segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

A CIDADANIA, OS CONFLITOS MUNDIAIS, A VERDADE, O BEM E A LIBERDADE

“Direito internacional e os conflitos mundiais
        
         Até a Segunda Guerra Mundial, as preocupações e atenções dos países e, por consequência, do direito internacional eram, fundamentalmente, a coexistência pacífica entre as nações e a manutenção da paz e da segurança internacionais. Depois, com a diminuição, ou quase desaparecimento das guerras entre Estados, as atenções se voltaram para a cooperação econômica e assumiram papel de relevo, em nível global, as organizações internacionais de cooperação e integração econômica, tais como a União Europeia, o Nafta, a Comunidade Andina de Nações, o Mercosul e a Asean, entre outras.
         Não obstante os avanços em direção à paz e os esforços no sentido da distribuição da riqueza, a vida não ficou melhor para ninguém, em nenhum lugar do mundo. As guerras e disputas entre nações deram lugar aos conflitos internos, e pelas razões mais abjetas como a cor da pele, as crenças religiosas, políticas, ideológicas, assim como pertencer a grupos, tribos e etnias diferentes e rivais, ou simplesmente por estar do outro da rua no momento errado.
         De 1989 a 2013, o número de mortes aumentou expressivamente no Sul e Centro da Ásia, assim como na África Subsaariana, no Norte e Leste da África e também na Europa e nas Américas. A violência, não apenas sexual, contra mulheres acima dos 15 anos cresceu desmesuradamente, não apenas na Índia e Brasil, mas, especialmente, na Etiópia, Peru, Bangladesh, Tanzânia, Tailândia, Namíbia, Servia, Montenegro e no Japão. Em todos os países da África Central ainda há registros de mutilação genital feminina de crianças a partir dos 2 anos. Muitas morrem em decorrência das infecções e doenças que se instalam nas feridas. E isso tudo bem debaixo dos nossos olhos.
         O abuso sexual contra meninos é também um motivo de preocupação. O clima geral de impunidade na grande maioria dos países, especialmente na África e no Oriente Médio, e de vácuo no Estado de direito afetam e comprometem a denúncia da violência e abuso sexual contra crianças às autoridades e, por conseguinte, a condenação dos perpetradores. De acordo com relatório da ONU, de julho de 2009, os autores desses crimes estão ligados ao poder local (ao governo), são eleitos pelo povo, são policiais, militares, assim como membros de grupos armados ilegais e de gangues criminosas.
         No Afeganistão, Paquistão, Iraque e países vizinhos, escolas e seus equipamentos são queimados. Quando não queimados ou destruídos dá-se o fechamento forçado ou o uso das instalações para fins de guerra interna. Ataques, combates e explosões de engenhos improvisados nas proximidades de prédios escolares e ataques de militares e ameaças contra os alunos e o pessoal docente têm aumentado de 2010 para cá. Esses incidentes são largamente perpetrados por grupos de oposição aos governos, como também por elementos conservadores em comunidades que se opõem à educação de meninas e mulheres.
         Não bastasse, atos criminosos são praticados contra os órgãos de ajuda humanitária (internos e internacionais), cujo objetivo é justamente atender as crianças e os civis detidos em campos de prisioneiros, ou os refugiados que se socorrem do país vizinho. O uso de técnicas duras de interrogatório e confissão forçada de culpa ainda são os recursos mais usados em grande parte dos países, tanto pela polícia quanto pelos grupos de guerrilhas.
         Relatório de 2010 da ONU revela que gangues da América Central estão cada vez mais transnacionais. Acredita-se que entre 8 mil e 10 mil membros dessas gangues operam em 38 estados dos EUA. Mais de 1,8 mil de seus membros foram presos nos Estados Unidos desde 2005. Em um caso recente, os líderes de uma gangue foram acusados de ordenar o assassinato de pessoas, nos EUA, a partir de sua cela na prisão de El Salvador.
         A violência no México e no Brasil não é apenas uma ameaça aos seus nacionais, é um questão de segurança internacional que atinge a todos. A criminalidade relacionada com os cartéis é um desafio que a polícia, nos dois países (e em outros latino-americanos), não encontra os meios para debelar.
         Relatório econômico da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 2013, revela que as políticas dos últimos anos posicionaram bem os países em desenvolvimento em termos de resultados macroeconômicos e financeiros. Porém, o crescimento econômico continua insuficiente e ainda resta muito a ser feito para tornar a vida das pessoas mais digna e segura. Não há outro caminho para acelerar a produtividade e melhorar as condições de vida das camadas mais desfavorecidas senão diminuir a criminalidade. Para tanto, são necessárias reformas de âmbito institucional, já que muitos dos problemas estão relacionados entre si.
         Essas necessidades são de conhecimento de todos nós. Não há saída sem reformas imperiosas visando o fortalecimento da educação, ao desenvolvimento de habilidades e do empreendedorismo, à redução da regulamentação comercial e da concorrência e à melhoria da legislação e do combate à corrupção, ao narcotráfico e à impunidade.
         Como se vê, mesmo com todos esses avanços e o fortalecimento do direito e das relações internacionais, o século 21 trouxe consigo a crise dos direitos humanos. O mundo ficou chocado por pouco tempo depois da tentativa de assassinato de Madala Yousafzai – símbolo global da luta de todas as meninas pela educação (em janeiro de 2013) – pelos fundamentalistas islâmicos. Contudo, de lá para cá a situação não melhorou e as pessoas continuam morrendo naquela parte do mundo e em muitas outras. E morrem simplesmente por não estar alinhadas com aqueles que naquele momento têm as armas na mão, e ousam desafiar preceitos, dogmas, ideologias ou, simplesmente, por pensar e ser diferente.”

(MARISTELA BASSO. Advogada, professora de Direito Internacional da Universidade de São Paulo (USP), em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 14 de fevereiro de 2014, caderno DIREITO & JUSTIÇA,   página 3).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral:

“Verdade, bem e liberdade
        
         A perda do laço essencial entre verdade, bem e liberdade na cultura contemporânea é a explicitação do caos moral que vai afundando a sociedade em acontecimentos assustadores. Os fenômenos em torno de violências, justiça com as próprias mãos, corrupção, fundamentalismos, entre outros, são resultado da perda deste laço fundamental. Sua recuperação é um longo caminho a percorrer. Sua urgência deve motivar os mais variados segmentos da sociedade, desde o recôndito da privacidade familiar, passando pelas igrejas e escolas, até ações governamentais em diferentes níveis, em um investimento mais consistente e permanente.
         O dia a dia da sociedade sem comprometimento com a verdade, o bem o autêntico sentido de liberdade pode trazer comprometimentos irreversíveis. O que se vê é um crescente processo de desumanização, com graves consequências para a vida, de todos e impactos na formação dos mais jovens. Assim, a ausência do laço essencial entre verdade, bem e liberdade impede que sejam dados novos passos no presente e também engessa a sociedade do amanhã. Muitos se acostumam com os relatos de violência nos noticiários e até, de certo modo, os esperam a cada dia, cultivando o gosto pelo hediondo. Alguns se sentem privilegiados, por não serem alvos ou vítimas, e se comportam como meros espectadores do caos que vai se implantando na sociedade. No entanto, o aumento crescente dessa violência é um risco para todos, mesmo para os que estão nos seus bunkers de defesa e comodidades.
         Não basta apenas um olhar sociológico e estrategista sobre essa situação. Providências e encaminhamentos advindos dessas análises são importantes. Contudo, o essencial é trabalhar pelo recuperação da perda do laço essencial entre verdade, bem e liberdade. Há, pois, uma questão de ordem moral pesando sobre os ombros de todos nessa luta de recomposição da sociedade. Quando se considera, por exemplo, o mundo da política, a luta por reforma política, obviamente que não basta legislar de modo novo e diferente, embora necessário. É prioritário poder contar com homens e mulheres à altura de exercícios cidadãos, superando o comum de fazer da política um canal para atendimentos de interesses partidários  e de grupos endinheirados.
         Os atrasos na sociedade são incontáveis, atingindo as instituições na sua identidade e missão, desfigurando o sentido de cidadania que se sustenta na verdade, no bem e na vivência autêntica da liberdade. O investimento prioritário, portanto, é na ordem moral. Essa ordem não se enquadra na permissividade de posicionamentos religiosos, políticos e sociais, nem nos rigores fundamentalistas dos que se elegem como os iluminados e donos da verdade. Urge um investimento permanente e consistente na ordem moral. Do contrário, não se vai conseguir debelar o processo que está levando a sociedade a resvalar na direção de um caos maior.
         Que absurdos ainda não foram presenciados? Repassar essa lista até desanima. A sensibilidade moral é o remédio para combater o que o papa Francisco chama de globalização da indiferença e o veneno da idolatria do dinheiro. A sociedade, por falta de aprofundado sentido moral, está sendo, passo a passo, conduzida por diferentes tiranias. Da tirania nascida da ganância que gera a insaciabilidade das riquezas àquelas novas tiranias, invisíveis, às vezes virtuais, que impõem suas leis e suas regras, cristalizando grupos radicais, de todo tipo, até religiosos, contribuindo na complicação que a sociedade contemporânea está vivendo.
         A verdade, o bem e a liberdade, como laço essencial da moralidade, devem ser o horizonte inspirador cotidiano de ações, programas e testemunho individual, em casa, na igreja, na escola, nas empresas, nas ruas, em todo lugar. É preciso libertar a sociedade contemporânea dos excessos de uma cultura em que cada um pretende ser portador de uma verdade subjetiva própria. Razões meramente políticas não inspirarão ações condizentes, neste momento, na busca urgente de soluções para mudar os cenários de exclusão e desigualdades, fontes de violências e disputas que se travam até mesmo sem se ter certeza a respeito de qual bandeira se está defendendo.
         As reações violentas tenderão a crescer por parte dos excluídos do sistema social e econômico, que é injusto na sua raiz. O avanço na direção de indispensável equilíbrio, para não inviabilizar a sociedade, supõe a convicção de que é preciso investir sempre e em todos os níveis na recuperação da força moral. Cada cidadão deve ser depositário dessa força, fazendo com que a sociedade redescubra que seu sustento e progresso dependem do respeito incondicional à verdade, o compromisso com o bem moral e a permanente aprendizagem  quanto à fragilidade e limites da liberdade humana.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreversíveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 639 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...