“Contas
de chegar e de sair
Não é de hoje que o
Brasil vive o dilema de administrar duas contas: a de chegar e a de sair. A
primeira abriga repertório, programas e atos que impulsionam o país, garantindo
uma escalada crescente na esfera das nações, o que lhe confere respeito,
credibilidade para levar a cabo metas e aspirações.
A
segunda reúne o acervo de demandas e carências, erros, falhas e ausências do
Estado no exercício de suas funções constitucionais, que mancham a imagem do
país na paisagem internacional e, por consequência, o impedem de ostentar a
marca de grandeza. Exemplo, os recentes episódios no presídio de Pedrinhas, no
Maranhão. Uma vergonha.
Afinal,
a maior ambição brasileira na esfera da política internacional não é ter
assento permanente no Conselho de Segurança da ONU? Mesmo que reunisse
condições para tal, é irrefutável que uma nação democrática precisa demonstrar
compromisso com sólida política de segurança interna. Não é o nosso caso.
Um
território inseguro, assolado pela violência, estaria confortável numa cadeira
do órgão que define diretrizes para a segurança mundial?
Somos
uma potência emergente, com elevado papel nos fóruns de decisão política e econômica
graças ao desenvolvimento obtido nas últimas décadas. O Brasil encontrou o fio
da meada, pagou a dívida ao FMI, exerce papel de liderança entre os países da
América do Sul, tem razoável influência na América Central e ajuda países da
África.
Nossa
democracia dá sinais de vitalidade. A população anima-se na trilha da
mobilização.
Nosso
sistema de consumo se expande sob o empuxo de políticas de redistribuição de
renda. Dispomos de moderna estrutura de produção. O país conquistou, mais recentemente,
o comando da Organização Mundial do Comércio, tem a China como principal
parceiro comercial, sinaliza expansão na política multilateral e vontade de
fortalecer vínculos com os Estados Unidos e a Europa.
Essa é
a base da conta de chegar para disputar espaços de mando e influência na
textura das nações.
O que
falta, agora, é estreitar a conta de sair, ou seja, atenuar as tintas que
enfeiam a paisagem dos nossos campos e cidades, a começar por declives e
despenhadeiros nos vãos da segurança pública. O país tem afundado nesse
lamaçal.
As
projeções são sombrias. Frágeis índices de escolaridade, desigualdade, tortura
em delegacias e centros de detenção, quadros policiais muito violentos,
execuções extrajudiciais, superlotação das prisões, impunidade, salários
vergonhosos de policiais, pobreza, ausência de espaços de lazer, falta de
treinamento, desaparelhamento de estruturas arrematam a descosturada malha da
segurança e elevam às alturas os índices de violência.
O
corpo das águas destoantes transborda. Os direitos humanos são hasteados nos
mastros da cidadania, mas o vento das ruas rasga os discursos. Ora, o velho
barão de Montesquieu já lidava com esse mote, dizendo: “Quando vou a um país,
não examino se há boas leis, mas se são executadas as que há, pois há boas leis
por toda parte.”
(Gaudêncio
Torquato. Jornalista e professor (USP), em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 29 de
janeiro de 2014, caderno O.PINIÃO, página
21).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 27 de
janeiro de 2014, caderno OPINIÃO, página
9, de RONALDO GUSMÃO, que é
presidente do Ietec, e que merece igualmente integral transcrição:
“Educação
e inovação
No último Programa
Internacional de Avaliação de Aluno (Pisa), realizado pela Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que mede a capacidade de leitura
e aprendizado de matemática e ciências dos estudantes de 15 anos em 65 países,
o Brasil ocupou a vergonhosa 55ª posição em leitura, 59º em ciências e 58º em
matemática.
Dos 18
mil alunos brasileiros que fizeram o exame, 67,1% estão abaixo do nível de
aprendizagem considerado bom ou adequado em matemática, e somente 1,1% estão
num nível elevado. Enquanto na média geral dos alunos examinados da OCDE,
somente 23,1% estão abaixo do nível e 12,6º estão num nível elevado. Em
leitura, somente 0,5% dos estudantes brasileiros estão num nível elevado. Em
ciências – ah, para que mesmo serve a ciência hoje em dia? –, somente 0,3% dos
nossos alunos estão num nível elevado. Como faremos inovação com esse nível de
conhecimento?
Segundo
a OCDE, no ritmo atual de desempenho levaremos 25 anos para alcançar as médias
dos alunos dos países pesquisados. Isso, levando-se em consideração que os
outros países ficarão com as médias estacionadas, algo improvável, o que indica
que esse número deverá ser ainda maior.
E
mais, a média de pontos em matemática dos estudantes examinados foi de 494,
enquanto a dos brasileiros foi de 391 pontos, com uma taxa de crescimento anual
de 4,1 pontos nos últimos 12 anos. Em ciências, a média dos examinados foi de
50l pontos e a dos brasileiros foi de 405, com taxa de crescimento anual de 2,3
pontos. Portanto, levaremos 41 anos para alcançar a média da OCDE. E fica ainda
pior quando comparamos ao nível de leitura: serão 71 anos para alcançar a mesma
média. É de perder o fôlego!
A
classe média brasileira, há muito tempo, não está conformada com a qualidade do
ensino público fundamental. Prova disso é que 41% estão com seus filhos em
escolas particulares. Mas, agora que descobriram que esse ensino não é lá essas
maravilhas, irão reagir?
Uma
outra pesquisa, “indicadores de desenvolvimento sustentável-2012” (PNAD 2011),
realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mediu a
taxa de escolaridade do brasileiro, que representa a média de anos de estudo da
população com idade a partir de 10 anos. A média nacional foi de 7,3 anos de
estudo, com crescimento de somente 1,8 anos nos últimos 16 anos. Nesse ritmo,
levaremos 50 anos para alcançar a taxa de escolaridade dos países mais
avançados: a média dos Estados Unidos é de 12,4 anos; Alemanha tem 12,2; Coreia
do Sul tem 11,6; e Japão tem 11,5 anos. No Brasil, somente 24,5% da população
com mais de 25 anos tem 11 anos ou mais de estudo.
O
Brasil ainda tem 8,7% da população de analfabetos absolutos, sem falar dos
funcionais, que têm capacidade mínima de leitura e escrita. Mas, o mais
importante não é o valor percentual, e sim o valor absoluto: são 12,9 milhões
de pessoas nessa situação, segundo a mesma pesquisa.
Antes
de ser um problema econômico, como é tratado por grande parte do poder público,
essa é uma questão de justiça social, de ética e moral de toda a sociedade
brasileira, representada pelos inúmeros governos ditatoriais e democráticos das
últimas décadas. Temos que trocar a taxa de retorno econômico pela inclusão
social. Aliás, não devemos nem usar taxa de inclusão, pois temos que tratar as
pessoas individualmente, e não como número dentro de uma estatística.
Traçando
uma relação com outra pesquisa realizada também pelo IBGE, vemos que a falta de
pessoal qualificado para 72,5% das empresas pesquisadas é um gargalo para o avanço
da inovação. A pesquisa de inovação tecnológica (Pintec), realizada pelo IBGE e
divulgada no final de 2012, mostrou que entre as 128,68 mil empresas
pesquisadas, 45,9 mil implementaram um produto e/ou processo novo entre 2009 e
2011, ou seja, 35,6% das empresas pesquisadas haviam sido inovadoras. O que
chama a atenção é o segmento de serviços de engenharia e arquitetura, em que
somente 29,6% foram inovadoras. Como alcançar o desenvolvimento dessa forma?
As
45,9 mil empresas inovadoras empregavam 103,3 mil pessoas nas atividades
internas de pesquisa e desenvolvimento, isto é, 2,24 profissionais por empresa,
quantidade muito pequena. E somente 11 mil profissionais era pós-graduados.
O
mundo está a cada dia mais complexo, exige pessoas mais instruídas, com
capacidade de adquirir informações por conta própria, que saibam fazer suas
escolhas e cobrar resultados, comprometimento e decência. Como um país pode ser
próspero sem ser inovador? Como ser
inovador sem ter uma população educada, com seus alunos com proficiência em
leitura, matemática e ciências? A educação é a base para o desenvolvimento
humano e econômico de qualquer nação.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes,
incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise
de liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas
educacionais, governamentais, jurídicas,
políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de
modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente
desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação
universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de
idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos
nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –,
até a pós-graduação (especialização,
mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas
políticas públicas;
b) o
combate, implacável e sem trégua,
aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária
ordem; III – o desperdício, também a
ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2014, segundo o Orçamento
Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros,
encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de
R$ 639 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente e qualificada auditoria...
Isto posto, torna-se absoluta inútil lamentarmos a falta
de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já
combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de
poupança e, mais contundente ainda, afeta
a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores
como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); a educação;
a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos
sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana
(trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor à
commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência
social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas;
polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência,
tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações;
qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –,
transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade,
produtividade, competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada,
qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que
permita a partilha de suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades
e potencialidades com todas as
brasileiras e com todos os
brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos
e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do
PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da
globalização, da internacionalização das empresas, da informação, do
conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um
possível e novo mundo da justiça, da
liberdade, da paz, da igualdade – e com
equidade –, e da fraternidade
universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...
O
BRASIL TEM JEITO!...
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