quarta-feira, 30 de outubro de 2013

A CIDADANIA, A SUSTENTABILIDADE, A PORNOPOLÍTICA E O BLACK BLOC

“Soluções científicas e técnicas não salvarão o mundo em que vivemos
        
         No dia 27 de setembro, centenas de cientistas reunidos em Estocolmo para avaliar o nível de aquecimento global do planeta, o conhecido Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC), nos transmitiram dados preocupantes: “Concentrações de dióxido de carbono (CO2), de metano (CH2) e de óxido nitroso (N2O), principais responsáveis pelo aquecimento global, agora excedem substancialmente as maiores concentrações registradas  em núcleos  de gelo durante os últimos 800 mil anos. A atividade humana influiu  nesse aquecimento com uma certeza de 95%. Entre 1951 e 2010, a temperatura subiu entre 0,5ºC e 1,3ºC e, em alguns lugares, já chegou a 2ºC.
         As previsões para o Brasil não são boas: poderemos ter, a partir de 2050, um permanente verão durante todo o ano. Tal temperatura poderá produzir efeitos devastadores para muitos ecossistemas e em crianças e idosos. Os cientistas do IPCC, fazem um apelo ardente para que se iniciem no mundo todo, imediatamente, ações, em termos de produção e de consumo, que possam deter esse processo e minorar seus efeitos maléficos. Como disse um dos coordenadores do relatório final, o suíço Thomas Stocker: “A questão mais importante não é onde estamos hoje, mas onde estaremos em dez, 15 ou 30 anos. E isso depende do que fizermos hoje”.
         A percepção básica que se tem ao ler o resumo de 31 páginas é que vivemos num tipo de mundo que sistematicamente destrói a capacidade de nosso planeta de sustentar a vida.
         O propósito de incontáveis grupos, movimentos e ativistas se concentra na identificação de novas maneiras de viver, de sorte que garantamos a vida em sua vasta diversidade e que vivamos em harmonia com a Terra, com a comunidade de vida e com o cosmos.
         Num trabalho que nos custou mais de dez anos de intensa pesquisa, o pedagogo canadense  e expert em moderna cosmologia Mark Hathaway e eu tentamos ensaiar um reflexão atenta que o incluísse a contribuição do Oriente e do Ocidente a fim de delinearmos uma direção viável para todos. O livro se chama “O Tao da Libertação: Explorando a Ecologia da Transformação” (Vozes, 2012)
         Nossa pesquisa parte da seguinte constatação: há uma patologia aguda inerente ao sistema que atualmente domina  e explora o mundo: a pobreza, a desigualdade social, o esgotamento da Terra e o forte desequilíbrio do sistema vida; as mesmas forças e ideologias que exploram e excluem os pobres estão também devastando toda a comunidade de vida e minando as bases ecológicas que sustentam o planeta Terra.
         Para sair dessa situação dramática, somos chamados, de uma maneira muito real, a nos reinventar como espécie. Para isso, precisamos de sabedoria que nos leve a uma profunda libertação/transformação pessoal, passando de senhores sobre as coisas a irmãos e irmãs com as coisas. Essa reinvenção implica também uma transformação/libertação coletiva através de um outro design ecológico. Este nos convence a respeitar e viver segundo os ritmos da natureza. Devemos saber o que extrair dela para a nossa subsistência coletiva e como aprender dela, pois ela se estrutura sistematicamente em redes de inter-retro-relações” que garantem a cooperação e a solidariedade à vida em todas as suas formas, especialmente à vida humana. Se essa cooperação/solidariedade de nós com a natureza e entre todos os humanos, não encontraremos uma saída eficaz.
         Sem uma revolução espiritual que envolva um outra mente (nova visão) e um novo coração (nova sensibilidade), em vão procuramos soluções meramente científicas e técnicas. Sem fé e esperança humanas, não construiremos uma arca salvadora para todos.”.

(LEONARDO BOFF. Filósofo  e teólogo, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 25 de outubro de 2013, caderno O.PINIÃO, página 20).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 28 de outubro de 2013, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de CARLOS ALBERTO DI FRANCO, que é diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciências Sociais (IICS), doutor em comunicação pela Universidade de Navarra (Espanha), e que merece igualmente integral transcrição:

“Pornopolítica e black bloc
        
         A história mundial está repleta de exemplos inspiradores. E a saga brasileira também. Os defeitos pessoais e as limitações humanas dos homens públicos, inevitáveis e recorrentes como as chuvas de verão, não matavam a política. Hoje, no entanto, assistimos ao advento da pornopolítica. A vida pública, com raras e contadas exceções, se transformou num espaço mafioso, numa avenida transitada por governantes corruptos, políticos cínicos e gangues especializadas no assalto ao dinheiro público.
         Os protestos que tomam conta das cidades precisam ser interpretados à luz da corrupção epidêmica, da impunidade cínica e da incompetência absoluta da gestão pública.
         A violência black bloc, equivocadamente, visa chamar a atenção de um Estado ausente. É a conclusão a que chegaram os pesquisadores Esther Solano, professora de relações internacionais da Unifesp, e Rafael Alcadipani, professor de estudos organizacionais da FGV-EASP. A pesquisa constituiu em acompanhar de perto as manifestações, observar, perguntar, conversar com pessoas que utilizam a tática black bloc, policiais e membros da imprensa. O universo “black bloc” é composto por jovens que estão na faixa etária entre 17 e 25 anos. São de classe média baixa, a maioria trabalha, alguns formados ou se formando em universidades particulares.
         Das conversas que tiveram, e das observações que realizaram, ficou claro que para estes jovens a violência simbólica funciona como uma forma de se expressar socialmente, um elemento provocador que tem o intuito de captar a atenção de um Estado percebido como totalmente ausente. O uso da violência simbólica também serve, na versão deles, para induzir a sociedade a refletir sobre a necessidade de uma mudança sistêmica: “protesto pacífico não adianta nada, só com violência o governo enxerga nossa revolta”. A intenção é transgredir, incomodar, deixar visibilidade, chamar para um debate. Exemplos de frases que retratam  isso são: “A causa de o black bloc agir é o descaso público. As pessoas estão sendo torturadas psicologicamente pelo cotidiano, não somos vândalos vândalo é o Estado, que deixa as pessoas horas esperando na fila do SUS.
         A pesquisa cumpriu um papel importante. Procurou entender o que se passa na cabeça do pessoal e decodificar o seu recado. A violência, não obstante eventuais matizes ideológicos e fortes marcas de vandalismo antissocial, está intimamente relacionada com uma percepção de que o Estado está na contramão da sociedade. O cidadão paga impostos extorsivos e o retorno dos governos é quase zero. Tudo o que depende do Estado funciona mal. Educação, saúde, segurança e transporte são incompatíveis com o tamanho  e a importância do Brasil. Os gastos públicos aumenta assustadoramente. O número de ministérios é uma piada. A corrupção rola solta. A percepção de impunidade é muito forte. A situação do julgamento do mensalão, independentemente das razões técnicas que fundamentaram alguns votos, transmitiu ao cidadão médio a convicção de que a lei não vale para todos. Estão conseguindo demonizar a política e,  consequentemente, empurrando a democracia para uma zona de risco.
         Os governantes precisam acordar. As vozes das ruas, nas suas manifestações legítimas e mesmo nos seus excessos, esperam uma resposta efetiva e não um discurso marqueteiro. A crise que está aí é brava. A gordura dos anos de bonança acabou. A realidade está gritando no bolso e na frustração das pessoas. E não há marketing que supere a força inescapável dos fatos. O governo pode perder o controle da situação.
         Transparência nos negócios públicos, ética, boa gestão e competência são as principais demandas da sociedade. Memória e voto consciente compõem a melhor receita para satisfazê-las. Sem dúvida. Mas devemos também bater forte na pornopolítica. Ela está na raiz da espiral de violência que sequestra a esperança dos jovens e ameaça nossa democracia.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas transformações em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo de modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, severo e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem (haja vista, por exemplo, a pesquisa acima, que a relaciona com o universo ‘black bloc’ e, também, a enraizada pornopolítica); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis);

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; cultura, esporte e lazer; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; turismo; comunicações; sistema financeiro nacional; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileira e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...    

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