“O
mito de Héstia, que representa
nosso centro, o do lar e o da Terra
Atualmente, há toda uma
nova forma de interpretar os velhos mitos gregos e de outros povos. Em vez de
considerar os deuses e as deusas entidades subsistentes, agora cresce a
hermenêutica, especialmente após os estudos do psicanalista Jung e de seus
discípulos Hilman, Neumann, Paris e outros, segundo a qual conceitos abstratos
não conseguem expressá-los.
Um
desses mitos é o da deusa Héstia, filha de Cronos (o deus do tempo e da idade
de ouro). E de Reia, a grande mãe, geradora de todos os seres. Héstia represente
o nosso centro pessoal, o centro do lar e o centro da Terra, nossa Casa Comum.
É virgem, não por desprezar a companhia do homem, mas para poder, com maior
liberdade, cuidar de todos os que se encontram no lar.
Héstia
significa, em grego, a “lareira com fogo aceso”: aquele lugar ao redor do qual
todos se agrupam para se aquecerem e conviverem. Portanto, é o coração da casa,
o lugar da intimidade familiar, longe do tumulto da rua. Héstia protege, dá
segurança e aconchego. Além disso, a ela cabem a ordem da casa e a chave da
despensa, para que sempre esteja bem fornida para familiares e hóspedes.
Nas
casas gregas e romanas, mantinha-se sempre um fogo aceso para expressar a
presença protetora de Héstia. Se o fogo de apagasse, era presságio de alguma
desgraça. Também não se começava a refeição sem fazer um brinde a ela.
Héstia
significava, também, aquele canto para onde alguém se recolhe para estar só,
ler seu jornal ou um livro e fazer uma meditação. Cada um tem o seu
“lugarzinho” ou sua cadeira preferida. Para saber onde se encontra a nossa
Héstia, devemos nos perguntar quanto estamos fora de casa: qual é a imagem que
melhor lembra o nosso canto? Aí está o centro existencial da casa. Sem a
Héstia, a casa se transforma num dormitório ou numa espécie de pensão gratuita,
sem vida. Com a Héstia há afeição, bem-estar e o sentimento de estar
“finalmente em casa”.
Héstia
era por todos venerada e, no Olimpo, a primeira a ser reverenciada. Júpiter
sempre defendeu sua virgindade contra o assédio sexual de alguns deuses mais
assanhados.
A
nossa cultura patriarcal e a masculinização das relações sociais tornam Héstia
grandemente enfraquecida. As mulheres fizeram bem em sair de casa, desenvolver
sua dimensão de “animus” (capacidade de se organizar e dirigir); Mas tiveram
que sacrificar, em parte, a sua dimensão de Héstia. Levaram para o mundo do
trabalho as virtudes principais do feminino: o espírito de cooperação e o
cuidado que tornaram as relações menos rígidas. Mas chega o momento de voltar
para casa e de resgatar Héstia.
Ai da
casa desleixada e desordenada! Aí emerge a vontade de que Héstia se faça
presente para garantir a atmosfera boa, íntima e familiar. Esta não é apenas
tarefa da mulher, mas também do homem. Por isso, em todo homem e em toda
mulher, deve-se equilibrar o momento de Hermes, o estar fora de casa para
trabalhar, com o momento de Héstia, o de voltar ao centro e ter seu refúgio e
aconchego.
Hoje,
por mais feministas que sejam as mulheres, elas estão resgatando essa dosagem
vital.
Héstia
também designava o centro da Terra, onde está o fogo primordial. Se a Terra não
é mais o centro físico do universo, ela continua sendo o centro psicológico e
emocional. Aqui vivemos, nos alegramos, sofremos e morremos. Mesmo viajando aos
espaços exteriores, os astronautas sempre revelavam ter saudades da Mãe Terra,
onde tudo o que é significativo e sagrado está aqui.
Temos
que resgatar Héstia, protetora da Casa Comum, manter seu fogo vivo e
conferir-lhe sustentabilidade. Não estamos lhe rendendo as honras que merece, e
ela nos envia seus lamentos com o aquecimento global e as calamidades
naturais.”
(LEONARDO
BOFF. Filósofo e Teólogo, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 22 de
janeiro de 2016, caderno O.PINIÃO,
página 16).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 5 de
fevereiro de 2016, caderno OPINIÃO,
página 7, de autoria de DOM WALMOR
OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que
merece igualmente integral transcrição:
“Cultura
da solidariedade
Considerar a
importância da cultura na formação de processos sociais, políticos, religiosos
e cidadãos é determinante, pois o conjunto de valores, princípios e hábitos
consistiu vetor que pode impulsionar projetos, avanços e possibilidades de
conquista. Isso significa que o enfrentamento de crises depende dos elementos
culturais que caracterizam grupos diversos – sociais, religiosos, entre outros.
Assim, é fundamental investir na cultura, desenvolver análises, avaliações e
promover correções. Não basta, por exemplo, alcançar o objetivo desafiador de
melhorar índices da economia. Para avançar, inclusive no campo econômico, é
preciso considerar a força dos valores culturais de um povo, com incidência
forte e profunda nos diversos processos.
Nesse
sentido, o Brasil e suas regiões precisam de investimentos no tecido cultural.
Não se pensa, obviamente, numa radical mudança, como se diz popularmente, “da
água para o vinho”. Porém, pela força da cultura, grandes conquista podem ser
alcançadas. E, entre as reformulações culturais necessárias, é preciso investir
na renovação dos valores que regem o exercício da política na sociedade
brasileira. Os parâmetros que muitas vezes norteiam esse âmbito da vida social
são considerados equivocados, pois distorcem o correto exercício da política,
que é determinante para o bem comum, para o desenvolvimento da sociedade.
Semelhante
reflexão, quando aplicada a certas práticas religiosas, também permite enxergar
grandes fragilidades, que causam o distanciamento do propósito nobre e
edificador na confissão da fé. São lamentáveis e preocupantes as
permissividades irracionais na configuração normativa que possibilita a
abertura de algumas “igrejas”. Muitas se dizem comprometidas com a prática
religiosa, mas, na verdade, priorizam o atendimento de interesses econômicos.
Isso revela que o tecido cultural brasileiro produz facilidades ou dificuldades
que ferem frontalmente metas importantes e comprometem a seriedade necessária
para o desenvolvimento da sociedade.
Se,
por um lado, qualificado tecido cultural produz práticas, costumes e posturas
cidadãs determinantes no progresso e equilíbrio social, sustenta a nobreza no agir
de grupos; por outro lado, um tecido cultural corrompido é base para o nefasto
costume de satisfazer-se e aquietar-se com o que está situado nos parâmetros da
mediocridade. Para corrigir descompassos, oportuno é ouvir uma indicação
preciosa do papa Francisco sobre a importância de se investir na cultura da
solidariedade. Nesse sentido, a solidariedade há de ser entendida como virtude
moral e comportamento social.
Para
se alcançar ou promover a cultura da solidariedade, é necessário o empenho
pessoal de conversão. Consequentemente, cada cidadão, instituição e segmento
social precisa assumir, a partir de conduta condizente com os valores dessa
cultura, um papel formativo com força de transformação. De modo especial, é
importante que as condutas orientadas pelos valores da solidariedade estejam
presentes na família, onde, primeiramente, são experimentados, ensinados e
aprendidos os valores do amor e da fraternidade. Eis, pois, um ambiente que
deve reunir experiências e dinâmica vivencial que educam e configuram um tecido
qualificado. A instituição familiar é imprescindível para promover e sustentar
processos capazes de definir os rumos da sociedade.
Uma
nova dinâmica cultural requer a promoção da solidariedade. O enfrentamento das
crises pede que cidadãos comuns, agentes culturais, meios de comunicação,
famílias e outros segmentos se unam e partilhem a consciência de que a direção
fundamental a ser seguida é investir na cultura da solidariedade.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e
oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança
de nossa história – que é de ética, de
moral, de princípios, de valores –, para
a imperiosa e urgente necessidade de profundas
mudanças em nossas estruturas educacionais,
governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas,
financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no
concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e
sustentavelmente desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras
cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade –, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas
públicas (enfim, 125 anos depois, a República proclama o que esperamos seja
verdadeiramente o início de uma revolução educacional, mobilizando de maneira
incondicional todas as forças vivas do país, para a realização da nova pátria;
a pátria da educação, da ética, da justiça, da civilidade, da democracia, da
participação, da sustentabilidade...);
b) o
combate implacável, sem eufemismos e
sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são:
I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo dados do Banco Central, a taxa
de juros do cartão de crédito atingiu em dezembro a também estratosférica marca
de 431,4% para um período de doze meses; e mais, em 2015, o IPCA acumulado nos doze meses
chegou a 10,67%...); II – a corrupção, há
séculos, na mais perversa promiscuidade
– “dinheiro público versus
interesses privados” –, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária
ordem (a propósito, a lúcida observação do procurador chefe da força-tarefa da
Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol: “A Lava Jato ela trata hoje de um tumor,
de um caso específico de corrupção, mas o problema é que o sistema é
cancerígeno...” – e que vem mostrando também o seu caráter transnacional; eis, portanto, que todos os valores que vão
sendo apresentados aos borbotões, são apenas simbólicos, pois em nossos 515
anos já se formou um verdadeiro oceano de suborno, propina, fraudes, desvios,
malversação, saque, rapina e dilapidação do nosso patrimônio... Então, a
corrupção mata, e, assim, é crime...); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar
inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis (por exemplo,
segundo Lucas Massari, no artigo ‘O Desperdício na Logística Brasileira’, a
“... Desconfiança das empresas e das famílias é
grande. Todos os anos, cerca de R$ 1 trilhão, é desperdiçado no Brasil. Quase
nada está imune à perda. Uma lista sem fim de problemas tem levado esses
recursos e muito mais. De cada R$ 100 produzidos, quase R$ 25 somem em meio à
ineficiência do Estado e do setor privado, a falhas de logística e de
infraestrutura, ao excesso de burocracia, ao descaso, à corrupção e à falta de
planejamento...”;
c) a
dívida pública brasileira - (interna e
externa; federal, estadual, distrital e municipal) –, com projeção para
2016, apenas segundo a proposta do Orçamento Geral da União, de exorbitante e
insuportável desembolso de cerca de R$
1,348 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos
(ao menos com esta rubrica, previsão de R$
1,044 trilhão), a exigir alguns fundamentos da sabedoria grega:
-
pagar,
sim, até o último centavo;
-
rigorosamente, não pagar com o pão do povo;
-
realizar uma IMEDIATA, abrangente,
qualificada, independente e eficaz auditoria...
(ver também www.auditoriacidada.org.br)
(e
ainda a propósito, no artigo Melancolia,
Vinicius Torres Freire, diz: “... Não será possível conter a presente
degradação econômica sem pelo menos, mínimo do mínimo, controle da ruína das
contas do governo: o aumento sem limite da dívida pública...”);
Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta
de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já
combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de
poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições,
negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à
pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas
e sempre crescentes necessidades de ampliação
e modernização de setores como: a gestão
pública; a infraestrutura (rodovias,
ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada,
esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística
reversa); meio ambiente; habitação;
mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda;
agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência
social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança
pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e
desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer;
turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e
operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade
– “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade,
competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira
alguma, abatem o nosso ânimo e nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada,
civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que
possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e
potencialidades com todas as
brasileiras e com todos os
brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários
previstos e que contemplam eventos como a
Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das
exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das
organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas
tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a
nossa esperança... e perseverança!
“VI,
OUVI E VIVI: O BRASIL TEM JEITO!”
-
Estamos nos descobrindo através da Cidadania e Qualidade...
-
ANTICORRUPÇÃO: Prevenir e vencer, usando nossas defesas democráticas...
- Por
uma Nova Política Brasileira...