“Embargos
infringentes
O novo Código Civil
emendado está quase pronto. Resta votar destaques. Três deles merecem
comentários. Primeiro, a suspensão dos prazos processuais no final do ano e
início do entrante, garantindo sossego e descanso aos advogados. Segundo, a
equiparação da fiança securitária e do seguro garantia judicial a dinheiro de
contado. Essa medida, de largo alcance, sofistica o mercado de seguros,
diminuindo os prêmios de risco e, além disso, livra o caixa das empresas da
espoliação absurda que a penhora on-line vinha fazendo nos seus recursos
financeiros nos processos de execução patrocinados pelos fiscos federal,
estaduais e municipais.
O
Convênio Bacen-Jud proporciona aos juízes, a pedido da Fazenda exequente,
invadir contas bancárias particulares e confiscar os recursos depositados para
deixá-los “penhorados”, com o agravante de os governos passarem a mão
imediatamente nos recursos, a custo zero (“funding”), enquanto os processos
judiciais se delongam anos a fio. Com a fiança e o seguro valendo dinheiro
vivo, o Código de Processo Civil dá por garantido o juízo, condição
indispensável para os contribuintes embargarem a execução, oferecendo
resistência às pretensões fazendárias, frequentemente ilegais e descabidas, sem
sacrificar seu capital de giro ou recorrer a empréstimos par poder ligitar com
o príncipe (o Estado), dotado de todos os privilégios.
Vem em
boa hora a decisão da Câmara dos Deputados. O Banco Central tem agora o HAL,
(sistema sofisticado de supercomputadores) que segue, em tempo real, milhões de
transações bancárias, sem similar no mundo, exceto na Alemanha, numa supervisão
total dos depósitos e do sistema de pagamentos brasileiro. Esses dados são
repassados ao judiciário e à Receita Federal. Feito um depósito ou
transferência, em 20 minutos fica-se sabendo, para as providências cabíveis e
incabíveis.
Finalmente,
pretende-se substituir os embargos infringentes nas decisões dos tribunais “por
maioria” por um novo julgamento, com outros magistrados. Isso é um disparate. O
nossos sistema recursal é bom, cumpre apenas evitar os abusos. Vamos lá. É
garantia do cidadão que a decisão de um juiz seja revista (apelação) por três
sobrejuízes, ao menos, num tribunal (2º grau) que reexaminará os fatos, as
provas, o direito e as razões de decidir do juiz monocrático, confirmando ou
reformando a sentença. Afora as decisões interlocutórias a desafiarem agravo (a
que não aceita seguro judicial, v.g., como sucedâneo do dinheiro vivo), há
necessariamente embargos declaratórios de decisões de mérito, seja de juiz
singular ou juízo colegiado (turma, câmara, seção ou plenário) para esclarecer,
ou mesmo refazer (nesse caso, com efeitos infringentes do julgado) obscuridade,
omissão, contradição ou ofensa ao
direito (pré-questionamento). Trata-se de economia processual. Os juízes, menos
na apelação, podem se retratar, evitando recursos.
Ao meu
sentir – não sou processualista – os infringentes, propriamente ditos, somente
deviam ser cabíveis de um órgão tribunalício fracionário para o tribunal pleno
ou composição quase-plena (câmaras cíveis reunidas, v.g.). Noutras palavras,
quando uma turma, câmara ou sessão decidem de modo contrário de outra ou contra
a jurisprudência mansa e pacífica dos tribunais, caberiam os embargos
infringentes ou de uniformização da jurisprudência, a bem da segurança
jurídica. Aqueles embargos arcaicos do regimento do Supremo são excrescentes,
não se justificam. (Os mesmos juízes vencidos e vencedores votam de novo o que
já votaram, sem falar do expediente da substituição, que é absurdo, pois não
foram os substitutos os juízes naturais do processo.)
Pois
bem, é isso que se quer agora ampliar. É barafunda processual, especialmente no
Superior Tribunal de Justiça, onde, todo semestre, ministros são mudados. Para
o governo é uma “mão na roda” mudar a composição dos tribunais superiores, à
deriva do bom direito, complicando em causa própria o sistema recursal. O mesmo
se daria nos tribunais de Justiça estaduais relativamente aos governadores.
Essa não! Seria retrocesso inadmissível. Basta investigar a origem do destaque.
Encontraríamos a mão do príncipe.
A
separação dos poderes implica independência política, formal e material dos juízes relativamente ao
Executivo.
Contra
a morosidade – mazela irritante – e desnecessário violentar o sistema recursal,
bastando aperfeiçoá-lo. Necessário, isso sim, é evitar que as Pessoas Jurídicas
de Direito Público (União, estados, municípios, suas autarquias e fundações)
recorram ao Judiciário por direitos que não têm ou deveres que descumprem, além
de recorrer mesmo contra a jurisprudência assente. O Executivo, no Brasil,
legisla em lugar do Parlamento e usa o Judiciário para não cumprir seus
deveres. Um desastre institucional.”
(SACHA
CALMON. Advogado, coordenador da especialização em direito tributário das
Faculdades Milton Campos, ex-professor da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG), presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF) no Rio
de Janeiro, em artigo publicado no jornal ESTADO
DE MINAS, edição de 26 de janeiro de 2014, caderno OPINIÃO, página 7).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de
24 de janeiro de 2014, caderno OPINIÃO, página
9, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE
AZEVEDO, que é arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece
igualmente integral transcrição:
“Fraternidade
e pobreza
A solidariedade cristã
é pauta pela convicção de que a fraternidade é premissa para vencer a pobreza,
como lembra o papa Francisco na sua primeira mensagem dedicada ao Dia Mundial
da Paz. O papa recorda seu predecessor Bento XVI, que, na Carta Encíclica Caritas in Veritate, apresentou a falta
de fraternidade – entre pessoas e nações – como uma das principais causas da
pobreza. Trata-se de uma deficiência que inviabiliza a urgente superação da
miséria, que castiga considerável parcela da humanidade.
Gestores
e executivos, de instituições governamentais e privadas, precisam reconhecer e
viver mais o princípio da fraternidade.
Sem essa vivência, correm o risco de se aprisionarem no território do que é
cartorial e, assim, tornam-se incapazes de contribuir para as mudanças rápidas
e urgentes do atual cenário, que faz crescer a brecha entre ricos e pobres.
Bastaria que cada cidadão levasse a sério a indicação secular de São Vicente de
Paulo. O santo afirma que, quando alguém vê um irmão na miséria, deveria
sentir-se envergonhado. Mas, como diz o papa Francisco, na Exortação Apostólica
Evangelii Gaudium, a globalização da
indiferença é um sério problema a ser enfrentado. Esta insensibilidade
tranquiliza as consciências e entorpece cidadanias. Desse modo, incapacita
pessoas para o exercício do altruísmo. A indiferença impede a superação da
pobreza, que pesa sobre os ombros de tantos e é um vergonha social.
A
falta de fraternidade que perpetua situações lastimáveis de miséria tem também
como causa a pobreza relacional, nos contextos familiar e comunitário. Sem o
sentido da fraternidade não se avançará adequadamente para se alcançar metas
que mudem os quadros. Por isso mesmo, é tão comum ancorar-se em justificativas,
contabilizando o que já se fez em detrimento das urgências e necessidades. Aí
está um fruto indigesto do modo como se faz política na sociedade brasileira,
dando mais importância e força ao partidário e seus “conchavos” do que à
meritocracia.
A
pobreza origina-se da carência de um sentido humanístico e compreensão ética
adequada da dignidade de cada pessoa humana, fazendo surgir situações extremas
de riqueza e desperdício de um lado e, do outro, a miséria de muitos, com o
peso da fome, da enfermidade e da exclusão social. As desigualdades sociais
crescentes em uma determinada região e contexto cultural precisam incomodar
mais a consciência cidadã. Assim é possível avançar na busca de soluções e de
respostas, em diferentes níveis e condições. Nessa perspectiva está, portanto,
um horizonte lúcido para se fazer política. Isso significa um empenho mais
efetivo para garantir a todas as pessoas, iguais na sua dignidade e nos seus
direitos fundamentais, o acesso aos serviços, especialmente aos recursos
educativos e de saúde, possibilitando a cada pessoa a construção de seu projeto
de vida.
O papa
Francisco, na mensagem para o Dia Mundial da Paz, relembra um importante
ensinamento da Igreja, sobre a hipoteca social. Como diz Santo Tomás de Aquino,
é lícito e até necessário que a pessoa tenha propriedade dos bens. Porém,
quanto ao uso, “não deve considerar as coisas exteriores que legitimamente
possui só como próprias, mas também como comuns, no sentido de que possam
beneficiar não só a si, mas também aos outros”. Se assumido como princípio
ético, esse ensinamento permitirá à cidadania dar um salto de qualidade e
produzirá, sem dúvida, uma grande transformação. A globalização da indiferença
é responsável por desvios morais que fazem da economia o território da
idolatria ao dinheiro. Daí nasce uma séria crise antropológica, ao se negar a
primazia de cada pessoa, substituindo-a por outros interesses e lógicas. A
perversidade se revela no crescimento que privilegia poucos e castiga muitos,
fruto de uma ideologia que defende a absoluta autonomia de mercados e a
especulação financeira.
O papa
Francisco, exemplar e coerente, indica um passo primeiro, determinante, com
força para fazer a diferença na busca da fraternidade, antídoto para vencer a
pobreza. Ele fala do desapego vivido por quem escolhe estilos de vida sóbrios e
essenciais, partilhando as suas riquezas,
conseguindo, assim, experimentar a comunhão fraterna com os outros. Não será
outro senão esse o primeiro compromisso cristão, de quem quer autenticamente
seguir Jesus Cristo. É desafiador, gera dúvidas, mas trata-sede um caminho
certo para cultivar a fraternidade, eficaz na superação da pobreza. O ponto de
partida dessa revolução é a convicção firme de que o relacionamento fraterno
com o próximo é o bem mais precioso.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, graves
e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de
liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas transformações em nossas
estruturas educacionais, governamentais,
jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais,
de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade –, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade
absoluta de nossas políticas públicas;
b) o
combate, implacável e sem trégua,
aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de variada
ordem; III – o desperdício, em todas
as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos,
inexoravelmente irreparáveis;
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e
intolerável desembolso de cerca de R$ 1
trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos
(apenas com esta rubrica, previsão de R$ 639 bilhões), a exigir
igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...
Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão
descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a
nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta
a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores
como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); a educação;
a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos
sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana
(transporte, trânsito, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às
commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência
social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas;
polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência,
tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações;
qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência,
eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade,
competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada,
qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que
possa partilhar suas extraordinárias riquezas, oportunidades e potencialidades
com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no
horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como
a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal,
à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da
internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da
inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo
mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com
equidade –, e da fraternidade
universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...
O
BRASIL TEM JEITO!...
Nenhum comentário:
Postar um comentário