segunda-feira, 1 de junho de 2015

A CIDADANIA, A RIQUEZA QUE NÃO MORRE, A EDUCAÇÃO E A FLOR NO LAMAÇAL (10/14)

(Junho = mês 10; faltam 14 meses para a Olimpíada 2016)

“A riqueza imperecível
        Gente suando por mais riqueza, títulos, poder e honras – sem tempo para olhar as estrelas, a natureza, as crianças, a vida que escorre e some pela via. Gente pisando na grama, atropelando, arrancando flor pela raiz.
         Riqueza fantasiada de felicidade. Riqueza acima do necessário, riqueza arrancada sem escrúpulo, disputada a qualquer preço. Riqueza que desconhece a importância de sua origem, dos métodos usados, dos sofrimentos gerados. Riqueza maldita. Para quê?
         Ansiedade, provocação, afã, luta, suor e até sangue.
         Ter mais, mais que o vizinho, mais que tudo.
         Riqueza sem objetivo, sem rumo, sem fim, sentada sobre um monte de vítimas. Riqueza para pagar guarda-costas e advogados, para perder o sossego; escancarada, vulnerável, sequestrável. Riqueza para fazer a festa de malandros, exposta à queda da Bolsa, à desvalorização cambial, ao assaltante e ao gatuno.
         Riqueza monumental guardada em palácios e moradas, que não cabe no caixão, que será gasta por outro fantoche. Um atrevido, um perdulário, um dissoluto, um bobo, um trapaceiro que a desintegrará, ou um santo, um místico que não saberá o que fazer e se livrará dela como de um peso.
         Riqueza que aquieta a sede ou que aflige a alma, que enche de preocupação e tormento. Fome de vento que nunca sacia. Inútil para o espírito que dela um dia se libertará como de um empréstimo.
         E o que dizer ao homem que não tem pão, incapaz de conseguir saciar o estômago e o de seus filhos? Homens diferentes. Uns ricos querendo ser mais ricos, outros pobres querendo ser ricos. Duas humanidades aparentemente diversas. Um único Deus. Que tem muito não tem tempo para aproveitar nem sossego para dormir profundo.
         Riqueza, para o rei Salomão, é Sabedoria. Dessa diz ele com entusiasmo: “É mais que a saúde e a beleza. Gozei da sabedoria mais do que a claridade do sol, porque a claridade que dela emana jamais se apaga”. Deixa claro o caminho, doce o pensamento, livre o agir.
         E mais: “Há na sabedoria um espírito inteligente, santo, único, múltiplo, sutil, móvel, penetrante, puro, claro, inofensivo, inclinado ao bem, agudo, livre, benéfico, benévolo, estável, seguro, sem inquietação, que pode tudo, que cuida de tudo... É ela um efusão da luz eterna, um espelho sem mancha da atividade de Deus e uma imagem de Sua bondade”.
         “Eu a amei e a procurei desde a juventude, me esforcei para tê-la por esposa... por meio dela obterei a imortalidade... e recolhido em minha casa, sem medo, descobridor da minha eternidade, repousarei junto dela...”. Sem precisar de mais nada que não seja o essencial.
         Sabedoria: riqueza imperecível, grandeza do humilde; justiça do misericordioso, doçura do homem, força, inteligência de quem aprendeu o que é amor. Tudo sem nada em contraposição a nada com tudo.
         Sabedoria emprestada de Si por Deus, gerando o homem “à imagem e semelhança dEle”. Nada custa, é de graça, apenas de quem a ama e a quer.”

(Vittorio Medioli, em artigo publicado no jornal SUPER NOTÍCIA, edição de 31 de maio de 2015, caderno OPINIÃO, página 2).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado na revista VEJA, edição 2428 – ano 48 – nº 22, de 3 de junho de 2015, páginas 86 e 87, de autoria de Gustavo Ioschpe, economista, e que merece igualmente integral transcrição:

“Uma flor no lamaçal
        A realidade é complexa. Pense no simples ato de ler esta página e na quantidade de áreas e saberes que foram necessários para possibilitar o nosso diálogo. Ele depende de muitos anos da minha formação; do computador em que escrevo e suas centenas de patentes; de toda a tecnologia de plantio e colheita de árvores, do processamento dessas árvores até que se tornem celulose e depois papel; do conhecimento de editores, diagramadores, revisores, fotógrafos mais a equipe que opera o maquinário da gráfica. Ainda há a equipe de logística, de transporte, financeira etc. Tudo isso está embutido no seu simples ato de folhear esta página (para quem a lê on-line, a quantidade de inovações e saberes envolvidos provavelmente é maior).
         A escola precisa preparar as pessoas para a complexidade desse mundo. Que está cada vez mais complicado, mas que já era complexo e multifacetado desde que o mundo é mundo. Seria muito difícil abarcar toda essa complexidade e interdependências em um currículo escolar. O professor teria de dominar todas essas áreas, o que é virtualmente impossível, e também controlar o ambiente para que as crianças só fossem expostas ao nível de complicação que pudessem deglutir. O que o sistema escolar fez, então, foi replicar o reducionismo da ciência: fracionar a complexidade em seus múltiplos elementos e ensiná-los de forma separada. Ao fazê-lo, garantiu que os pupilos pudessem ter mestres que dominam profundamente o assunto ensinado e que o nível de dificuldade da matéria fosse controlado e ajustado à capacidade de compreensão dos alunos. É um modelo brilhante, que vem produzindo grandes resultados há milênios.
         Com em toda atividade de especialização e divisão do trabalho, porém, há um dowside: perde-se a visão global. Alguém já disse que um especialista é aquele que sabe cada vez mais sobre cada vez menos. O professor de história precisa mergulhar não apenas nessa disciplina, mas também, provavelmente, nos conteúdos de história das séries em que leciona. A mesma coisa acontece com seus colegas de todas as outras disciplinas. Esse foco no conhecimento gerou grandes avanços, mas acarretou um importante retrocesso: tudo o que está fora do currículo é ignorado, parece desimportante.
         Desde a década de 90, pelo menos, com o trabalho do psicólogo Daniel Goleman, tornou-se amplamente difundido o achado de que os fatores não cognitivos são tão ou mais importantes para o sucesso na vida adulta – não apenas profissional, mas também pessoal – que o QI ou a cultura geral. A popularização dessa ideia, chamada de inteligência emocional, também penetrou a área da educação, especialmente em países desenvolvidos, onde muitas escolas criaram programas para ensinar os pequenos a ser pacientes, perseverantes, abertos, respeitosos etc. O movimento é compreensível. Se algo muito importante na idade adulta, faz mais sentido ensiná-lo ainda na infância, pois depois pode ser difícil ou tarde demais. E também é lógico que a dianteira tenha sido tomada por países desenvolvidos. Primeiro, porque eles já resolveram o bê-a-bá, de forma que têm liberdade para se preocupar com problemas mais avançados. Segundo, porque nosso mundo é regido por uma competição de talentos – e, se houver uma dimensão do talento humano que está sendo cultivada em um lugar mas não em outro, quem ficar para trás terá uma desvantagem estratégica importante. E, terceiro, porque até nos países em que o sistema funciona muito bem há crianças que não aprendem, que abandonam a escola e se rendem ao crime ou às drogas. Um sinal de que mesmo um sistema azeitado pode estar deixando alguma coisa de lado.
         Nos últimos anos, começou a emergir uma literatura coesa e robusta, da qual o livro Uma Questão de Caráter (péssima tradução de How Children Succedeed), de Paul Tough, oferece um competente resumo, da importância de qualidades não cognitivas como garra e autocontrole para o sucesso de crianças (já mencionei aqui, em outro artigo, o experimento clássico de Walter Mischel com os marsmallows; para quem conhece, vale a pena dar um Google ou ver twitter.com/gioschpe).
         Recentemente, uma ONG deu um passo além: entendeu que a promessa desse novo olhar sobre o desenvolvimento humano não era apenas de incorporar os temas não acadêmicos à educação, mas, de forma mais ambiciosa, trazer todos os conhecimentos da ciência para a sala de aula. Sim, pois paradoxalmente a instituição que forma os futuros cientistas não tem se beneficiado de quase nada do que eles vêm descobrindo ao longo das últimas décadas. Desde a década de 60 do século passado, economistas já buscam quantificar o processo educacional. Mais recentemente tivemos neurocientistas descobrindo muito sobre como o cérebro aprende e psicólogos notando os impactos de questões de higidez mental sobre a capacidade de aprendizado de crianças e jovens. Mas nada disso entra no radar da esmagadora maioria dos professores do mundo todo, que não costumam aprender sobre esses conhecimentos em suas formações. Passam a vida tentando mudar a cabeça de seus alunos mas não têm a menor ideia de como o cérebro funciona. Baseiam sua prática em pensadores teóricos do século XIX. E eis o mais surpreendente: essa ONG não é da Finlândia, da Coreia nem de qualquer outra potência educacional, mas do... Brasil! Trata-se do Instituto Ayrton Senna.
         O IAS acaba de lançar uma iniciativa chamada eduLab21, em parceria com o Insper e a Universidade de Ghent, na Bélgica. É um laboratório destinado a trazer o conhecimento em educação para o século XXI e o conhecimento do século XXI para a área de educação. O polo belga será o responsável pela geração de novos estudos, inicialmente usando inputs das áreas de psicologia, neurociência e economia. O polo brasileiro, comando por Ricardo Paes de Barros, o melhor economista brasileiro de sua geração, terá como responsabilidades a organização do conhecimento gerado (em todo o mundo) e sua implantação e teste em sala de aula. E aqui a coisa fica mais interessante: como o IAS atende milhões de alunos através de parcerias com secretarias municipais e estaduais de Educação em quase todo o país, o que há de mais avançado nessa pesquisa poderá ser quase que imediatamente testado em campo, em centenas de escolas. Poder realizar experimentos em tantos e tão grandes grupos de alunos é o sonho de todo pesquisador; beneficiar-se do conhecimento de ponta em primeira mão é o sonho de todo bom gestor público. O IAS já vinha tomando um papel de liderança internacional na pesquisa do impacto dos aspectos socioemocionais sobre a aprendizagem por meio de uma parceria com a OCDE. Com o eduLab21, não seria surpreendente se virasse a instituição referência mundial no assunto. Tudo isso sem custar um centavo ao Erário. É quase inacreditável, mas do lamaçal que se tornou a educação brasileira brota uma flor que há de nos orgulhar.
         A morte de Ayrton Senna foi um evento traumático para a maioria dos brasileiros acima de 30 anos, entre os quais me incluo. Foi-se num acidente estúpido nosso compatriota que triunfava no mundo das máquinas, da tecnologia de ponta. Seu falecimento institucionalizou o trabalho pelo bem das crianças brasileiras, que Senna fazia de maneira informal e quase escondido. O choque da sua morte e o amor de tantas pessoas mundo afora ajudaram seu instituto a obter as doações de pessoas e empresas que até hoje o mantêm operando. Que doce ironia que agora sua irmã, Viviane, comande uma instituição que também tem pinta de líder mundial em uma área que está na ponta do conhecimento.
         P.S. Full disclosure: este articulista está em conselhos do Insper e do Instituto Ayrton Senna, de forma não remunerada.
         P.P.S. Em twitter.com/gioschpe cito alguns programas de intervenções na área socioemocional com resultados comprovados.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas (enfim, 125 anos depois, a República proclama o que esperamos seja verdadeiramente o início de uma revolução educacional, mobilizando de maneira incondicional todas as forças vivas do país, para a realização da nova pátria; a pátria da educação, da ética, da justiça, da civilidade, da democracia, da participação, da sustentabilidade...);

     b)    o combate implacável, sem eufemismos e sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo levantamento da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade – Anefac –, a alta de abril dos juros  do cartão de crédito chegou a 295,48%  ao ano...); II – a corrupção, há séculos, na mais perversa promiscuidade  –  “dinheiro público versus interesses privados” –, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem (a propósito, a simples divulgação do balanço auditado da Petrobras, que, em síntese, apresenta no exercício de 2014 perdas pela corrupção de R$ 6,2 bilhões e prejuízos de R$ 21,6 bilhões, não pode de forma alguma significar página virada – eis que são valores simbólicos –, pois em nossos 515 anos já se formou um verdadeiro oceano de desvios, malversação, saque, rapina e dilapidação do nosso patrimônio...); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis (haja vista as muitas faces mostrando a gravidade das crônicas paralisações de obras e serviços públicos, gerando perdas bilionárias...);

     c)     a dívida pública brasileira - (interna e externa; federal, estadual, distrital e municipal) –, com projeção para 2015, apenas segundo a proposta do Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1,356 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 868 bilhões), a exigir imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade – “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo e nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a   Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!

O BRASIL TEM JEITO!...