segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

A CIDADANIA, O HOMEM, A DEMOCRACIA E A DIGNIDADE E DELINQUÊNCIA

“Homem, Estado e democracia
        
         Talvez o maior dilema doutrinário nos chamados regimes democráticos de direito reside da hierarquia, na resultante de poder do que se convencionou chamar de equação homem x Estado. O âmago dessa perplexidade mora na ideia de que é impositiva uma hierarquização entre as vontades, interesses e expectativas de um e de outro. O embate entre eles, inevitável , torna imperativa a supremacia do Estado sobre o indivíduo. Isso, inegavelmente, põe em cheque os próprios valores da democracia a qual é um regime de liberdades e não de restrições ou hierarquias. Uma questão que se coloca está em examinar como se forma o que se chama aqui de “vontade do Estado”. Acaso ela não seria a expressão da vontade dos indivíduos que ocupam o Estado? E, nessa perspectiva, não seria inescapável que o conflito dessas vontades reduz-se a um conflito de vontades, grupais ou individuais? Ou seja, o indivíduo (ou grupo) desvestido das prerrogativas de Estado “versus” o indivíduo (ou grupo) investido dessas prerrogativas?
         O Estado não é um  animal, alma autônoma afastada do homem, mas criação dos homens e composta por homens. Dessa forma, não há uma lógica plausível no pensamento de que sua simples existência signifique a prevalência de suas “vontades” sobre as vontades, expectativas e interesses do cidadão  que conflitem com as do Estado. Nesse núcleo, nem há diferença entre os regimes totalitários ou liberais: a distinção é, ou de ênfase, ou de modelos de seleção dos homens do Estado, apenas.
         A partir do modelo de Karl Loewenstein pode-se avançar nesse tema. Para ele, um poder transcende ao próprio Estado (policy determination) o instituiria, segundo cláusulas definidas numa constituição. Ao Estado, criado segundo os contornos estabelecidos nessa determinação, caberia o exercício do que chamou de policy execution (execução) e de policy control  (controle). Ao contrário do modelo vertical de Montesquieu, os poderes do Estado não estariam necessariamente formalizados em estruturas burocráticas autônomas. A proposição de Loewenstein é material. Assim, haveria execução indistintamente nos poderes Executivo e Legislativo. E controle no Judiciário. A determinação é como que o sopro de Deus; dá vida ao Estado, institui suas características, seus poderes e esvanece. Ao concentrar na determinação toda a fonte de autoridade e hierarquia do Estado sobre o indivíduo, o modelo faz crer que essa autoridade não reside no Estado real, cotidiano. Ao Estado cabe, apenas e tão somente, realizar os modelos hierárquicos e de supremacia que lhe foram impostos. O Estado não é fonte da hierarquia, mas estrutura para sua realização.
         O simples deslocamento da hierarquia para aquilo que os kantianos chamariam de metajuridicidade não resolve a questão. A execução impõe, de per si, o estabelecimento do que eu chamo de micro-determinação. Os burocratas, inclusive os da execução, têm um modo próprio de interpretar e aplicar as regras de direito com que o deus determinação os ungiu. E não há, necessariamente, coincidência nessas ações, colocados o homem e o Estado diante delas. E, em vista dessa “descoincidência”, sempre haverá espaço para o cidadão confrontar as decisões do burocrata.
         Assim, o problema da hierarquia na equação homem x Estado encontra-se apenas aparentemente isolado dos mecanismos da ação diuturna de um e de outro. A determinação não apazigua toda a miríade de conflitos que brota da interpretação entre o homem e a execução da norma jurídica. Na verdade, a determinação parece propor conflitos. E tanto assim é que a própria existência do controle político evidencia o conflito inerente à sua execução.
         Cabe aqui divagar, no sentido de que o controle não se resume a controle de legalidade do ato estatal. Isso é bem pouco. Afastado o rigor formalista dos kantianos, o Estado é muito mais que a norma jurídica institucionalizada. A chamada política do direito (no dizer de Kelsen) diz muito mais perto aos interesses do cidadão do que a fria letra da lei.
         O que se pode depreender, a partira da informalidade do trio de Loewenstein, é que nem é necessário que o controle resida exclusivamente na burocracia estatal. É de se sugerir que ele também está nas ruas, no cidadão ao qual o estado diz servir. Sob o aspecto formal (eleições) ou informal (protestos) é fora de questão o enorme poder que reside nessa instância. De fato, ainda que se mantenha a determinação incólume, é aceitável, seja pela alternância de poder protagonizada a partir das eleições, seja pela revisão da ação do estado decorrente dos protestos, que haja um sensível “tranco” na ação do Estado. E isso sem ruptura institucional. Sem fraturar a determinação.
         Portanto, é ingênuo e precipitado imaginar-se que a “voz das ruas” seja prenúncio de inevitável ruptura institucional. Pelo contrário, como mecanismo de controle, é um dos elementos da sociedade organizada capaz de impor uma saudável revisão na execução.
         O pensamento padrão considera que a estrutura burocrática do Estado haverá de conter todos os “poderes” que atuam no cotidiano das democracias. Eis o equívoco. E, quem sabe, o germe maldito da própria ruptura institucional: a incapacidade de compreender que o controle (tal como a determinação o é, sempre) pode muito bem interferir desde “fora” do Estado. E ser respeitado como tal.”

(CAIO BOSON.  Advogado especialista em direito público e sócio de Boson  & Associados, Advogados, em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 21 de fevereiro de 2014, caderno DIREITO & JUSTIÇA, página 8).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral transcrição:

“Dignidade e delinquência
        
         Os cenários nas sociedades contemporâneas merecem atenção e tratamento especial por parte de todos, particularmente das lideranças políticas, governamentais e religiosas. Esses cenários estão marcados pela banalização crescente da dignidade humana, que favorece atos de delinquência, trazendo prejuízos irreversíveis. A perda do sentido autêntico da pessoa tem sido um vetor determinante do esvaziamento da consciência individual e coletiva. Aí está uma incontestável e perene fonte da violência, da corrupção e dos mais diversos tipos de manipulações – de coisas, instituições e pessoas.
         A gravidade dessa situação atinge o núcleo da consciência moral que deve sustentar cada pessoa no desabrochamento de sua conduta, pautada no mais relevante sentido de respeito ao outro. No coração humano há uma lei inscrita pelo próprio Deus, no fundo da própria consciência. É uma lei que o homem não impôs a si mesmo, mas à qual ele deve obedecer, como uma voz que estão chamando-o ao amor, ao bem. Quando o indivíduo perde a competência para ouvir essa voz, se encontra às portas do mal. A perda e esvaziamento da consciência moral são, pois, o impulso determinante que faz nascer o delinquente.
         Criminosos, dos mais variados tipos, escutam outra voz que determina a submissão interesseira à idolatria do dinheiro, ao entendimento do prazer como fonte de manipulação e lucro. Essa voz alimenta a ganância que inaugura a cada momento uma corrida desenfreada, pautada na disputa, que faz de cada um inimigo do outro. Essa delinquência está nas violências de todo tipo, inclusive nos radicalismos políticos e fundamentalismos religiosos, arregimentando muita gente aos extremos, equivocada e lamentavelmente convencida de estar mais próxima da verdade, sentindo-se no direito de produzir, segundo seus critérios, os ordenamentos necessários, e a implantação de uma justiça que é cega e incapaz de estabelecer a verdadeira dignidade que configura e define a pessoa.
         O princípio sagrado e intocável da dignidade humana não permite que cada pessoa se pense como absoluta, edificada por si mesma, sobre si mesma e de si mesma dependente. A sociedade contemporânea está sendo levada por dinâmicas que estão alimentando reducionismos muito perigosos. Isso compromete o entendimento do sentido da dignidade, gera um enfraquecimento da fraternidade e incapacita para a solidariedade. Lamentável é o entendimento da consciência moral com a simples função de aplicação de normas gerais aos casos individuais da vida. A decomposição da consciência moral deve inspirar uma “trincheira” guerreando por sua recuperação. No caminho  oposto, corre-se o risco de se produzir colapsos em série que inviabilizarão o futuro das sociedades. Crescerão as barbáries e os descompassos regerão a vida cotidiana, que se tornará, impulsionada pelo frenesi da vida moderna e das ganâncias, um lento suicídio coletivo, atingindo as culturas, tradições e pessoas.
         É preciso eleger como prioridade a permanente recomposição da consciência moral individual e comunitária. O inadequado tratamento dessa primazia é a produção de delinquências praticadas tanto por “engravatados” quanto por “maltrapilhos”. Deve-se investir, de modo sério e profundo, em toda a esfera psicológica e afetiva de cada pessoa, bem como nos múltiplos contextos do ambiente social e cultural. Esse investimento, portanto, há de ter cada pessoa como destinatária. Seu encaminhamento concreto indica que o conjunto da sociedade precisa ser mapeado e tratamentos específicos precisam ser disponibilizados. Assim será possível alcançar um processo educativo e de recuperação dessa consciência moral perdida. Esse mapeamento se desdobra em vários capítulos, cada um com a tarefa de sensibilizar e buscar contribuições para resgatar e qualificar a cidadania..
         Capítulo determinante desse processo são as reflexões sobre a realidade carcerária do Brasil, com seus 500 mil presos, em condições de contínua e acentuada perda da consciência moral, em razão das dinâmicas e das condições dos presídios. Uma realidade que envolve muitas situações, de diferente matizes, e gera grande preocupação pelo que se está produzindo. O sistema prisional tem feito surgir contextos inadequados, atingindo famílias, presos que não deveriam estar no cárcere e até aqueles de alta periculosidade. Uma situação que se agrava diante da grande comunidade atingida por compreensões equivocadas ou ineficazes sobre a prioridade de recuperar pessoas, permitindo-lhes recompor a consciência moral.
         Esse capítulo, entre outros mapeamentos que a sociedade brasileira precisa considerar, é prioridade do Vicariato Episcopal para Ação Social e Política da Arquidiocese de Belo Horizonte, com sua Pastoral Carcerária, e de experiências exitosas como as Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac), instituições que estão em diálogo com a sensibilidade social e comprometimento da ministra Cármem Lúcia Antunes, do Supremo Tribunal Federal. Um trabalho necessário pela certeza de que o Estado precisa de ajuda. É preciso o envolvimento de instituições especializadas em humanidade para recuperar dignidades e superar delinquências.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, severo e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de variada ordem (por exemplo, as barbáries, as violências, as delinquências que vão aflorando nas sociedades contemporâneas); III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão – revisada – de R$ 654 bilhões), a exigir uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...             

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

A CIDADANIA, A FORÇA DOS SONHOS E A UTOPIA DE MORUS


“Os sonhos podem mostrar nossa realidade com maior clareza
        
         Geralmente somos mais livres nos sonhos, de modo que eles podem colocar-nos em contato com níveis mais elevados do nosso ser, de onde podem vir orientações precisas.
         Todos os que passaram pela experiência de um sonho marcante sabem que depois de vivenciá-lo não continuaram a ser os mesmos.
         No nível da consciência de vigília, de desperto, temos a ilusão de que somos separados uns dos outros, de que somos uma coisa e o universo é outra, como algo distante e fora de nós. Todavia, um sonho pode mostrar que essa não é a realidade.
         Um sonho pode apresentar o que vem realmente do nosso lado interno, profundo, e não da nossa parte mais superficial, aparente ou racional. Num sonho, isso pode ser liberado, e então ficamos diante da realidade, vendo-a com mais clareza.
         Quanto mais nos aprofundamos nesse assunto, mais temos sonhos simbólicos, ligados a fatos não concretos, conforme costumamos pensar. Em vários casos, esses sonhos simbólicos podem ser considerados a linguagem da nossa alma, a qual não se atinge com a mente comum.
         Na vida de desperto, um mais um é igual a dois; ao passo que, na linguagem da alma, não é assim. Na vida espiritual, se interpretarmos um sonho simbólico em termos lógicos e racionais, dificilmente chegaremos a uma conclusão correta. Para sabermos o que ele está manifestando, é preciso despir-nos de toda preocupação de ver as coisas logicamente, de querer introjetar nossas ideias sobre o significado que possa ter. É preciso que nos liberemos de conceitos; do contrário, não compreenderemos o símbolo.
         Diante de um sonho, convém ficarmos imparciais, tanto ao passá-lo a outros, se for o caso, como para a nossa própria compreensão. Devemos registrá-lo com fidedignidade, com detalhes, mas sem acrescentar-lhe nada. Se me coligo em silêncio com o símbolo que vi e fico quieto, isentando-me de formar uma opinião, provavelmente outros elementos surgirão na minha consciência. Esses elementos podem ter um significado específico que emergirá de dentro de mim, não através de explicações mentais, mas de estados de ânimo que me transformam.
         Ainda que, quieto e imparcial diante do símbolo, eu não consiga chegar a conclusão alguma, não tem importância; pelo simples fato de ter ficado nessa atitude, impassível e impessoal, permito que o símbolo me transforme. Por ser ele um concentrado de energias de um outro nível, com minha atitude de imparcialidade acabo entrando em contato com a energia que traz, mesmo sem compreendê-lo.
         Se um símbolo for muito abstrato, de tal modo que meu grau de compreensão atual não me permita atingi-lo, basta eu ficar relaxado para ser tocado por sua energia. Talvez o símbolo visto ou sonhado, mais profundo o nível do qual terá vindo. Cada vez que o recordo, e que nele penso com gratidão e afeto, sou energizado e me coligo com um nível mais interno do meu ser. Tal nível está sendo representado pelo símbolo e, por isso, quando minha mente se volta para ele, sou colocado em contato com meu ser interno, na proporção em que isso pode ser feito na atual fase da minha existência.”

(TRIGUEIRINHO. Escritor, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 16 de fevereiro de 2014, caderno O.PINIÃO, página 18).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 19 de fevereiro de 2014, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de FREI BETTO, escritor, autor de O Calendário do poder (Rocco), entre outros livros, e que merece igualmente integral transcrição:

“Utopia de Morus
        
         João Paulo II consagrou, em 2000, o inglês Thomas Morus (1478-1535) padroeiro dos políticos. Fez boa escolha, considerada a ambiguidade da maioria dos políticos. Canonizado em 1935 pelo papa Pio XI e pouco conhecido por sua suposta santidade, Morus é famoso por ser autor de um livro clássico, Utopia (1516), termo que cunhou a partir do grego utopos, que significa “lugar nenhum”.
         Morus inspirou-se em Luciano, satírico grego do século 2, autor de História verdadeira , e em Erasmo, de quem era amigo, autor de Elogio da loucura (1511), que, em carta enviada a Morus, afirmou que “gracejos podem levar a algo mais sério”. É o que faz a boa literatura de nosso Veríssimo.
         Em sua obra, Morus descreve a comunidade de uma ilha onde não havia dinheiro nem propriedade privada; admitiam-se adoradores do Sol e da Lua. “Todos eram livres para praticar a religião que bem entendessem, e tentar converter as outras pessoas para a sua própria fé, desde que o fizessem traquila e educadamente, por meio de argumento racional.”
         Tinha o autor por objetivo protestar contra as injustiças da Inglaterra de sua época: pobreza generalizada, criminalidade (e apelos à redução da maioridade penal...),  pena de morte para quem furtava para matar a fome. “Vocês ingleses” – diz o narrador da Utopia – “me fazem lembrar os professores incompetentes, que preferem reprovar os seus alunos que ensinar-lhes. Em vez de infligir essas punições horríveis, seria muito mais adequado proporcionar a todos algum meio de sobrevivência, de modo que ninguém se encontrasse sob a horripilante necessidade de se tornar, primeiramente, um ladrão, e depois um cadáver.”
         Na ilha de Morus “todos recebem uma porção justa, de modo a não haver jamais pobres ou mendigos. Ninguém é proprietário de nada, mas todos são ricos – afinal, que riqueza maior pode haver que a alegria, a paz de espírito e estar livre da angústia?”
         Dois fatores fizeram Morus renegar suas antigas ideias: a Reforma de Lutero e a sua nomeação a funcionário real, em 1518. Picado pela mosca azul, o poder lhe subiu à cabeça. Logo foi promovido a “conselheiro teológico” e, em 1529, nomeado lorde chanceler de Henrique VIII.
         O que ele antes via como desejável, agora que chegara ao poder lhe parecia perigoso. Preferiu esquecer o que pregou e escreveu. Embora a comunidade da Utopia assemelhe-se ao comunismo, Morus, inimigo da Reforma, passou a atacar a vida comum dos anabatistas como terrível heresia, e tomou a defesa dos ricos proprietários de terras.
         Lorde Morus proibiu mais de 100 livros, perseguiu quem não professava a fé católica, entre os quais o teólogo protestante William Tyndale, que traduziu a Bíblia para o inglês. Segundo seu biógrafo, John Guy, Morus aplicava severamente as leis que decretava: “Vendedores de livros eram multados e presos, e seus estoques de literatura herética queimados em praça pública”, e eles obrigados a desfilar em feiras livres, cavalgando de costas, para que o povo lhes atirasse frutas podres.
         No epitáfio que cunhou para si mesmo, Morus afirmava orgulhoso ter sido um “perseguidor de ladrões, assassinos e hereges”. O último termo foi suprimido na reforma de seu túmulo, no século 19.
         Em 1533, Henrique VIII separou-se de Catarina de Aragão, apaixonado que estava por Ana Bolena. Como Roma lhe negou a anulação do casamento, a fim de legalizar seu divórcio e sacramentar o novo matrimônio perante a Igreja, o rei transferiu para si a autoridade do papa e fundou a Igreja Anglicana. Por se recusar a aceitar Ana Bolena como rainha da Inglaterra e ficar do lado do lado do papa Clemente VII, que excomungou Henrique VIII, Morus foi decapitado em 1535.
         O poder é antiutópico ou distópico por natureza? Por que, hoje, tantos que outrora elevavam sua voz contra a exploração do capital e desfraldavam bandeiras progressistas, de leões bravios tornaram-se dóceis cordeiros do rebanho neoliberal?
         Penso que o poder, devido às premências do presente, faz com que se perca a visão de futuro. E, como o poderoso tende a perpetuar-se no cargo (vide as velhas raposas da política brasileira), procura reduzir o processo histórico a seu momento pessoal. Julga-se início e fim, sem consciência de que não passa de mediador (meio) de um mandato popular.
         Daí o risco de transformar-se numa figura ridícula, sem honra biográfica, merca caricatura de suas ambições desmedidas. Em sua pobre topia, não há mais lugar para a utopia.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, adequadas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas  educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 639 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (transporte, trânsito, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. E ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...



          

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

A CIDADANIA, AS EXIGÊNCIAS DA JANELA DA RENOVAÇÃO E A ESCOLHA DA ESCOLA DOS NOSSOS FILHOS

“Gente não é problema
        
         Nunca a informação foi tão acessível quanto agora. Mas continua sendo difícil ver além dos dados. Nossa avaliação é sempre bastante frágil. Quem diria, por exemplo, antes da crise imobiliária nos EUA, que os analistas financeiros estavam mal informados? Ao contrário, eles estavam munidos, em tempo real, de muitíssimos dados. Pouquíssimos, no entanto, vislumbraram o que estava por vir. Depois de ocorrer, a pergunta era natural: como é que não vimos isso?
         Por que se dá esse fenômeno? A realidade parece se esconder, trapacear. Talvez a dificuldade esteja nessa informação em tempo real. A proximidade com os fatos deixa-nos vulneráveis.
         Mas não é apenas a falta de distanciamento da informação. Às vezes nos enganamos por anos, décadas. Por exemplo, especialmente a partir dos anos 1960, veio à tona com grande força a preocupação geográfica. Consolidou-se a leitura unívoca de que o crescimento populacional era um problema a ser combatido. A pobreza e a miséria no mundo estavam de certa forma mais próximas, tornavam-se mais conhecidas. Imagens televisivas dos países extremamente pobres pareciam gritar: o mundo não comporta mais gente, falta alimento, e parecia urgente a necessidade de uma guinada. Acrescentava-se também a consciência ecológica. A presença humana gerava – quase como uma lei física – problemas ambientais. O mundo parecia ser uma casa pequena para tanta gente. Diminuir o número de habitantes, ou ao menos não crescer tão rapidamente, apresentava-se como um questão de sobrevivência.
         Era a cultura de uma época. Duas décadas atrás, não se via assim. No debate sobre a reconstrução da Europa, no pós-guerra, o crescimento da população não era vista como problema; muito ao contrário. Já nos anos 60, ao avaliar o desenvolvimento dos países latino-americanos, a demografia estava na ordem do dia. Objetivamente, a Europa, em 1945, era mais densamente povoada que a América Latina dos anos 60. No entanto, neste lado do planeta, o número de pessoas era encarado como um problema; lá, não.
         Essa visão transcendeu os anos 60 e nas décadas seguintes era lugar-comum criticar o crescimento populacional. Chegou até agora; até quase agora, para ser exato. No apagar das luzes da década passada, sem grande estardalhaço, passou-se a falar o contrário. Aparecia na mídia a expressão “janela demográfica”. Ao contrário de todas as visões anteriores, agora a população jovem era um aspecto positivo. Passava a ser considerado um valioso ativo dos países.
         Qual foi a grande mudança? Surgiu uma nova tese acadêmica? Não. Apenas passou a ser evidente que os países cuja população ativa – leia-se população jovem – era proporcionalmente maior estavam em crescimento; já os outros, não. Na década de 50 a China tinha o tamanho da Europa. Hoje, o Velho Continente, limitado na sua capacidade de renovação, está mergulhado numa assombrosa crise. A China, não obstante sua enorme fatura social, é a grande potência do terceiro milênio.
         Sociedades envelhecidas não têm capacidade de ousar e de inovar. Que idade tinha Steve Jobs quando se lançou na fascinante aventura da Apple? Bill Gates não era um cinquentão quanto concebeu a Microsoft. Os velhos, carregados de experiência e maturidade, são bons gestores. Mas o motor de um país  é a ousadia. E o atrevimento não tem cabelos brancos.
         O Brasil tem enfrentado a turbulência global graças à sua janela demográfica: uma população em idade ativa desproporcionalmente grande. Quando o mundo mergulhava na dura crise econômica que ainda perdura, o ex-presidente Lula, apoiado em aguçada intuição e sentido de oportunidade, conclamou os brasileiros a um forte exercício de consumo. O apelo deu certo. O tamanho e a juventude do mercado brasileiro mantiveram a saúde econômica.
         Ter tomado consciência apenas agora nos põe noutro problema: conseguir enriquecer como país antes de envelhecer. Estamos numa corrida contra o tempo. Queremos sucumbir ao inverno demográfico ou estamos dispostos a abrir a janela da renovação? Gente não é problema. É solução.”

(CARLOS ALBERTO DI FRANCO. Diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciências Sociais (IICS), doutor em comunicação pela Universidade de Navarra (Espanha), em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 17 de fevereiro de 2014, caderno OPINIÃO, página 9).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado na revista VEJA, edição 2361 – ano 47 – nº 8, de 19 de fevereiro de 2014, páginas 82 a 84, de autoria de Gustavo Ioschpe, que é economista, e que merece igualmente integral transcrição:

“Como escolhi a escola dos meus filhos
        
         Nos últimos dois anos, culminando no fim do ano passado, eu e minha mulher passamos pelo processo angustiante de escolher a escola em que nossos filhos estudarão. Ao longos dos anos, muitos leitores e conhecidos me perguntam onde meus filhos estudam, e, ainda que ache que a escola que escolhemos é pouco relevante para terceiros, por motivos que explicito a seguir, talvez o processo que trilhamos ajude quem está nessa encruzilhada.
         O cenário é bem distinto dependendo se o aluno cursará uma escola pública ou privada. Para os pais que matricularão os filhos em escola pública, a sugestão é simples: matricule seu filho na escola com Ideb mais alto que você conseguir. Como o currículo é teoricamente igual em todas as escolas da rede, o Ideb é o melhor indicador da qualidade da instrução que a escola oferece. Ele é medido para o 5º e o 9º anos, o que permite dar uma boa ideia da qualidade ao longo do ensino fundamental.
         Para quem pode mandar o filho para uma escola particular, a escolha é um pouco mais complicada. O único indicador objetivo e externo de qualidade é o Enem (escolas particulares não participam da Prova Brasil e, assim, não têm Ideb). O Enem é um teste feito para medir o aprendizado do aluno, não a performance da escola. No Estado de São Paulo e em alguns outros em que até recentemente as universidades públicas não usavam o Enem em seu processo seletivo, muitos alunos dos colégios top tinham pouco incentivo para ir bem no teste, o que reduzia a média da escola. Outro problema do Enem é que ele só avalia o aluno no último ano do ensino médio. É possível, ainda que pouco provável, que uma escola manipule a entrada de alunos em seu último ano selecionando alunos  verdade ter arregimentado os melhores alunos (digo que isso é pouco provável porque é difícil que os melhores alunos optem por uma escola ruim).
         Tudo isso, porém, é de relevância menor, porque o fato que vem sendo demonstrado inescapavelmente pela pesquisa há décadas é que o impacto da escola sobre o aprendizado é menor do que a maioria dos pais imagina. Cerca de 80% da variação de desempenho escolar dos alunos é explicada pelas condições econômicas e, especialmente, culturais/educacionais de seus pais. À escola cabem os outros 20%. Não que isso seja pouco relevante: em um cenário muito competitivo, mesmo 5% de diferença na formação pode fazer a pessoa entrar ou não na universidade ou no emprego dos sonhos. Mas a escola tem menos poder de mudança do que os pais imaginam.
         Por isso, minha recomendação principal aos afortunados que podem escolher onde o filho estudará é: prefiram a escola cuja proposta e valores mais se encaixem com aqueles da família. Não existe “a melhor” escola; existe a melhor escola para a demanda daqueles pais. O importante é saber o foco principal. É o lado acadêmico? A formação religiosa? É ser bilíngüe? É a preparação para a cidadania? O desenvolvimento da criatividade? A segunda coisa importante é saber que nenhuma escola vai alcançar a excelência em todas essas dimensões. Porque o tempo letivo é finito; toda escola tem prioridades. Cabe aos pais saber o que procuram – e ficar de olho aberto em relação às escolas que dizem ser possível assobiar e chupar cana ao mesmo tempo.
         O mais importante, especialmente para quem mora em cidade grande, com ampla oferta educacional, é decidir aquilo que você não quer. Ninguém visitar  dezenas de escolas, então o primeiro passo é filtrar aquelas que não se encaixam no que você procura.
         No nosso caso, tomamos algumas decisões. A primeira é que não seguiríamos o ditado, proferido por alguns conhecidos, de que “escola boa é a escola mais perto de casa”. A escola de meus filhos é uma decisão importante demais para ficar sujeita à conveniência do meu deslocamento. É verdade que uma distância maior entre a casa e a escola é um fator que impacta negativamente o aprendizado (fontes em twitter.com/gioschpe), mas o jeito de resolver isso é mudando de casa, não de escola. Meu avô se mudou de cidade para que meu pai pudesse estudar em escolas melhores; no meu caso, por já morar em uma cidade com muitas ótimas escolas, só preciso mudar de bairro. Decidimos não circunscrever nossas buscas a nenhuma área específica, portanto.
         A segunda decisão importante é que buscaríamos uma escola “normal”. Eu e minha mulher somos judeus e fizemos universidade nos EUA; a maioria dos nossos amigos imaginava que nossos filhos estudariam em uma escola judaica e/ou bilíngüe. Negativo. Não escolhi escola judaica porque sou um racionalista, ateu e cosmopolita. Acho que uma escola deve defender a supremacia e a universalidade do saber. Em uma escola religiosa, por mais light que seja, sempre haverá um conflito entre o dogma religioso e a curiosidade ilimitada do pensamento. Como é possível que uma escola ensine ao mesmo tempo que descendemos de primatas e de Adão e Eva? Não pode. Um dos dois está mentindo. Também acho que uma escola deve abrir portas, não construir muros. Não quero colocar meus filhos em um ambiente em que estejam rodeados de iguais, mas sim que aprendam a conviver com a diferença.
         Sobre as bilíngües: ainda que seja de fundamental importância  o domínio de línguas estrangeiras, não acho que essa deveria ser a principal função da escola. Há muitas maneiras de adquirir fluência em um idioma. Tanto eu quanto minha mulher nunca estudamos em escola bilíngüe e entramos em boas universidades americanas. A questão relevante aqui é se o benefício da educação bilíngue compensa os custos. Quais são eles? Há o financeiro: escolas internacionais viraram grife e, como toda grife, podem cobrar um premium por suas marcas. Mais importante: há o desenraizamento. Conheço bastante gente que estudou em escola internacional e domina pouco o português, não conhece a história do país etc. E, ao mesmo tempo, não é americano, nem suíço ou francês. Fica no limbo, não é nem uma coisa nem outra. Alguém já escreveu que árvores sem raízes não dão frutos. Concordo. Espero que meus filhos conquistem o mundo, mas sabendo muito bem de onde vieram. Finalmente, o problema de muitas escolas bilíngües e internacionais é que não têm uma medição externa de qualidade. A maioria dos alunos não faz o Enem, nem faz vestibulares concorridos. Certamente deve haver excelentes escolas internacionais espalhadas pelo país, mas é mais difícil separar o joio do trigo.
         Feitas essas exclusões, como escolher, então, a escola ideal para nós? Meu pensamento foi escolher a escola que melhor suprisse aquilo que nós, pais, não conseguimos suprir, e que não se arrogasse tarefas que são de nossa alçada. Não procuramos, portanto, uma escola que dê uma educação de valores ou que esteja preocupada em “formar o cidadão crítico e consciente”: isso é tarefa nossa, da qual não abrimos mão. Procuramos uma escola forte academicamente, que desenvolva em nossos filhos o gosto pelo saber e a capacidade de raciocínio analítico. Especialmente na área de exatas, já que, se um filho meu não gostar de ler, eu vou mandar fazer teste de DNA...
         Usamos o Enem como o primeiro corte, procurando as melhores escolas da cidade. (Usamos o Enem, digamos, “pra valer”: descartamos uma escola que faz parte de uma rede grande e seleciona os melhores alunos de toda a rede e os concentra numa unidade. Aí o mérito é mais do aluno do que da escola). O segundo corte foi feito utilizando os critérios acima. Selecionamos então três escolas para visitar e conversar com a equipe. As três me pareceram academicamente excelentes.
         A primeira é muito repressora. Não permite namoros no pátio, política estudantil etc. Nós somos muito liberais e, além disso, acho que dificilmente o pensamento pode ser livre e questionador em um ambiente tão controlado. Não era a escola para a gente, portanto. A segunda é uma escola muito tradicional, linda, liberal, de altíssima qualidade. Poderia colocar meus filhos lá. Só duas coisas incomodavam um pouco. Primeiro, a maioria dos alunos é filha de ex-alunos, o que não só gera um ambiente pouco arejado como ajuda a inflar os resultados do Enem. Segundo, é uma escola de padres, e, ainda que não fosse estritamente religiosa, essa associação com o plano superior nos causava algum desconforto. A terceira foi a que mais nos agradou. Muito rigorosa academicamente, sem ser repressora. Ótimo resultado no Enem, especialmente em matemática, uma área em que mesmo as boas escolas brasileira patinam. Um ambiente estimulante – salas de aula abarrotadas de livros, materiais escolares e trabalhos de alunos. Até o pátio da pré-escola, com coelhos, peixes e tartarugas, é um ambiente de estimulação, de abertura para o mundo. Havia uma consistência muito grande entre o discurso e a prática, e via-se que havia atenção ao detalhe (até o tipo de bolo que o aluno pode trazer em seu dia de aniversário é pensado. Essa atenção ao detalhe é um bom indicador de qualidade de qualquer instituição). E a grande maioria dos alunos entra na escola por sorteio. Ainda que obviamente haja um recorte por renda, já que a mensalidade não é barata, é um bom sinal: é mais difícil ter um bom desempenho acadêmico quando a origem dos alunos não é tão controlada. Essa, então, foi a escola que escolhemos, mesmo que o sorteio não nos tenha sido generoso (levamos dois anos para conseguir entrar).
         Por mais que esse processo tenha sido longo e angustiante, sei que ele marca o começo dessa caminhada, não o seu fim. Pretendo ser um pai presente, que acompanha o que se passa no dia a dia da escola e discute com os filhos, como a pesquisa recomenda. Mas de casa, a distância, sem fazer a tarefa dos meninos, deixando que eles quebrem um pouco a cabeça, frustrem-se, que se esforcem muito, que entendam o valor do trabalho, da perseverança, da paciência e do foco. Pelo menos esse é o meu plano racional. Se o coração de pai vai deixar, isso eu conto para vocês daqui a uns anos.”.

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 639 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tanta sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento -  estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que permita a partilha de suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. E ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...
             



segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

A CIDADANIA, OS CONFLITOS MUNDIAIS, A VERDADE, O BEM E A LIBERDADE

“Direito internacional e os conflitos mundiais
        
         Até a Segunda Guerra Mundial, as preocupações e atenções dos países e, por consequência, do direito internacional eram, fundamentalmente, a coexistência pacífica entre as nações e a manutenção da paz e da segurança internacionais. Depois, com a diminuição, ou quase desaparecimento das guerras entre Estados, as atenções se voltaram para a cooperação econômica e assumiram papel de relevo, em nível global, as organizações internacionais de cooperação e integração econômica, tais como a União Europeia, o Nafta, a Comunidade Andina de Nações, o Mercosul e a Asean, entre outras.
         Não obstante os avanços em direção à paz e os esforços no sentido da distribuição da riqueza, a vida não ficou melhor para ninguém, em nenhum lugar do mundo. As guerras e disputas entre nações deram lugar aos conflitos internos, e pelas razões mais abjetas como a cor da pele, as crenças religiosas, políticas, ideológicas, assim como pertencer a grupos, tribos e etnias diferentes e rivais, ou simplesmente por estar do outro da rua no momento errado.
         De 1989 a 2013, o número de mortes aumentou expressivamente no Sul e Centro da Ásia, assim como na África Subsaariana, no Norte e Leste da África e também na Europa e nas Américas. A violência, não apenas sexual, contra mulheres acima dos 15 anos cresceu desmesuradamente, não apenas na Índia e Brasil, mas, especialmente, na Etiópia, Peru, Bangladesh, Tanzânia, Tailândia, Namíbia, Servia, Montenegro e no Japão. Em todos os países da África Central ainda há registros de mutilação genital feminina de crianças a partir dos 2 anos. Muitas morrem em decorrência das infecções e doenças que se instalam nas feridas. E isso tudo bem debaixo dos nossos olhos.
         O abuso sexual contra meninos é também um motivo de preocupação. O clima geral de impunidade na grande maioria dos países, especialmente na África e no Oriente Médio, e de vácuo no Estado de direito afetam e comprometem a denúncia da violência e abuso sexual contra crianças às autoridades e, por conseguinte, a condenação dos perpetradores. De acordo com relatório da ONU, de julho de 2009, os autores desses crimes estão ligados ao poder local (ao governo), são eleitos pelo povo, são policiais, militares, assim como membros de grupos armados ilegais e de gangues criminosas.
         No Afeganistão, Paquistão, Iraque e países vizinhos, escolas e seus equipamentos são queimados. Quando não queimados ou destruídos dá-se o fechamento forçado ou o uso das instalações para fins de guerra interna. Ataques, combates e explosões de engenhos improvisados nas proximidades de prédios escolares e ataques de militares e ameaças contra os alunos e o pessoal docente têm aumentado de 2010 para cá. Esses incidentes são largamente perpetrados por grupos de oposição aos governos, como também por elementos conservadores em comunidades que se opõem à educação de meninas e mulheres.
         Não bastasse, atos criminosos são praticados contra os órgãos de ajuda humanitária (internos e internacionais), cujo objetivo é justamente atender as crianças e os civis detidos em campos de prisioneiros, ou os refugiados que se socorrem do país vizinho. O uso de técnicas duras de interrogatório e confissão forçada de culpa ainda são os recursos mais usados em grande parte dos países, tanto pela polícia quanto pelos grupos de guerrilhas.
         Relatório de 2010 da ONU revela que gangues da América Central estão cada vez mais transnacionais. Acredita-se que entre 8 mil e 10 mil membros dessas gangues operam em 38 estados dos EUA. Mais de 1,8 mil de seus membros foram presos nos Estados Unidos desde 2005. Em um caso recente, os líderes de uma gangue foram acusados de ordenar o assassinato de pessoas, nos EUA, a partir de sua cela na prisão de El Salvador.
         A violência no México e no Brasil não é apenas uma ameaça aos seus nacionais, é um questão de segurança internacional que atinge a todos. A criminalidade relacionada com os cartéis é um desafio que a polícia, nos dois países (e em outros latino-americanos), não encontra os meios para debelar.
         Relatório econômico da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 2013, revela que as políticas dos últimos anos posicionaram bem os países em desenvolvimento em termos de resultados macroeconômicos e financeiros. Porém, o crescimento econômico continua insuficiente e ainda resta muito a ser feito para tornar a vida das pessoas mais digna e segura. Não há outro caminho para acelerar a produtividade e melhorar as condições de vida das camadas mais desfavorecidas senão diminuir a criminalidade. Para tanto, são necessárias reformas de âmbito institucional, já que muitos dos problemas estão relacionados entre si.
         Essas necessidades são de conhecimento de todos nós. Não há saída sem reformas imperiosas visando o fortalecimento da educação, ao desenvolvimento de habilidades e do empreendedorismo, à redução da regulamentação comercial e da concorrência e à melhoria da legislação e do combate à corrupção, ao narcotráfico e à impunidade.
         Como se vê, mesmo com todos esses avanços e o fortalecimento do direito e das relações internacionais, o século 21 trouxe consigo a crise dos direitos humanos. O mundo ficou chocado por pouco tempo depois da tentativa de assassinato de Madala Yousafzai – símbolo global da luta de todas as meninas pela educação (em janeiro de 2013) – pelos fundamentalistas islâmicos. Contudo, de lá para cá a situação não melhorou e as pessoas continuam morrendo naquela parte do mundo e em muitas outras. E morrem simplesmente por não estar alinhadas com aqueles que naquele momento têm as armas na mão, e ousam desafiar preceitos, dogmas, ideologias ou, simplesmente, por pensar e ser diferente.”

(MARISTELA BASSO. Advogada, professora de Direito Internacional da Universidade de São Paulo (USP), em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 14 de fevereiro de 2014, caderno DIREITO & JUSTIÇA,   página 3).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral:

“Verdade, bem e liberdade
        
         A perda do laço essencial entre verdade, bem e liberdade na cultura contemporânea é a explicitação do caos moral que vai afundando a sociedade em acontecimentos assustadores. Os fenômenos em torno de violências, justiça com as próprias mãos, corrupção, fundamentalismos, entre outros, são resultado da perda deste laço fundamental. Sua recuperação é um longo caminho a percorrer. Sua urgência deve motivar os mais variados segmentos da sociedade, desde o recôndito da privacidade familiar, passando pelas igrejas e escolas, até ações governamentais em diferentes níveis, em um investimento mais consistente e permanente.
         O dia a dia da sociedade sem comprometimento com a verdade, o bem o autêntico sentido de liberdade pode trazer comprometimentos irreversíveis. O que se vê é um crescente processo de desumanização, com graves consequências para a vida, de todos e impactos na formação dos mais jovens. Assim, a ausência do laço essencial entre verdade, bem e liberdade impede que sejam dados novos passos no presente e também engessa a sociedade do amanhã. Muitos se acostumam com os relatos de violência nos noticiários e até, de certo modo, os esperam a cada dia, cultivando o gosto pelo hediondo. Alguns se sentem privilegiados, por não serem alvos ou vítimas, e se comportam como meros espectadores do caos que vai se implantando na sociedade. No entanto, o aumento crescente dessa violência é um risco para todos, mesmo para os que estão nos seus bunkers de defesa e comodidades.
         Não basta apenas um olhar sociológico e estrategista sobre essa situação. Providências e encaminhamentos advindos dessas análises são importantes. Contudo, o essencial é trabalhar pelo recuperação da perda do laço essencial entre verdade, bem e liberdade. Há, pois, uma questão de ordem moral pesando sobre os ombros de todos nessa luta de recomposição da sociedade. Quando se considera, por exemplo, o mundo da política, a luta por reforma política, obviamente que não basta legislar de modo novo e diferente, embora necessário. É prioritário poder contar com homens e mulheres à altura de exercícios cidadãos, superando o comum de fazer da política um canal para atendimentos de interesses partidários  e de grupos endinheirados.
         Os atrasos na sociedade são incontáveis, atingindo as instituições na sua identidade e missão, desfigurando o sentido de cidadania que se sustenta na verdade, no bem e na vivência autêntica da liberdade. O investimento prioritário, portanto, é na ordem moral. Essa ordem não se enquadra na permissividade de posicionamentos religiosos, políticos e sociais, nem nos rigores fundamentalistas dos que se elegem como os iluminados e donos da verdade. Urge um investimento permanente e consistente na ordem moral. Do contrário, não se vai conseguir debelar o processo que está levando a sociedade a resvalar na direção de um caos maior.
         Que absurdos ainda não foram presenciados? Repassar essa lista até desanima. A sensibilidade moral é o remédio para combater o que o papa Francisco chama de globalização da indiferença e o veneno da idolatria do dinheiro. A sociedade, por falta de aprofundado sentido moral, está sendo, passo a passo, conduzida por diferentes tiranias. Da tirania nascida da ganância que gera a insaciabilidade das riquezas àquelas novas tiranias, invisíveis, às vezes virtuais, que impõem suas leis e suas regras, cristalizando grupos radicais, de todo tipo, até religiosos, contribuindo na complicação que a sociedade contemporânea está vivendo.
         A verdade, o bem e a liberdade, como laço essencial da moralidade, devem ser o horizonte inspirador cotidiano de ações, programas e testemunho individual, em casa, na igreja, na escola, nas empresas, nas ruas, em todo lugar. É preciso libertar a sociedade contemporânea dos excessos de uma cultura em que cada um pretende ser portador de uma verdade subjetiva própria. Razões meramente políticas não inspirarão ações condizentes, neste momento, na busca urgente de soluções para mudar os cenários de exclusão e desigualdades, fontes de violências e disputas que se travam até mesmo sem se ter certeza a respeito de qual bandeira se está defendendo.
         As reações violentas tenderão a crescer por parte dos excluídos do sistema social e econômico, que é injusto na sua raiz. O avanço na direção de indispensável equilíbrio, para não inviabilizar a sociedade, supõe a convicção de que é preciso investir sempre e em todos os níveis na recuperação da força moral. Cada cidadão deve ser depositário dessa força, fazendo com que a sociedade redescubra que seu sustento e progresso dependem do respeito incondicional à verdade, o compromisso com o bem moral e a permanente aprendizagem  quanto à fragilidade e limites da liberdade humana.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, indubitavelmente irreversíveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 639 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...