“O
nascedouro da utopia brasileira
está na cultura de raiz popular
Praticamente todos os
analistas da nação brasileira tinham os olhos voltados para o passado: como se formou
este tipo de sociedade que temos. Foram detalhistas, mas não dirigiam os olhos
para a frente.
Todos
os países que se firmaram projetaram seu sonho maior e, bem ou mal, o
realizaram, às vezes como os países europeus, penalizando pela colonização outros
povos na África, na América Latina e na Ásia. Geralmente, é num contexto de
crise que se elabora a utopia, como forma de encontrar uma saída. Celso
Furtado, que, além de renomado economista, era um agudo observador da cultura,
nos diz em “Brasil: A Construção Interrompida” (1992): “Falta-nos a experiência
de provas cruciais, como as que conheceram outros povos cuja sobrevivência
chegou a estar ameaçada” (p.35). Não nos faltaram situações críticas que seriam
as chances para elaborar nossa utopia. Mas as forças conservadoras e
reacionárias “se empenharam em interromper o nosso processo histórico de
formação de um Estado-nação (p.35) por medo de perder seus privilégios.
E,
assim, ficamos apenas com um Brasil imaginário, gentil, forte, grande, a
província mais ridente do planeta Terra. Mas fomos impedidos de construir um
Brasil real que integrasse minimamente a todos, multicultural, tolerante e até
místico.
Chegou
o momento em que se nos oferece o desafio de construir essa utopia. A partir de
que base assumiremos essa empreitada? Deve ser a partir de algo tipicamente
nosso, que tenha raízes em nossa história e represente outro software social.
Esse patamar básico é nossa cultura, especialmente nossa cultura popular. O que
faz o Brasil ser Brasil é a autonomia criativa da cultura de raiz popular.
A
cultura aqui é vista como um sistema de valor e de projetos de povo. A cultura
se move na lógica dos fins e dos grandes símbolos e relatos que dão sentido à
vida. Ela é perpassada pela razão cordial e contrasta com a lógica fria dos
meios, inerentes à razão instrumental-analítica que visa à acumulação material.
Esta predominou e nos fez apenas imitadores secundários dos países tecnicamente
mais avançados. A cultura seguiu outra lógica, ligada à vida que vale mais que
a acumulação de bens materiais.
Nossa
cultura, admirada no mundo inteiro, nos permite refundar o Brasil, o que
significa “ter a vida como a coisa mais importante do sistema social. É
construir uma organização social que busque e promova a felicidade, a alegria,
a solidariedade, a partilha, a defesa comum, a união na necessidade, o vínculo,
o compromisso com a vida de todos os seus membros, que elimine e impeça a
exclusão de todos os tipos e em todos os níveis” (Luiz Gonzaga de Souza Lima,
em “A Refundação do Brasil: Rumo à Sociedade Biocentrada”, 2011, p.266).
A
solução para o Brasil não se encontra na economia como o sistema dominante nos
quer fazer crer, mas na vivência de seu modo de ser aberto, afetuoso, alegre,
amigo da vida. A razão instrumental básica ajudou a criar uma infraestrutura
básica sempre indispensável. Mas o principal foi colocar as bases para uma
biocivilização que celebra a vida, que convive com a pluralidade das
manifestações, dotada de incrível capacidade de integrar, de sintetizar e de
criar espaços onde nos sentimos mais humanos.
Pela
cultura, não feita para o mercado, mas para ser vivida e celebrada, poderemos
antecipar, pelo menos um pouco, o que poderá ser uma humanidade globalizada que
sente a Terra como grande Mãe e Casa Comum. O sonho maior, nossa utopia, é a
comensalidade: sentarmo-nos junto à mesa e desfrutarmos a alegria de conviver
amigavelmente e de saborear os bons frutos da grande e generosa Mãe Terra.”.
(LEONARDO
BOFF. Teólogo, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 13 de maio de 2016, caderno O.PINIÃO, página 28).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 18 de maio
de 2016, caderno OPINIÃO, página 7,
de autoria de DENISE HILLS,
Superintendente de Sustentabilidade do Itaú Unibanco, e que merece igualmente
integral transcrição:
“Além
da ponta do iceberg
Está no discurso de
celebridades, é tema de uma encíclica do papa e também de jornais e conversas
das famílias no almoço de domingo. A preocupação com as mudanças climáticas e
seus efeitos, incluindo os impactos na economia mundial, é um assunto que, bem
ou mal, interessa a todos. Tratado ainda como algo que nos afeta no futuro,
distante do dia-a-dia das pessoas, o aquecimento global e seus consequências
estão muito mais próximos das nossas vidas e das empresas do que se pode
imaginar. As pessoas o relacionam com a chuva de hoje, o calor, ou até mesmo
com o preço da comida.
As
mudanças climáticas e seus reflexos, no entanto, vão além da previsão do tempo
ou do peso dos alimentos na inflação. São a pedra no sapato do mundo. Por isso
o novo acordo do clima, fechado na COP 21 em Paris no fim do ano passado, foi
tão comemorado. Visto como ponto de partida para a construção de uma economia
de baixo carbono, mais limpa e, portanto, com menos impacto no meio ambiente,
ele começou a tomar forma no final deste mês, quando foi aberto para
assinaturas por parte dos países-membros da Convenção da ONU sobre Mudança do
Clima, em Nova York.
Além
de estabelecer que o aumento da temperatura média do planeta fique abaixo dos
2ºC, o Acordo de Paris inclui a participação ativa do setor empresarial, o
financiamento para implementação dos termos da transição, e os caminhos para
atingir uma economia de baixo carbono por meio de novas tecnologias, energias
renováveis e restauração florestal, por exemplo. E é hora de trabalhar na
implementação do documento. O senso de urgência levou para mesa em Paris as
lideranças de diversos setores da sociedade, empresas e governo.
Então,
a transformação vai acontecer através de ações do poder público e da indústria,
especialmente as com mais altos níveis de emissões de carbono? Claro que não.
Nada é simples nesta conversa. Essa é a ponta do iceberg, o primeiro passo da
jornada. A responsabilidade é de todos e de cada um. Dos chamados mecanismos de
transição e financiamento, a discussão que vai contribuir para que os objetivos
pensados na COP 21 se viabilizem está na agenda de todos os bancos.
Mas, o
que aquecimento global tem a ver com instituições financeiras?
Pense
por um minuto em um seguro para uma casa, em um lugar onde os índices de chuva
têm mudado drasticamente nos últimos anos. Ou mesmo no quanto essas questões
podem mudar daqui para frente e o quanto essas mudanças são prolongadas.
O
desafio é incorporar as questões socioambientais nos modelos de crédito,
investimentos e na precificação correta dos ativos, considerando sempre os
impactos socioambientais positivos e negativos, e com isso, avaliar de forma
responsável e real o valor e a capacidade de retorno do capital ao investidor.
Muitas vezes, esse investimento pode ser um fundo de pensão, o seu fundo de
pensão, por exemplo. Por isso é que muitos investimentos desse tipo seguem os
Princípios de Investimentos Responsáveis, e muitos Assets também. Isso dá uma
ideia mais clara de como esse tema afeta todos de forma diferente, mas
compartilhada.
Um dos
principais desafios agora é pautar as decisões de médio e longo prazos. O
acordo é uma espécie de manual de referência e novas diretrizes para a economia
mundial. Sua contribuição é extremamente valiosa para a mobilização e
direcionamento dos esforços rumo a um padrão de desenvolvimento que não comprometa
a nossa viabilidade como espécie no planeta. E isso, claro, envolve governos,
empresas, bancos, toda a sociedade.
É
provavelmente por isso que você também está lendo este artigo até agora. E é
por isso que estamos celebrando o 22 de abril, dia em que o acordo assinado na
COP 21 passou a tomar uma forma legal. É mais assunto para o almoço de domingo,
mais expectativa, mais compromisso, mais gente trabalhando. Trata-se de um
passo histórico na busca de uma economia de baixo carbono. E as instituições financeiras
serão parte nessa transição, na medida em que traduzem esta influência na
economia e nos diversos setores da sociedade. Sabemos que o caminho é longo,
mas a assinatura do documento produzido em Paris representa a materialização do
compromisso de diferentes atores na construção de uma nova realidade para o
mundo.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e
oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança
de nossa história – que é de ética, de
moral, de princípios, de valores –, para
a imperiosa e urgente necessidade de profundas
mudanças em nossas estruturas educacionais,
governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas,
financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no
concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e
sustentavelmente desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras
cruciais como:
a)
a educação
– universal e de qualidade –, desde a educação
infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em
pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas
crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –,
até a pós-graduação (especialização,
mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade
absoluta de nossas políticas públicas (enfim, 125 anos depois, a República
proclama o que esperamos seja verdadeiramente o início de uma revolução
educacional, mobilizando de maneira incondicional todas as forças vivas do
país, para a realização da nova pátria; a pátria da educação, da ética, da
justiça, da civilidade, da democracia, da participação, da
sustentabilidade...);
b)
o combate
implacável, sem eufemismos e sem tréguas, aos três dos nossos maiores e
mais devastadores inimigos que são: I – a inflação,
a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se
em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo dados do Banco
Central, a taxa de juros do cartão de crédito atingiu em abril a ainda
estratosférica marca de 435,6% para um período de doze meses; e mais ainda em
abril, o IPCA acumulado nos doze meses chegou a 9,28%, com os juros do cheque
especial de março em históricos 300,8%...); II – a corrupção, há séculos, na mais perversa promiscuidade –
“dinheiro público versus interesses privados” –, como um câncer a se
espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos
e comprometimentos de vária ordem (a propósito, a lúcida observação do
procurador chefe da força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol: “A
Lava Jato ela trata hoje de um tumor, de um caso específico de corrupção, mas o
problema é que o sistema é cancerígeno...” – e que vem mostrando também o seu
caráter transnacional; eis, portanto,
que todos os valores que vão sendo apresentados aos borbotões, são apenas
simbólicos, pois em nossos 515 anos já se formou um verdadeiro oceano de
suborno, propina, fraudes, desvios, malversação, saque, rapina e dilapidação do
nosso patrimônio... Então, a corrupção mata, e, assim, é crime...); III – o desperdício, em todas as suas
modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente
irreparáveis (por exemplo, segundo Lucas Massari, no artigo ‘O Desperdício na
Logística Brasileira’, a “... Desconfiança das
empresas e das famílias é grande. Todos os anos, cerca de R$ 1 trilhão, é
desperdiçado no Brasil. Quase nada está imune à perda. Uma lista sem fim de
problemas tem levado esses recursos e muito mais. De cada R$ 100 produzidos,
quase R$ 25 somem em meio à ineficiência do Estado e do setor privado, a falhas
de logística e de infraestrutura, ao excesso de burocracia, ao descaso, à
corrupção e à falta de planejamento...”;
c)
a dívida
pública brasileira - (interna e externa; federal, estadual, distrital e
municipal) –, com projeção para 2016, apenas segundo a proposta do
Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1,348 trilhão, a título de juros,
encargos, amortização e refinanciamentos (ao menos com esta rubrica, previsão
de R$ 1,044 trilhão), a exigir
alguns fundamentos da sabedoria grega:
- pagar,
sim, até o último centavo;
-
rigorosamente, não pagar com o pão do povo;
-
realizar uma IMEDIATA, abrangente,
qualificada, independente e eficaz auditoria...
(ver também www.auditoriacidada.org.br)
(e ainda
a propósito, no artigo Melancolia,
Vinicius Torres Freire, diz: “... Não será possível conter a presente
degradação econômica sem pelo menos, mínimo do mínimo, controle da ruína das
contas do governo: o aumento sem limite da dívida pública...”);
Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta
de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já
combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de
poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições,
negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à
pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas
e sempre crescentes necessidades de ampliação
e modernização de setores como: a gestão
pública; a infraestrutura (rodovias,
ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada,
esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística
reversa); meio ambiente; habitação;
mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda;
agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência
social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança
pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e
desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer;
turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e
operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade
– “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade,
competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira
alguma, abatem o nosso ânimo e nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada,
civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que
possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e
potencialidades com todas as
brasileiras e com todos os
brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários
previstos e que contemplam eventos como a
Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das
exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das
organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas
tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a
nossa esperança... e perseverança!
“VI,
OUVI E VIVI: O BRASIL TEM JEITO!”
- 55
anos de testemunho de um servidor público (1961 – 2016)...
-
Estamos nos descobrindo através da Cidadania e Qualidade...
-
ANTICORRUPÇÃO: Prevenir e vencer, usando nossas defesas democráticas...
- Por
uma Nova Política Brasileira...