“Quando
o coração está deserto
Sou um homem em busca
da felicidade. Se não for possível, me contento com a paz, harmonia e
tranquilidade. Vocês dirão, mas esse cara é maluco, quem não quer esse ambiente
em sua existência? No geral sou bem aquinhoado em meus desejos, mas alguns
dias, algumas pessoas, algumas situações me tiram o sossego e chegam mesmo a
formar um turbilhão em minha mente, me perturbam.
Será
que ainda vale a pena lutar contra a ignorância, a mentira e a avidez de alguns
que andam em nosso redor? Confesso que, por momentos, o desânimo toma conta de
mim. O que existe de gente que só sabe falar, imperiais em suas convicções, e
nunca ouvem e prestam atenção no que lhes é dito. Arrogantes donos da verdade,
seres que se julgam superiores, mas não passam de medíocres participantes de
uma farsa.
Preferiria
estar falando de pessoas de quem gosto, que amo e me alegram. Ou do baile que a
Seleção deu no tique-taque dos espanhóis, no domingo de festa em que o relógio
deles enguiçou. Gosto da vida que é gol, abomino as bruxas de espírito pesado e
malditos que frequentam salões elegantes da música popular brasileira. Reparem,
por outro lado, que ficou fora de moda defender o direito e a Constituição
cidadã de 1988. Eles não se importam, ou porque não viveram os tempos militares
ou porque querem a sua ditadura, que se rasgue a maior conquista de nossa
geração.
Um
senador acaba de sugerir, na televisão, que não importa se uma reforma
política, que não estava nos cartazes das manifestações de rua, seja aprovada
depois do prazo pela Constituição. Faz-se uma emenda e se resolve a questão. Ô
louco, há cláusulas irremovíveis na Constituição e essa é uma delas. Pensam que
podem fazer com a bíblia do cidadão o que quiserem. Não podem e não farão,
porque o Brasil não é a casa da mãe Joana. Entre o palácio e a praça, o palácio
quer que a praça, o povo, só diga sim ou não.
Os
tempos mudam e as pessoas também. Mas, o direito, a justiça e a dignidade de
todos – garantidos pelo capítulo constitucional dos direitos e garantias
individuais –, são permanentes. Não será o poder econômico, muito a vaidosa
impressão daqueles que se pensam donos do mundo, que irá apagar o que se
conquistou com tanto amor dos brasileiros com o nosso país.
Escrevi
há tempos uma frase para uma gravura de Galileu Galilei, criada por Gianfranco
Cerri, para uma campanha dos professores universitários mineiros: “O poder não
tem o poder de esconder eternamente a verdade”. Viva a inteligência, viva a vida.
Pronto: desabafei. Volto à festa e à alegria.”
(FERNANDO
BRANT, em artigo publicado no jornal ESTADO
DE MINAS, edição de 3 de julho de 2013, caderno CULTURA, página 8).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição,
caderno OPINIÃO, página 9, de
autoria de FREI BETTO, que é
escritor, autor de Calendário do poder (Rocco),
entre outros livros, e que merece igualmente integral transcrição:
“Recado
das ruas
As manifestações de rua
no Brasil fundem a cuca de analistas e cientistas políticos. Dirigentes
partidários e lideranças políticas se perguntam perplexos: quem lidera, se não
estamos lá? Recordo quando deixei a prisão, em fins de 1973. Ao entrar, quatro
anos antes, predominava o movimento estudantil na contestação à ditadura. Ao
sair, encontrei um movimento social – Comunidades Eclesiais de Base, oposição
sindical, grupos de mães, luta contra a carestia – que me surpreendeu. Do alto
de meu vanguardismo elitista fiz a pergunta: como é possível se nós, os
líderes, estávamos na cadeia?
Com
essa mesma perplexidade Marx encarou a Comuna de Paris, em 1871; a esquerda
francesa, o Maio de 1968; e a esquerda mundial, a queda do muro de Berlim e o esfacelamento
da União Soviética, em 1989.
“A
vida extrapola o conceito”, já dizia meu confrade São Tomás de Aquino, no
século 13. Agora, aqui no Brasil, todas as lideranças políticas encaram
confusas e despeitadas as recentes manifestações de rua. Com a mesma
interrogação invejosa que a esquerda histórica do Brasil mirou o surgimento do
PT em 1980: que história é essa de, agora, os proletários querem ser a
vanguarda do proletariado?
Historicamente
eram os líderes da esquerda brasileira homens oriundos da classe média
(Astrogildo Pereira, Mário Alves e João Amazonas), dos círculos militares
(Prestes, Gregório Bezerra, Apolônio de Carvalho) e da intelectualidade
(Gorender e Caio Prado Júnior). Marighella foi das raras lideranças
provenientes das classes populares.
O
recado das ruas é simples: nossos governos se descolaram da base social. Para
usar uma categoria marxista, a sociedade política se divorciou da sociedade
civil, risco que previ e analisei no livro A
mosca azul – Reflexão sobre o poder (Rocco, 2005). A sociedade política –
Executivo, Legislativo e Judiciário – se convenceu de que representava de fato
o povo brasileiro, e mantinha sob seu controle os movimentos de representação
da sociedade civil, como ocorre, hoje, com a UNE e a CUT.
Nem só
de pão vive o homem, alertou Jesus. Embora 10 anos de governo petista tenham
melhorado as condições sociais e econômicas do Brasil, o povo não viu saciada
sua fome de beleza – educação, cultura e participação política. O governo
petista optou por uma governabilidade assegurada pelo Congresso Nacional – onde
ainda perduram os “300 picaretas” denunciados por Lula. Desprezou a
governabilidade apoiada nos movimentos sociais, como fez Evo Morales, com
êxito, na Bolívia.
Assim,
nosso governo aos poucos perdeu os anéis para conservar os dedos. Acreditou que
tudo permaneceria como dantes no quartel de Abrantes. Seja porque a oposição
anda enfraquecida por suas próprias disputas internas, seja porque considera
Eduardo Campos e Marina Silva meros balões de ensaio. O que nem a Abin (olhos e
ouvidos secretos do governo) previu foi o súbito tsunami popular invadindo as
ruas do Brasil em pleno período da Copa das Confederações – quando se esperava
que todos estivessem com a atenção concentrada nos jogos.
Agora
o governo inventa o discurso de que sem partidos não há política nem
democracia. Ora, basta uma aula de história de ensino médio para aprender que a
democracia nasceu na Grécia muitos séculos antes da era cristã, e mais ainda do
aparecimento de partidos políticos. Hoje, a maioria dos partidos nega a
democracia ao impedir um governo do povo com o povo. Não basta pretender
governar para o povo e, assim, considerar-se democrata. O povo nas ruas exige
novos mecanismos de participação democrática, enquanto manifesta sua descrença
nos partidos, que são intimados a renovar seus métodos políticos ou serão
atropelados pela sociedade civil.
Eis o
recado das ruas: democracia participativa, não apenas delegativa, ou seja,
governo do povo, com o povo e para o povo. Isso não é utopia, desde que não se
considere modelo perpétuo o
pluripartidarismo e se admita que o regime democrático pode e deve ganhar novos
desenhos de participação popular nas esferas de poder.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes,
incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise
de liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas
educacionais, governamentais, jurídicas,
políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de
modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade
absoluta de nossas políticas públicas;
b) o
combate, implacável e sem trégua,
aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária
ordem; III – o desperdício, em todas
as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos,
indubitavelmente irreparáveis;
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e
insuportável desembolso de cerca de R$ 1
trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas
com esta rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma
imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...
Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão
descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a
nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta
a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores
como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); a educação;
a saúde; saneamento ambiental (água
tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana,
logística reversa); meio ambiente;
habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda;
agregação de valor às commodities; assistência social; previdência social;
segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia
federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência,
tecnologia e inovação; sistema financeiro nacional; esporte, cultura e lazer;
turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e
operacional –, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade,
produtividade, competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada,
qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que
possa partilhar suas extraordinárias riquezas, oportunidades e potencialidades
com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no
horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como
a 27ª Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro; a Copa do Mundo de 2014;
a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das
exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das
organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas
tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...
O
BRASIL TEM JEITO!...