quarta-feira, 12 de agosto de 2015

A CIDADANIA, A FORÇA DA BOA GOVERNANÇA E A NOVA VIAGEM EDUCACIONAL

“Princípios de um bom governo
        Embora  pouco conhecido e lamentavelmente de baixa aplicação, o Código Iberoamericano de um Bom Governo, assinado em Montevidéu por representantes de vários países, incluindo o Brasil, em junho de 2006, deveria ser melhor avaliado. Em seu preâmbulo, traz como premissa para os países desenvolverem que seus governos “reconheçam, respeitem e promovam todos os direitos humanos – civis, políticos, sociais, culturais e econômicos –, em sua natureza interdependente e universal”. Todo o código é articulado em torno de três tópicos fundamentais, indispensáveis à ação dos governantes, a saber: natureza democrática do governo, ética governamental e gestão pública. O primeiro retrata a importância do reconhecimento em sua plenitude da condição de estado democrático de direito dos países, garantindo a aplicabilidade de direitos, deveres e obrigações, consagrando o clássico princípio do direito da igualdade, em que os desiguais devem ser tratados de maneira desigual, sempre na busca da emancipação dos indivíduos e no seu crescimento pessoal. É sempre bom ressaltar que as democracias participativas e representativas devem ser compreendidas como complementares uma da outra e em hipótese alguma como uma inibidora da outra e em posição sobreposta.
         No caso brasileiro, claro está que já alcançada a democracia formal, simbolizada pelo direito de votar e ser votado, o grande desafio é concretização da democracia real, em que há o reconhecimento pleno da condição de cidadania e participação ativa de todos nos destinos dos países. O segundo item trata da ética governamental, tema da maior relevância principalmente nos chamados países em desenvolvimento, em que a impunidade se destaca, aliada a questões culturais que realçam falta de transparência nas ações dos governantes, seja em postos do Executivo ou do Legislativo. Muitas das vezes, o interesse público e o bem comum são desconsiderados em favor de interesses escusos, ilegais, imorais e antiéticos.
         Em relação ao terceiro ponto norteador do código, não há mais espaço para governos que não tenham elementos de gestão pública na ordem do dia. Cada vez mais, a cidadania exige que princípios da eficiência, celeridade e eficácia sejam observados na prestação de serviços públicos. A compreensão dos governantes deve ser inevitável de que os governos existem em função dos cidadãos e não o contrário. A relação poder público – cidadão é dupla, pois este é ao mesmo tempo patrão, como quem paga os salários, mediante impostos, e ao mesmo tempo clientes, na condição de destinatários da aplicação de políticas públicas. Por fim, cabe aos governantes, atuais e futuros, de cargos executivos e legislativos, seguirem, além dos dispostos no código, os ensinamentos de Santo Tomás Moro, proclamado pela Igreja Católica em 2000 patrono dos governantes e políticos. Nascido em Londres, sempre pautou sua vida preocupado com a formação educacional moral e intelectual dos povos. Como acentuou o então papa João Paulo II, o exemplo de Tomás Moro está “na necessidade que sente o mundo político e administrativo de modelos críveis que mostrem o caminho da verdade em um momento histórico em que se multiplicam árduos desafios e graves responsabilidades”.”.

(FÁBIO CALDEIRA. Advogado, mestre em ciência política (Espanha) e doutor em direito público (UFMG), em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 22 de maio de 2008, caderno OPINIÃO, página 11).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de 11 de agosto de 2015, mesmo caderno, página 7, de autoria de MÁRCIA ESTEVES AGOSTINHO, doutora em engenharia de produção, professora e pesquisadora na Universidade Estácio de Sá, e que merece igualmente integral transcrição:

“Grande viagem educacional
        As mudanças trazidas por inovações tecnológicas que interconectam pessoas em tempo real vão muito além da forma como nos comunicamos. Seu poder de transformar estruturas hierárquicas em redes de decisão distribuída transpassa, potencialmente, todas as áreas da convivência humana – inclusive a universidade.
         Do ensino a distância (EAD) aos Massive Open On-line Courses (MOOCs), já são tantos os exemplos de introdução de novas tecnologias de informação e comunicação (TIC) no ensino que nem faz mais sentido considera-los inovadores. Além disso, o simples fato de disponibilizar conteúdos – por melhores que sejam – para acesso em todo o globo não garante educação, muito menos de qualidade. Para tal, mais do que informação, é preciso que o estudante tenha experiências significativas.
         No sentido de propiciar esse tipo de experiência, começam a surgir modelos de universidades que trocam a sala de aula tradicional pelo aprendizado ativo, em cursos de imersão interdisciplinares, por meio de trajetos curriculares customizados. Contudo, a rigor, também não podemos considera-los inovadores.
         Embora adaptada às restrições e possibilidades atuais, a estrutura desse modelo educacional nos remete ao fenômeno inglês do século 18 conhecido como “grand tour” – a grande viagem educacional, que os jovens aristocratas realizavam pelo continente europeu. Além de um rito de passagem para a vida adulta, a viagem representava a oportunidade de entrar em contato direto com a herança cultural da Renascença.
         Ainda que a viagem (que podia durar anos!) exigisse considerável soma de recursos, não bastava ser rico. Era preciso encontrar o tutor certo para guiar o rapaz por caminhos que pudessem, de fato, contribuir para sua formação. O tutor precisava ser alguém de reconhecido saber, capaz de adequar o “itinerário” tradicional aos interesses específicos do jovem sob sua orientação.
         Mais do que informações e o domínio de uma nova língua, a viagem garantia experiências significativas que levavam a um aprendizado para a vida. No início, esse tipo de formação era um privilégio da aristocracia. Porém, com a introdução das estradas de ferro – uma inovação tecnológica paradigmática –, o fenômeno se estendeu à classe média.
         Ampliar a educação de qualidade esse é o desafio que precisamos encarar. De que forma, exemplos como esses podem se tornar escaláveis? Como podemos oferecer a milhões de alunos espalhados por todo o Brasil uma formação geral sólida, que lhes permita adquirir conhecimentos específicos úteis e atualizados ao longo da vida?
         A resposta está na rede. Não a rede no sentido da internet ou das redes sociais, embora reconheça que elas façam parte da solução. Refiro-me à rede como uma estrutura de organização sistêmica. Nesse modelo, cada professor funcionaria como um tutor que o guia o grand tour de seus alunos por meio das expertises disponíveis entre os docentes e centros de conhecimento de uma universidade, promovendo experiências significativas.
         Se unir tecnologia à criatividade organizacional, a universidade terá a oportunidade de, de fato, inovar e, assim, influenciar o destino a favor dos estudantes. Da mesma forma que as estradas de ferro levaram o grand tour da aristocracia do século 18 para a classe média do século seguinte, as tecnologias de informação e comunicação podem ajudar a trazê-lo para o século 21.”.

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas (enfim, 125 anos depois, a República proclama o que esperamos seja verdadeiramente o início de uma revolução educacional, mobilizando de maneira incondicional todas as forças vivas do país, para a realização da nova pátria; a pátria da educação, da ética, da justiça, da civilidade, da democracia, da participação, da sustentabilidade...);

     b)    o combate implacável, sem eufemismos e sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo dados do Banco Central, a taxa de juros do cartão de crédito atingiu em  junho a marca de 372,0% ao ano... e mais, em julho, o IPCA acumulado nos últimos doze meses chegou a 9,56%...); II – a corrupção, há séculos, na mais perversa promiscuidade  –  “dinheiro público versus interesses privados” –, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem (a propósito, a lúcida observação do procurador chefe da força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol: “A Lava Jato ela trata hoje de um tumor, de um caso específico de corrupção, mas o problema é que o sistema é cancerígeno...” – e que vem mostrando também o seu caráter transnacional;  eis, portanto, que todos os valores que vão sendo apresentados aos borbotões, são apenas simbólicos, pois em nossos 515 anos já se formou um verdadeiro oceano de suborno, propina, fraudes, desvios, malversação, saque, rapina e dilapidação do nosso patrimônio... Então, a corrupção mata, e, assim, é crime...); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis (por exemplo, segundo Lucas Massari, no artigo ‘O Desperdício na Logística Brasileira’, a “... Desconfiança das empresas e das famílias é grande. Todos os anos, cerca de R$ 1 trilhão, é desperdiçado no Brasil. Quase nada está imune à perda. Uma lista sem fim de problemas tem levado esses recursos e muito mais. De cada R$ 100 produzidos, quase R$ 25 somem em meio à ineficiência do Estado e do setor privado, a falhas de logística e de infraestrutura, ao excesso de burocracia, ao descaso, à corrupção e à falta de planejamento...”;

     c)     a dívida pública brasileira - (interna e externa; federal, estadual, distrital e municipal) –, com projeção para 2015, apenas segundo a proposta do Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1,356 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 868 bilhões), a exigir alguns fundamentos da sabedoria grega:
- pagar, sim, até o último centavo;
- rigorosamente, não pagar com o pão do povo;
- realizar uma IMEDIATA, abrangente, qualificada, independente e eficaz auditoria... (ver também www.auditoriacidada.org.br
(e ainda a propósito, no artigo Melancolia, Vinicius Torres Freire, diz: “... Não será possível conter a presente degradação econômica sem pelo menos, mínimo do mínimo, controle da ruína das contas do governo: o aumento sem limite da dívida pública...”);

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade – “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo e nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a   Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!
O BRASIL TEM JEITO!  
  
         

           

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