segunda-feira, 22 de junho de 2009

UM CENÁRIO MELANCÓLICO DA REPÚBLICA

Há um pouco mais de quinze anos, em Editorial do Jornal ESTADO DE MINAS, Caderno Opinião, página 6, de 9 de novembro de 1993, encontramos mais uma contundente análise do cenário lastimável da República, ontem como hoje, e ENXOVALHADO pela ação nociva de parcela significativa de nossas lideranças.

Como contribuição pedagógica ao nosso trabalho de MOBILIZAÇÃO PARA A CIDADANIA E QUALIDADE, consideramos OPORTUNÍSSIMA a transcrição, sem corte, do mencionado editorial:

“Conceito de cidadania

A perplexidade que as sucessivas descobertas de esquema de corrupção vão causando, sobretudo quando envolvem nomes antes insuspeitos, faz despertar o conceito de cidadania. Somente a construção ampla do conceito de cidadania no Brasil poderá opor-se de maneira eficaz ao alcance da ação deletéria da moralidade que a corrupção provocou no Brasil. De repente, e não só mais envolvendo a questão dos orçamentos públicos, constata-se que a corrupção estendeu tentáculos longos e armou quadrilhas poderosas, dominando procedimentos e decisões, em dimensão tamanha que não serão as eleições gerais que se realizam ano que vem suficientes para remover da vida pública, no Legislativo ou no Executivo, os que já se encontram viciados na prática de todos estes atos ilegais ou imorais que a CPI vem revelando.

Pede-se algo mais. Basta ver o que falam as faixas da passeata pela moralidade no Rio. Ou o que estão revelando os pronunciamentos e manifestos que acontecem por todo o Brasil, em todos os setores e instituições, refletindo a indignação contra este estado de coisas. Será difícil à CPI, por mais isenta e firmemente conduzida que o seja, conseguir apurar toda a verdade. A cada dia aparecem indícios de novos envolvimentos. Conclui-se que a máquina corruptiva é complexa e longa, envolvendo condutas já enraizadas, diversos tipos de favorecimentos, despistados e até legalizados, sendo difícil, em muitos casos, o enquadramento dos envolvidos em qualquer artigo do Código Penal. A condenação, portanto, situa-se no campo moral e é nesse patamar que precisa ser enfrentada a crônica e enraizada corrupção brasileira.

É hora do desenvolvimento do conceito de cidadania no Brasil, no que significa de mais atual, moderno, civilizatório. O cidadão é o homem consciente do seu tempo, dos seus direitos e deveres como ser socializado, co-responsável pelo tipo de sociedade de que participa e ajudou a construir. É nesse compromisso político e social que se insere sua ética de conduta. E é nessa linha conceitual que o ato de roubar o dinheiro público é tão condenável quanto a ausência de participação política, dever essencial do cidadão. A construção de um Brasil como nação democrática passa por esse ethos, ampliado e atualizado pelo moderno conceito de cidadania, onde não há lugar para traços como o jeitinho, o levar vantagem de qualquer maneira, o político corrupto, populista ou desinteressado dos problemas nacionais, o tráfico de influência, o deixar para depois, a propina, etc.

Igualam-se, como escândalos sociais, as matanças do Carandiru e da Candelária e o impeachment de Collor e, agora, os roubos do Orçamento. Ou as obras com preços superfaturados já garantindo a propina. A miséria de 32 milhões de brasileiros é também fenômeno correlato. Na verdade, as ordens política e econômica inscrevem-se em um quadro cultural. O impasse brasileiro, a ingovernabilidade, o imobilismo, a incapacidade de gerar soluções, de remover os graves e perversos desequilíbrios de toda ordem, são vertentes de um mesmo estuário. A revolução moral só se completa dentro da evolução cultural, estribada no conceito de cidadania, ainda bastante incipiente no Brasil onde a exclusão não permite taxas mínimas de educação popular. A encruzilhada histórica em que o País se encontra pode ser o ponto de inflexão de que precisa. Ou se condena a resistir à própria História”.

Este é, pois, um EDITORIAL para ser lido e relido com a data de HOJE. Então na encruzilhada histórica proposta pela matéria, o ponto de INFLEXÃO, lamentavelmente, ainda não foi encontrado. Estamos morro abaixo, com a CORRUPÇÃO e o DESPERDÍCIO de RECURSOS PÚBLICOS causando PREJUÍZOS INCALCULÁVEIS à gerações e gerações de BRASILEIROS e de BRASILEIRAS, aumentando a cada dia o fosso entre RICOS e POBRES e a EXCLUSÃO mais ABOMINÁVEL: a da ÉTICA pelos POLÍTICOS, que provoca uma EROSÃO MORAL em TODA a SOCIEDADE.

E aí, sim, como o reforça o EDITORIAL: só mesmo uma CRUZADA NACIONAL pela CIDADANIA e QUALIDADE.

Um comentário:

Ana Lúcia disse...

Mário vc buscou um texto de 9 de novembro de 1993. Esta é a data do editorial do jornal Estado de Minas e infelizmente para nós brasileiros e brasileiras, o mesmo texto realmente pode ser lido como se fosse hoje. E com um agravante, temos políticos que acham natual a falta de ética, de decoro parlamentar e a corrupção.o Projeto Lista Limpa, coordenado pela CNBB, continua e quem quer aderir basta ir a uma igreja, com o título de eleitor e assinar o documento. Esta campanha não é apenas para os católicos, mas sim para todos os brasileiros e brasileiras que ainda querem um dia ir votar não por obrigação, mas por acreditar em seus políticos e seu país. Cidadania é assinar o documento para que possamos barrar estes candidatos que, como diz o editorial de 1993 vem marcando com lama nossa história.