“DESVANTAGEM
NA LARGADA
O
novo plano do MEC para garantir alfabetização a todas as crianças prevê que
elas cheguem lá até os 8 anos – meta que nos coloca atrás das nações mais
desenvolvidas
A educação brasileira
atravessou os séculos numa zona de sombra em que não se sabia nem mesmo quantas
escolas havia no país – muito menos em que nível elas estavam e aonde deveriam
chegar. O vasto rol de termômetros e rankings do ensino tratou de sepultar esses
tempos mais obscuros e abriu espaço na sala de aula para um hábito ao qual o
Brasil ainda não é tão afeito: o de traçar de metas. Na semana passada, uma
delas – da mais suma importância – passou pelo crivo da Câmara dos Deputados e
agora aguarda a apreciação do Senado. Trata-se da medida provisória federal que
estabelece que toda criança seja alfabetizada até os 8 anos de idade –
“prioridade das prioridades” para o ministro da Educação, Aloizio Mercadante.
Com 1,4 milhão de crianças entre 7 e 14 anos ainda iletradas no país, não há
dúvida de que a iniciativa, inédita, toca em um nó que, se desatado, terá
efeitos positivos de longuíssimo alcance. Mas também lança um ponto de
interrogação sobre uma questão à qual pouco se atentou durante todo o debate –
e é crucial: por que esperar de crianças de escolas públicas que se alfabetizem
até os 8 anos, quando nos colégios particulares, assim como em todo o mundo
desenvolvido, elas chegam lá, no máximo, ao 7?
A diferença de expectativas tende a agravar o
abismo que já separa a rede pública da rede privada no Brasil, temem os
especialistas ouvidos por VEJA. E essa discrepância pode se fazer sentir não só
no princípio, mas por todo o ciclo escolar. Um estudo do americano James
Heckman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, mostra que, quanto mais cedo a
criança recebe estímulos cognitivos, menos tempo ela precisa para reter novos
conhecimentos. Se já reúne um repertório razoável de palavras, suas chances de
avançar no saber crescem exponencialmente. “Quem sabe mais aprende mais, num
ciclo virtuoso que devemos estender a todos”, resume Heckman. “Aceitar logo de
saída que uma criança seja alfabetizada mais tarde do que outra aniquila a
ideia de que a sala de aula deve gerar oportunidades iguais para todos. Só
agrava o apartheid educacional que já distancia alunos de escolas públicas e
privadas”, enfatiza Claudia Costin, secretária municipal de Educação do Rio de
Janeiro, onde pais e professores selaram um pacto comprometendo-se a fazer a
sua parte para que todos saibam ler até o fim do 1º ano do ensino fundamental –
em média, aos 6 anos.
Vista como um todo, a
medida provisória, que custará ao governo 2,7 bilhões de reais até 2014,
ancora-se em pilares acertados: estabelece prazos, avalia resultados, premia os
melhores. No pacote, está sendo formulado um currículo nacional que vai nortear
as aulas do 1º ao 3º ano. A existência de um roteiro para o professor ensinar é
das iniciativas de maior resultado na sala de aula – mas, por um misto de
inépcia de autoridades e resistência de uma ala de educadores que se vê tolhida
na sua liberdade de ensinar, é ainda rara nas redes públicas. Também se prevê
que os 360 000 professores alfabetizadores sejam remunerados para reforçar seus
estudos aos sábados e recebam livretos com estratégias para ensinar, área que
boa parte das faculdades de pedagogia apenas tangencia, ou ignora. O MEC
aplicará ainda uma prova para aferir o nível de conhecimento dos alunos ao
final do 3º ano. E as escolas que se saírem melhor receberão um bônus. Os 26 estados
e mais de 5 000 municípios que até agora assinaram o chamado Pacto Nacional
pela Alfabetização terão direito a verbas.
Em 2012, o MEC enviou
ao Conselho Nacional de Educação o novo currículo para os primeiros anos do
ensino fundamental. Seu conteúdo ainda não veio a público, mas especialistas
que já se debruçaram sobre o documento alertam para o fato de que lhe falta
objetividade. “É confuso e pouco assertivo quanto às exigências”, observa a
especialista Ilona Becskeházy, que se deteve sobre currículos de países como
Portugal e Canadá, segundo ela muito mais específicos em relação às
expectativas de aprendizado. “Precisamos
de uma vez por todas definir quais habilidades devem ser assimiladas, ano a
ano”, reforça Maria Helena Guimarães, presidente da Fundação Seade, em São
Paulo. Ainda há tempo para lapidar o texto final. Vale o empenho. Hoje, apenas
um de cada quatro brasileiros adultos é considerado plenamente alfabetizado –
ou seja, consegue depreender sentido de um texto mais complexo. Só com muita
ambição acadêmica será possível reverter cenário tão desolador.”
(NATHÁLIA
BUTTI, em reportagem da revista VEJA, edição
2311 – ano 46 – nº 10, de 6 de março de 2013, páginas 96 e 97).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo e edição, página
20, de autoria de CLAUDIO DE MOURA
CASTRO, que é economista, e que merece igualmente integral transcrição:
“A
mágica da educação
Vale a pena refletir
sobre o elo entre a educação e o que acontece com nossa vida profissional. Sabemos
que, ao deixar a escola e encontrar um emprego, o número de anos de estudo é o
mais poderoso determinante do que vamos ganhar. Como regra geral, quanto mais
se estuda, mais o salário inicial é elevado – embora varie de acordo com a
oferta e a procura de competências. Se acreditamos que o contracheque reflete a
nossa contribuição para a produtividade da empresa, os anos de estudo são a
maior fonte de progresso. É o que Adam Smith dizia e que já foi exaustivamente
medido.
De
fato, quanto maior o estoque de educação com o qual iniciamos a vida
profissional, mais ganhamos. Ou seja, no dia em que pleiteamos um emprego, o
mercado valoriza o que aprendemos na escola. Portanto, há boas razões para a
escola ensinar bem aquilo que conta para um bom desempenho profissional.
Mas os
números contam mais histórias. Quem estudou pouco ou nada não só começa com um
salário medíocre, mas permanece a vida toda atolado no mesmo nível. Já para os
que têm mais educação, no curso da sua vida profissional, o salário pode
duplicar ou triplicar. Esses aumentos são espantosamente maiores do que o
benefício de entrar mais educado no mercado de trabalho – no caso, comparado
com quem tem menos escolaridade.
Nosso primeiro
salário reflete aqueles conhecimentos que a escola nos deu e que o mercado
valoriza. É fácil entender. Mas o que explicaria o avanço ao longo da carreira,
se já havíamos parado de estudar? Como esquecemos muito do aprendido na escola,
até não seria absurdo pensar que o salário encolheria.
Em boa
medida, as empresas remuneram de acordo com a capacidade de produzir de cada um
– e com a escassez relativa daquele perfil de mão de obra, mas não precisamos
aqui entrar nesses complicadores. Se pagam cada vez mais, ao longo da nossa
carreira, se o salário segue crescendo, isso significa que nos tornamos mais
produtivos. É forçoso concluir que, de alguma forma, continuamos aprendendo.
Ficamos mais educados, apesar de não estarmos mais na escola.
Em
outra palavras, os aumentos ao longo dos anos só podem ser explicados pela
capacidade de aprender com a experiência vivida. Esse amadurecimento ao longo
da vida – fortemente influenciado pela nossa educação formal prévia – metamorfoseia-se
em maior produtividade. Eis a mágica da educação!
Visto
de outra maneira, o que aprendemos na escola e tem uso imediato aumenta os
salários, mas não tanto. Conta mais o que aprendemos depois. Logo, seja do
ponto de vista individual, seja do da empresa, o aprendizado mais valorizado
economicamente é aquele que se dá durante a vida profissional, não antes. Essa
conclusão, além de curiosa, não é sem consequências.
Tudo o
que puder ser feito para maximizar o aprendizado ao longo de nossa carreira se
traduz em avanços nos rendimentos. É importante lembrar, conta a qualidade da
educação que tivemos. Não são quantos fatos e fórmulas decoramos, mas a
capacidade de ler, escrever, pensar, decifrar o mundo ao nosso redor, bem como
identificar e encontrar soluções para os problemas que vão aparecendo.
Pela
vida afora, ajudará tudo o que possa facilitar, incentivar e promover o
aprendizado, até o máximo condizente com o potencial de cada um. Ajudam os
cursos, mentores, estágios ou grupos de discussão. Essa é a boa tese da
Educação Permanente. Mas nem tudo vem de fora. Também funciona o esforço
próprio, autodidata, de maneira totalmente informal. E, mais ainda, avançamos
mercê de uma insaciável curiosidade e de uma atitude de sempre fazer perguntas
e procurar respostas. O que importa é a busca incansável de formas de alimentar
a nossa sede de conhecimentos e de novas soluções.
Nossa
carreira depende do esforço para continuar a aprender. O tesouro da educação
não está no diploma e no que ensinou a
escola, mas sim no que ela nos permite crescer depois.”
Eis, pois, mais páginas contendo importantes,
pedagógicas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior
crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas
educacionais, governamentais, jurídicas,
políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de
modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente
desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade
absoluta de nossas políticas públicas;
b) o
combate, severo e sem trégua, aos
três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente e
diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar
por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e
comprometimentos de variada ordem; III – o desperdício,
em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e
danos, indubitavelmente irreparáveis;
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2013, segundo o Orçamento Geral da União, de astronômico e
intolerável desembolso de cerca de R$ 1
trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos
(apenas com esta rubrica, previsão de R$ 610 bilhões), a exigir igualmente uma
imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...
Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tanta
sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa
capacidade de investimento e de poupança e, mais grave ainda, afeta a
credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de extremas e sempre crescentes necessidades
de ampliação e modernização de
setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); educação;
saúde; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); saneamento ambiental (água tratada,
esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística
reversa); meio ambiente; habitação;
emprego, trabalho e renda; assistência social; previdência social; segurança
alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal;
defesa civil; minas e energia; agregação
de valor às commodities; turismo; logística; sistema financeiro
nacional; comunicações; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e
inovação; esporte, cultura e lazer; qualidade (planejamento, eficiência, eficácia,
efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade),
entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente justa, ética, educada, civilizada,
qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que
possa partilhar suas extraordinárias riquezas, oportunidades e potencialidades
com todas as brasileiras e com todos os brasileiros, especialmente no
horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como
a 27ª Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro em julho; a Copa das
Confederações em junho; a Copa do Mundo de 2014; a Olimpíada de 2016; as obras
do PAC e os projetos do pré-sal, segundo as exigências do século 21, da era da
globalização, da internacionalização das empresas, da informação, do
conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um
possível e novo mundo da justiça, da
liberdade, da paz, da igualdade – e com
equidade –, e da fraternidade
universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...
O
BRASIL TEM JEITO!...