“APLICAÇÃO
DA LEI ANTICORRUPÇÃO BRASILEIRA
Promulgada em 1º de
agosto de 2013, entrou em vigor em 29 de janeiro de 2014 a Lei 12.846, que
dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas
pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
Alcunhada
de Lei Anticorrupção ou Lei da Empresa Limpa, referida normal legal tem, como
origem e inspiração, as Convenções sobre o Combate à Corrupção, firmadas em
1999, no âmbito da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), e em 2003, na Organização das Nações Unidas (ONU), ratificadas pelo
Brasil, respectivamente, em 2000 e 2005.
Trata-se,
sem sombra de dúvidas, de um poderoso conjunto de regras legais, que submete as
corporações, em seus relacionamentos com a administração pública, em todas as
suas esferas, à responsabilização objetiva por seus atos infracionais.
Na
esfera da responsabilidade objetiva, constatado o ilícito sancionado pela
norma, e sua prática, pela pessoa jurídica, afasta-se a perquirição de seu
eventual dolo ou culpa, elementos de responsabilização subjetiva, bastando,
pois, que reste evidenciada a prática, no interesse ou benefício da empresa,
atentatória à administração pública, nacional ou estrangeira.
A lei
espraia seu raio de aplicação para toda e qualquer sociedade, personificada ou
não, empresária ou simples, fundações, associações de entidades ou pessoas e
sociedades estrangeiras, que tenha sede, filial ou representação em território
brasileiro, independentemente da forma de organização ou do modelo societário
adotado, subsistindo a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica ainda que
em relação a ela sejam promovidos atos de alteração contratual ou estatutária,
transformação, incorporação, fusão ou cisão societária.
Os
tipos lesivos sancionados pela Lei Anticorrupção vão desde a promessa,
oferecimento ou paga, direta ou indiretamente, de vantagem indevida a agente
público ou a terceira pessoa a ela relacionada, o financiamento, custeio,
patrocínio ou subvenção para a prática dos ilícitos nela previstos até os atos
de fraude nos processos de licitação e contratos.
Na
esfera administrativa, as penas aplicáveis à pessoa jurídica responsabilizada
vão desde a obrigatoriedade de publicação extraordinária da decisão
condenatória a multas, no valor de 0,1% a 20% de seu faturamento bruto, sem
prejuízo da obrigação de reparação integral do dano causado.
Prejudicado
o critério de aferição do faturamento bruto, por qualquer motivo, as multas
serão fixadas no mínimo em R$ 6 mil e no máximo em R$ 60 milhões.
Civilmente,
a pessoa jurídica responsabilizada poderá sofrer, ainda, sanções que vão desde
o perdimento dos bens, direitos ou valores direta ou indiretamente obtidos por
meio da infração, a proibição de recebimentos de incentivos, subsídios,
subvenções, doações ou empréstimos de entidades públicas, até sua dissolução
compulsória.
Erige
a Lei Anticorrupção, todavia, importantes instrumentos para redução das penalidades
civis e administrativas nela previstas. A existência comprovada, no âmbito da
pessoa jurídica responsabilizada, de um conjunto de mecanismos e procedimentos
internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e
à aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, o chamado compliance, é elemento que deve ser
levado em consideração na aplicação das sanções administrativas.
Os
acordos de leniência, por sua vez, no bojo dos quais as pessoas jurídicas
responsáveis ajustam sua cooperação nas investigações e nos respectivos
processos administrativos, afastam a aplicação da sanção administrativa de
publicação extraordinária da decisão condenatória e da proibição de recebimento
de incentivos e subsídios públicos, podendo ainda acarretar a redução de até
dois terços da multa aplicada.
Inobstante
a ausência de clareza da norma, no tocante ao sistema de pesos e medidas que
balizará a aplicação das sanções administrativas às empresas investigadas,
certo é que a dureza das regras de responsabilização objetiva e o peso das
sanções civis e administrativas daí decorrentes justificam a preocupação com a
criação imediatas dos programas de compliance.
Se os
parâmetros de avaliação dos mecanismos e procedimentos de compliance serão estabelecidos, ainda, em regulamento (decreto) a
ser editado pelo Poder Executivo federal, as empresas preocupadas em já
estabelecer os seus programas podem se valer das recomendações editadas pela
OCDE ou dos manuais editados pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos.
O
material é farto e o trabalho é longo, mas indispensável.”
(DAVID
GONÇALVES DE ANDRADE SILVA, sócio-diretor da Andrade Silva Advogados, em
artigo publicado no jornal ESTADO DE
MINAS, edição de 6 de fevereiro de 2015, caderno DIREITO & JUSTIÇA, página 8).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição,
caderno OPINIÃO, página 7, de
autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE
AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente
integral transcrição:
“No
reverso das crises
No reverso das crises
estão lições importantes que precisam ser aprendidas e praticadas. A sociedade
brasileira sofre com um elenco de crises. Entre elas está a hídrica, provocada
por falta de chuvas e por inadequado tratamento do meio ambiente; a crise
econômica, por consequência de se seguirem apenas os princípios das leis de
mercado; a crise ética, com o conhecimento público de esquemas bilionários de corrupção
e desrespeitos ao erário; a crise do compromisso comunitário, apontada pelo
papa Francisco na sua exortação apostólica Alegria
do evangelho; a crise moral, ancorada nos relativismos, no individualismo e
em um entendimento estreito de liberdade, autonomia e bem-estar. Sem exagerar,
convive-se com um verdadeiro caldeirão de crises.
Apesar
do peso e do enorme desafio, no horizonte está a oportunidade singular de
aprendizagem e de adoção de práticas que permitam alcançar dinâmicas mais
saudáveis, capazes de recuperar o tecido social. Lições precisam ser
aprendidas, retomadas e praticadas na tarefa ingente de conduzir a vida privada
e cidadã; construir, diariamente, a sociedade. Não são, necessariamente, lições
de alta complexidade, pois partem de princípios éticos e morais muito simples,
mas com incidência transformadora. São capazes de reverter os processos e
vivências que deterioram instituições, culturas, e retardam, ou mesmo
inviabilizam, a construção de uma sociedade igualitária.
Impressiona,
entre outras dimensões, o crescimento da violência, com estatísticas que causam
horror. Não se trata apenas da criminalidade que ocorre nas ruas, mas também a
praticada no recôndito dos lares e inclui as perpetradas contra o bem comum,
com prejuízos, especialmente, para os mais pobres. É uma urgência partilhar
esse quadro desafiador composto pelas crises
para que se forme um juízo a respeito dos processos que estão
prejudicando a convivência social. As mudanças necessárias não são pontuais.
Torna-se imprescindível buscar novas dinâmicas capazes de conduzir a sociedade
rumo às práticas éticas e morais que são caminho para a necessária virada
civilizatória contemporânea. Assim, será possível refletir e transformar cada
instituição, grupos políticos, instâncias culturais e também confissões
religiosas.
Um
primeiro passo importante é que cada pessoa reconheça o quadro de crises que
afeta a sociedade brasileira. Assim, será possível criar um grande movimento de
despertar ético capaz de fecundar a consciência moral de todos. Nesse sentido,
não se podem poupar esforços, nem mesmo pelo temor de parecer alarmismo. A
situação é muito grave e assim precisa ser percebida. Eventuais progressos e
conquistas alcançadas não podem servir para camuflá-la. Antes de se adotarem as
providências de incidência transformadora – as reformas que a sociedade
brasileira precisa – é preciso que cada cidadão compreenda e assuma a sua
parte.
A
busca pela conduta honesta de todos não é apenas um aspecto a integrar a
estratégia de um governo, mas dever de cada pessoa no cumprimento de suas tarefas.
Precisa fundamentar as ações no contexto das famílias, das escolas, das
confissões religiosas, dos segmentos todos, e na vivência da política. Superar
as graves crises pode ser algo simples, um caminho natural, desde que todos
partilhem um gosto, convicção e compromisso: ser honesto em tudo o que se fala,
faz e constrói, no exercício de tarefas profissionais e cidadãs. Nessa direção,
há também a necessidade de superar a medíocre prática de tentar se apresentar
como “bom” ou “o melhor” a partir da estratégia de se destruir os outros.
É o
momento de derrubar as ameaças à vida social com uma grande onde formada pela
alegria e o santo orgulho de ser honesto, um remédio para curar a doença da
corrupção, dos relativismos, das disputas mesquinhas, da busca egoísta pela
realização de interesses próprios com prejuízos para a coletividade. É hora de,
humildemente, avaliar o quadro de crises para se alcançarem lições, muitas,
tantas delas, sem segredo de assimilação e prática. Lições que estão no reverso
dessas crises.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes,
incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise
de liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas
educacionais, governamentais, jurídicas,
políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de
modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente
desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade –, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas
públicas;
b) o
combate implacável, sem eufemismos e
sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são:
I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero); II – a corrupção, há séculos, na mais perversa promiscuidade –
“dinheiro público versus interesses privados” –, como um câncer a se
espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos
e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício,
em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e
danos, indubitavelmente irreparáveis (por exemplo, e diante de novas facetas, a
agudíssima crise da dupla falta – de água e de energia elétrica...);
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2015, segundo a proposta do Orçamento Geral da União, de
exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1,356 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e
refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 868 bilhões), a exigir imediata, abrangente, qualificada e
eficaz auditoria...
Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão
descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a
nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a
credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores
como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); a educação;
a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos
sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana
(trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às
commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência
social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas;
polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência,
tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações;
qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –,
transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade – “fazer mais e
melhor, com menos” –, criatividade, produtividade, competitividade); entre
outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo e
nem arrefecem o nosso entusiasmo e
otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação
verdadeiramente participativa, justa,
ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e
desenvolvida, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas
riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos
os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos
bilionários previstos e que contemplam eventos como a Olimpíada de 2016; as
obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das exigências do século 21, da
era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do
conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um
possível e novo mundo da justiça, da
liberdade, da paz, da igualdade – e com
equidade –, e da fraternidade
universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!
O
BRASIL TEM JEITO!