quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

A CIDADANIA, A LEI ANTICORRUPÇÃO, OS PARTIDOS POLÍTICOS E OS VOTOS DE NATAL

“A Lei Anticorrupção e os partidos
        Os recentes e impressionantes esquemas de corrupção bem demonstram a assombrosa fragilidade ética e moral das empresas e das autoridades envolvidas que, inebriadas pelo poder do dinheiro, pensaram estar acima do bem e do mal, fazendo da lei um mero ornamento de decoração. O problema é que, por maior que seja a fortuna de um homem, jamais será possível contornar a miséria da ilegalidade. Sem cortinas, o ilícito é um incômodo vício perpétuo; pode-se tentar fugir ou correr, mas, quando menos se espera, a verdade estará ali para mostrar a crueza de sua face.
         Nesse contexto nacional conturbado, muitos temas começam a ser discutidos, sendo oportuno o estabelecimento de uma abordagem isenta e imparcial, voltada apenas para a plena efetivação dos melhores fins e interesses da lei. Ilustrativamente, a possível aplicabilidade da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013) aos partidos políticos surge como uma importante questão do momento. Cabe indagar: partidos políticos podem estar envolvidos em atos de corrupção? Ora, é claro que sim. Logo, nada mais natural que os partidos estejam, por imperativo lógico, sujeitos às disposições legais anticorruptivas.
         A Lei 12.846/2013 não quis deixar margens para dúvidas, estabelecendo que suas disposições aplicam-se “às sociedades empresariais e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, bem quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente” (parágrafo único do artigo 1º). Como se vê, o objetivo da Lei Anticorrupção é amplo, com o propósito de atingir as mais diversas formas de associação humana, “independentemente da forma de organização”, sendo desimportante se “constituídas de fato ou de direito”.
         No tocante aos partidos políticos, a Lei 9.096/1995 os definiu como “pessoa jurídica de direito privado”, destinados a “assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal” (art. 1º). Por assim ser, não há como fugir da aplicabilidade da Lei Anticorrupção aos partidos políticos. Aliás, em sua essência, as agremiações partidárias são centros de elevação da vida pública e de consequente combate à indecência política em todas as suas formas. O fato de alguns partidos serem tortos atualmente torna ainda mais cogente e imediata a aplicação das disposições da Lei 12.846/2013 às desviantes estruturas partidárias.
         Muito se tem dito no sentido de que a Lei Anticorrupção precisaria, para ter eficácia, de regulamentação executiva. O argumento, todavia, é manifestadamente improcedente. Nos exatos termos da lei (artigo 7º), parágrafo único), apenas os parâmetros de avaliação dos mecanismos e procedimentos de otimização do chamado compliance é que devem ser objetivo de ato normativo complementar do Poder Executivo. Afora essa exceção pontual, os demais dispositivos materiais da lei são dotados de eficácia plena e imediata.
         Talvez alguns, por interesses inconfessáveis, não queiram o vigor da Lei Anticorrupção, que, confesso, em alguns aspectos jurídicos me soa um tanto demasiada. Todavia, no aspecto político, a nova lei nasce velha, pois, desde muito, deveria estar viva e ressonante. No que toca ao tema do presente artigo, os partidos podem até espernear, mas não há perna para fugir da lei. Ou será que seguiremos a ter uma legalidade perneta?”.

(SEBASTIÃO VENTURA PEREIRA DA PAIXÃO JR. Advogado, em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 28 de dezembro de 2014, caderno OPINIÃO, página 7).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de 26 de dezembro de 2014, mesmo caderno e página, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral transcrição:

“Votos de Natal
        Questionamentos, com tons de aridez e desânimo, podem brotar do coração humano em meio às festas natalinas. De novo, é tempo do Natal e onde está a novidade? Ao avaliar os últimos anos, ou mesmo a década que passou, o que mudou para melhor? Talvez, as análises sejam marcadas pelo pessimismo, concluídas com uma afirmação melancólica: de novo, é tempo do Natal. Os votos natalinos, que ocupam a pauta da mídia, os cumprimentos entre pessoas e os cartões enviados, podem parecer mera repetição. Isso porque, dias depois, tudo parece voltar a uma rotina que tem o seu peso próprio. Os votos de Natal podem se tornar apenas “palavras pronunciadas ao vento”, sem nenhuma força de transformação e mudança. Em vez disso, cada pessoa deve aproveitar o tempo do Natal como oportunidade para capacitar-se para o novo.
         A novidade que se experimenta não se esgota nas indispensáveis inventividades do comércio ou na criatividade de estrategistas para alcançar ganhos, sair de crises, conseguir novas respostas econômicas, inclusive para superar os cenários excludentes que envergonham a sociedade. O novo do tempo do Natal está na fonte plantada bem no centro da história, perca de cada homem e mulher, no mistério insondável e inesgotável da encarnação do Verbo, Jesus Cristo, o Filho de Deus. A fonte do novo que não envelhece está entre nós, é o cântico do tempo do Natal. Está aí a novidade procurada pelo coração humano, como necessidade amorosa que alimenta o sentido da vida.
         A liturgia na Igreja Católica constrói esse caminho experiencial com singularidade e riqueza preciosas, além de uma incontestável força pedagógica. Essa força é transformadora, com incidência na vida de quem percorre o caminho rumo ao mistério do Natal do Senhor. Indispensável é livrar-se das exterioridades que ancoram os corações na superficialidade. São pesados fardos que não permitem avanços na experiência do encantamento que o mistério do Natal opera na história da humanidade e na vida de cada pessoa. Santo Agostinho, tocado no mais íntimo do seu ser por este mistério expressa, de maneira admirável, sua profundidade e seu alcance quando diz: “Celebremos esse dia de festa, em que o grande e eterno Dia, gerado pelo Dia grande e eterno, veio a esse nosso dia temporal e tão breve”. Essa reflexão permite compreender melhor a novidade, sempre atual, que deve acompanhar os votos de feliz Natal. Ao alcançar esse entendimento, de modo profundo, supera-se a rotina que promove esterilidade, são superados desencantos, não se deixa exaurir a força dos que combatem em muitas frentes, especialmente as que buscam a paz, a solidariedade e a justiça.
         Santa Terezinha do Menino Jesus, sempre muita tocada pelas festas do Natal, em diálogo com Maria, a Mãe do Salvador, pergunta, em meditação profunda: “Terei inveja dos anjos que cantam o nascimento do Salvador? Não, porque o Senhor deles é meu irmão!”. Esta verdade é a fonte da esperança que garante a novidade tão almejada pelo coração humano. Não há outra realidade comparável ao encontro do novo que está sempre guardado no coração de Deus. Tudo o que está fora dessa fonte é repetição, não raramente enfadonha, sem força de modular os corações no amor que alimenta lógicas transformadoras, corrige os descompassos das arbitrariedades, elimina as amarguras que comprometem a fraternidade, supera as indiferenças que retardam o remédio urgente da solidariedade entre pessoas, culturas, povos e nações.
         A vivência do Natal pode e deve ser a inteligente oportunidade para escrever um capítulo novo na história da sociedade, da vida pessoal e familiar. Essa tarefa é urgente, pois existe uma lista de intermináveis desafios a serem superados – da corrupção endêmica na sociedade brasileira, passando pelas disputas e manipulações que encobrem malfeitos e arrogâncias de todo tipo até a perda lamentável do encantamento e da ternura, que sustentam o respeito ao outro, em todas as circunstâncias. Os votos de Natal produzem efeitos, particularmente, quando o coração humano os traduz em propósitos a serem verdadeiramente assumidos, especialmente aqueles que corrigem os descompassos que fragilizam instituições, conturbam a família, desfiguram a vivência da fé na Igreja e perpetuam os tons de selvageria nas relações interpessoais.
         Na especialidade deste tempo, de tamanha densidade, que os votos de Natal criem a oportunidade para a reconciliação entre pessoas, classes e povos; inspirem a lista de propósitos pessoais para qualificar a vivência do ano novo, fecundem o encantamento por Deus e o respeito ao semelhante, principalmente ao mais pobre. Esses são os votos de Natal!”.

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate implacável, sem eufemismos e sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, há séculos, na mais perversa promiscuidade  –  “dinheiro público versus interesses privados” –, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem (a propósito, o petróleo em si não mancha as mãos dos trabalhadores; mas as mãos dos corruptos mancham até o petróleo...); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade – “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo e nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!

O BRASIL TEM JEITO!