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quarta-feira, 11 de setembro de 2013

A CIDADANIA, A ARTE DE CUIDAR DOS ENFERMOS, BRECHT E A ARTE DE CUIDAR DO POVO

“A arte de cuidar dos enfermos nos momentos mais decisivos da vida
        
         Nos últimos anos tenho trabalhado de forma aprofundada a categoria do cuidado, especialmente nos livros “Saber Cuidar” e “O Cuidado Necessário” (Vozes). O cuidado, mais que uma técnica ou uma virtude, representa uma arte e um paradigma novo de relação para com a natureza e com as relações humanas, amoroso, diligente e participativo. Tenho tomado parte em muitos encontros e congressos de operadores de saúde, com os quais pude dialogar e aprender, pois o cuidado é a ética natural dessa atividade tão sagrada.
         Retomo aqui algumas ideias referentes às atitudes que devem estar presentes em quem cuida de enfermos, seja em casa ou no hospital. Vejamos algumas delas.
         Compaixão: é a capacidade de colocar-se no lugar do outro e sentir com ele. Não dar-lhe a impressão de que está só e entregue à sua própria dor.
         Toque da carícia essencial: tocar o outro é devolver-lhe a certeza de que pertence à nossa humanidade. O toque da carícia é uma manifestação de amor. Muitas vezes, a doença é um sinal de que o paciente quer se comunicar, falar e ser ouvido. Quer identificar um sentido na doença. O enfermeiro ou o médico e a médica podem ajudá-lo a se abrir e a falar. Testemunha uma enfermeira: “Quando te toco, te cuido; quando te cuido, te toco; se és um idoso, te cuido quando estás cansado; te toco quando te abraço; te toco quando estás chorando; te cuido quando não estás mais podendo andar”.
         Assistência judiciosa: O paciente precisa de ajuda, e a enfermeira ou o enfermeiro deseja cuidar. A convergência desses dois movimentos gera a reciprocidade e a superação do sentimento de uma relação desigual. A assistência deve ser judiciosa: tudo o que o paciente pode fazer, incentivá-lo a fazer, e assisti-lo somente quando já não o pode fazer por si mesmo.
         Devolver-lhe a confiança na vida: o que o paciente mais deseja é recuperar a saúde. Daí ser decisivo devolver-lhe a confiança em suas energias interiores, físicas, psíquicas e espirituais,  pois elas atuam como verdadeiras medicinas. Incentivar gestos simbólicos, carregados de afeto. Não raro, os desenhos que a filhinha traz para o pai doente suscitam nele tanta energia e comoção que equivalem a um coquetel de vitaminas.
         Fazê-lo acolher a condição humana: normalmente o paciente se interroga perplexo: “Por que isso foi acontecer comigo, exatamente agora que tudo na vida estava dando certo? Por que, jovem ainda, sou acometido de grave doença?”. Tais questionamentos remetem a uma reflexão humilde sobre a condition humaine que é, em todo o momento, exposta a riscos e a vulnerabilidades inesperadas.
         Quem é sadio sempre pode ficar doente. E toda doença remete à saúde, que é o valor de referência maior. Mas não conseguimos saltar por cima de nossa sombra e não há como não acolher a vida assim como é: sadia e enferma, bem-sucedida e fragilizada, ardendo por vida e tendo que aceitar eventuais doenças e, no limite, a própria morte. É nesses momentos que os pacientes fazem profundas revisões de vida. Não se contentam apenas com as explicações científicas, dadas pelo corpo médico, mas anseiam por um sentido que surge a partir de um diálogo profundo ou da palavra sábia de um parente, de um sacerdote, de um pastor ou de uma pessoa espiritual. Resgatam, então, valores cotidianos que antes nem sequer percebiam.
         Acompanhá-lo na grande travessia: há um momento inevitável em que todos devemos morrer. É a lei da vida, sujeita à morte: uma travessia decisiva. Ela deve ser preparada por toda uma vida que se guiou por valores morais generosos, responsáveis e benfazejos. A tragédia da vida não é a morte, mas aquilo que deixamos morrer dentro de nós enquanto vivemos.”

(LEONARDO BOFF. Filósofo e teólogo, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 6 de setembro de 2013, caderno O.PINIÃO, página 22).

Mais uma importa e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 24 de agosto de 2013, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de MAURO WERKEMA, que é jornalista, e que merece igualmente integral transcrição:

“Brecht e o ‘analfabeto político’
        
         O dramaturgo alemão Bertold Brecht, crítico mordaz da sociedade burguesa, dizia que “o pior analfabeto é o analfabeto político”. É aquela pessoa que, numa espécie de empáfia entre arrogante e burra, estufa o peito para dizer: “detesto política”. Nas palavras do papa Francisco, trata-se da “indiferença orgulhosa”. Não votam ou anulam a cédula eleitoral. Não percebem que são elas que justamente permitem, com seu afastamento, ou inconsciência, ou falta de cidadania e de humanismo, a existência dos maus políticos, dos desonestos na vida pública, das mazelas dos governos e assim por diante. Insensíveis e omissos, esquecem-se de que a política é atividade que permite a construção da vida republicana e da democracia e que é pelo seu exercício que os cidadãos elegem e sustentam governos. E podem mudar maus governos e maus políticos.
         Se a vida pública, entre nós, em todo o mundo, em todos os tempos, tem desvios, com os corruptos e incompetentes, exploradores dos mandatos populares, não quer dizer que simplesmente deva o cidadão, aquele que vive em sociedade, negar inteiramente essa atividade, omitindo-se. Ou negando-se a enxergar, participar, interagir, opinar, votar. Na verdade, abdica de sua condição de pessoa, de ser social, inserido num processo histórico, que indispensavelmente tem vida compartilhada com seus congêneres, vizinhos, colegas de trabalho e de vida, cidadãos de uma mesma comunidade, interdependentes de normas, leis, ações governamentais. Na verdade, o omisso é pior do que o crítico negativista. Este, pelo menos, tem opinião e presta atenção mínima na realidade.
         Política, na sua melhor definição, é a busca de caminhos consensuais em prol do bem público. Ou seja, é a construção de caminhos comuns para consumação dos interesses coletivos. Este é conceito originário da velha e sábia Grécia, que floresce por volta dos anos 400 a.C., auge da civilização helênica, sob o ensinamento de filósofos como Aristóteles e Platão. Nasce a ideia de república. A polis grega é a política e também a cidade, é o exercício, portanto, interligado e essencial da cidadania, pela ação política, na ágora (praça), onde todos estavam. Portanto, a não ser que a pessoa fuja da vida urbana, entre para uma caverna e tenha vida ermitã, isolada e sozinha, não tem consciência lógica ou qualquer sentido, renegar a política como atividade imanente à vida humana quando exercida coletivamente.
         Evitar e condenar os maus políticos quanto é da essência desta atividade o debate de ideias. Cabe ao cidadão consciente de seu papel, do seu tempo, da sua responsabilidade histórica, evitar os maus políticos, aqueles que traem a confiança popular, que submetem seus mandatos aos interesses próprios escusos e desviantes do verdadeiro sentido da representação popular. Mas o importante é que os maus políticos se elegem e se perpetuam nos seus mandatos justamente em razão da omissão dos “analfabetos políticos” que, com sua alienação, permitem a existência destas “ervas daninhas”. O voto, que tem peso igual para todos, ricos e pobres, doutores e iletrados, colhido por sufrágio universal, na urna indevassável, é a melhor arma para afastar os maus políticos. É a arma do cidadão, para promover a transitoriedade dos mandatos e dos governos. Os que se recusam a votar estão, na verdade, despindo-se de sua condição cidadã, fugindo de qualquer responsabilidade coletiva, abstraindo-se  da sua própria  condição de ser vivo, consciente, inserido num processo histórico. Deixa de ser gente, ou agente da história, é ser passivo, despido de solidariedade, de fraternidade, de responsabilidade para com si e seus semelhantes.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas transformações em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:
     
     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, severo e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; logística; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; esporte, cultura e lazer; turismo; comunicações; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São gigantescos desafios, e bem o sabemos, mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo e nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, a informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e  de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...