a pátria da educação, da ética, da justiça, da civilidade, da democracia, da participação, da sustentabilidade...);

     b)    o combate implacável, sem eufemismos e sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo dados do Banco Central, a taxa de juros do cartão de crédito subiu 1,7 ponto percentual em abril e atingiu 347,5%  ano ano...); II – a corrupção, há séculos, na mais perversa promiscuidade  –  “dinheiro público versus interesses privados” –, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem (a propósito, a simples divulgação do balanço auditado da Petrobras, que, em síntese, apresenta no exercício de 2014 perdas pela corrupção de R$ 6,2 bilhões e prejuízos de R$ 21,6 bilhões, não pode de forma alguma significar página virada – eis que são valores simbólicos –, pois em nossos 515 anos já se formou um verdadeiro oceano de suborno, propina, fraudes, desvios, malversação, saque, rapina e dilapidação do nosso patrimônio... Então, a corrupção mata, e, assim, é crime...); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis (por exemplo, e segundo o estudo “Transporte e Desenvolvimento – Entraves Logísticos ao Escoamento de Soja e Milho, divulgado pela Confederação Nacional do Transporte, se fossem eliminados os gastos adicionais devido a esse gargalo, haveria uma economia anual de R$ 3,8 bilhões...);

     c)     a dívida pública brasileira - (interna e externa; federal, estadual, distrital e municipal) –, com projeção para 2015, apenas segundo a proposta do Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1,356 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 868 bilhões), a exigir IMEDIATA, abrangente, qualificada e eficaz auditoria... (ver também www.auditoriacidada.org.br).

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade – “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo e nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a   Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!

O BRASIL TEM JEITO!...