“A
Democracia, a Ética e o Poder
Muitas democracias
contemporâneas estão em crise, violentadas por formas sofisticadas e extremas
de corrupção associadas ao exercício do poder. O poder realmente corrompe? O
homem é naturalmente bom e na sociedade se humaniza ou se corrompe? O homem é
ruim em sua natureza e na vida em sociedade se humaniza?
Para
Hobbes, o homem é ruim em estado de natureza e fica pior na vida em sociedade.
Afirma Locke que ao nascer o homem é um tábula rasa, em si mesmo não sabe o que
é o bem ou o mal, mas tende para o bem e se humaniza na vida social. Em
oposição, Rousseau diz que o homem nasce livre, mas por toda a parte está
acorrentado, em sua natureza o homem é bom, mas a sociedade o corrompe.
A
política é ciência e arte e a ação política que não é capaz de realizar o bem
comum serve aos senhores das trevas, que submetem as razões de Estado às
perniciosas razões de governo, os legítimos interesses dos governados sufocados
por interesses escusos dos governantes e de seus protegidos. Quando a ética não
impera sobre a consciência da ação política, a crise pode se transformar em
caos.
A
questão é clássica, merece um olhar para o passado com suas lições. De um lado,
Sócrates, defendendo a ética de princípios, a justiça como valor supremo, os
homens justos e sábios. Temendo a omissão do homem bom e a corrupção, Sócrates
insistia há 2.450 anos ser indecoroso pleitear o poder. Para o mestre, os bons
não querem governar por dinheiro ou por honras, não são ambiciosos.
Em
oposição, os sofistas propunham a ética de resultados, a justiça como uma mera circunstância,
o ser justo apenas quando a ação trouxer vantagem pessoal.
Falar
de poder e de ética impõe lembrar Maquiavel que, em 1513, escreveu De Principatibus, à época a Itália
espoliada, dividida por três grandes forças: os príncipes, a Igreja e os
exércitos mercenários. O príncipe perfeito teria a força do leão e a astúcia da
raposa e governaria um Estado aético comprometido com a eficiência.
Thomas
Hobbes, em O Leviatã, 1651, defendeu
que há no homem um desejo perpétuo pelo poder que somente cessa com a morte, e
o que distingue o homem dos demais
animais é a razão, que a maioria dos homens não sabe usar. Ultrapassar de
qualquer forma quem estiver à frente é vencer.
O
poder e a corrupção voltaram como questões fundamentais em Montesquieu, em
1748. “O poder corrompe... É preciso que o poder limite o poder”. Ao lado de
Locke e de Rousseau, em O espírito das
leis, Montesquieu estruturou teorias sobre tripartição do poder e sobre
freios e contrapesos, pilares do estado democrático de direito.
No
século 21, em algumas democracias o pode não limita o poder, governar é
remediar os males alheios e a ética não é essência do poder. A corrupção está
em toda parte, nos poderes públicos, praticada por gente que deveria ser
exemplo de dignidade e de honra e pautar sua vida na realização do bem comum.
Ao
longo da história do Brasil, a Constituição e outros instrumentos de defesa da
sociedade e do Estado têm permitido períodos de trevas entre o arbítrio e a
impunidade, subordinando os elevados ideais do bem comum aos interesses de
detentores do poder e dos que vivem à sua sombra.
Sócrates
identificou virtudes humanas de que os sofistas conheciam apenas sombras.
Quando os homens bons e justos se confortam em suas virtudes, disso se
aproveitam leões e raposas humanas. Qualquer forma de corrupção é absolutamente
inaceitável. Praticada por autoridades públicas, é crime hediondo. Ou não?”.
(RUY CHAVES. Diretor
da Estácio, em artigo publicado no jornal ESTADO
DE MINAS, edição de 28 de março de 2016, caderno OPINIÃO, página 7).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de
18 de maio de 2007, mesmo caderno, página 11, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo
metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral transcrição:
“Quem
conhece Deus?
Quem conhece Deus? Esta
é a pergunta que explicita o cerne da questão central do discurso inaugural
pronunciado pelo papa Bento XVI, dia 13 último, na abertura da 5ª Conferência
Geral dos Bispos da América Latina e do Caribe. A interrogação pode parecer uma
escolha de entendimento do que dá prioridade a uma fuga em direção ao
intimismo, ao individualismo religioso, ou um abandono da realidade urgente dos
grandes problemas econômicos, sociais e políticos. Foi o próprio para quem
assim argumentou, interrogando, enquanto retomava o tema da Conferência Geral,
“Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que n’Ele nossos povos tenham
vida”. Sua argumentação teológica e pastoral focaliza no horizonte a tarefa
primordial que a Igreja tem de alimentar a fé do povo de Deus. É bem do
consenso de hoje que contemporâneo, atualizado e comprometido é quem tem
adequada compreensão, envolvimento e inserção atuante na realidade. Ele põe,
então, uma pergunta óbvia e necessária na busca de alinhamento dos necessários
entendimentos: “O que é a realidade? O
que é real? São realidade só os bens materiais, os problemas sociais econômicos
e políticos?” Aqui, diz o papa, precisamente, se localiza o grande erro das
tendências dominantes do último século. Ele considera esse erro como nefasto
porque destrutivo.
Essa
destrutividade ele a aponta, corajosamente, para agrado ou desagrado de muitos,
nos sistemas marxistas, assim como nos sistemas capitalistas. Esses sistemas,
ao considerar a realidade, elegem outros valores, obviamente, muitos em si são
gritantes contravalores, prescindindo na sua compreensão e entendimento da
realidade fundante, Deus. Incontestavelmente, aqui está uma grave mutilação do
conceito de realidade enquanto a priva de sua relação, dependência e referência
a Deus. Nisso, pois, se comprova o fracasso dos próprios sistemas citados, por
colocarem Deus entre parêntese, com seus muitos caminhos equivocados e com suas
receitas destrutivas. Aqui se pergunta sobre uma saída. Ela não vai nascer
simplesmente de uma definição conceitual estratégica, senão de uma experiência
diferente que só a experiência com Deus pode proporcionar. É a experiência do
amor revelado por Cristo Jesus, na oferta suprema de sua própria vida,
garantindo a todos a fonte perene de graça que cura e dá a salvação. Essa
compreensão é uma experiência que não permite o isolamento, recorda o papa na
sua reflexão. Antes, leva à comunhão, tendo o outro sempre como o mais
importante. Assim, que, o encontro com Deus é, em si mesmo e como tal, sublinha
o papa Bento XVI, encontro com os irmãos enquanto ato de convocação, de
unificação e de responsabilidade em relação ao outro e aos demais. Nesse ponto
de sua argumentação, o sumo pontífice introduz a justificação incontestável e a
marca definitória da identidade do discípulo ao afirmar que nesse contexto a
opção preferencial pelos pobres está implícita na fé cristológica, isto é,
naquele Deus que se fez pobre por nós para nos enriquecer com a sua pobreza,
como diz o apóstolo Paulo, na 2ª Carta
aos Coríntios 8, 9. A abordagem e
compreensão comprovam que o serviço da fé tem uma importância insubstituível na
vida dos povos da América Latina e do Caribe, como de todo homem e mulher em
qualquer parte do mundo.
Na
América Latina e no Caribe, tenha-se presente o serviço da fé prestado pela
Igreja Católica, reconhecidas as sombras e contradições inegáveis, até mesmo
essa de ser o maior contingente cristão entre as diferentes partes do mundo,
tendo, no entanto, um cenário vergonhoso e asqueroso de desigualdades e
exclusões, é um serviço que anima a vida e a cultura destes povos. É um serviço
para proporcionar o encontro com a verdade, o único que garante caminho e
dinâmica para se alcançar a felicidade que anela todo coração humano. Uma
verdade que não é um conceito ou uma simples teoria. Uma verdade que é amor e
tem um nome; é uma pessoa. É Cristo Jesus. O conhecimento de sua pessoa e
missão e a adesão amorosa e apaixonada a Ele, assumindo, as aventuras e
alegrias de sua oferta, é o segredo do novo que, em meio a uma cultura em
profunda mudança, por isso tão difusa e confusa, compõem a busca e nela se tem
certeza de uma resposta definitiva. O serviço evangelizador da Igreja, nas suas
diferentes frentes de trabalho, particularmente na centralidade da experiência
da fé, como encontro pessoal com o Cristo vivo e ressuscitado, é imprescindível
no turbilhão de mudança de época vivida neste momento. Perdê-lo ou
enfraquecê-lo é correr o riso de perder-se. Essa consciência desafia seus
pastores a encontrarem novos métodos, caminhos e dinâmicas para fortalecer nos
corações e nas culturas a genuinidade do crer em Cristo e do ser discípulo
dele, como resposta corajosa, ética e comprometida, agora e para a vida
vindoura. É sábia e incontestável a indicação do papa Bento XVI para esta 5ª Conferência,
quando a Igreja busca qualificar o seu serviço à humanidade.”.
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e
oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança
de nossa história – que é de ética, de
moral, de princípios, de valores –, para
a imperiosa e urgente necessidade de profundas
mudanças em nossas estruturas educacionais,
governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas,
financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no
concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e
sustentavelmente desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras
cruciais como:
a)
a educação
– universal e de qualidade –, desde a educação
infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em
pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas
crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –,
até a pós-graduação (especialização,
mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade
absoluta de nossas políticas públicas (enfim, 125 anos depois, a República
proclama o que esperamos seja verdadeiramente o início de uma revolução educacional,
mobilizando de maneira incondicional todas as forças vivas do país, para a
realização da nova pátria; a pátria da educação, da ética, da justiça, da
civilidade, da democracia, da participação, da sustentabilidade...);
b)
o combate
implacável, sem eufemismos e sem tréguas, aos três dos nossos maiores e
mais devastadores inimigos que são: I – a inflação,
a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se
em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero (segundo dados do Banco
Central, a taxa de juros do cartão de crédito atingiu em março a ainda
estratosférica marca de 432,24% para um período de doze meses; e mais, em
fevereiro, o IPCA acumulado nos doze meses chegou a 10,36%...); II – a corrupção, há séculos, na mais perversa
promiscuidade – “dinheiro público versus interesses privados”
–, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando
incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem (a propósito, a
lúcida observação do procurador chefe da força-tarefa da Operação Lava Jato,
Deltan Dallagnol: “A Lava Jato ela trata hoje de um tumor, de um caso
específico de corrupção, mas o problema é que o sistema é cancerígeno...” – e
que vem mostrando também o seu caráter transnacional; eis, portanto, que todos os valores que vão
sendo apresentados aos borbotões, são apenas simbólicos, pois em nossos 515
anos já se formou um verdadeiro oceano de suborno, propina, fraudes, desvios,
malversação, saque, rapina e dilapidação do nosso patrimônio... Então, a
corrupção mata, e, assim, é crime...); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar
inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreparáveis (por exemplo,
segundo Lucas Massari, no artigo ‘O Desperdício na Logística Brasileira’, a
“... Desconfiança das empresas e das famílias é
grande. Todos os anos, cerca de R$ 1 trilhão, é desperdiçado no Brasil. Quase
nada está imune à perda. Uma lista sem fim de problemas tem levado esses
recursos e muito mais. De cada R$ 100 produzidos, quase R$ 25 somem em meio à
ineficiência do Estado e do setor privado, a falhas de logística e de
infraestrutura, ao excesso de burocracia, ao descaso, à corrupção e à falta de
planejamento...”;
c)
a dívida
pública brasileira - (interna e externa; federal, estadual, distrital e
municipal) –, com projeção para 2016, apenas segundo a proposta do
Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1,348 trilhão, a título de juros,
encargos, amortização e refinanciamentos (ao menos com esta rubrica, previsão
de R$ 1,044 trilhão), a exigir
alguns fundamentos da sabedoria grega:
- pagar,
sim, até o último centavo;
-
rigorosamente, não pagar com o pão do povo;
-
realizar uma IMEDIATA, abrangente,
qualificada, independente e eficaz auditoria...
(ver também www.auditoriacidada.org.br)
(e ainda
a propósito, no artigo Melancolia,
Vinicius Torres Freire, diz: “... Não será possível conter a presente
degradação econômica sem pelo menos, mínimo do mínimo, controle da ruína das
contas do governo: o aumento sem limite da dívida pública...”);
Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta
de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já
combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de
poupança e, mais grave ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições,
negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à
pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas
e sempre crescentes necessidades de ampliação
e modernização de setores como: a gestão
pública; a infraestrutura (rodovias,
ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada,
esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística
reversa); meio ambiente; habitação;
mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda;
agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência
social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança
pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e
desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer;
turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e
operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade
– “fazer mais e melhor, com menos” –, criatividade, produtividade,
competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira
alguma, abatem o nosso ânimo e nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada,
civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática e desenvolvida, que
possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e
potencialidades com todas as
brasileiras e com todos os
brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários
previstos e que contemplam eventos como a
Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do Pré-Sal, à luz das
exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das
organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas
tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a
nossa esperança... e perseverança!
“VI,
OUVI E VIVI: O BRASIL TEM JEITO!”
-
Estamos nos descobrindo através da Cidadania e Qualidade...
-
ANTICORRUPÇÃO: Prevenir e vencer, usando nossas defesas democráticas...
- Por
uma Nova Política Brasileira...
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