“Crise
faz o mecenato social perder força no Brasil, o que é um erro
Segundo o Relatório
2014 Bisc Comunitas (Benchmarking de Investimento Social Corporativo), houve
queda no valor investido pela Iniciativa privada em responsabilidade social –
de 2012 para 2013, o capital investido caiu de R$ 2,1 bilhões para R$ 1,6
bilhão, sendo que 33% das empresas que reduziram seus investimentos apontam o
cenário econômico desfavorável como responsável por essa mudança.
Triste
realidade. Em meio à instabilidade econômica, uma das primeiras frentes que
sofrem com cortes de “budget” são aquelas voltadas ao trabalho social. Isso
acontece porque muitos empresários não enxergam a tangibilidade das ações
sociais e como isso pode ser favorável para seu negócio, principalmente em
momentos de crise.
Iniciativas
com foco na redução das desigualdades sociais e na promoção da cidadania são
sérias demais e merecem ser tratadas como produtos sociais. Devem ter público
definido, durabilidade, divulgação, benefício comprovado a quem se destina e
dar retorno de imagem para o investidor. Os resultados desse tipo de
investimento podem ser mensurados qualitativamente, e, quando uma empresa
mostra para a sociedade que, mesmo em situação de crise, não abre mão de
esforços e capital para melhorar a vida das pessoas, o reconhecimento ainda é
maior.
Mas,
em tempos de crise, segurança é a palavra de ordem para qualquer centavo a ser
empregado. Por se tratar de ações que geram benefícios considerados
erroneamente, muitos gestores ainda não conseguem enxergar além dos números.
Por outro lado, as empresas contratadas para viabilizar as ações tampouco apresentam
os resultados de forma clara e convincente. Da mesma forma que um produto é
colocado no mercado e conquista espaço à medida que o público percebe seu
valor, um projeto social deve gerar resultados concretos para o dia a dia das
pessoas e também aos olhos de quem acreditou e investiu.
A
prestação de contas deve ser exigida. Já que existe insegurança em relação aos
aportes feitos em responsabilidade social, por que não cobrar das executoras
que as contas sejam analisadas por uma companhia independente de auditoria?
Mudanças como essa culminariam na profissionalização das relações com o
terceiro setor e, provavelmente, na volta do apetite por investir.
Ainda
seguindo a lógica empresarial, faz sentido aplicar capital financeiro, humano e
criativo em iniciativas que diminuam as desigualdades socioeconômicas,
facilitem o acesso à saúde, à educação e à qualificação profissional, combatam
a violência em suas mais profundas raízes e em outras necessidades de nossos
dias, se esses esforços trouxerem benefícios de imagem à empresa. É legítimo
por parte das companhias almejar que suas marcas sejam relacionadas a causas
sociais. Está comprovado que somente o setor público não consegue arcar com os
custos. O “private contributer” é essencial para o desenvolvimento das
sociedades.
Períodos
de crise como o que o Brasil atravessa propiciam mudanças. O país precisa de
mecenas que incentivem a produção social, contribuindo para que haja
transformações em seu cenário. Não há nação que se desenvolva abandonando os
seus cidadãos. É muito fácil responsabilizar apenas o setor público pelas
agruras da atualidade. Se forem assumidas a parte que cabe ao Estado, às
instituições privadas e a necessidade de se realizar um trabalho sério e
confiável por parte das companhias e ONGs que atuam no terceiro setor, será
possível construir uma sociedade mais justa e próspera para os brasileiros.”
(LEONOR SÁ
MACHADO. Empresária e professora, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 16 de
maio de 2015, caderno O.PINIÃO, página
16).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 15 de maio
de 2015, caderno OPINIÃO, página 7,
de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE
AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente
integral transcrição:
“Mudanças
nas crises
As crises que se
apresentam no horizonte da sociedade brasileira configuram-se em enormes
desafios, um peso que incomoda. No entanto, é oportuno considerar a crise
momento para se substituir dinâmicas e qualificar processos. É uma fase
desafiadora e arriscada e os resultados podem ser benéficos ou prejudiciais,
determinados pelos acertos ou equívocos nas decisões. As crises econômica,
hídrica, moral, existencial e outras tantas que se apresentam recaem sobre o
conjunto da sociedade e permeiam toda sua estrutura. Uma situação cheia de
perigos, mas também com sementes fecundas de renovação.
Essa
fase crítica gera desorientação, desconfiança e até desespero. Fragiliza as
instituições e exige mais das instâncias governamentais no exercício da
insubstituível tarefa de garantir o bem comum e o equilíbrio político. Mas,
também, aciona o instinto de sobrevivência e a vontade de encontrar saídas. E
mesmo quando se sabe que a solução de uma crise suscita outros problemas, que
pode projetar novos quadros desafiadores, é imperativa a busca de soluções,
conduta profundamente vinculada ao tecido da cultura de uma sociedade em crise.
E a qualidade desse tecido é que permitirá uma reação compatível com os
desafios postos. Nesse horizonte, a crise só pode ser enfrentada à medida que
se entra num processo profundo de transformação. Ela se instaura exatamente
quando funcionamentos se tornam obsoletos e há falta de respostas novas; porque
cresce a lista de necessidades e se configura uma fragilização de processos
variados em razão dos procedimentos comprometidos, como é o caso endêmico da
corrupção.
Faz-se
urgente priorizar, entre a resposta à crise, a aposta em uma profunda e radical
mudança cultural. Sabemos que não é simples. Processos dessa natureza são
demorados. Mesmo assim, é preciso investir em fórmulas eficazes na superação
dos desafios. A resposta pode estar em novas soluções e em uma cultura mais
solidificada pronta para enfrentar as
novas crises, mas, também, aquelas que são permanentes. Como exemplo, é
válido considerar a crise hídrica na sua exigência de providências técnicas e
logísticas, como também a atitude simples e determinante de cada consumidor.
Entre as indicações práticas no enfrentamento dessa situação aparecem
necessidades como não se tomar banho demorado ou economizar água quando se
escova os dentes. Tudo isso parece banal e muito doméstico para constar na
pauta pública. Mas aqui é que se toca mais profundamente o tecido cultural de
uma sociedade que ainda precisa aprender a discernir o limite entre economizar
e esbanjar. Essa referência que até parece comum revela o quanto gestos,
atitudes e escolhas que constituem a base do tecido cultural e o cotidiano da
sociedade têm consistência ou operam em estado de emergência, de alarme, no seu
papel de civilidade e autêntico sentido de cidadania. Em questão, portanto,
está o comprometimento a compreensão de que é preciso investir, sobretudo, numa
perspectiva de radicais mudanças culturais. Caso contrário, o conjunto da
sociedade se constitui em condição de parasita, esperando que apenas instâncias
governamentais e empresariais solucionem as crises. Às lideranças, cabe agir
com a consciência do serviço, do dever de buscar o bem comum.
O enfrentamento da crise é frágil e não consegue
incidir na realidade se não imprime a velocidade esperada aos processos. É alto
o preço a se pagar pelos prejuízos causados pela morosidade e escolhas pouco
inteligentes ou que desconsideram as razões humanísticas e humanitárias. E não
menos graves são os danos provocados pela mesquinhez de indivíduos, grupos ou
classes que viram as costas aos clamores da realidade e se recusam a gestos de
desprendimento ou sacrifícios pelo bem comum. Esperam a superação da crise como
resposta a interesses de confortos particulares e não como atendimento de demandas
cidadãs.
Bem
adverte o papa Francisco na sua exortação apostólica, A alegria do evangelho, sublinhando o prejuízo que traz essa
cultura em que cada um pretende ser portador de uma verdade subjetiva própria,
que dificulta a indispensável inserção de cada cidadão em um projeto comum que
vá além dos benefícios e desejos pessoais. A grande crise, portanto, é cultural
e seu enfrentamento só pode se dar com grandes mudanças culturais.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes,
incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise
de liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas
educacionais, governamentais, jurídicas,
políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de
modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente
desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade –, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas
públicas (enfim, 125 anos depois, a República proclama o que esperamos seja
verdadeiramente o início de uma revolução educacional, mobilizando de maneira
incondicional todas as forças vivas do país, para a realização da nova pátria;
a pátria da educação, da ética, da justiça, da civilidade, da democracia, da
participação, da sustentabilidade...);
b) o
combate implacável, sem eufemismos e
sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são:
I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo levantamento da Associação
Nacional dos Executivos de Finanças – Anefac –, a alta de abril dos juros do cartão de crédito chegou a 295,48% ao ano...); II – a corrupção, há séculos, na mais perversa promiscuidade –
“dinheiro público versus interesses privados” –, como um câncer a se
espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos
e comprometimentos de vária ordem (a propósito, a simples divulgação do balanço
auditado da Petrobras, que, em síntese, apresenta no exercício de 2014 perdas
pela corrupção de R$ 6,2 bilhões e prejuízos de R$ 21,6 bilhões, não pode de
forma alguma significar página virada
– eis que são valores simbólicos –, pois em nossos 515 anos já se formou um
verdadeiro oceano de desvios, malversação, saque, rapina e dilapidação do nosso
patrimônio...); III – o desperdício, em
todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos,
indubitavelmente irreparáveis (haja vista as muitas faces mostrando a gravidade
das crônicas paralisações de obras e serviços públicos, gerando perdas
bilionárias...);
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2015, segundo a proposta do Orçamento Geral da União, de
exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1,356 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e
refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 868 bilhões), a exigir imediata, abrangente, qualificada e
eficaz auditoria...
Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão
descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a
nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a
credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como:
a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); a educação;
a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos
sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana
(trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às
commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência
social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas;
polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência,
tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações;
qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –,
transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade – “fazer mais e
melhor, com menos” –, criatividade, produtividade, competitividade); entre
outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo e
nem arrefecem o nosso entusiasmo e
otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação
verdadeiramente participativa, justa,
ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e
desenvolvida, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas
riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos
os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos
bilionários previstos e que contemplam eventos como a Olimpíada de 2016; as
obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das exigências do século 21, da
era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do
conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um
possível e novo mundo da justiça, da
liberdade, da paz, da igualdade – e com
equidade –, e da fraternidade
universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!
O
BRASIL TEM JEITO!...