quarta-feira, 10 de julho de 2013

A CIDADANIA, A INTERNET NA MOBILIZAÇÃO SOCIAL E A DEMOCRACIA PARTICIPATIVA

“Internet e mobilização
        
         Quem quiser entender o poder de fogo do ciberativismo que tomou conta do país, levando milhares de pessoas a participar de passeatas e manifestações, empunhando em uma mão cartazes de confecção caseira e na outra sofisticados celulares, precisa, antes de tudo, entender o ambiente em que ele foi gestado.
         Vamos aos números: o Brasil já ocupa a terceira posição em quantidade de usuários ativos na internet (53,9 milhões), atrás apenas dos EUA e do Japão. Mais de metade da população tem computador em casa e 94,2 milhões de brasileiros têm acesso à internet. Em nosso país, um celular é ativado a cada segundo – temos 264 milhões deles, sendo 65 milhões de smartphones e 58,9 milhões de conexões 3G. Não é de admirar que, com tamanho alcance, a internet seja parte fundamental do fenômeno que hoje toma as ruas do país.
         Num primeiro momento, as manifestações pela queda das tarifas do transporte público em São Paulo foram mobilizadas quase integralmente pela internet. A partir do dia 13, em virtude dos excessos cometidos pela polícia paulista, o tema ganhou maior destaque na imprensa tradicional, passando a monopolizar o tempo dos telejornais na TV aberta.
         Nesse momento, a internet deixou de ser protagonista da produção de conteúdo, mas se manteve fundamental na repercussão e amplificação do que era veiculado na grande imprensa. Estabeleceu com as mídias convencionais uma relação de retroalimentação que ajudou a definir e pautar o movimento – principalmente quando o fenômeno saiu de São Paulo para ganhar novas praças e, com elas, bandeiras que ultrapassaram a questão inicial, do transporte público.
         Diferentemente do que acontecia nas manifestações de duas décadas atrás, no entanto, o discurso pasteurizado da grande imprensa é, agora, contestado por imagens captadas pelos próprios manifestantes. Veiculado livremente no ambiente democrático da internet, esse material oferece um ponto de vista único e pessoal dos acontecimentos. Permite o debate, a troca de experiências e o compartilhamento instantâneos – e, assim, mantém o movimento vivo, impulsionando a adesão de forma exponencial. Tudo se propaga rapidamente e é fácil entender por quê: 97% dos brasileiros usuários de internet estão nas redes sociais, nas quais passam cerca de cinco horas por dia.
         É desse atrito entre as informações da grande imprensa e o contudo gerado por indivíduos independentes, que se constroem os conceitos com os quais estamos, agora, nos defrontando. E que são caóticos neste primeiro momento, dificultando o entendimento, porque caótica é a rede – e é preciso, antes de tudo, dominar a arte do monitoramento e da gestão para extrair do caos o que é ou não importante.
         Mas se é verdade que dialoga com as mídias tradicionais na produção de conteúdo, a internet reina absoluta na organização das passeatas. Notadamente, páginas e grupos do Facebook são utilizados para pautar e agendar as manifestações. O Twitter, por sua vez, tem sido a ferramenta de mobilização e difusão de palavras de ordem. No momento mesmo em que escrevia este artigo, chegam notícias de que os manifestantes reunidos em frente ao Congresso Nacional estavam organizando seus deslocamentos táticos a partir de mensagens trocadas via SMS e What’sApp.
         Para entender  por que as redes sociais são fundamentais para toda essa articulação é preciso considerar que a rede reorganizou os hábitos de socialização – e as comunidades virtuais são o melhor exemplo disso. A mudança de paradigmas promovida pela internet acabou por trair os conceitos de comunidades tradicionais. Antes fortemente baseadas na interação física na proximidade geográfica, as novas comunidades se estruturam agora sobre um único aspecto: o interesse em comum de seus membros.
         Quando o interesse comum que sustenta esses novos grupos encontra um ambiente propício, essas relações podem migrar do mundo virtual para o real. E o fazem com a força de um fenômeno que desconhece fronteiras – sejam elas territoriais ou culturais.
         O que se vê no Brasil, hoje, certamente tem causas mais profundas, que exigirão, nos próximos dias, análises históricas e socioculturais que nos ajudem a entender como chegamos a esta conjuntura. Mas já não há dúvidas a respeito do ambiente, democrático e plural, no qual foram gestadas as mudanças que estão por vir.”

(LUIZ ALBERTO FERLA. CEO da Knowtec, Talk, TechFront, KeepingUp e DDBR, em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 2 de julho de 201, caderno OPINIÃO, página 9).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de 5 de julho de 2013, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, que é arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral transcrição:

“Cidadania e instituição
        
         As manifestações populares que estão sendo realizadas no Brasil podem ser também interpretadas como reação a uma crise que, ao longo dos anos, cresceu em nossa sociedade, atingindo instituições sociais e políticas do país. Diante dessa realidade, que exige uma resposta de todos, diversos peritos, analistas e demais cidadãos refletem a crise da República, ajudando a construir uma nova cultura, e manifestam abertamente o anseio, que por algum tempo permaneceu meio escondido, de se alcançar uma sociedade com funcionamentos mais justos e solidários.
         A compreensão do fenômeno que se expandiu pelas cidades do país merece ainda muitos aprofundamentos, mas é possível afirmar que as manifestações quebraram mordaças de todo tipo, fazendo ouvir a voz das ruas. Nesse sentido, o fenômeno contribuiu para pressionar aqueles que, no exercício de suas responsabilidades, grandes ou pequenas, ferem a cidadania. Exige-se uma readequação dos funcionamentos de instituições, de modo especial nas instâncias governamentais, que deveriam servir prioritariamente ao povo e não a um tratamento cartorial a partir do interesse de oligarquias.
         Tratar essa chaga que atormenta o Brasil é investir na direção de uma cultura contrária ao exercício do poder coronelista, ainda existente neste milênio, de maneira explícita ou disfarçada em discursos e favores, muitas vezes distribuídos a partir da ação daqueles  que foram eleitos para representar a coletividade. A dinâmica das manifestações populares é um sinal evidente e exigente de que é necessário mudar a forma de se fazer política. Obviamente, não se trata de pensar uma política sem partidos, que têm a função de incrementar o diálogo indispensável no funcionamento da sociedade. Busca-se, na verdade, um novo contexto, em que partidos e políticos contracenem mais com o povo, segundo novas dinâmicas de funcionamentos institucionais, capazes de viabilizar a participação inegociável, representatividade à altura e constante alimentação de uma cultura cidadã.
         Nesse caminho, será possível respeitar direitos e combater a corrupção, encontrar um modelo de se fazer política voltado para o bem comum. Diante de todos, está a exigência de se revisar, profundamente, as instituições políticas e o modo como nossos representantes exercem seus mandatos. O povo tem que ser a instância maior de poder. O compromisso com o seu bem comum será sempre remédio para mudar a cultura excludente e injusta com a qual a sociedade brasileira funciona escrevendo uma história que pode e precisa ser diferente. Urge uma inteligência que articule, institucionalmente e nas ações de todos, particularmente dos que exercem poderes republicanos, mecanismos legais existentes para que um processo amplo, profundo e incidente permita o desenho desse novo tempo e dessa nova cultura.
         O povo nas ruas sinaliza a necessidade imediata de respostas, mas, ao mesmo tempo, não se pode correr o risco de tratar as grandes dimensões e implicações dessa crise a toque de caixa, como se o assunto fosse simples, ou fazer aquilo que já se fez e se faz muito: utilizar um simples “remendo” para dar uma resposta com a pretensão equivocada de acalmar as pessoas. Também, evidentemente, deve-se descartar a hipótese de provocar mudanças que promovam efeitos positivos apenas para partidos políticos, interesses pessoais ou mesmo de pequenos grupos hegemônicos. Essa possibilidade, se não for descartada, certamente produzirá, como se pode deduzir a partir da observação dos últimos acontecimentos, uma grande convulsão social marcada pela mistura, como já se viu, do anseio do cidadão justo e civilizado com os lamentáveis atos de vandalismos e violências.
         Nesse sentido, a reforma política, importante item da pauta cidadã, não pode ser entendida como simples calmante para as reações populares, com o atropelamento de instituições e com procedimentos que a tratem como se fosse apenas a resposta plebiscitária de uma, duas ou três questões. Ela é complexa e deve ser tratada adequadamente para que o Brasil em crise consiga abrir um novo ciclo político e social. É importante destacar que, para viver essa almejada nova etapa, não basta apenas mudar dinâmicas e procedimentos nos funcionamentos governamentais. O povo precisa participar e ter a oportunidade de refletir, dialogar, assimilar e opinar nesse processo.
         Cada instituição, na sua competência própria e por sua dinâmica peculiar, precisa ajudar nessa configuração de uma nova cidadania como marco civilizatório para a sociedade brasileira. A CNBB continua sua importante colaboração, com outras instituições sérias, para que se efetive uma verdadeira reforma política no país. A Igreja Católica, com sua capilaridade, nas suas comunidades e instituições, coloca-se a serviço desse diálogo e da formação de uma nova cidadania. A participação de todos é fundamental nesse processo, oportunidade singular para construir um novo Brasil.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; sistema financeiro nacional; esporte, cultura e lazer; comunicações; turismo; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que permita a partilha de suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a 27ª Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro; a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...
  
        


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