segunda-feira, 29 de junho de 2015

A CIDADANIA, A PRIMAZIA DA EDUCAÇÃO ESPECIAL E A ECOLOGIA HUMANA E INTEGRAL

“Política educacional para deficientes
        Há atualmente entre os profissionais que se dedicam à causa da pessoa com deficiência discussão acalorada referente à ideal política educacional a ser adotada pelo Estado brasileiro para essas pessoas, principalmente aquelas com deficiência mental/intelectual. O dilema que se coloca é basicamente o seguinte: de um lado os defensores da chamada inclusão absoluta da pessoa com deficiência, para os quais, independentemente do tipo ou grau de deficiência, todos os alunos devem obrigatoriamente ser matriculados nas chamadas “escolas regulares”, com a extinção em definitivo das escolas especiais, e, de outro, aqueles que defendem a coexistência harmônica das duas modalidades de escola, devendo haver o respeito à liberdade de escolha das famílias e às peculiaridades de cada caso.
         Sem a menor pretensão de adentrar nas questões de natureza sociológica, psicológica ou pedagógica que tal discussão impõe, por absoluto despreparo do autor nessas áreas de conhecimento, o presente artigo tem por objetivo apenas trazer à baila o que o direito prevê quanto à questão e se há resposta na legislação pátria.
         Preliminarmente, deve ser verificado que a Constituição de 1988 (CF) dispõe expressamente sobre a educação a ser prestada pelo Estado brasileiro (latu senso) à pessoa com deficiência, asseverando que o dever com a educação será efetivado mediante a garantia de, entre outras coisas, atendimento educacional especializado aos “portadores” de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. Parece claro, portanto, que, para entender em profundidade o dispositivo legal em comento, necessária é a compreensão do significado da palavra preferencialmente.
         Segundo o dicionário Houaiss, preferência é a ação de preferir, de escolher um entre outros. Ora, se preferir é escolher, quando a CF diz que a educação para a pessoa com deficiência se dará preferencialmente na rede regular de ensino, está dizendo que é dever do Estado dar às famílias o poder de escolha do melhor caminho a ser adotado para o seu ente, ou seja, dar a opção a estas de matrícula tanto nas escolas regulares quanto nas escolas especiais, dependendo do tipo de deficiência e de seu grau, entre outros fatores.
         Parece claro, também, que há uma escala de prioridade no dispositivo citado, ou seja, em regra, a matrícula do aluno com deficiência deve se dar nas escolas regulares, antigamente e erroneamente chamadas de escolas comuns. No entanto, o Estado (lato sensu) deve conceder às famílias de alunos com deficiência também a possibilidade de matriculá-las nas escolas especiais.
         Tal dispositivo constitucional já seria mais do que suficiente para responder à questão aqui posta, pois, como se sabe, é a Constituição a lei maior de qualquer Estado e nenhuma lei pode dispor de forma diversa da Carta Magna, sob pena de flagrante inconstitucionalidade e invalidade do dispositivo antagônico.
         No entanto, ao se analisar as leis que tratam da educação para a pessoa com deficiência, verifica-se que elas dispõem neste particular em sentido harmônico e compassado à Constituição, senão vejamos:
         A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.396/96), que, como o próprio nome diz, traz as regras básicas do serviço de educação a ser prestado dentro do território brasileiro, contém também dispositivo específico quanto à educação para a pessoa com deficiência, repetindo, em seu artigo 4º, o conteúdo da norma constitucional.
         Ademais, tal lei prevê regra ainda mais explícita quanto à obrigação do Estado de manter, em regime de coexistência, as escolas regulares e as especiais, o que joga definitivamente por terra qualquer discussão, ao menos sob o ponto de vista legal, sobre a questão.
         Neste sentido, o artigo 58 da mencionada Lei de Diretrizes e Bases é claro ao dispor que “o atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular”. Ora, o dispositivo legal não poderia ser mais claro no sentido de que a educação da pessoa com deficiência deve se dar não só por meio de serviços especializados na escola regular, mas, quando o caso exigir, em classes ou escolas especiais.
         Portanto, ao encerrar a atividade de tais escolas ou ao proibir a matrícula de novos alunos nestas, os entes públicos estão frontalmente violando dispositivos de natureza constitucional e legal sobre o tema, o que pode dar ensejo, inclusive, à responsabilização por improbidade administrativa do gestor da área.
         Por fim, para que fique definitivamente demonstrada a opção do Estado brasileiro pela coexistência das escolas regulares e das escolas especiais, deve ser mencionada a Lei 7.853/89, chamada durante longo período de Estatuto da Pessoa com Deficiência. Tal lei dispõe que é obrigação do Estado matricular compulsoriamente em cursos regulares de estabelecimentos públicos ou privados as pessoas com deficiência capazes de se integrar no sistema regular de ensino.
         Nota-se, através de uma hermenêutica elementar da determinação contida no dispositivo citado, que só devem ser incluídos no sistema regular de ensino aqueles alunos que têm condições de se integrar de forma adequada a este. Para os outros, ou seja, aqueles que, em razão do tipo, grau de deficiência ou por outra razão, não seja possível a inclusão, deve o Estado oferecer as escolas especiais.
         Assim, ao menos sob o ponto de vista jurídico/legal, não há dúvida de que, por opção expressa e clara do constituinte e do legislador infraconstitucional, a política educacional escolhida pelo Estado brasileiro para a pessoa com deficiência é a de dar primazia à inclusão e integração destes alunos na rede regular de ensino, sem, contudo, abrir mão da escola especial, que continua tendo papel essencial para receber e atender aquele aluno para o qual, por diversos fatores, a inclusão não se mostra a melhor opção.”

(ESTÊVÃO MACHADO DE ASSIS CARVALHO. Defensor público do estado de Minas Gerais, coordenador da Defensoria Especializada da Pessoa Idosa e da Pessoa com Deficiência, especialista em direito civil pela PUC-Minas, em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 26 de junho de 2015, caderno DIREITO & JUSTIÇA, página principal).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, mesma edição, caderno OPINIÃO, página 7, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral transcrição:

“Fraqueza das reações
        O papa Francisco, na sua carta encíclica Louvado seja, aponta profeticamente a letargia no cenário de reações em busca de uma ecologia integral. Essa é uma realidade incontestável. Basta pensar que o Protocolo de Kyoto, que alcançou resultados abaixo do que se esperava, já caminha  para o encerramento do prazo de validade. Em breve, será realizado em Paris mais um encontro mundial com o objetivo de refletir sobre o meio ambiente e a preservação do planeta. Porém, como se diz, “o papel aceita tudo”. Faltam efetivações – tem razão o papa Francisco quando levanta a sua voz profética para apontar um gravíssimo problema: a fraqueza das reações. Por isso mesmo, ele convoca todos a contribuírem para uma profunda revolução cultural.
         O processo de deterioração da qualidade de vida e a crescente degradação social é uma realidade incontestável. O sacrifício ambiental como condição para se alcançar “desenvolvimento”, sem dúvida, é um atentado à dignidade de toda pessoa. Contribui para multiplicar bolsões de miséria, ilhas de exclusão social e cultural, além de estimular as práticas alicerçadas no consumo exagerado. Assim, conduz a sociedade a uma desumanização com consequências irreversíveis. Não se pode deixar de considerar que esse terrível processo é desencadeado pela negação e substituição inegociáveis, tão imprescindíveis quanto as fundações de um grande edifício. A crise moral em curso no coração da sociedade tem tudo a ver com o processo de degradação ambiental.
         Há um descompasso patente e um desgoverno perverso que empurra a humanidade rumo ao crescimento econômico desmedido e descontrolado. Os ambientes urbanos estão, cada vez mais, se tornando pouco saudáveis, devido à contaminação proveniente de emissões tóxicas, além dos problemas de transporte, poluição visual e acústica. As cidades avançam para o caos em razão de seu equivocado funcionamento, com gastos excessivos – de seus moradores e governantes – sem inteligência clarividente. Demanda-se, principalmente das autoridades, rapidez na apresentação de respostas adequadas.
         Com a crise ambiental, o preço mais alto é pago pelos pobres, que, embora não raramente vivam próximo a lugares com grandes recursos naturais, produzem para poucos. Essa triste situação confirma a mediocridade de setores dos governos e dos vários segmentos da sociedade que têm o poder e o dever de mudar os cenários de injustiça, mas não o fazem pela falta de lucidez e, também, em razão da ganância. Seguem na contramão de uma ecologia humana e integral. Lamentavelmente, prevalece o equivocado entendimento de que o mais importante é ajuntar para si as riquezas à custa dos pobres, como sublinha o papa Francisco na oração final que conclui a carta encíclica.
         O Santo Padre, pela força de sua autoridade, denuncia e adverte a respeito de sinais que comprovam como o crescimento dos últimos não significou, em todos os seus aspectos, um verdadeiro progresso integral e uma melhoria da qualidade de vida. Não bastarão as conferências sobre meio ambiente, nem mesmo as urgentes legislações adequadas. Ao se considerar a crescente desigualdade planetária, é urgente emoldurar as análises técnicas e o escrito dos protocolos com o indispensável desenvolvimento de uma capacidade de viver com sabedoria. Sublinha o papa Francisco que é preciso pensar em profundidade e amar com generosidade.
         Incontestavelmente, falta um viés e um substrato na ordem espiritual, frequentemente descartado pelo contexto contemporâneo, presidido pela lógica do lucro e da defesa mesquinha de interesses individuais, coletivos, ideológicos, institucionais e de nações. Por que existe a fraqueza das reações, como aponta profeticamente o papa Francisco? Há uma inércia e uma insensatez, temperada com indiferença, diante do dever de ouvir com atenção os clamores e lamentos dos abandonados do mundo. Essa escuta é insubstituível para sensibilizar e iluminar a inteligência. A ausência dessa escuta gera irracionalidades, como as guerras, a corrupção e a indisposição para partilhar.
         Está em baixa a cultura que pode subsidiar e sustentar o processo urgente de reação diante da grave crise que ameaça o planeta. Por isso mesmo, embora seja evidente a necessidade de mudar hábitos e lógicas, não se veem atitudes efetivas adotadas pelo grande conjunto de instituições e de pessoas. Quem pode e deve desencadear os processos de mudança não toma posição. Escutar os mais pobres, os que partilham o pouco que ainda possuem, é lição que deve ser aprendida para dar rumo novo à vida da sociedade. Na riqueza do horizonte delineado pelo papa Francisco na carta encíclica Louvado seja, é hora de conhecer melhor suas indicações, estuda-las e assumir compromissos. É indispensável que todos se empenhem na transformação da realidade, um cenário preocupante em razão da fraqueza das reações.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas (enfim, 125 anos depois, a República proclama o que esperamos seja verdadeiramente o início de uma revolução educacional, mobilizando de maneira incondicional todas as forças vivas do país, para a realização da nova pátria; a pátria da educação, da ética, da justiça, da civilidade, da democracia, da participação, da sustentabilidade...);

     b)    o combate implacável, sem eufemismos e sem tréguas, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo dados do Banco Central, a taxa de juros do cartão de crédito subiu 1,7 ponto percentual em abril e atingiu 347,5%  ano ano...); II – a corrupção, há séculos, na mais perversa promiscuidade  –  “dinheiro público versus interesses privados” –, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem (a propósito, a simples divulgação do balanço auditado da Petrobras, que, em síntese, apresenta no exercício de 2014 perdas pela corrupção de R$ 6,2 bilhões e prejuízos de R$ 21,6 bilhões, não pode de forma alguma significar página virada – eis que são valores simbólicos –, pois em nossos 515 anos já se formou um verdadeiro oceano de suborno, propina, fraudes, desvios, malversação, saque, rapina e dilapidação do nosso patrimônio... Então, a corrupção mata, e, assim, é crime...); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis (por exemplo, e segundo o estudo “Transporte e Desenvolvimento – Entraves Logísticos ao Escoamento de Soja e Milho, divulgado pela Confederação Nacional do Transporte, se fossem eliminados os gastos adicionais devido a esse gargalo, haveria uma economia anual de R$ 3,8 bilhões...);

     c)     a dívida pública brasileira - (interna e externa; federal, estadual, distrital e municipal) –, com projeção para 2015, apenas segundo a proposta do Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1,356 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 868 bilhões), a exigir IMEDIATA, abrangente, qualificada e eficaz auditoria... (ver também www.auditoriacidada.org.br).

Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade – “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo e nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a   Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!

O BRASIL TEM JEITO!...     
     
        


  

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