sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

A CIDADANIA, O LAMAÇAL DA SEGURANÇA PÚBLICA E OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO E DA INOVAÇÃO

“Contas de chegar e de sair
        
         Não é de hoje que o Brasil vive o dilema de administrar duas contas: a de chegar e a de sair. A primeira abriga repertório, programas e atos que impulsionam o país, garantindo uma escalada crescente na esfera das nações, o que lhe confere respeito, credibilidade para levar a cabo metas e aspirações.
         A segunda reúne o acervo de demandas e carências, erros, falhas e ausências do Estado no exercício de suas funções constitucionais, que mancham a imagem do país na paisagem internacional e, por consequência, o impedem de ostentar a marca de grandeza. Exemplo, os recentes episódios no presídio de Pedrinhas, no Maranhão. Uma vergonha.
         Afinal, a maior ambição brasileira na esfera da política internacional não é ter assento permanente no Conselho de Segurança da ONU? Mesmo que reunisse condições para tal, é irrefutável que uma nação democrática precisa demonstrar compromisso com sólida política de segurança interna. Não é o nosso caso.
         Um território inseguro, assolado pela violência, estaria confortável numa cadeira do órgão que define diretrizes para a segurança mundial?
         Somos uma potência emergente, com elevado papel nos fóruns de decisão política e econômica graças ao desenvolvimento obtido nas últimas décadas. O Brasil encontrou o fio da meada, pagou a dívida ao FMI, exerce papel de liderança entre os países da América do Sul, tem razoável influência na América Central e ajuda países da África.
         Nossa democracia dá sinais de vitalidade. A população anima-se na trilha da mobilização.
         Nosso sistema de consumo se expande sob o empuxo de políticas de redistribuição de renda. Dispomos de moderna estrutura de produção. O país conquistou, mais recentemente, o comando da Organização Mundial do Comércio, tem a China como principal parceiro comercial, sinaliza expansão na política multilateral e vontade de fortalecer vínculos com os Estados Unidos e a Europa.
         Essa é a base da conta de chegar para disputar espaços de mando e influência na textura das nações.
         O que falta, agora, é estreitar a conta de sair, ou seja, atenuar as tintas que enfeiam a paisagem dos nossos campos e cidades, a começar por declives e despenhadeiros nos vãos da segurança pública. O país tem afundado nesse lamaçal.
         As projeções são sombrias. Frágeis índices de escolaridade, desigualdade, tortura em delegacias e centros de detenção, quadros policiais muito violentos, execuções extrajudiciais, superlotação das prisões, impunidade, salários vergonhosos de policiais, pobreza, ausência de espaços de lazer, falta de treinamento, desaparelhamento de estruturas arrematam a descosturada malha da segurança e elevam às alturas os índices de violência.
         O corpo das águas destoantes transborda. Os direitos humanos são hasteados nos mastros da cidadania, mas o vento das ruas rasga os discursos. Ora, o velho barão de Montesquieu já lidava com esse mote, dizendo: “Quando vou a um país, não examino se há boas leis, mas se são executadas as que há, pois há boas leis por toda parte.”

(Gaudêncio Torquato. Jornalista e professor (USP), em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 29 de janeiro de 2014, caderno O.PINIÃO, página 21).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 27 de janeiro de 2014, caderno OPINIÃO, página 9, de RONALDO GUSMÃO, que é presidente do Ietec, e que merece igualmente integral transcrição:

“Educação e inovação
        
         No último Programa Internacional de Avaliação de Aluno (Pisa), realizado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que mede a capacidade de leitura e aprendizado de matemática e ciências dos estudantes de 15 anos em 65 países, o Brasil ocupou a vergonhosa 55ª posição em leitura, 59º em ciências e 58º em matemática.
         Dos 18 mil alunos brasileiros que fizeram o exame, 67,1% estão abaixo do nível de aprendizagem considerado bom ou adequado em matemática, e somente 1,1% estão num nível elevado. Enquanto na média geral dos alunos examinados da OCDE, somente 23,1% estão abaixo do nível e 12,6º estão num nível elevado. Em leitura, somente 0,5% dos estudantes brasileiros estão num nível elevado. Em ciências – ah, para que mesmo serve a ciência hoje em dia? –, somente 0,3% dos nossos alunos estão num nível elevado. Como faremos inovação com esse nível de conhecimento?
         Segundo a OCDE, no ritmo atual de desempenho levaremos 25 anos para alcançar as médias dos alunos dos países pesquisados. Isso, levando-se em consideração que os outros países ficarão com as médias estacionadas, algo improvável, o que indica que esse número deverá ser ainda maior.
         E mais, a média de pontos em matemática dos estudantes examinados foi de 494, enquanto a dos brasileiros foi de 391 pontos, com uma taxa de crescimento anual de 4,1 pontos nos últimos 12 anos. Em ciências, a média dos examinados foi de 50l pontos e a dos brasileiros foi de 405, com taxa de crescimento anual de 2,3 pontos. Portanto, levaremos 41 anos para alcançar a média da OCDE. E fica ainda pior quando comparamos ao nível de leitura: serão 71 anos para alcançar a mesma média. É de perder o fôlego!
         A classe média brasileira, há muito tempo, não está conformada com a qualidade do ensino público fundamental. Prova disso é que 41% estão com seus filhos em escolas particulares. Mas, agora que descobriram que esse ensino não é lá essas maravilhas, irão reagir?
         Uma outra pesquisa, “indicadores de desenvolvimento sustentável-2012” (PNAD 2011), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mediu a taxa de escolaridade do brasileiro, que representa a média de anos de estudo da população com idade a partir de 10 anos. A média nacional foi de 7,3 anos de estudo, com crescimento de somente 1,8 anos nos últimos 16 anos. Nesse ritmo, levaremos 50 anos para alcançar a taxa de escolaridade dos países mais avançados: a média dos Estados Unidos é de 12,4 anos; Alemanha tem 12,2; Coreia do Sul tem 11,6; e Japão tem 11,5 anos. No Brasil, somente 24,5% da população com mais de 25 anos tem 11 anos ou mais de estudo.
         O Brasil ainda tem 8,7% da população de analfabetos absolutos, sem falar dos funcionais, que têm capacidade mínima de leitura e escrita. Mas, o mais importante não é o valor percentual, e sim o valor absoluto: são 12,9 milhões de pessoas nessa situação, segundo a mesma pesquisa.
         Antes de ser um problema econômico, como é tratado por grande parte do poder público, essa é uma questão de justiça social, de ética e moral de toda a sociedade brasileira, representada pelos inúmeros governos ditatoriais e democráticos das últimas décadas. Temos que trocar a taxa de retorno econômico pela inclusão social. Aliás, não devemos nem usar taxa de inclusão, pois temos que tratar as pessoas individualmente, e não como número dentro de uma estatística.
         Traçando uma relação com outra pesquisa realizada também pelo IBGE, vemos que a falta de pessoal qualificado para 72,5% das empresas pesquisadas é um gargalo para o avanço da inovação. A pesquisa de inovação tecnológica (Pintec), realizada pelo IBGE e divulgada no final de 2012, mostrou que entre as 128,68 mil empresas pesquisadas, 45,9 mil implementaram um produto e/ou processo novo entre 2009 e 2011, ou seja, 35,6% das empresas pesquisadas haviam sido inovadoras. O que chama a atenção é o segmento de serviços de engenharia e arquitetura, em que somente 29,6% foram inovadoras. Como alcançar o desenvolvimento dessa forma?
         As 45,9 mil empresas inovadoras empregavam 103,3 mil pessoas nas atividades internas de pesquisa e desenvolvimento, isto é, 2,24 profissionais por empresa, quantidade muito pequena. E somente 11 mil profissionais era pós-graduados.
         O mundo está a cada dia mais complexo, exige pessoas mais instruídas, com capacidade de adquirir informações por conta própria, que saibam fazer suas escolhas e cobrar resultados, comprometimento e decência. Como um país pode ser próspero sem ser inovador? Como  ser inovador sem ter uma população educada, com seus alunos com proficiência em leitura, matemática e ciências? A educação é a base para o desenvolvimento humano e econômico de qualquer nação.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:
     
     a)     a educação  universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção  para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 639 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente e qualificada auditoria...

Isto posto, torna-se absoluta inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda,  afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor à commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que permita a partilha de suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das empresas, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...

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