“A
sociedade do cansaço e do abatimento social
Há uma discussão pelo
mundo sobre a “sociedade do cansaço”. Seu formulador principal é um coreano que
ensina filosofia em Berlim, Byung-Chul Han. O pensamento nem sempre é claro e
é, por vezes, discutível, como quando afirma que o “cansaço fundamental” é
dotado de uma capacidade especial de “inspirar e fazer seguir o espírito”.
Independentemente
das teorizações, vivemos numa sociedade do cansaço. No Brasil, além de cansaço,
sofremos um desânimo e um abatimento atroz.
A
aceleração do processo histórico e a multiplicação de sons e mensagens, o
exagero de estímulos e comunicações, especialmente pelo marketing comercial,
pelos celulares com todos os seus aplicativos, e a superinformação que nos
chega pelas mídias sociais nos causam depressão, dificuldade de atenção e uma
síndrome de hiperatividade. Chegamos ao fim do dia estressados e
desvitalizados.
Acresce-se
ainda o ritmo do produtivismo neoliberal imposto aos trabalhadores no mundo
inteiro. Cobra-se de todos o melhor desempenho possível, o que desequilibra
emocionalmente as pessoas, gerando irritabilidade e ansiedade. O número de
suicídios é assustador. Ressuscitou-se o dito da revolução de 68 do século
passado. Então se dizia: “metrô, trabalho, cama”. Agora se diz: “metrô,
trabalho, túmulo”. Quer dizer: doenças letais, perda do sentido da vida e
verdadeiros infartos psíquicos.
Entre
nós, nos últimos meses, grassa um desalento generalizado. A campanha eleitoral
turbinada com grande virulência verbal, acusações, deformações e reais
mentiras, além do fato de a vitória do PT não ter sido aceita, suscitou ânimos
de vindita. Bandeiras sagradas do PT foram traídas pela corrupção em altíssimo
grau, gerando decepção profunda, o que fez perder costumes civilizados. A
linguagem se canibalizou. Saíram do armário o preconceito contra os nordestinos
e a desqualificação da população negra. Como disse Sérgio Buarque de Holanda:
podemos agir a partir do coração cheio de raiva, de ódio e de preconceitos.
Os
interesses das classes abastadas são antagônicos aos das classes empobrecidas.
Aquelas, historicamente hegemônicas, temem a inclusão dos pobres e a ascensão
de outros setores da sociedade, a lugares antes reservados apenas para elas.
Somos um dos países mais desiguais do mundo, onde mais campeiam injustiças
sociais, violência banalizada e assassinatos que equivalem em número à guerra
do Iraque. Temos trabalhadores vivendo sob condição equivalente à da
escravidão.
Como
sair desse inferno humano? A nossa democracia é apenas de voto; não representa
o povo, mas os interesses dos que financiaram as campanhas, por isso é de
fachada.
Vejo
uma saída possível por parte da sociedade organizada e dos movimentos sociais,
que possuem outro ethos e outro sonho de Brasil e de mundo. Mas eles precisam
estudar, se organizar, pressionar as classes dominantes e o Estado
patrimonialista, se preparar para propor uma alternativa de sociedade que
possua raízes naqueles que, no passado, lutaram por outro Brasil com projeto
próprio. Um povo doente e ignorante nunca fundará uma nova e possível
biocivilização nos trópicos.
Tal
sonho pode nos tirar do cansaço e do desamparo social e nos devolver o ânimo
necessário para enfrentar os entraves dos conservadores e suscitar a esperança
bem fundada de que nada está totalmente perdido, mas que temos uma tarefa
histórica a cumprir. Utopia? Como dizia Oscar Wilde, “se no nosso mapa não
constar a utopia, nem olhemos para ele, porque nos está escondendo o
principal”. Do caos presente deverá sair algo bom. Em vez da cultura do cansaço
e do abatimento, teremos uma cultura da esperança e da alegria.”.
(LEONARDO
BOFF. Filósofo e Teólogo, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 15 de
janeiro de 2016, caderno O.PINIÃO,
página 18).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 22 de
janeiro de 2016, caderno OPINIÃO, página
7, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE
AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente
integral transcrição:
“Combate
à indiferença
A indiferença é
incontestável ameaça à paz e, por isso, o papa Francisco faz o
convite-convocação: “Vence a indiferença e conquista a paz”. Essa interpelação,
tema do Dia Mundial da Paz 2016, diz respeito a todos os cidadãos. Exige
redobrada atenção por parte dos diferentes segmentos da sociedade. Não se trata
de um movimento simples e qualquer, mas da capacidade para o diálogo, que vai
além de simples conversa e está distante dos conchavos interesseiros. Trata-se
de caminho para nova cultura.
A
indiferença é espessa camada a ser removida, com muito esforço, para dar lugar
à fluidez da escuta e sensibilidade que fazem nascer no coração humano a
competência para eleger, em todas as circunstâncias, o outro como prioridade.
Por isso, se equivocam dirigentes, governantes e todos os que escolhem, decidem
e operam na contramão do diálogo. Os prejuízos são enormes e facilmente
constatáveis: a vergonhosa exclusão social, a perpetuação dos esquemas de
corrupção e a manipulação do que é bem comum em benefício de interesses
particulares. O resultado é uma terrível mediocridade na atuação de dirigentes
e governos, sem lucidez para encontrar soluções e saídas. Consequentemente, a
paz segue ameaçada.
É
óbvio concluir que a falta de diálogo provocada pela indiferença é um problema
grave. Trata-se de carência comum a vários ambientes – parlamentos, muitas
vezes cenários, de poucos e ineficazes entendimentos; diversos ambientes de
trabalho e famílias. A falta do diálogo, alimentada e alimentadora da
indiferença, tudo envenena. A indiferença comprova a carência de sabedoria na
condução da vida. É sinal da perda de rumo e da incompetência que impede
exercícios responsáveis e inventivos na atuação profissional e cidadã.
Situações
desoladoras resultam desse verdadeiro veneno: os desperdícios, a perda de
oportunidades para avanços e progressos, o recrudescimento de grupos, a disputa
entre pessoas, famílias, nações. Ninguém fica isento de pagar um alto preço,
que inclui o aumento da violência. Ela nasce também das revoltas e da dor da
indiferença sofrida pelos mais pobres, por quem não tem voz e vez. E não
adiantam esquemas de segurança, isolamentos que desenham segregações ou portas
fechadas para tratar em mesas restritas os assuntos que dizem respeito ao
interesse do bem comum.
Nesse
contexto, a vida de todos, indistintamente, é temperada pelos espectros de
incertezas e desconfianças que descompassam corações, inteligências e
vivências. Não há, assim, outro caminho, senão acolher, efetiva e urgentemente,
a convocação de investir na superação da indiferença, particularmente pela
prática sincera e permanente do diálogo, compreendido como escuta prioritária
do outro, antes de qualquer juízo e decisão. Isso envolve a conduta pessoal e
também transformações nas dinâmicas institucionais. É mudança cultural capaz de
introduzir uma novidade na esfera de entendimentos e de deixar aparecer a luz
da sabedoria, que permite encontrar saídas para as crises. Uma luminosidade
apropriada para oferecer respostas aos muitos questionamentos, soluções para
problemas e dar nova configuração aos cenários sociais, políticos e culturais.
Vale
acolher a instigante convocação feita pelo papa Francisco: “Vence a indiferença
e conquista a paz”, que se torna ainda mais forte pela exemplaridade de suas
atitudes – em permanente diálogo com todas as pessoas, com a cultura contemporânea
– e também por sua simplicidade cativante. Acolher essa convocação significa
admitir que a indiferença globalizada é um inimigo comum a ser combatido e
vencido com urgência. Essa embate inclui indispensavelmente o empenho pessoal
de todos. Raciocínio lógico e simples é considerar que, se cada pessoa enfrenta
a indiferença e luta pela paz, alcançam-se grande impacto positivo na qualidade
dos relacionamentos e valiosas soluções para as crises governamentais,
institucionais, familiares e de relações humanas.
Há um
caminho a ser trilhado para qualificar-se como agente de combate à indiferença
na sociedade: buscar aproximar-se de Deus. O papa Francisco lembra que a
indiferença em relação a Deus supera a esfera íntima e espiritual do indivíduo
e traz consequências para a esfera pública e social. De modo interpelante,
Francisco acrescenta que o esquecimento e a negação de Deus induzem o homem a
não reconhecer qualquer norma que esteja acima de si. Isso produz crueldade e
violência. Assim, para edificar um mundo melhor, é hora de vencer a indiferença
que ameaça a paz.”.
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e
oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança
de nossa história – que é de ética, de
moral, de princípios, de valores –, para
a imperiosa e urgente necessidade de profundas
mudanças em nossas estruturas educacionais,
governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas,
financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no
concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e
sustentavelmente desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras
cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade –, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas
públicas (enfim, 125 anos depois, a República proclama o que esperamos seja
verdadeiramente o início de uma revolução educacional, mobilizando de maneira
incondicional todas as forças vivas do país, para a realização da nova pátria;
a pátria da educação, da ética, da justiça, da civilidade, da democracia, da
participação, da sustentabilidade...);
b) o
combate implacável, sem eufemismos e
sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são:
I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo dados do Banco Central, a taxa
de juros do cartão de crédito atingiu em novembro a também estratosférica marca
de 378,76% para um período de doze meses; e mais, em 2015, o IPCA acumulado nos doze meses
chegou a 10,67%...); II – a corrupção, há
séculos, na mais perversa promiscuidade
– “dinheiro público versus
interesses privados” –, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária
ordem (a propósito, a lúcida observação do procurador chefe da força-tarefa da
Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol: “A Lava Jato ela trata hoje de um tumor,
de um caso específico de corrupção, mas o problema é que o sistema é
cancerígeno...” – e que vem mostrando também o seu caráter transnacional; eis, portanto, que todos os valores que vão
sendo apresentados aos borbotões, são apenas simbólicos, pois em nossos 515
anos já se formou um verdadeiro oceano de suborno, propina, fraudes, desvios,
malversação, saque, rapina e dilapidação do nosso patrimônio... Então, a
corrupção mata, e, assim, é crime...); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar
inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis (por exemplo,
segundo Lucas Massari, no artigo ‘O Desperdício na Logística Brasileira’, a
“... Desconfiança das empresas e das famílias é
grande. Todos os anos, cerca de R$ 1 trilhão, é desperdiçado no Brasil. Quase
nada está imune à perda. Uma lista sem fim de problemas tem levado esses
recursos e muito mais. De cada R$ 100 produzidos, quase R$ 25 somem em meio à
ineficiência do Estado e do setor privado, a falhas de logística e de
infraestrutura, ao excesso de burocracia, ao descaso, à corrupção e à falta de
planejamento...”;
c) a
dívida pública brasileira - (interna e
externa; federal, estadual, distrital e municipal) –, com projeção para
2016, apenas segundo a proposta do Orçamento Geral da União, de exorbitante e
insuportável desembolso de cerca de R$
1,348 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos
(ao menos com esta rubrica, previsão de R$
1,044 trilhão), a exigir alguns fundamentos da sabedoria grega:
-
pagar,
sim, até o último centavo;
-
rigorosamente, não pagar com o pão do povo;
-
realizar uma IMEDIATA, abrangente,
qualificada, independente e eficaz auditoria...
(ver também www.auditoriacidada.org.br)
(e
ainda a propósito, no artigo Melancolia,
Vinicius Torres Freire, diz: “... Não será possível conter a presente
degradação econômica sem pelo menos, mínimo do mínimo, controle da ruína das
contas do governo: o aumento sem limite da dívida pública...”);
Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta
de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já
combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de
poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições,
negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à
pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas
e sempre crescentes necessidades de ampliação
e modernização de setores como: a gestão
pública; a infraestrutura (rodovias,
ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada,
esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística
reversa); meio ambiente; habitação;
mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda;
agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência
social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança
pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e
desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer;
turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e
operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade
– “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade,
competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira
alguma, abatem o nosso ânimo e nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada,
civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que
possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e
potencialidades com todas as
brasileiras e com todos os
brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários
previstos e que contemplam eventos como a
Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das
exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das
organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas
tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a
nossa esperança... e perseverança!
“VI,
OUVI E VIVI: O BRASIL TEM JEITO!”
-
Estamos nos descobrindo através da Cidadania e Qualidade...
-
ANTICORRUPÇÃO: Prevenir e vencer, usando nossas defesas democráticas...
- Por uma
Nova Política Brasileira...