quarta-feira, 5 de novembro de 2014

A CIDADANIA, AS CRIANÇAS, AS ELEIÇÕES, O DIÁLOGO E A EMOÇÃO

“Crianças e as eleições
        Inúmeros artigos são publicados a respeito do desenvolvimento da criança no mundo contemporâneo. Diante do aumento da violência e dos maus tratos às crianças e aos adolescentes, essa questão é motivo de preocupação crescente entre as entidades e profissionais de saúde que atuam na área. A felicidade está intimamente relacionada com o desenvolvimento de todas as pessoas. Contribuir para esse desenvolvimento integral da criança, promovendo, assim, a sua felicidade, é tarefa árdua, leva tempo e depende não só da família e dos pediatras, mas também do interesse governamental. Nada melhor do que discutir esse assunto em tempos de eleições.
         Vivemos em uma sociedade onde a busca pela riqueza material deixa pouco tempo para os pais se dedicarem aos filhos. O sistema capitalista exige desses pais uma presença no mercado de trabalho, e o envolvimento com a natureza, os amigos, as práticas espirituais, ou com o desenvolvimento, ficando em segundo plano. Tal ciclo ocasiona o que poderíamos designar de fenômeno da terceirização do afeto. Pessoas e instituições são contratadas para assumir a educação dos filhos: as cuidadoras, os motoristas, os parentes, as escolas e as creches. Para se conseguir que as crianças fiquem quietinhas, muitas vezes, são colocadas diante de “babás eletrônicas”, como a TV, jogos eletrônicos, DVDs e filmes, durante horas a fio.
         Por outro lado, temos os pais que se dedicam integralmente aos seus filhos. As mães que abdicam da vida profissional com objetivo de cuidar somente da família são exemplos concretos. Os fortes vínculos afetivos podem prevenir o crescimento de uma geração egoísta, indiferente, imatura e inapta para lidar com situações mais exigentes.
         Indubitavelmente, entre os extremos de delegar a terceiros a educação dos filhos e da dedicação integral, temos vários outros modelos de mães e famílias que variam de acordo com as características econômicas, geográficas, culturais, religiosas, entre outras. Definir modelos únicos de mães, com o objetivo de melhor educar as crianças, seria colaborar para o aumento da angústia e sentimento de culpa de milhares de mulheres que, na vida real, não podem segui-lo. Não há dúvidas de que a terceirização da crianças se associa a problemas graves como o abandono e a indiferença, que podem causar sequelas cognitivas, comportamentais e sociais, com danos irreversíveis à formação dessa criança e também das próximas gerações. Algumas medidas são consideradas preventivas e fundamentais nessa difícil missão de sermos pais: amamentar ao seio materno, participar diretamente da vida escolar e social dos nossos filhos, limitar o tempo de uso das mídias digitais e televisão a, no máximo, duas horas diárias.
         O apoio da sociedade como um todo poderá auxiliar na importante detecção dos sinais e sintomas que podem denunciar o abuso e maus tratos físicos e emocionais à criança e ao adolescente. A depressão e outras alterações comportamentais, como distúrbios de aprendizagem e abuso  de drogas e álcool, podem ser percebidas por quem está à volta.
         Considerando a proximidade do pleito para escolha do presidente do nosso país, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) publicou algumas propostas que considera imprescindíveis para o bom desenvolvimento da criança e adolescente. Resumidamente: acesso universal de fetos, crianças e adolescentes à atenção pediátrica; licença maternidade de seis meses; programa de residência médica em pediatria, com duração de três anos; hospitais infantis em pontos estratégicos do país; credenciamento de pediatras para atender demanda do SUS em consultório; consulta de puericultura feita por pediatra; Programa Nacional de Educação Infantil (Pronei), projeto de lei concebido pela SBP em 2007, que ampliará a rede de creches e pré-escolas de qualidade em todos os municípios; criar a profissão de cuidador da primeira infância; ensino fundamental de qualidade, em tempo integral; prevenção do alcoolismo e do uso de drogas ilícitas; fim de propaganda com crianças.
         Um futuro melhor para o nosso país está diretamente aliado à capacidade da nossa sociedade de promover as boas práticas dos cuidados individuais. Além disso, necessitamos de um apoio governamental com implementação das medidas necessárias para que um dia todas as nossas crianças e adolescentes possam ter o direito de ser verdadeiramente amadas, cuidadas e valorizadas.”

(RAQUEL PITHON DOS REIS. Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 22 de outubro de 2014, caderno OPINIÃO, página 9).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de 22 de agosto de 2014, mesmo caderno e página, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral transcrição:

“Diálogo e emoção
        A dinâmica entre diálogo e emoção configura ou enfraquece a cultura de um povo e o sentido de sua identidade. Cada pessoa sofre os efeitos desse complexo processo, com incidências sobre o modo de viver. O resultado final é um tipo de cidadania, ou aquilo que se reconhece por “brasilidade”. Vale a análise  da seriedade com que um povo realiza e respeita seus compromissos cidadãos. A corrupção é uma referência bem concreta do resultado desse processo entre diálogo e emoção. Trata-se de um binômio que entrelaça e influencia fortemente o jeito de ser de cada cidadão e o torna peça da engrenagem que faz a sociedade funcionar de um determinado modo. Pode produzir descompassos, alimentando as brechas vergonhosas entre ricos e pobres; fazer da política um mecanismo de interesses exclusivamente partidários, com a consequente perda do seu nobre sentido de priorizar o equilíbrio social. Esse processo  que envolve diálogo e emoção também incide na ambiência religiosa, produzindo todo tipo de prática. É possível que resulte em manipulação, enriquecimento e outros absurdos, em detrimento da dimensão intrínseca à fé verdadeira, ao menos no que diz respeito ao Evangelho de Jesus Cristo – o compromisso com a justiça e uma incansável luta por ela.
         A discussão filosófica sobre a emoção é extensa. Aristóteles a compreende como uma das  três classes de coisas que se encontram na alma. Ela desempenha, nesse sentido, um determinante papel na vida humana. O consenso é que as emoções sejam harmonizadas, para que não se pendule entre a hegemonia dos sentimentos e a tendência de eliminá-los. Existem emoções más. Algumas, inclusive, são produzidas para se alcançarem metas questionáveis. Há também aquelas que temperam a existência, sem deixar prevalecer a perturbação que leva à perda da serenidade e o consequente comprometimento da racionalidade. A prevalência dos sentimentos ruins prejudica a articulação entre o diálogo e a emoção, produz nefastos resultados para a cultura e também promove atrasos em respostas, aumento irracional da burocratização e disputas injustificáveis entre grupos e pessoas. Consequentemente, convive-se com grandes perdas de oportunidades e não se alcança a seriedade cidadã que alavanca o desenvolvimento integral da sociedade. Essa fragilidade pode ser corrigida com a força, a abertura e a exercitação do diálogo.
         Dialogar não é apenas uma disputa. Trata-se de uma arte, método rigoroso de conceitualização que promove um processo cognitivo, temperado pelo que é bom das emoções. A dinâmica dialogal, no entanto, não pode ser confundida com os elementos que compõem um tratado geral sobre a fofoca, nem a produção de peças para desmoralização dos outros, muito menos enrijecimentos conceituais que irracionalmente levam muitos a construir, para si mesmos e para seus pares, um lugar para julgar os outros. Isso está longe da dinâmica dialogal.
         O ensino formal e as práticas educativas na vida comum de uma sociedade podem ou não emoldurar a cidadania no equilíbrio entre diálogo e emoção. As polarizações emocionais produzem irracionalidades que cegam e comprometem processos políticos, e a autenticidade da religiosidade. Formam os guetos institucionais e alimentam a rigidez cultural. Inviabilizam, assim, a inovação, porque prejudicam a racionalidade e, consequentemente, a inspiração necessária para as mudanças importantes.
Essa reflexão pode servir para analisar e gerar novos entendimentos a respeito do que se passa na sociedade brasileira, no atual contexto eleitoral, como também contribuir para o tratamento adequado a ser dado aos gravíssimos problemas sociais que pesam sobre os ombros dos pobres, em relação à habitação, educação, saúde e trabalho. São necessários entendimentos criativos e cidadãos, indispensáveis para que a sociedade brasileira avance não apenas nos resultados econômicos, mas também nos aspectos políticos e sociais.
A sociedade precisa de cidadãos articulados entre diálogo e emoção, pilares de uma moralidade sadia e remédio para os absurdos que estão sendo gerados pela falta de proximidade, pelo descompasso emocional de muita gente. Pessoas que, muitas vezes, são amparadas por certa militância digital, que, aparentemente, constitui lugar de aproximação, mas apenas acentua distâncias. Atitude sábia diante das irracionalidades é seguir a indicação poética de Fernando Pessoa: “Segue teu caminho, rega as tuas plantas, ama as tuas rosas. O resto é a sombra de árvores alheias”.”.

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate implacável, sem eufemismos e sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, há séculos, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional – na promíscua relação “dinheiro público versus interesses privados” –,  gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de variada ordem (a propósito, noticia a mídia: “A sonegação fiscal no Brasil já atingiu R$ 318,6 bilhões este ano. Em todo o acumulado de 2013, a cifra foi de R$ 415,1 bilhões, valor que representa mais de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional...”); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que permita a partilha de suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidade e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!

O BRASIL TEM JEITO!...

    

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