quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

A CIDADANIA, A SOLIDARIEDADE, A FELICIDADE E O ANO NOVO

“2013 mais coletivo, menos individual

Fim de ano é tempo de reflexão sobre a própria vida na esfera afetiva e profissional, o mundo em que vivemos, os amigos que estão do nosso lado e os que se foram (porque morreram ou pelo desgaste do tempo), e sobre a própria finitude. Algumas coisas não podemos resolver, mas tentar mudar o mundo ao nosso redor com algumas ações do cotidiano, de preferência envolvendo-nos com grupos organizados, é possível. E isso nos faz muito bem.

Observamos nesta época um clima de confraternização mais emocional do que o normal e parece-nos que as pessoas vão mais aos seus templos de orações, o que é importante. Afinal, como constata o filósofo suíço Alain de Bottom, em qual outro local homens e mulheres de todas as raças e classes sociais são recebidos e se sentem acolhidos? Por mais críticas que se façam às diversas igrejas, elas têm essa importância, agregam!

Sim, mas o que dizer sobre o mundo em que vivemos? Levamos os questionamentos sobre as nossas dúvidas para os diversos templos? No aspecto individual, sim. No coletivo, não. Indagamos e pedimos bênçãos nesses locais para a nossa vida afetiva e profissional e principalmente para termos uma boa saúde. Refletimos, também, com calafrios ou não, sobre a nossa morte. São, portanto, em geral, sentimentos individuais. Mas e no coletivo, para o que pedimos bênçãos no nosso cotidiano e suas relações externas? Supomos que muito pouco. Em geral, deixamos as coisas como estão, com exceção para um ou outro espírito mais intenso e rebelde.

Muitos questionamentos poderiam ser feitos em salões de igrejas e nas praças públicas. Como fica solidão humana em tempos de redes sociais? Por que pagamos excessivos impostos? Por que os planos de saúde são caros para os idosos?Por que os muito pobres do país sofrem com um sistema de saúde ineficaz? Por que uma corrupção instalada em várias esferas de poder rouba tanto dinheiro da educação e da saúde no Brasil? Por que vemos tantos ex-pobres enriquecerem com a política em desproporção aos salários que recebem e surgirem como donos de concessionárias e instituições de ensino? Por que tantas pessoas morrem em acidentes de trânsito e com a violência urbana? E as terríveis drogas, cada vez mais destruindo pessoas e lares, como combatê-las?

Pense, caro leitor: se nesta época e ao longo do ano nos reuníssemos em praças públicas e salões de entidades de classe e das várias igrejas e repetíssemos com frequência todas essas perguntas, tal como orações ou mantras, e também, depois de algum tempo, nessas mesmas reuniões, falássemos em bom tom sobre as respostas a essas perguntas. E criássemos alternativas, pode ter certeza que, depois de certo tempo, surgiriam algumas soluções para tantas questões que inquietam a nossa alma no aspecto coletivo. Só que essas situações deveriam se repetir muito, até que as primeiras questões levantadas não existissem mais e passássemos às outras. E podem ter certeza também: as questões individuais ficariam em segundo plano, com muito menos importância.

Mas, enquanto essas “reuniões” não existem de fato (fica apenas a ideia), vamos nos lembrar de boas ações e imagens que alegram o nosso coração nessa época do ano e são muitas: uma orquestra sinfônica tocando, um coral de pessoas idosas, um coral de crianças cantando músicas de Natal, jovens entregando sopas para os moradores de rua; cenas do trabalho dos Médicos sem Fronteiras, a Praça da Liberdade iluminada. Esse é o lado bom do ser humano. A solidariedade para a qual o homem foi talhado e sem ela, com certeza, a vida não faz sentido. Pensem também nos sinos de uma catedral badalando e nos fogos da passagem do ano. Pensou? É com esse clima de alegria e intensidade que devemos pensar no coletivo e menos no individual. Bom ano-novo!”

(LUIZ FRANCISCO CORRÊA, Jornalista, diretor da Via Comunicação, membro do Conselho Curador da Fundação de Pesquisa e Ensino da Cirurgia (Fupec), diretor da Associação Palavra Bem Dita), em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 26 de dezembro de 2012, caderno OPINIÃO, página 9).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição, caderno e página, de autoria de FREI BETTO, Escritor, autor de A arte de semear estrelas (Rocco), entre outros livros, e que merece igualmente integral transcrição:

“Feliz ano novo

Por que desejar feliz ano novo se há tanta infelicidade à nossa volta? Será feliz o próximo ano para afegãos e palestinos, e os soldados usamericanos sob ordens de um governo imperialista que qualifica de “justas” guerras de ocupações genocidas? Serão felizes as crianças africanas reduzidas a esqueletos de olhos perplexos pela tortura da fome? Seremos todos felizes conscientes dos fracassos de Copenhague, que salvam a lucratividade e comprometem a sustentabilidade?

O que é a felicidade? Aristóteles assinalou: é o bem maior que a todos almejamos. E meu confrade Tomás de Aquino alertou: mesmo ao praticarmos o mal. De Hitler a madre Teresa de Calcutá, todos buscam, em tudo que fazem, a própria felicidade.

A diferença reside na equação egoísmo/altruísmo. Hitler pensava em suas hediondas ambições de poder. Madre Teresa, na felicidade daquels que Frantz Fanon denominou “condenados da Terra”.

A felicidade, o bem mais ambicionado, não figura nas ofertas do mercado. Não se pode comprá-la, há que conquistá-la. A publicidade empenha-se em nos convencer de que ela resulta da soma dos prazeres. Para Roland Barthes, o prazer é “a grande aventura do desejo”.

Estimulado pela propaganda, nosso desejo exila-se nos objetos de consumo. Vestir essa grife, possuir aquele carro, morar nesse condomínio de luxo – reza a publicidade – nos fará felizes.

Desejar feliz ano novo é esperar que o outro seja feliz. E desejar que também faça os outros felizes? O pecuarista que não banca assistência médico-hospitalar para seus peões e gasta fortunas com veterinários de seu rebanho, espera que o próximo tenham também um feliz ano novo?

Na contramão do consumismo, Jung dava razão a São João da Cruz: o desejo busca sim a felicidade, “a vida em plenitude” manifestada por Jesus, mas ela não se encontra nos bens finitos ofertados pelo mercado. Como enfatizava o professor Milton Santos, acha-se nos bens infinitos.

A arte da verdadeira felicidade consiste em canalizar o desejo para dentro de si e, a partir da subjetividade impregnada de valores, imprimir sentido à existência. Assim, consegue-se ser feliz mesmo quando há sofrimento. Trata-se de uma aventura espiritual. Ser capaz de garimpar as várias camadas que encobrem o nosso ego.

Porém, ao mergulhar nas obscuras sendas da vida interior, guiados pela fé e/ou pela meditação, tropeçamos nas próprias emoções, em especial naquelas que traem a nossa razão: somos ofensivos com que amamos; rudes com quem nos trata com delicadeza; egoístas com quem é generoso; prepotentes com quem nos acolhe em solícita gratuidade.

Se lograrmos mergulhar mais fundo, além da razão egótica e dos sentimentos possessivos, então nos aproximamos da fonte da felicidade escondida atrás do ego. Ao percorrer as veredas abissais que nos conduzem a ela, os momentos de alegria se consubstanciam em estado de espírito. Como no amor.

Feliz ano novo é, portanto, um voto de emulação espiritual. Claro, muitas outras conquistas podem nos dar prazer e alegre sensação de vitória. Mas não são o suficiente para nos fazer felizes. Melhor seria um mundo sem miséria, desigualdade, degradação ambiental, políticos corruptos!

Essa infeliz realidade que nos circunda, e da qual somos responsáveis por opção ou omissão, constitui um gritante apelo para nos engajarmos na busca de “outros mundos possíveis”. Contudo, ainda não será o feliz ano novo.

O ano será novo se, em nós e à nossa volta, superarmos o velho. E velho é tudo aquilo que já não contribui para tornar a felicidade um direito de todos. À luz de um novo marco civilizatório há que superar o modelo desenvolvimentista-consumista e introduzir, no lugar do PIB, a FIB (Felicidade Interna Bruta), fundada na economia solidária e sustentável.

Se o novo se faz advento em nossa vida espiritual, então com certeza teremos, sem milagres ou mágicas, um feliz ano novo, ainda que o mundo prossiga conflitivo; a crueldade travestida de doces princípios; e o ódio disfarçado de discursos amoroso. A diferença é que estaremos conscientes de que, para ter um Feliz Ano-novo, é preciso, é preciso abraçar um processo ressurrecional: engravidar-se de si mesmo, virar-se pelo avesso e deixar o pessimismo para dias melhores.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores – para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do país no concerto das potências mundiais livres, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

a) a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo de matricularmos nossas crianças de seis anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

b) o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de variada ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis;

c) a dívida pública brasileira, com projeção para 2012, segundo o Orçamento Geral da União, de astronômico e intolerável desembolso da ordem de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos, a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tanta sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a confiança em nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de extremas e sempre crescentes demandas, necessidades, carências e deficiências, o que aumento o colossal abismo das desigualdades sociais e regionais e nos afasta num crescendo do seleto grupo dos sustentavelmente desenvolvidos...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo, nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que permita a partilha de suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previsto e que contemplam eventos como a 27ª Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro em 2013; a Copa das Confederações de 2013; a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, segundo as exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das empresas, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...





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