terça-feira, 16 de setembro de 2014

A CIDADANIA, O NOBRE POLÍTICO E O MOMENTO CRUCIAL

“O nobre político
        
         A política brasileira está podre. Ela é movida a dinheiro e poder. “Dinheiro compra poder, e poder é uma ferramenta poderosa para se obter dinheiro. É disso que se trata as eleições: o poder arrecada o dinheiro que vai alçar os candidatos ao poder. Saiba que você não faz diferença alguma quando aperta o botão verde da urna eletrônica para apoiar aquele candidato oposicionista que, quem sabe, possa virar o jogo. No Brasil, não importa o estado, a única  coisa que vira o jogo é uma avalanche de dinheiro. O jogo é comprado, vence quem paga mais.” Assustador o diagnóstico que o juiz Márlon Reis faz da política brasileira. Conhecido por ter sido um dos mais vibrantes articuladores da coleta de assinaturas para o projeto popular que resultou na Lei da Ficha Limpa, foi o primeiro magistrado a impor aos candidatos a prefeito e a vereador revelar os nomes dos financiadores de sua respectivas campanhas antes da data da eleição. Seu livro O nobre deputado: relato chocante (e verdadeiro) de como nasce, cresce e se perpetua um corrupto na política brasileira (Ed. LeYa, 2014), inspirou o título do deste artigo.
         A radiografia do juiz, infelizmente, acaba de ser poderosamente confirmada pela s revelações feitas pelo ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. Em resumo, amigo leitor, durante oito anos – de 2004 a 2012 – os contratos da maior empresa brasileira com grandes empreiteiras eram usados como fonte de propina para partidos políticos. Dá para entender as razões da crise da Petrobras. É pilhagem, saque, puro banditismo. Atinge em cheio os governos de Dilma e Lula.
         Trata-se só do começo. O ex-diretor decidiu fazer a delação premiada para tentar encurtar sua temporada na prisão. Não quer repetir a experiência de Marcos Valério, condenado a 40 anos de prisão. Quando Valério quis fazer acordo de delação premiada, o operador do mensalão não tinha mais nada a oferecer à Justiça porque o esquema já estava desvendado. Agora, a conversa é outra. Com o processo no início, não havendo ninguém denunciado, é o momento propício para Costa oferecer o que os investigadores precisam: os autores e as provas do crime. As coisas estão difíceis para os acusados.
         O novo escândalo é a ponta do iceberg de algo mais profundo: o sistema eleitoral brasileiro está bichado e só será reformado se a sociedade pressionar para valer. Hoje, teoricamente, as eleições são livres, embora o resultado seja bastante previsível. Não se elegem os melhores, mas os que têm mais dinheiro para financiar campanhas sofisticadas e milionárias. Empresas investem  sem qualquer idealismo. É negócio. Espera-se retorno do investimento. A máquina de fazer dinheiro para perpetuar o poder tem engrenagens bem conhecidas no mundo político: emendas parlamentares, convênios fajutos e licitações com cartas marcadas.
         Indignação? Desencanto? É óbvio. O macroescândalo da Petrobras promete. O mensalão vai parecer berçário. O Brasil está piorando? Não. Está melhorando. A exposição da chaga é o primeiro passo para a cura do doente. Ao divulgar as revelações do ex-diretor da Petrobras, a imprensa cumpre um papel relevante: impede que o escândalo fique na gaveta de uma CPI do Congresso.
         Existem razões para otimismo? Acho que sim. A Lei da Ficha Limpa começa a dar frutos. Muitos candidatos podem estar fora das eleições em outubro – um deles, José Roberto Arruda (PR), pressionado, desistiu da candidatura a governador do Distrito Federal. A promiscuidade entre políticos e empresas parece estar com os dias contados. O Supremo Tribunal Federal (STF), provavelmente, votará pelo fim das doações de empresas, na ação movida nesse sentido pela OAB. A imprensa de qualidade, livre e independente, está aí. Incomodando. Felizmente. Lei jornais. Informe-se. Acredite no Brasil, não em salvadores da pátria. E vote bem. O caminho é longo, mas vale a pena.”

(CARLOS ALBERTO DI FRANCO. Doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra (Espanha), em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 15 de setembro de 2014, caderno OPINIÃO, página 7).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de 13 de setembro de 2014, caderno PENSAR, página 2, de autoria de CID VELOSO, médico, foi reitor da Universidade Federal de Minas Gerais entre 1986 e 1990 e presidiu a Associação Médica de Minas Gerais de 1991 a 1993, e que merece igualmente integral transcrição:

“Momento crucial
        
         Superados na história humana os conceitos políticos de direita e esquerda devido à falência de experiências  e revoluções realizados em nome da ideologia esquerdista, resta redefinir as tendências dos grupos políticos ideológicos sejam extintos quanto que seja vitorioso o princípio monolítico do poder do dinheiro dobre todas as coisas.
         Assim, podem-se conceituar duas tendências básicas de atuação política de governantes, sem desconhecer que os conceitos não são rígidos nem radicais, mas representam posições que influem nas ações dos grupamentos humanos. Em alguns governos, houve alguma confluência das tendências e, na maioria, houve radicalização das ações governamentais.
         A primeira tendência é a do capitalismo radical, selvagem, denominado neoliberalismo, que basicamente privilegia, no topo das ações, leis e discursos, o império do dinheiro, da economia e dos valores materiais. Ouvi uma frase que define bem o neoliberalismo: prevalece o princípio de que devemos olhar e cuidar do próprio umbigo, não nos interessando pelo outro – o parente, o vizinho, o colega de trabalho, a comunidade. Em outras palavras: cada um para si e nem Deus para todos. É sempre citado o princípio da civilização capitalista, que prega a liberdade total (com pouca interferência do governo, o chamado governo mínimo) de atuação econômica e financeira, garantindo que o mercado atue como a mão invisível que regula todas as transações e ações econômicas.
         Embora tudo isso seja real e possa participar da política de uma maneira controlada, há um fato que ainda não é citado e passa batido, por se tratar de um segmento da sociedade que tem pouca voz: as classes C, D, E, F e G e os “excluídos” (pobres, negros, homossexuais e trabalhadores da lavoura, entre outros). Eles não estão incluídos nesse mercado, portanto, não são beneficiados pela dinâmica da “mão invisível”. Acredito, portanto, que essa dinâmica deve existir, mas com interferência do Estado (no sentido amplo, incluindo os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário) para criar condições de incluir as classes desprivilegiadas.

MISÉRIA NOS EUA O país paradigmático desse sistema é os Estados Unidos. A nação mais rica do mundo, mais poderosa e mais militarizada tem uma grande massa populacional excluída: 40 milhões de pessoas não contam com assistência à saúde regular formal, pois lá não existe Sistema Único de Saúde (SUS) – que é cheio de problemas, mas atende realmente toda a população brasileira. Com demora e filas, mas atende. Esses cidadãos americanos não podem pagar planos de saúde nem médicos particulares; só são atendidos em caso de acidente ou urgência por algumas instituições filantrópicas limitadas. Visitando Seatle no fim do ano passado, vi muitos moradores de rua dormindo em passeios e praças. Anteriormente, nos arredores de New Orleans, pude ver muitas casas em áreas semelhantes às nossa favelas com moradores em estado de grande pobreza.
         Infelizmente, temos presenciado em quase todo o mundo a atitude neoliberal de cuidar de si – os outros que se danem, Faço parte da classe média, mas tenho criticado muito a “atitude de classe média”. De vez em quando, no bairro onde moro, vejo ocupantes de carros que passam por minha rua jogarem latinha de cerveja ou papel velho pela janela. Temos um sistema de vigias em minha rua, contribuímos com mensalidades para mantê-lo, mas alguns vizinhos não participam, por decisão individual, embora estejam sendo vigiados!

CLASSE MÉDIA Essa detestável “atitude classe média” é evidente no trânsito. Não se concede espaço para o carro que sai da garagem, fura-se sinal vermelho em faixa de pedestre, bloqueiam-se cruzamentos. O pior é que quem adota essas atitudes são exatamente os que cometem a “pequena corrupção” de cada dia: sonegam impostos; não exigem nota fiscal; pagam honorários médicos menores sem recibo; burlam os fiscais da alfândega quando trazem compras do exterior; obtêm atestado medido falso para faltar ao serviço; compram DVDs piratas; fazem “gatos” de ligações de luz e de TV. Condenam a violência, mas compram cocaína para um festinha à noite em casa – contradição inaceitável.
         Nos últimos tempos, tivemos finalmente a legislação para beneficiar empregados domésticos. Vigora a lei que regula a profissão. Apesar da demora, vêm sendo regulamentados o FGTS e o auxílio-desemprego para esses profissionais, além da lei que pune quem não paga o INSS dos domésticos. Além disso, o salário mínimo, que teve reajustes importantes nos últimos anos, favorece a classe. O que se ouve frequentemente  em nosso meio é a queixa de que não há mais empregado doméstico e está muito difícil manter um deles. Só faltam dizer, mas está subentendido, que  deveria ser mantida a situação anterior de informalidade e exploração da mão de obra escrava.
         A segunda tendência política de governantes é o conjunto de ações, leis, discursos e projetos destinados às classes mais desprotegidas. Era chamado socialismo, mas devemos evitar o nome, queimado por experiências ditatoriais histórias que não devem se repetidas ou copiadas. Essa política privilegia o direcionamento de recursos orçamentários  e leis para dar a todos oportunidades iguais, principalmente em termos de educação, condições básicas de vida e segurança pública. Não se trata de distribuir a riqueza, retirando dos ricos  e dando aos pobres, como dizem em tom crítico os que são contra, mas de proporcionar a todos oportunidades para estudar e crescer profissionalmente, reduzindo-se a desigualdade econômica e social. A proposta não é dar esmolas (deve-se eliminá-las baseado no velho aforismo “não dê o peixe, mas ensine a pescar”), mas apoiar e ajudar pessoas em situação crítica. Também não creio na divisão equitativa dos ganhos, pois deve haver um diferencial segundo competência, criatividade e liderança. O que não é aceitável é a enorme desigualdade entre o patrão e o trabalhador.
         É lógico que o empreendedor tem mais visão, mais coragem de investir, corre maior risco, mas é o trabalhador quem efetiva o negócio, devendo ter participação real mais significativa nos resultados/lucros. Várias empresas avançaram e mantêm a política de participação de lucros, embora muito abaixo do justo. Assim, são louváveis os programas de farmácia popular, casa própria, Mais Médicos, leis para empregados domésticos, valorização do salário mínimo, Bolsa-família, cotas em universidades e restaurantes populares.
         Obviamente, para um governo atuar de acordo com a segunda tendência, são necessários recursos econômicos. Portanto, devem ser desenvolvidas ações para obtê-los, incentivando a indústria, diminuindo os gastos públicos, mantendo boa política cambial, estimulando a exportação, reduzindo as importações, reformulando a política fiscal, combatendo a corrupção – o que o atual governo não está fazendo suficientemente. O ponto fundamental é: essas ações econômicas são necessárias, mas não devem ser o foco principal do governo, que deve atuar intensivamente na política de diminuir a desigualdade econômica e proporcionar aos cidadãos de classes mais desprotegidas oportunidades reais.
         O capitalismo radical/neoliberalismo é dominante por causa da índole do homem de competir, lutar contra os outros, conquistar espaços, progredir e enriquecer, perseguindo desesperadamente o poder do dinheiro sem ética, sem caridade e sem sentido humanitário. O dinheiro acaba corrompendo todos os governos (não é só no Brasil), os políticos, as eleições, a imprensa e as religiões, deixando mínimo espaço para atitudes e atividades comunitárias, sociais e humanitárias.

BEM-ESTAR É muito difícil mudar a tendência capitalista em favor de governos mais voltados para o bem-estar da população. As revoluções comunistas tiveram inicialmente esse objetivo, mas não conseguiram sucesso por ter implantado ditaduras ferozes, que descaracterizaram os princípios de convivência social livre e democrática. Várias nações europeias adotaram a política do bem-estar social, mas, depois dos governos de Margareth Thatcher, na Inglaterra, e Ronald Reagan, nos EUA, o continente descambou para o neoliberalismo. Um reflexo claro disso foi a crise que ocorreu em 2008: a população protestou violentamente contra cortes na área social, sobretudo na Grécia, Espanha e Portugal. Apenas os escandinavos ainda mantêm grande parte dessa política de bem-estar social.
         Em resumo: a humanidade é muito complexa, mas precisa caminhar para um modelo de maior solidariedade, maior proteção social aos excluídos e maior espírito comunitário, desenvolvendo políticas econômicas  apenas suficientes para sustentar esse modelo.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;
     
     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem (a propósito, destaca a mídia: “Mais de US$ 30 bilhões em dinheiro sujo ligado à evasão de impostos, ao crime e à corrupção saem do Brasil todos os anos, o dobro de uma década atrás, mostrou um estudo do Global Financial Integrity (GFI), um grupo de pesquisa baseado em Washington que defende a transparência financeira...”; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;
     
     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria..
     
     Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos);  a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada,civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...      

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