“Os
recentes ensaios de democracia participativa
O discurso já vem de
longe. A democracia representativa, que vive na maioria dos países ditos
democráticos, depois que o poder econômico se tornou avassalador e globalizado,
tem mostrado sinais de enorme decadência.
O
dinheiro entra, pelo menos três vezes, de modo decisivo, na escolha e atuação
dos representantes do “povo”. Para eleger-se, necessita-se de muito dinheiro
que pessoalmente só o têm aqueles que pertencem à elite. Outros necessitam de
financiadores, que se transformam em “benfeitores” à espera da “gratidão” dos
políticos. Já aí a representatividade sofre detrimento. Uns se fazem
representar mais que os outros. E os detentores do capital gozam de vantagens
incomparáveis.
No
trabalho parlamentar, os políticos frequentemente isolam-se das aspirações e dos problemas
populares. Lá funcionam os poderosos lobbies. E quem os financia? De novo, o
capital consegue privilégios únicos ao controlar os projetos, forçar as
votações daqueles que os favorecem.
O
político sabe que no período de mandato se extingue em quatro ou oito anos. E
depois? A reeleição entra, logo no
início, com perspectiva de futuro. De novo, interfere o capital, que acompanha
o político todo o tempo para testar-lhe a confiança e, assim, ajudá-lo no
próximo processo eleitoral.
A
liberdade do político restringe-se enormemente em face dos interesses
dominantes. No discurso, mostra-se popular, na prática, submete-se ao império
do sistema presente, quase sem saída.
A
alternativa fácil e tentadora, sobretudo em momentos de convulsão social, soa
como golpe, como já a conhecemos em 1964. O provérbio popular lembra-nos que “a
emenda ficou pior que o soneto”. As soluções rápidas de processos que carecem
de tempo terminam ainda mais desastrosas.
Aos
poucos, a cultura atual está a descobrir novas formas de ação política que não
passam pela mera representatividade partidária. Assistimos, nas últimas
semanas, a ensaios de tal experiência. Algumas conquistas se fizeram por força
da pressão popular. No entanto, um país não vive de mobilizações de massa em
grande escala. Cumpre encaminhar dois processos simultâneos: diminuir o custo econômico dos parlamentares,
reduzindo drasticamente o número e controlando os numerosos adendos de
privilégios e assessores. Já não cumprem bem a finalidade para a qual se
elegeram. E o dinheiro público teria, então, chance de criar alternativas:
mobilizar outras maneiras de ouvir a população, como sindicatos, movimentos
sociais, grupos de base, orçamento participativo, organização de bairro,
notáveis da República etc. E crescem em importância as redes sociais. Como
inseri-las eficientemente na sondagem de opinião permanece tarefa fundamental
para a democracia futura. Nada se faz sem riscos. E só experiências,
inicialmente tópicas e bem-sucedidas, permitem legislação nova, flexível e
colada à realidade das grandes maiorias.
A
lentidão do aspecto jurídico parlamentar emperra mudanças rápidas do país. A consulta direta ao povo,
via plebiscito ou outras formas a serem criadas, permite transformações
aderentes à vida do povo com maior presteza. Estamos em tempo de pensar o
futuro, para que tanta vitalidade, expressa nas mobilizações populares, não termine
no silêncio acomodado.”
(J. B.
Libânio. Teólogo, escritor e professor; padre jesuíta, em artigo publicado
no jornal O TEMPO Belo Horizonte,
edição de 14 de julho de 2013, caderno O.PINIÃO,
página 21).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado na revista VEJA, edição 2329 – ano 46 – nº 28, de
10 de julho de 2013, páginas 100 e 101, de autoria de GUSTAVO IOSCHPE, que é
economista, e que merece igualmente integral transcrição:
“DADOS
NOVOS,
PROBLEMA
ANTIGO
Na terça-feira 25 de
junho, foram divulgados os dados do Education at a Glance 2013, o maior
observatório de estatísticas educacionais do mundo, atualizado anualmente pela
OCDE. O levantamento traz informações dos 34 países-membros da OCDE (os do
chamado Primeiro Mundo, mais Chile, México, Turquia e países da Europa
Oriental) e oito países do G20, incluindo o Brasil. O EAG reúne dados sobre
diversos aspectos da educação – financiamento, estrutura de gastos, escolaridade
da população, carga horária dos sistemas educacionais e retornos à educação,
entre outros. Os dados são novos, mas, no que tange ao Brasil, infelizmente o
retrato é antigo. Apesar de termos aumentado significativamente os insumos
educacionais na última década – especialmente o volume de investimento –, nosso
sistema educacional continua gerando poucos formados. Só 12% da nossa população
adulta tem ensino superior, taxa que é quase um terço da existente nos países
da OCDE (31%). Por causa da escassez de gente qualificada no país, os
diplomados continuam ganhando excepcionalmente bem no mercado de trabalho
(aqui, o bacharel ganha 2,5 vezes mais que alguém com apenas o ensino
secundário, contra 1,5 vez na OCDE). Assim, a educação nacional, longe de ser
uma ferramenta de alteração do status
quo, torna-se a grande perpetuadora de nossas desigualdades de renda.
Esses
dados deveriam ser lidos com muita atenção por governantes e pelos
manifestantes que foram às ruas clamando por uma educação melhor, sob pena de
insistirmos na tecla errada: aumentar o volume de gastos no setor não deve
trazer a qualidade educacional de que precisamos. Como mostra o EAG, em 2000 o
Brasil gastava 2,4% do seu PIB com educação básica, contra 3,6% da média dos
países da OCDE. Proporcionalmente, portanto, esses países gastavam 50% mais do
que o Brasil. Em 2010, porém, a situação se invertera e o país já gastava 4,3%
do seu PIB na área, contra 3,9% nos países da OCDE. Gastamos, portanto, 10%
mais do que eles, em termos de nossas riquezas nacionais. Ainda gastamos menos
no ensino superior (universitário): 0,9% do PIB, contra 1,6% do PIB.
Mas,
antes que se dê atenção aos que usarão esse dado como prova do “sucateamento”
da universidade brasileira, é preciso prestar atenção aos detalhes e notar que
ele compara coisas e realidades diferentes. O dado brasileiro diz respeito
apenas a instituições públicas, enquanto na maioria dos países da OCDE os dados
fornecidos são de instituições públicas e privadas. Essa é uma enorme
diferença, porque no Brasil o setor privado responde por quase três quartos da
matrícula universitária, enquanto nos países da OCDE, pelo contrário, 71% da
matrícula está nas universidades públicas. Além disso, nesses países a taxa de
matrícula no ensino superior costuma ficar entre 50% e 80%, enquanto no Brasil
mal passa de 20%. Ou seja, gastamos um pouco menos no ensino superior, mas para
um número várias ordens de grandeza menor de alunos. A diferença fica visível
quando se olha para o custo por aluno. Se na educação básica o Brasil tem
gastos semelhantes aos dos países desenvolvidos, no ensino superior nosso gasto
por aluno, relativo ao nível médio de renda médio do país, é bem diferente:
enquanto o universitário brasileiro custa 105% da renda de um brasileiro médio,
nos países desenvolvidos essa relação é de apenas 41%.
A
educação brasileira também consome uma fatia maior do orçamento público do que
aquela dos países da OCDE: 18,1% aqui, contra 13% lá. A destinação dos gastos é
parecida: quase três quartos da verba vai para bancar o salário dos professores
e funcionários. Os dados também trazem pouco alento àqueles que acreditam ser
indispensável ter ensino de tempo integral em todo o sistema educacional para
que seja possível oferecer um ensino de qualidade: a jornada média, no ensino
fundamental, é de 863 nos países da OCDE contra as 800 previstas em lei no
Brasil. Também fica difícil atribuir nosso insucesso à “superlotação” das
nossas salas, já que aqui, novamente, as diferenças são pequenas: no Brasil há
27,5 alunos por classe no ensino fundamental, contra 22,3 na OCDE. O outro
insumo medido pela OCDE que poderia lançar muita luz sobre o nosso debate
educacional – o salário dos professores – está misteriosamente indisponível
para o Brasil. Os dados brasileiros são enviados à OCDE pelo Inep, órgão do
Ministério da Educação. Até o EAG de 2005, esses dados constavam dos
relatórios. No EAG daquele ano – que trazia informações referentes a 2003, o
primeiro ano do governo Lula –, os dados mostravam que o professor brasileiro
tinha salário mais alto que o de países da OCDE, quando comparado à renda
médias dos respectivos países (um professor brasileiro ganhava 2,3 vezes a
renda média nacional, enquanto seu confrade da OCDE, com a mesma jornada e a
mesma experiência na profissão, recebia 1,4 vez). Consultado sobre o porquê da
omissão no relatório desse ano, o Inep/MEC não se pronunciou até o fechamento
desta edição. Será porque esses dados ajudariam a reforçar que o professor
brasileiro ganha o que seria de esperar, algo que desagrada aos sindicatos de
professores e funcionários da educação, apoiadores históricos do PT? Fica a
dúvida.
Em
entrevista a VEJA, Andreas
Schleicher, diretor da OCDE, comenta as diferenças de resultados educacionais
entre o Brasil e outros países em desenvolvimento que ostentam melhores
indicadores no setor, como a China e o Chile. “Os países que tiveram melhorias
significativas elevaram seus padrões de exigência e conseguiram tornar a
docência uma profissão, em vez de ver o professor como um mero entregador de
conteúdos. O Brasil poderia aprender com os chineses como eles fizeram para que
os melhores professores e diretores se encaminhem para as escolas com maiores
dificuldades – o oposto do que acontece no Brasil, onde os melhores professores
escolhem as áreas mais fáceis. Os países de sucesso não são os que gastam mais,
mas aqueles que aplicam seus recursos de forma que eles possam realmente fazer
a diferença para quem mais importa, que são os alunos de família de baixa
renda. Os alunos de classe média e alta vão bem em todos os lugares do mundo. O
buraco entre o Brasil e outros países se dá pelo que é feito com os alunos
pobres. Tanto o Brasil quanto a China acreditam que é importante dar uma
educação de qualidade para todos os alunos, mas a diferença é que no Brasil a
mediocridade é tolerada, é aceitável você ter um aprendizado mais ou menos. Na
China as ambições são mais elevadas. Acho que o Brasil teria um desempenho
muito melhor nos testes internacionais de educação se tivesse expectativas mais
altas, especialmente para crianças mais pobres.”
Está
aí um pacto pela educação que nossas lideranças (e manifestantes) poderiam
implementar: que todos os professores, funcionários, diretores de escola e
secretários municipais e estaduais de educação se comprometessem a dar um
ensino de qualidade mesmo aos alunos mais pobres, sem aceitar para eles nada
menos do que desejam para os próprios filhos.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes,
pedagógicas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior de
liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas
educacionais, governamentais, jurídicas,
políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de
modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente
desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado,doutorado e pós-doutorado), como prioridade
absoluta de nossas políticas públicas;
b) o
combate, implacável e sem trégua,
aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de variada
ordem; III – o desperdício, em todas
as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos,
indubitavelmente irreparáveis;
c) a
dívida pública brasileira, com projeção
para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável
desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a
título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta
rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma imediata,
abrangente, qualificada e eficaz auditoria...
Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão
descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a
nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta
a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores
como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos
sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana
(trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às
commodities; assistência social; previdência social; segurança alimentar e
nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil;
logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação); sistema
financeiro nacional; comunicações; esporte, cultura e lazer; turismo; qualidade
(planejamento – estratégico, tático e operacional –, eficiência, eficácia,
efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade);
entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada,
qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que
possa partilhar suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e
potencialidades com todas as
brasileiras e com todos os
brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos
e que contemplam eventos como a 27ª Jornada Mundial da Juventude no Rio de
Janeiro; a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os
projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização,
da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da
inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo
mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com
equidade –, e da fraternidade
universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...
O
BRASIL TEM JEITO!...
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