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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

A CIDADANIA, A HUMANIDADE NA ELABORAÇÃO CIENTÍFICA E A CONSTRUÇÃO DA CULTURA DA FRATERNIDADE UNIVERSAL

“Nossa cultura conferiu valor 
absoluto ao espírito científico
        A nossa cultura, a partir do chamado Século das Luzes (1715-1789), aplicou de forma rigorosa a compreensão de René Descartes (1596-1650) de que o ser humano é “Senhor e mestre” da natureza, podendo dispor dela ao seu bel-prazer. Conferiu um valor absoluto à razão e ao espírito científico.
         Com isso, se fecharam muitas janelas do espírito que permitem também um conhecimento, sem necessariamente passar pelos cânones racionais. O que mais foi marginalizado e até difamado foi o coração, órgão da sensibilidade e do universo das emoções, sob o protesto de que ele atrapalharia “as ideias claras e distintas” (Descartes) do olhar científico. Assim surgiu um saber sem coração, mas funcional ao projeto da modernidade, que era – e continua sendo – o de fazer do saber um poder como forma de dominação da natureza, dos povos e das culturas.
         Curiosamente, toda a epistemologia moderna, que incorpora a mecânica quântica, a nova antropologia, a filosofia fenomenológica e a psicologia analítica, tem mostrado que todo conhecimento vem impregnado das emoções do sujeito e que sujeito e objeto estão indissoluvelmente  vinculados, às vezes por interesses escusos (J. Habermas).
         Foi a partir de tais constatações e com a experiência desapiedada das guerras modernas que se pensou no resgate do coração. Finalmente, é nele que reside o amor, a simpatia, a compaixão, o sentido de respeito, base da dignidade humana e dos direitos inalienáveis.
         Isso que nos parece novo e uma conquista – os direitos do coração – era o eixo da grandiosa cultura maia na América Central, particularmente na Guatemala. Como não passaram pela circuncisão da razão moderna, guardaram fielmente suas tradições, que provêm dos avós, ao largo das gerações.
Participei várias vezes de celebrações maias, sempre ao redor do fogo. Começam invocando o coração dos ventos, das montanhas, das águas, das árvores e dos ancestrais. Fazem suas invocações no meio de um incenso nativo perfumado e produtor de muita fumaça.
Ouvindo-os falar das energias da natureza e do universo, parecia-me que sua cosmovisão era muito afim, guardadas as diferenças de linguagem, da física quântica. Tudo para eles é energia e movimento entre a formação e a desintegração que conferem dinamismo ao universo. Eram exímios matemáticos e haviam inventado o número zero. Seus cálculos do curso das estrelas se aproximavam em muito aos que alcançamos com os modernos telescópios.
Dizem que tudo o que existe nasceu do encontro amoroso de dois corações, o do céu e o da Terra, que é um ser vivo que sente, intui, vibra e inspira os seres humanos. Estes são os “filhos ilustres, indagadores e buscadores da existência”, afirmações que nos lembram Martin Heidegger.
A essência do ser humano é o coração, que deve ser cuidado para ser afável, compreensivo e amoroso. Toda a educação que se prolonga ao largo da vida é para cultivar a dimensão do coração. Os irmãos de La Salle mantêm, na capital guatemalteca, um imenso colégio, onde jovens maias vivem na forma de internato bilíngue, no qual se recupera e sistematiza a cosmovisão maia, ao mesmo tempo em que assimilam e combinam saberes ancestrais com os modernos saberes, especialmente os ligados à agricultura e a relações respeitosas com a natureza.
Apraz-me concluir com um texto que uma mulher sábia me repassou no fim de um encontro com indígenas maias. “Quando tens que escolher entre dois caminhos, pergunta-te qual deles, pergunta-te qual deles tem coração. Quem escolhe o caminho do coração, mais se equivocará” (Popol Vuh).”.

(LEONARDO BOFF. Filósofo e teólogo, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 19 de fevereiro de 2016, caderno O.PINIÃO, página 20).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, mesma edição, caderno OPINIÃO, página 7, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral transcrição:

“Olhares sobre o Brasil
        Os olhares sobre a realidade brasileira, que é complexa e plural, devem ser muitos e com grande acuidade. Uma visão estreita é incapaz de perceber as muitas necessidades, de enxergar os caminhos que devem ser seguidos para sair das crises deste tempo. Os olhares têm que avançar para além do território das opiniões ou das listas de lamentações. Também não podem focalizar apenas as atribuições e responsabilidades dos outros, como tática para se eximir das próprias tarefas. A visão míope de um segmento pode significar atrasos em processos e graves prejuízos, com consequências irreversíveis.
         Analisar a realidade é exercício que requer conhecimento e adequada interpretação para configurar a indispensável corresponsabilidade de todos os cidadãos na construção de uma sociedade solidária, alicerçada na cultura da justiça, da paz e do respeito incondicional à dignidade de toda pessoa.
         Assim, todos estão desafiados a reavaliar seus conceitos e colaborar com as transformações urgentes e com ações mais eficazes. Sem essa premissa, há o risco de se supervalorizar a própria atuação, achar que já se faz muito, que os trabalhos atendem às expectativas. Afinal, não seria pela prevalência dessa ilusão que a política na realidade brasileira, particularmente a partidária, convive com a incapacidade para apontar novos rumos e promover o diálogo entre cidadãos?
         Há uma miopia crônica generalizada, salvaguardadas as exceções. Isso se comprova na incompetência de grupos diversos para debelar processos que alimentam a corrupção, a indiferença em relação aos mais pobres. Também é sinal da falta de visão, nos setores público e privado, a timidez para investir em projetos capazes de promover novas dinâmicas que contribuam para se alcançar uma sociedade mais igualitária.
         Não basta apenas planejar bem o próprio negócio. Há um modo necessário de se olhar a realidade por meio de valores inegociáveis, de princípios, de sensibilidade política e cultural, que, audaciosamente, remete cada cidadão à direção do bem comum. A partir dessa visão, as ações fundamentam-se no amor e não se reduzem às estratégias de pequenos grupos que reforçam a segregação econômica, social, política, cultural e até mesmo religiosa.
         Assim, os dias da quaresma oferecem oportunidade importante: a vivência da Campanha da Fraternidade deste ano. Trata-se de exercício ecumênico que nasce da fé cristã, nas diferentes confissões religiosas, para articular experiências e, dessa forma, contribuir com o contexto socioeconômico, político e cultural. Quem crê em Cristo não pode apenas usufruir das consolações espirituais ou se restringir a arrumar os próprios ambientes, projetos e templos. É compromisso que nasce da fé contribuir mais decisivamente na transformação da realidade.
         Por isso, os cristãos no Brasil devem, a partir da Campanha da Fraternidade 2016, configurar uma experiência ecumênica capaz de transformar a realidade. O que se objetiva não é a organização de bancadas no Parlamento, nas assembleias, na simples defesa de interesses corporativos, pessoais, com fechamentos e dogmatismos que desconsideram o diálogo indispensável em uma sociedade plural. Busca-se agir a partir da misericórdia, que não negocia jamais a ética e a moralidade e também não passa o trator em cima de ninguém em nome de Deus.
         A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, na promoção da Campanha da Fraternidade Ecumênica 2016, com o tema “Casa comum: nossa responsabilidade”, empenham-se na tarefa de fazer ecoar o apelo que pede união entre os cristãos, para além de suas diferenças, em torno da defesa e promoção da vida. O saneamento básico, no horizonte de uma alicerçada ecologia integral, é a bandeira que se quer erguer, inspirando outros segmentos da sociedade. Com os cristãos de mãos unidas, a realidade brasileira pode mudar. Nessa direção, as confissões religiosas estão desafiadas a contribuir para que a fé ilumine e inspire os olhares sobre o Brasil.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:
a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas (enfim, 125 anos depois, a República proclama o que esperamos seja verdadeiramente o início de uma revolução educacional, mobilizando de maneira incondicional todas as forças vivas do país, para a realização da nova pátria; a pátria da educação, da ética, da justiça, da civilidade, da democracia, da participação, da sustentabilidade...);
b)    o combate implacável, sem eufemismos e sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo dados do Banco Central, a taxa de juros do cartão de crédito atingiu em janeiro a ainda estratosférica marca de 410,97% para um período de doze meses; e mais, também em janeiro, o IPCA acumulado nos doze meses chegou a 10,71%...); II – a corrupção, há séculos, na mais perversa promiscuidade  –  “dinheiro público versus interesses privados” –, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem (a propósito, a lúcida observação do procurador chefe da força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol: “A Lava Jato ela trata hoje de um tumor, de um caso específico de corrupção, mas o problema é que o sistema é cancerígeno...” – e que vem mostrando também o seu caráter transnacional;  eis, portanto, que todos os valores que vão sendo apresentados aos borbotões, são apenas simbólicos, pois em nossos 515 anos já se formou um verdadeiro oceano de suborno, propina, fraudes, desvios, malversação, saque, rapina e dilapidação do nosso patrimônio... Então, a corrupção mata, e, assim, é crime...); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis (por exemplo, segundo Lucas Massari, no artigo ‘O Desperdício na Logística Brasileira’, a “... Desconfiança das empresas e das famílias é grande. Todos os anos, cerca de R$ 1 trilhão, é desperdiçado no Brasil. Quase nada está imune à perda. Uma lista sem fim de problemas tem levado esses recursos e muito mais. De cada R$ 100 produzidos, quase R$ 25 somem em meio à ineficiência do Estado e do setor privado, a falhas de logística e de infraestrutura, ao excesso de burocracia, ao descaso, à corrupção e à falta de planejamento...”;
c)     a dívida pública brasileira - (interna e externa; federal, estadual, distrital e municipal) –, com projeção para 2016, apenas segundo a proposta do Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1,348 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (ao menos com esta rubrica, previsão de R$ 1,044 trilhão), a exigir alguns fundamentos da sabedoria grega:
- pagar, sim, até o último centavo;
- rigorosamente, não pagar com o pão do povo;
- realizar uma IMEDIATA, abrangente, qualificada, independente e eficaz auditoria... (ver também www.auditoriacidada.org.br)
(e ainda a propósito, no artigo Melancolia, Vinicius Torres Freire, diz: “... Não será possível conter a presente degradação econômica sem pelo menos, mínimo do mínimo, controle da ruína das contas do governo: o aumento sem limite da dívida pública...”);

Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade – “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo e nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a   Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!

“VI, OUVI E VIVI: O BRASIL TEM JEITO!”

- Estamos nos descobrindo através da Cidadania e Qualidade...
- ANTICORRUPÇÃO: Prevenir e vencer, usando nossas defesas democráticas...
- Por uma Nova Política Brasileira...