sexta-feira, 15 de março de 2013

A CIDADANIA, AS DESUMANIDADES E UM OLHAR À ESQUERDA


“Um mundo desumano

           Não há sucesso de gestão sem contemplar a realização humana, mas no mundo governamental ou corporativo, não é em assim que acontece. A humanização no século 20 deixou muito a desejar e piora neste século. As incertezas do futuro decorrem de o homem atual não usar o conhecimento conquistado em benefício da maioria. O que está acontecendo na outrora poderosa Europa serve de exemplo e reflexão. O desemprego e o medo tomam conta das famílias não só da Grécia, Espanha e Portugal, e, coincidência ou não, os governos são socialistas. Como pode tamanho fracasso da Espanha contabilizar 22,8% de desempregados? As mesmas aflições caminham para a Itália, França e Reino Unido. O povo paga a conta e o número de bilionários cresce mundo afora, e no Brasil é surpreendente a lista, que aumenta a cada ano. Sobre a paz, grande valor humano, o que acontece na Síria é assustador: mais de 60 mil mortes por causa de uma única pessoa que não deixa o poder. Interesses econômicos de países com poder de veto na ONU impedem uma intervenção.
         O erro histórico foi sempre não colocar o homem no centro das coisas. No Brasil, embora nos encontremos em um momento melhor, estamos sempre à mercê das informações inverossímeis dos governantes, do flagelo da corrupção e de políticos notadamente desonestos infiltrados em todos poderes. A cada eleição nossas esperanças se perdem, pois o país continua mal representado. Pior ainda, esses políticos introduzem os filhos na política, criando um círculo vicioso, de várias gerações de famílias que não deixam o poder, sempre à sombra de um coronelismo ainda vivo.
         No Brasil, como na maioria dos países, há muito ranço da Idade Média, dos senhores feudais que abandonaram a ética, a moral e os melhores princípios humanos apregoados pela filosofia e religiões. Antropólogos e sociólogos contemporâneos têm chamado a atenção sobre o risco de a nossa sociedade como um todo, sob a ótica humanística, cair em um processo de involução, ou seja, deteriorar-se ao ponto de ter que depurar-se para continuar. Pessimismos à parte, é assustador o que está acontecendo com o respeito à vida, quando se mata até por diversão, como se vê em São Paulo.
         O conformismo não pode tomar conta de nós e deixar princípios consagrados esquecidos. Conhecimentos filosóficos criam barreiras de avanço de muitos males sociais que estamos enfrentando. A sociedade precisa mobilizar-se. Os formadores de opinião e responsáveis pela formação dos outros estão “sem tempo”, jogando suas energias em tudo aquilo que dá resultado imediato e dinheiro. Mudança de pensamento, entretanto, é lenta, pois começa ainda no berço e nos bancos das escolas. Ideias ruins entram com muita facilidade, demoram a sair e as boas, por consequência, encontram mais resistência. Assim é o homem atual: imediatista e fechando-se nos próprios interesses. Entretanto não podemos perder as oportunidades que surgem de mudança, como ora aconteceu com o Supremo Tribunal Federal (STF), que, ao condenar figurões jamais imaginados, com certeza irá fortalecer valores humanos e abrir-nos a esperança e novos caminhos.”
(GILSON E. FONSECA. Consultor de empresas, sócio da Soluções em Engenharia Geotécnica/Soegeo), em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 29 de janeiro de 2013, caderno OPINIÃO, página 11).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de 4 de agosto de 2012, caderno PENSAR, página 2, de autoria de JOÃO PAULO, que é editor de Cultura, e que merece igualmente integral transcrição:

“Sempre à esquerda

Não há nada mais velho que a última moda. Do mesmo modo, nada mais é atual que as antigas certezas. Entre as velhas palavras que voltam a ganhar significado na vida política está a esquerda e, consequentemente, seu par antitético, a direita. A crise, em todas as suas dimensões – econômica social e comportamental –, trouxe de volta o poder heurístico e moral da esquerda como leitura do mundo, interpretação da realidade e perspectiva de transformação. E estamos carentes desses três territórios de humanidade: o olhar, a compreensão e a ação sobre as circunstâncias.
Dois livros lançados recentemente ajudam a pôr em ordem os conceitos e recuperar, se não as certezas, pelo menos dúvidas mais bem arranjadas: A esquerda que não teme dizer seu nome, de Vladimir Safatle (Editora Três Estrelas); e Marx estava certo, de Terry Eagleton (Editora Nova Fronteira). São pensadores insuspeitos em termos de conhecimento, vinculação acadêmica (Safatle é professor de filosofia da USP e Eagleton da Universidade de Oxford), autores de obras eruditas e que nunca se furtaram ao debate. Espécie rara de intelectual público, cada vez mais em falta no mercado das ideias.
A esquerda que não teme dizer seu nome é livro curto e incisivo. Desde o título deixa às claras que o propósito do autor não é apenas defender a esquerda, mas um certo tipo de esquerda, que se ousa ir além de sua tradição. A esquerda que nos cabe hoje responde a novas exigências políticas e econômicas e, por isso, precisa ao mesmo tempo acurar a análise e ousar na intervenção. Ao dizer seu nome, não apenas como esquerda, adianta  que algo precisa ser atualizado, revisto. A esquerda mudou, porque o mundo e o capitalismo mudaram, mas se mantém esquerda em sua essência. É esse movimento do surgimento do outro no seio do mesmo livro que o diagnostica com precisão.
Vladimir Safatle inicia seu texto recuperando as duas caricaturas mais conhecidas dos coveiros da esquerda. De um lado há os que se aferram ao irrefletido argumento que defende que a divisão entre esquerda e direita deixou de ter sentido com o fim das ideologias; de outro, os viúvos arrependidos que se regozijam de participar de um mundo em que o paraíso foi alcançado com a democracia representativa e com a entronização do mercado. As injustiças, se há, são fruto da incompetência individual ou alvo da benemerência (por incrível que possa parecer, até o Estado de bem-estar social parece avançado demais).
O que o autor quer recuperar é, em primeiro lugar, o espaço por excelência da esquerda: a política. Quando se fala em desprestígio da política é bom entender que se trata de demonizar certo tipo de política. Não há nada mais político que classificar os movimentos sociais como terroristas, assacar contra direitos sociais e trabalhistas, fechar as instâncias diretas de participação. Nada mais político , nada mais de direita. No entanto, essas e outras ações são feitas em nome de uma visão “racional” ou técnica, que escarnece da dimensão política como reino da corrupção.  O retorno à política dever ser feito não a partir de negações, mas da afirmação do que é inegociável. É aí que a esquerda precisa dizer o seu nome.
Quando se analisam as crises no Oriente Médio e na Europa – de um lado as inconstâncias da política, no outro as fragilidades da economia –, o receituário da direita quer se confundir com a racionalidade e apontar soluções que são sempre refratárias ao povo. No caso dos países do Norte da África e do Oriente Médio, a intervenção militar; nas situações de crise da economia da zona do euro, os ajustes em torno de medidas de austeridade e retirada de direitos. A capitulação ou o caos.
O livro de Vladimir Safatle é um convite ao exercício da esquerda em duas dimensões. De um lado, a recuperação do que é inegociável, de outro a proposição de novas estratégias que atendam às demandas colocadas pelo nosso tempo. A renovação da esquerda é um projeto em aberto, mas que parte de alguns elementos de base. Para o autor, o que não é passível de negociação, sob o risco de perder sua dimensão fundante, é a defesa do igualitarismo, da soberania popular e do direito à resistência. O progressismo, outro nome sobre o qual se buscou camuflar a esquerda, é fruto de um princípio filosófico (a igualdade), de uma estratégia política (a soberania popular ou a democracia que vai além do Estado do direito) e de um valor moral (o direito à resistência).
Uma das mais interessantes e argutas reflexões do autor se volta para o problema de como pensar as diferenças numa sociedade cada vez mais plural. Para um pensamento que se propõe a defender a igualdade, é fundamental saber avançar além do mero reconhecimento das singularidades, como faz um certo multiculturalismo constrangido. “Há, no entanto, uma crítica esquerdista às sociedades multiculturais que consiste em dizer que elas, de certa forma, não são suficientemente multiculturais. Elas procuram, apenas, atomizar a sociedade por meio de uma lógica estanque do reconhecimento das diferenças que funciona, basicamente, no plano cultural e ignora os planos político e econômico. Uma sociedade verdadeiramente multicultural é uma sociedade radicalmente universalista e indiferente às diferenças.”

ERROS E ACERTOS Terry Eagleton é considerado um dos mais destacados críticos marxistas da atualidade. No entanto, de forma paradoxal, ficou mais conhecido por sua diatribe com os defensores do ateísmo. Eagleton desancou os neorevolucionalistas como Richard Dawkins, não pela ciência, mas pela ignorância em matéria de religião. O pensador inglês mostrou que Dawkins e companhia podem entender muito de biologia, mas não sabem nada de filosofia. O fato de Darwin estar certo no que tange aos fatos não torna a teologia um equívoco. Um marxista que crê em Deus, defende a teologia e vê sentido em debater a relação entre fé e razão precisa ser levado a sério.
         O livro de Eagleton, Marx estava certo, foi escrito para tirar a caricatura de cena e pôr em seu lugar uma leitura atenta, inteligente e contemporânea do pensamento marxista. Mais que defender Marx das deturpações (coisa que ele não precisa, já que Marx, sempre, esteve muito melhor que seus críticos), o projeto do autor é mostrar a pertinência e a atualidade do maior crítico do capitalismo. O método é o da refutação, uma limpeza na área.
         A cada um dos 10 capítulos Eagleton desautoriza as críticas apressadas e de má-fé, a começar pela mais radical de todas: a de que o marxismo acabou. Se Marx era útil no tempo da violenta exploração do trabalho, não deixa de ser necessário no momento que tornou a injustiça quase uma segunda natureza, ainda que anódina. Seguem outros ataques e ponderações de Eagleton: a de que o marxismo seria bom na teoria e violento na prática; que seria um tipo incontornável de determinismo; obcecado pelo conceito ultrapassado de classes sociais; defensor de um Estado onipotente e ineficaz; incapaz de alimentar os movimentos sociais contemporâneos; e por aí vai.
         Ao final o leitor aprende, entre outras, que Marx alimentava uma fé inquebrantável no indivíduo, desconfiava de todo tipo de dogma abstrato, era cauteloso em relação à noção de igualdade e não tinha tempo para arquitetar uma sociedade perfeita. Marx acreditava em revoluções pacíficas e não se opunha a uma boa reforma. Defendeu as mulheres, a paz mundial e a luta contra o fascismo. Se você concorda com algumas dessas ideias, talvez seja de esquerda e nem saiba. Aliás, não saber a verdade sobre o marxismo é a mais marxista das meias-verdades levadas a cabo pela direita. Ideologia existe é para isso mesmo.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, adequadas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas transformações em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:
     
     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;
     
     b)    o combate, severo e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de variada ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;
     
     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de astronômico e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tanta sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); educação; saúde; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; emprego, trabalho e renda; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; minas e energia; agregação de valor às commodities; logística; turismo; esporte, cultura e lazer; sistema financeiro nacional; comunicações; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade), entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que permita a partilha de suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a 27ª Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro em julho; a Copa das Confederações em junho; a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das empresas, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...
     

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