“A
Terra não é um planeta em que há vida, ela é um organismo vivo
A partir dos anos 70,
ficou claro para grande parte da humanidade científica que a Terra não é apenas
um planeta sobre o qual existe vida. Ela é viva, um superorganismo vivente
denominado pelos andinos de “Pacha Mama” e pelos modernos de “Gaia”, o nome grego
para a Terra viva.
A
espécie humana representa a capacidade de Gaia de ter um pensamento reflexo e
uma consciência sintetizadora e amorosa. Nós, humanos, possibilitamos à Terra
apreciar a sua luxuriante beleza, contemplar sua intrincada complexidade e descobrir
espiritualmente o mistério que a penetra.
O que
os seres humanos são em relação à Terra é a Terra em relação ao cosmos por nós
conhecido. O cosmos não é um objeto sobre o qual descobrimos a vida. O cosmos é
um sujeito vivente que se encontra num processo permanente de gênese.
A
mudança que essa leitura deve produzir nas mentalidades e nas instituições só é
comparável com aquela que se realizou no século XVI aos se comprovar que a
Terra era redonda e girava ao redor do Sol. Especialmente, a verificação de que
as coisas ainda não estão prontas, estão continuamente nascendo, abertas a
novas formas de autorrealização. Consequentemente, a verdade se dá numa
referência aberta, e não num código fechado e estabelecido.
Importa,
antes de mais nada, realizar a reintegração do tempo. Nós não temos a idade que
se conta a partir do dia do nosso nascimento. Nós temos a idade do cosmos.
Começamos a nascer há 13,7 bilhões de anos, quando principiaram a se organizar
todas aquelas energias e materiais que entram na constituição de nosso corpo e
de nossa psiquê. Quando isso madurou, estão nascemos de verdade, sempre abertos
a outros aperfeiçoamentos futuros.
Se
sintetizarmos o relógio cósmico de 13,7 bilhões de anos no espaço de um ano
solar, querendo apenas realçar algumas datas que nos interessam, teríamos o
seguinte quadro:
Em 1º
de janeiro, ocorreu o big-bang. Em 1º de maio, o surgimento da Via Láctea. Em 9
de setembro, a origem do sistema solar. Em 14 de setembro, a formação da Terra.
Em 25 de setembro, a origem da vida. Em 30 de dezembro, o aparecimento dos
primeiros hominídeos. Em 31 de dezembro, irromperam os primeiros homens e
mulheres. Os últimos dez segundos de 31 de dezembro inauguraram a história do Homo sapiens, do qual descendemos
diretamente. O nascimento de Cristo ter-se-ia dado precisamente às 23h59min56s.
O mundo moderno teria surgido no 58º segundo do último minuto do ano. E nós? Na
última fração de segundo antes de completar meia-noite.
Em
outras palavras, somente há 24 horas o universo e a Terra têm consciência
reflexa de si mesmos.
Uma
pedagogia adequada à nova cosmologia nos deveria introduzir nessas dimensões
que nos evocam o sagrado do universo e o milagre de nossa própria existência.
Isso, em todo o processo educativo, da escola primária à universidade.
Em
seguida, faz-se mister reintegrar o espaço dentro do qual nos encontramos.
Vendo a Terra de fora da Terra, descobrimos um elo de uma imensa cadeia de
seres celestes. Pertencemos ao sistema solar, que é um entre bilhões e bilhões
de outras estrelas num planeta pequeno, mas extremamente aquinhoado de fatores
favoráveis à evolução de formas cada vez complexas e conscientizadas de vida: a
Terra.
Reintegrados
no espaço e no tempo, nos sentimos como Pascal: um nada diante do Todo e um
Todo diante do nada. E nossa grandeza reside em saber e celebrar tudo isso.”
(LEONARDO
BOFF. Filósofo e teólogo, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 4 de
abril de 2014, caderno O.PINIÃO, página
20).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 4 de abril
de 2014, caderno OPINIÃO, página 9,
de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE
AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente
integral transcrição:
“Cultura
marcada pela fé
O papa Francisco, na
sua exortação apostólica sobre o anúncio do evangelho no mundo atual, sublinha
o quanto é indispensável e importante a cultura marcada pela fé e a sua
dimensão determinante nos rumos e tradições de grupos humanos pelo mundo afora.
É
incontestável o legado recebido por culturas seculares, em valores humanísticos
e espirituais, em razão do anúncio, aprendizagem a vivência da fé cristã. Um
legado que tem como referência uma fonte inesgotável que é o evangelho de Jesus
Cristo, e ele próprio, Redentor e Salvador.
A
contemporaneidade continua necessitada da oferta preciosa que vem dessa fonte.
Independentemente de todo tipo de crítica, até mesmo merecida, às configurações
morais com excessivos rigores ou anuências tácitas frente às posturas
discriminatórias e prejudiciais, a dinâmica da fé cristã continua
indispensável. É fundamental, especialmente quando se trata da busca do
equilíbrio humanitário na importante tarefa de afastar o mundo do caos moral e
espiritual para o qual caminha, em razão de hegemonias dadas ao dinheiro e às
relativizações éticas e morais.
Sem
aprofundar aqui sobre a importância da fé na cultura, do ponto de vista
histórico-social, ou mesmo na explicitação de sua rica dinâmica interna, faz-se
importante redobrar a atenção quanto ao que lhe é próprio, conferindo às
culturas consistência adequada e equilíbrio das relações sociais e políticas no
interno das sociedades.
A
dinâmica da Igreja no anúncio do evangelho para a vida do mundo precisa avaliar
permanentemente vários aspectos importantes para que sua mensagem não seja
equivocada. Nesse sentido, por exemplo, o papa Francisco adverte quanto ao
risco de um perigoso mundanismo espiritual que pode tomar conta das igrejas e
permear a definição de seus projetos e eventos. Entendendo-se por mundanismo
espiritual – como diz o papa Francisco – a dinâmica que esconde atrás das
aparências de religiosidade, até mesmo de amor à Igreja, a busca da glória
humana e do bem-estar pessoal em vez da glória do Senhor.
Nas
mais ricas e autênticas tradições espirituais do cristianismo, a glória do
Senhor não é senão a vida plena do homem, fazendo do outro destinatário de uma
amor comprometido. Daí nasce o rico corolário que implica a autenticidade da
fé, mais do que a prioridade do bem-estar pessoal, e o compromisso com uma
ordem social justa, resultante da vivência dessa mesma fé cristã. Esse
mundanismo espiritual, portanto, pode produzir misturas nefastas e enganosas
entre o que, de fato, é fé cristã marcando a cultura, e o que, está na
contramão da mais genuína espiritualidade cristã.
A
autenticidade da dinâmica da fé cristã não pode ser comparada a nem mesmo
visitar as linguagens tão conhecidas das produções típicas de autoajuda, com
passagens por outros tipos de crenças como os traços remanescentes da filosofia
da “nova era” – presentes do urbano contemporâneo e envolvidos em um processo
de elaboração de uma nova cultura.
Assim,
a proposta da dinâmica cristã, nesse mesmo contexto, não permite e não se
ajusta ao que sincreticamente é criado para atender aos anseios humanos e com
adaptações cômodas em vista do mero bem-estar pessoal. Um exemplo disso é a
ideia, imposta pela permissividade, que parte do princípio de que toda norma
compromete a autonomia e a liberdade.
Não
menos atenção merece o secularismo que vai reduzindo a fé e até a missão da
Igreja ao âmbito privado e íntimo, fazendo com que sejam vistos com
naturalidade os horrorosos processos de desumanização, resultado das relações
sociais e políticas que se deterioram, por vezes provocando situações
irreversíveis.
Sendo
assim, o anúncio do evangelho não pode ser desvirtuado a ponto de causar
sombras na transcendência enquanto compreensão e dinâmica vivencial que abre o
ser humano à solidariedade, ao sentido de sua oferta. Que qualifica sua
cidadania civil com os princípios de quem vive o Reino de Deus em seu
cotidiano, movido pela certeza de estar a caminho de uma vida que está para
além do tempo e da história.
É hora
de cuidar para que certas influências da cultura globalizada, aquela da
primazia do bem-estar pessoal, da idolatria ao dinheiro e da criação de guetos
para usufruto descomprometido de forças institucionais, não desfigurem o que é
próprio da fé cristã em sua força libertária e transformadora.
O papa
Francisco aponta que a fé cristã, vivida e respeitada, proporciona a descoberta
e a transmissão da mística de vivermos juntos, de nos misturarmos, nos
encontramos, darmos o braço uns aos outros, nos apoiarmos e participarmos desse
maré que, embora caótica, pode transformar-se em verdadeira fraternidade,
caravana solidária, peregrinação sagrada. O ganho será a autenticidade de uma
cultura marcada pela fé.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes,
adequadas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise
de liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas
educacionais, governamentais, jurídicas,
políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de
modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente
desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade
absoluta de nossas políticas públicas;
b) o
combate, implacável e sem trégua,
aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária
ordem; III – o desperdício, em todas
as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos,
inexoravelmente irreparáveis;
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e
intolerável desembolso de cerca de R$ 1
trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos
(apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir igualmente uma
imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...
Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão
descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a
nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta
a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais – (a propósito, a diferença de
renda entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres, no Brasil, é de 50 vezes
maior; enquanto na Nova Zelândia, é de 8 vezes maior) – e de extremas e sempre
crescentes necessidades de ampliação e
modernização de setores como: a gestão
pública; a infraestrutura (rodovias,
ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada,
esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística
reversa); meio ambiente; habitação;
mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda;
agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência
social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança
pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e
desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer;
turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e
operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade,
criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada,
civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e
solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e abundantes riquezas,
oportunidades e potencialidades com todas
as brasileiras e com todos os brasileiros.
Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e
que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do
PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da
globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do
conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um
possível e novo mundo da justiça, da
liberdade, da paz, da igualdade – e com
equidade –, e da fraternidade
universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...
O
BRASIL TEM JEITO!...
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