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quarta-feira, 19 de junho de 2013

A CIDADANIA, O HORIZONTE DA CRIMINALIDADE E A ÉTICA DA VIDA

“BH manchada de sangue
        
         Até quando continuarão a matar moradores de rua na capital dos mineiros? Esse crime e muitos outros estão manchando de sangue a história jovem, bela e promissora desta nossa amada cidade. Belo Horizonte reúne possibilidades incontáveis para ser uma sociedade exemplar, fazendo jus à condição de centro desta terra mineira, o lugar atraente da síntese das muitas Minas que configuram um tesouro nacional: a mineiridade. Contudo, desafiadores problemas nos afligem e demandam a todos nós, do poder público especialmente, qualificada, velocidade e audácia para atingir metas mais cidadãs na constituição de uma sociedade mais justa e solidária, servidora de todos, sobretudo dos pobres.
         Como se não bastassem os desafios que nos afligem na contemporaneidade, ao se pensar a urgente necessidade de garantir moradia digna para todos, de resguardar o atendimento cidadão no âmbito da saúde pública, bem como o acesso à educação e ao mundo do trabalho, Belo Horizonte está se tornando palco do horrendo massacre de moradores de rua. Nesses últimos dois anos, a cifra chega a cem. Parafraseando o horror das destruições profetizadas por Jesus, quando a sociedade perde parâmetros éticos, tratada com descaso os problemas urgentes que afligem a vida das pessoas, é a “abominação da desolação”.
         A pauta de urgências para superar esse cenário envolve muitos itens e demandas que estão exigindo de todos os cidadãos uma redobrada atenção, um sentido de realidade mais apurado e um comprometimento diuturno, que inclui tanto as pequenas ações de solidariedade com aquelas mais encorpadas pela articulação de pessoas e instituições. Abrange também os indispensáveis projetos estratégicos e sistêmicos dos governos em vista do bem comum. Nesse sentido, ao se considerar o processo construtivo da sociedade belo-horizontina, o que vale para cada cidadão desta amada terra, desafiados pela conturbada realidade das regiões metropolitanas, são as ações rápidas e eficazes, medidas urgentes para que cessem aqui as mortes de moradores de rua.
         A razão primeira é o respeito integral à dignidade de cada pessoa, merecedora de todo o cuidado e zelo, por obrigação governamental, por autenticidade de cidadania e pela força do amor que a fé verdadeira guarda. É urgente, pois, um “acordar a sociedade inteira” para este problema gravíssimo: a violência contra moradores de rua, que está manchando ainda mais de sangue a nossa história e os nossos dias. Serve de alerta o Livro do Apocalipse, abertura do quinto selo; uma referência simbólica à história da humanidade e seu destino. Conforme narra São João, os que estavam debaixo do altar, imolados, gritaram em voz forte: “Senhor santo e verdadeiro, até quando tardarás em fazer justiça, vingando o nosso sangue contra os habitantes da terra?” (Ap 6,10). Deus tem a condução da história. Todos nós seremos julgados, pelo amor a cada pessoa que gera o respeito e compromisso cidadãos. Particularmente, pelo amor que demonstrarmos pelos inocentes, pobres e indefesos.
         O tesouro da fé cristã que se mistura ao patrimônio admirável das riquezas deste chão mineiro deve renovar na sua capital e em cada recanto desta terra bendita uma vivaz, profética e inspiradora opção preferencial pelos pobres. Trata-se de um capítulo anterior, mais consistente em razões e raízes , aos projetos sociais advindos das obrigações governamentais, pois é fundamental para que sejam bem cumpridos. A opção preferencial pelos pobres nasce da fé em Jesus Cristo, incontestavelmente o grande patrimônio de nossa cultura. O Evangelho é fonte inesgotável de valores, educador da simplicidade de coração, da audácia na busca do bem e da justiça. Um caminho para incentivar ações e atitudes coerentes.
         É hora de limpar o sangue que mancha BH com o assassinato de moradores de rua. Que essa urgência inspire campanhas para que não se mergulhe uma sociedade na violência, para que não sejam configuradas realidades quase irreversíveis de insegurança e injustiça. Ainda está em tempo para que cidades iluminadas pelo sol, que desponta do alto de suas montanhas, cultivem o querer bem à dignidade de toda pessoa. Da abominação dos assassinatos deve nascer, por gestos e palavras, um tempo novo que seja para todos o “belo horizonte”.”

(DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 14 de junho de 2013, caderno OPINIÃO, página 9).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 16 de junho de 2013, caderno O.PINIÃO, página 19, de autoria de J. B. Libânio, que é teólogo, escritor e professor; padre jesuíta, e que merece igualmente integral transcrição:

“A ética da vida: prezar a própria e a dos outros
        
         Impressionam-nos as manchetes de violência por futilidades. Analista financeiro é queimado vivo após assalto na zona sul de São Paulo. Ladrões teriam ficado insatisfeitos com R$ 100. Aquela jovem assassina a própria mãe para ilusoriamente herdar bens materiais. Jovem entra na universidade ou na escola e metralha crianças e jovens. Enfim, as notícias rodam por aí em quantidade e horror. Casos singulares que revelam a brutalidade do coração humano.
         Quando mergulhamos nas estatísticas, o espanto cresce. No século passado, mais de 100 milhões morreram de maneira violenta. E as guerras? E as câmaras de gás dos nazistas? E a bomba atômica jogada sobre civis em duas cidades do Japão? E o bombardeio aliado sobre a multidão de alemães praticamente derrotados, acampados em Dresden?
         Surgem perguntas angustiantes. De onde viemos, por sermos assim tão violentos? Onde estamos por praticar tanta truculência? E assustados nos interrogamos: e para onde caminha tanta perversidade humana?
         A história nos relata inícios sombrios da humanidade. A Bíblia, nas primeiras páginas, narra o simbólico assassinato de Abel pelo irmão Caim. A própria Escritura se enche de cenas de muita violência, sofrida e praticada pelo povo judeu. A descrição da conquista da Terra Prometida se faz com alta taxa de limpeza étnica.
         Jesus inverte a história sagrada. Prefere sofrer a violência a praticá-la. Ordena que Pedro embainhe a espada depois de cortar a orelha do soldado Malco, a quem ele cura. As bem-aventuranças invertem a história da humanidade e insuflam novos ares. Mas, mesmo assim, os cristãos não aprenderam. A Inquisição, a caça às bruxas, as condenações de hereges obscureceram o céu do perdão, da misericórdia, da pacificidade anunciado e realizado por Jesus.
         Há, sem dúvida, dose de terrível intolerância a morar no coração humano. O poeta Plauto e depois Hobbes, repetem que “homo homini lupus” – o ser humano é lobo para o outro ser humano. Por outro lado, J. J. Rousseau acredita na bondade radical do ser humano, mas a sociedade o corrompe.
         Em geral, a verdade balança entre extremos. Certamente, todos não somos lobos. Nem também a inocência imaculada. Os psicanalistas descobrem no inconsciente pulsões de vida e de morte. E a de morte volta-se ora contra si ora contra outro. A teologia nos fala de falta original, mas redimível pela graça.
         Vale para todos o cultivo da ética da vida. Significa prezar a vida própria e a dos outros como maior valor, intangível, não comerciável, não disponível. Esbarramos no santuário sagrado que cada pessoa encerra. Funda-se no ato criativo de Deus que nos chama a todos à comunhão. O dado teológico presta-se para excelente base ética. Paulo chega a dizer que somos “Templo do Espírito Divino”. Tanta dignidade humana impõe-nos a responsabilidade de não profanarmos  em nós tal beleza e de respeitar a alheia. Infelizmente, o universo de fatos e o imaginário que criamos sobre o ser humano dificultam-nos vê-lo em tal esplendor. Cabe-nos falar mais da grandeza do ser humano que de sua miséria para melhorar a imagem que fazemos dele e assim baixemos a violência contra ele.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:
     
     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente  e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, isto é, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tanta sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos  sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; assistência social; previdência social; sistema financeiro nacional; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; logística; esporte, cultura e lazer; comunicações; turismo; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa das Confederações, a 27ª Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro em julho; a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...