segunda-feira, 15 de abril de 2013

A CIDADANIA, A BABEL DOS CONSENSOS, A EDUCAÇÃO E A JUVENTUDE


“Babel nos consensos

A exigência inegociável de construir um mundo melhor a partir da força própria dos consensos constitui a natureza da sociedade contemporânea. Compreende-se essa desafio quando se considera, entre os vários aspectos complexos que caracterizam a pós-modernidade, a natural rejeição às tentativas de domínio que trazem como consequência uma redução ao direito de participação cidadã. Forte também é o que caracteriza os ideais democráticos e o respeito às diferenças, particularmente às minorias. Contudo, na contramão dessa busca por entendimentos, o que se verifica, com muita frequência, é uma verdadeira Babel, que nos remete à narrativa do livro do Gênesis.
Não há como fugir da busca pelo consenso, sob pena de produzir totalitarismos, fundamentalismos ou mesmo afastamentos, que geram deserções prejudiciais para instituições e seus funcionamentos. Imprescindível é seguir no exigente caminho do diálogo, exercitando a paciência e nunca desistindo de avançar na construção da convergência em torno de temas, prioridades e assuntos importantes para a vida social, política, cultural e também religiosa. Esse percurso que dá espaço para diferentes opiniões não pode negociar a centralidade da verdade. Só por ela se pode discernir adequadamente e alcançar a meta fundamental do bem e da justiça.
É um enorme desafio buscar a verdade que define rumos, corrige descompassos, dá prioridade ao que, naquele momento histórico e naquele lugar, é melhor e adequado. A verdade não está nunca sob o domínio de um ou de outro. Afinal, como bem ensina a sabedoria popular, “cada cabeça é uma sentença”. A complexidade se apresenta, justamente, em razão do inevitável confronto entre a verdade buscada, a realidade em si e as opiniões. Estas carecem de ser analisadas em suas fundamentações. Aí se encontra um infindável número de tensões e confrontos, que refletem interesses, muitas vezes não pertinentes, estreiteza de mentalidade, além da falta de uma formação cultural e humanística para subsidiar uma participação edificante na configuração do consenso.
É importante considerar que sem a construção de entendimentos, nas diferentes instâncias, modalidades e intensidades, a cultura não avança. Atrasos de todo tipo são perpetuados e os cidadãos não usufruem dos bens e dons da natureza, da história, do seu próprio povo e das dádivas de Deus. Dessa Babel contemporânea surgem os fundamentalismos, de tipos variados, sintomas da perda do equilíbrio, que configuram a mediocridade e incapacidade para garantir o bem, a verdade e a justiça. Não menos grave é a falta de lucidez necessárias aos operadores da união, por tarefa política, cultural ou religiosa. Uma carência fundamentada na falta do imprescindível embasamento humanístico. Trata-se de um problema que compromete o exercício da liderança, com decisões, posturas e escolhas que conduzem a coletividade no caminho oposto ao bem comum.
Diante de todos está esse sério desafio à conjuntura social, com suas importantes questões em pauta, como a reforma política, das instituições todas, incluindo as religiosas. Os consensos indispensáveis na construção da sociedade não podem ser reduzidos a meros processos de negociação partidária ou de interesses cartoriais. Só o compromisso com a verdade, meta a ser sempre buscada, possibilitará um qualificado processo na formação dos entendimentos construídos a partir de escolhas acertadas, rumos bem definidos e a participação indispensável de todos.
Na complexidade dessa questão de formar consensos, como força educativa e definidora de novos rumos, não poderá faltar o exercício de um caminho indicado por Jesus, em sua maestria, a partir de ditos e parábolas: a humildade. O exercício dessa virtude tem efeitos admiráveis sobre nós todos. Aos inteligentes, dá mais luminosidade. Aos governantes, a capacidade para ouvir o povo e, a partir dessa escuta, discernir as prioridades e urgências. Em cada cidadão, eleva o gosto pelo diálogo e um despertar apurado quanto ao compromisso de construir a sociedade justa e solidária. No caminho da humildade indicado pelo mestre Jesus, a Babel de consensos se tornará a sociedade de entendimentos.”
(DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO. Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 12 de abril de 2013, caderno OPINIÃO, página 9).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de 13 de abril de 2013, caderno PENSAR, coluna OLHAR, página 2, de autoria de JOÃO PAULO, que é editor de Cultura, e que merece igualmente integral transcrição:

“Educação na cultura de cassino
         
         As pessoas não gostam de pensar. Dá trabalho. Sobretudo quando a exigência de reflexão parece jogar contra tudo que se convencionou considerar como valor: o sucesso, o dinheiro e o poder. Por isso os pensadores estão em baixa, o estudo deixou de ser um bem, a ideia de preparação apenas um atraso à chegada ao mundo das mercadorias e do prazer imediato e com preço na etiqueta.
         O sociólogo polonês Zygmunt Bauman vem, nas últimas décadas, alertando para esse tipo de cenário, a modernidade líquida (que substituiu a modernidade sólida), e para o tipo de homem funcional nesse contexto. Sua extensa obra é um alerta que, embora fundamentado na melhor ciência social, parte sempre do cotidiano e de experiências presentes na vida de todos: o medo que paralisa e nos entope de ansiedade, a fragilidade dos laços amorosos, transformação do homem em mercadoria pela sanha do consumo, o desprestígio da política, a aceitação da injustiça social como um mero dano colateral da globalização.
         Com 30 livros já lançados no Brasil, Bauman vive na Inglaterra desde 1971 e, a cada estudo, parece operar um poderoso do-in em nossas fragilidades. Com a capacidade de ir ao ponto certo, sua massagem intelectual faz circular energias necessárias para quem ainda se dispõe não apenas  a compreender nossos descaminhos, como a atuar para modificar seu rumo. O que Bauman mostra não é um panorama de depressão e tristeza. Ele sabe que a modernidade líquida, ainda que ansiogênica em sua natureza, se alimenta da cota de prazer que promete em termos de consumo e felicidade imediata. A modernidade líquida não é um descaminho, mas um projeto.
         Por isso, o mais recente livro do sociólogo, Sobre educação e juventude (Editora Zahar), é tão interessante. Dado o diagnóstico, Bauman se preocupa em mostrar o projeto de formação educacional que está por trás de um mundo sem futuro. Mesmo a mais liberal das ideologias sempre via na educação um momento necessário para renovação das elites culturais e políticas. Estava na educação o bastão que se transmitia de uma geração a outra, em termos de valores e conhecimentos fundamentais. Na sociedade líquida, na cultura de cassino, na expressão de George Steiner, esquecer é melhor que lembrar. O consumo é ponto de partida e de chegada.
         Não é um acaso que os jovens, hoje, se sintam desnorteados e raivosos quando percebem que a promessa de um emprego se frustra numa sociedade que não valoriza o conhecimento (há algumas décadas se falava orgulhosamente em sociedade do conhecimento, hoje se defende que devemos ser formados para esquecer o que aprendemos ontem sob o risco da desobediência). Há vários sinais desse desprestígio: a corrida para os concursos (a estabilidade acima do desafio de criar e mudar o mundo), o excesso de relações virtuais, o abuso nas drogas, o comportamento violento, o consumismo. Não é um acaso que os mitos de sucesso de hoje apelem tanto para pessoas que deixaram a escola de lado, como Steve Jobs, Jack Dorsey e David Karp, todos da área de informática: no mundo do sucesso imediato, a educação é um atraso de vida.
         Em Sobre educação e juventude, o sociólogo, em diálogo com o italiano Ricardo Mazzeo, enfrenta os desafios da educação na sociedade contemporânea. Não se trata apenas de uma defesa genérica que costuma ser traduzida em termos de busca de mais recursos, ampliação da jornada, valorização dos professores e primazia do conhecimento, como se todos os males se devessem a um déficit no setor. Na verdade, o projeto de educação para o consumo é funcional e vitorioso, não sinal de uma derrota. Mudar a educação é um passo importante para a transformação da sociedade. Não se pode querer menos que isso.
         Bauman começa lembrando a contribuição do antropólogo Gregory Bateson e sua distinção entre níveis de educação. No primeiro patamar, o mais baixo, há apenas a transferência de informação a ser memorizada. No segundo, se busca a formação de uma estrutura cognitiva que permita, no futuro, que outras informações possam ser absorvidas e incorporadas, criando um patrimônio de saber e habilidades. O terceiro nível se refere à capacidade de desfazer a estrutura anterior, sem deixar no lugar um elemento substituto. O que pode, em momentos muito especiais, ser a abertura para  novos paradigmas (é importante lembrar que quebrar paradigmas é algo mais profundo que mudar de ideia), na maioria das vezes, tem efeito paralisador sobre o conhecimento.
         Na educação contemporânea, o primeiro nível deixou de ser importante, já que a mera informação  foi transferida para a memória das ,máquinas, e o que era potencialmente um câncer se tornou um valor. Hoje, em alguns contextos, esquecer é mais importante que manter viva a memória. A tradução dessa operação, por exemplo, no mundo do trabalho, se dá na desvalorização de carreiras longas, de aprendizagens cumulativas, de patrimônios de experiência plasmados no tempo. Em muitas áreas de prestígio, vale mais ter tido muitos empregos dispersos e até conflitantes do que uma trajetória coerente de construção de um saber e de um saber fazer. A liquidez moderna exige desprendimento, volatilidade, mudança. Como os personagens de Lewis Carol em Alice no País das Maravilhas, é preciso ir rápido para ficar no mesmo lugar e correr duas vezes mais rápido para sair de onde está.

ALIMENTAR ÓDIO A juventude atual vive um cenário de decréscimo de expectativas como não se via há muito tempo. Ter um diploma não é mais garantia de nada. Na geração de seus pais, não havia esforço mais amoroso que investir na educação na educação do filho. Hoje, sobretudo na Europa, a ausência de perspectivas dos jovens, que se veem forçados a aceitar ocupações abaixo de sua formação, domina as consciências infelizes. O resultado, ao lado de uma saudável revolta, contudo, muitas vezes se transforma em ódio geracional (como se a previdência fosse a culpada de tudo) ou mixobia, traduzida em comportamentos racistas e xenófobos, como se os estrangeiros fossem responsáveis pelo desequilíbrio de um capitalismo que não vê fronteiras na hora de expandir e quer criar barreiras no momento da distribuição.
         Os alertas e propostas de Zygmunt Bauman não se voltam para a nostalgia de um passado de ouro. Há novos desafios no mundo. O que suas reflexões sobre a educação parecem trazer são alguns pressupostos que não podem ser deixados de lado quando se pensa, hoje, em soluções amplas para temas sociais e políticos.
         O diagnóstico parece conter em si a terapia: somos herdeiros de uma era de diferenças, as questões globais só são pensáveis no terrenos dos temas locais, a assimilação à cultura dominante não é mais um destino, o capitalismo gera mais problemas do que é capaz de resolver com seus próprios instrumentos, a tecnologia não vai dar conta de nosso impasse ecológico, a conquista dos ideais modernos foi interrompida, o mercado de consumo não vai obturar nossas faltas enquanto indivíduos e cidadãos.
         Sobre educação e juventude é um livro para todos, já que, mesmo não sendo mais jovens, precisamos voltar à humilde disposição para aprender. Somos responsáveis pela mixórdia em que nos metemos. Mas é sempre mais cômodo colocar a culpa nos outros e apostar numa genérica saída “pela educação”. Qual educação? Como afirmou Paulo Freire, “o educador precisa ser educado”. O que era um acicate contra o conservadorismo talvez mereça hoje ser tomado como um tarefa saneadora de nossas arrogâncias e certezas combalidas.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, lúcidas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:
     
     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil  (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;
     
     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis;
     
     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tanta sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); educação; saúde; saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); emprego, trabalho e renda; assistência social; previdência social; agregação de valor às commodities; minas e energia; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; logística; turismo; esporte, cultura e lazer; sistema financeiro nacional; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa das Confederações em junho; a 27ª Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro em julho; a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das empresas, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...

  

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