“A
gestação do povo brasileiro, a universidade e o saber popular
O povo brasileiro ainda
não acabou de nascer. Vindos de 60 países diferentes, aqui estão se mesclando
representantes desses povos num processo
aberto, todos contribuindo na gestação de um povo novo que um dia acabará de
nascer.
O que
herdamos da Colônia foi um estado altamente seletivo, uma elite excludente e
uma imensa massa de destituídos e descendentes de escravos. Mas, apesar desse
constrangimento histórico-social, no meio dessa massa enorme, maduraram
lentamente lideranças e movimentos que propiciaram o surgimento de todo tipo de
comunidades, associações, grupos de ação e de reflexão.
Do exercício
democrático no interior desses movimentos nasceram cidadãos ativos; da
articulação entre eles está nascendo uma energia geradora que lentamente chega
à consciência de sua história e projeta um futuro diferente e melhor para
todos.
Nenhum
processo dessa magnitude se faz sem
aliados, sem a ligação orgânica daqueles que manejam um saber especializado com
os movimentos sociais comprometidos. É aqui que a universidade é desafiada a
alargar o seu horizonte. Importa que os mestres e alunos frequentem a escola
viva do povo e permitir que gente do povo possa entrar nas salas de aula.
Essa
visão supõe a criação de uma aliança entre a inteligência acadêmica com a
miséria popular. Todas as universidades se tornaram o lugar clássico da
problematização da cultura, da vida, do homem, de seu destino e de Deus. As
duas culturas –, mais e mais, se intercomunicam no sentido de pensar o todo, o
destino do próprio projeto científico e técnico face às intervenções que faz na
natureza e sua responsabilidade pelo futuro comum da nação e da Terra. Tal
desafio exige um novo modo de pensar que não segue uma lógica do simples e
linear, mas com do complexo e do dialógico.
As
universidades são urgidas a buscar um enraizamento orgânico nas periferias, nas
bases populares e nos setores ligados diretamente à produção. Aqui pode se
estabelecer uma fecunda troca de saberes, entre o popular e o acadêmico; dessa
aliança surgirão seguramente novas temáticas teóricas nascidas do confronto com
a antirrealidade popular e da valorização da riqueza incomensurável do povo na
sua capacidade de encontrar, sozinho, saídas para os seus problemas.
Desse
casamento se acelera a gênese de um povo; permite um novo tipo de cidadania,
baseada na concidadania dos representantes da sociedade civil e acadêmica e das
bases populares que tomam as iniciativas por si mesmos e submetem o Estado a um
controle democrático.
Nessas
iniciativas populares, os movimentos sociais sentem necessidade de um saber
profissional. É onde a universidade pode e deve entrar, socializando o saber.
Desse
ir e vir fecundo entre pensamento universitário e saber popular pode surgir o
biorregionalismo com um desenvolvimento
adequado àquele ecossistema e à cultura local. A partir dessa prática, a
universidade resgatará seu caráter de servidora da sociedade.
Esse
processo dinâmico e contraditório só prosperará se estiver imbuído de um grande
sonho: de ser um povo novo, autônomo, livre e orgulhoso de sua terra.
Apesar
de todas as tribulações históricas, o povo brasileiro nunca perdeu sua
autoestima e o encantamento do mundo. É um povo de grandes sonhos.
Talvez
seja essa visão encantada do mundo uma das maiores contribuições que nós,
brasileiros, podemos dar à cultura mundial emergente, tão pouco mágica e tão
pouco sensível ao jogo, ao humor e à convivência dos contrários.”
(LEONARDO
BOFF. Filósofo e teólogo, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 7 de
março de 2014, caderno O.PINIÃO, página
18).
Mais uma importante e oportuna contribuição para o
nosso trabalho de Mobilização para a
Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 28 de abril
de 2014, caderno OPINIÃO, página 9,
de autoria de CARLOS ALBERTO DI FRANCO, diretor
do master em jornalismo, professor de ética e doutor em comunicação pela
Universidade de Navarra (Espanha), e que merece igualmente integral transcrição:
“Jornalismo
com alma
Antes da era digital,
em quase todas as famílias existia um álbum de fotos ou uma caixa de sapatos
cheia de fotografias. Lá estavam as nossas lembranças, os nossos registros
afetivos. Muitas vezes abríamos o álbum ou a caixa e a imaginação voava. Era
bem legal.
Agora,
fotografamos tudo e arquivamos compulsivamente. Nossa antiga caixa de sapatos
foi substituída pelas galerias de fotos de nossos dispositivos móveis. Temos
overdose de fotos, mas falta o mais importante: a memória afetiva, a curtição
daqueles momentos. Fica para depois. E continuamos fotografando e arquivando.
Pensamos, equivocadamente, que o registro do momento reforça sua lembrança, mas
não é assim. Milhares de fotos são incapazes de superar a vivência de um
instante. É importante guardar imagens. Mas é muito mais importante viver cada
momento com intensidade.
Algo
análogo, muito parecido mesmo, ocorre com o consumo da informação. Navegamos
freneticamente no espaço virtual. Uma enxurrada de estímulos dispersam a
inteligência. Ficamos reféns da superficialidade. Perdemos contexto e
sensibilidade crítica. A fragmentação dos conteúdos pode transmitir certa
sensação de liberdade. Não dependemos, aparentemente, de ninguém. Somos os
editores do nosso diário personalizado. Será? Não creio, sinceramente. Penso
que há uma crescente nostalgia de conteúdos editados com rigor, critério e
qualidade técnica e ética. Há uma demanda reprimida de reportagem. É preciso
reinventar o jornalismo e recuperar, num contexto muito mais transparente e
interativo, as competências e a magia do jornalismo de sempre. É preciso olhar
para trás para dar saltos consistentes.
“Hoje”,
dizia Nelson Rodrigues, “ninguém imagina o que eram as velhas gerações
românticas da imprensa. Mudaram o jornal e o leitor. No ano passado, houve uma
chuva inédita, uma chuva bíblica, flagelando a cidade. Desde Estácio de Sá não
víamos nada parecido. E todo mundo morreu e desabou, e se afogou, menos o
repórter. Não houve uma única baixa na reportagem. Fez-se toda a cobertura do
dilúvio e ninguém ficou resfriado, ninguém espirrou, ninguém apanhou uma reles coriza.
Por aí se vê que há, entre a nossa imprensa moderna e o fato, uma distância
fatal. O repórter age e reage como um marginal do acontecimento. Antigamente,
não. Antigamente, o profissional sofria o fato na carne e na alma.”
Jornalismo
sem alma. É o diagnóstico de uma doença que contamina inúmeras redações. O
leitor não sente o pulsar da vida. As reportagens não têm o cheiro do asfalto.
As empresas precisam repensar os seus modelos e investir poderosamente no
coração. É preciso dar novo brilho à reportagem e ao conteúdo bem-editado,
sério, preciso, isento.
É
preciso contar boas histórias. Com transparência e sem filtros ideológicos. O
bom jornalista ilumina a cena, o repórter manipulador constrói a história. Na
verdade, a batalha da isenção enfrenta a sabotagem da manipulação deliberada,
da preguiça profissional e da incompetência arrogante. Todos os manuais de
redação consagram a necessidade de ouvir os dois lados de um mesmo assunto. Mas
alguns procedimentos, próprios de opções ideológicas invencíveis, transformam
um princípio irretocável num jogo de aparência.
A
apuração de mentira representa uma das mais graves agressões à ética e à
qualidade informativa. Matérias previamente decididas em guetos sectários
buscam a cumplicidade da imparcialidade aparente. A decisão de ouvir o outro
lado não é honesta, não se apóia na busca da verdade, mas num artifício que
transmite um simulacro de isenção, uma ficção de imparcialidade. O assalto à
verdade culmina com uma estratégia exemplar: repercussão seletiva. O pluralismo
de fachada, hermético e dogmático, convoca pretensos especialistas para
declarar o que o repórter quer ouvir. Mata-se a notícia. Cria-se a versão.
Resultado:
a credibilidade, verdadeiro capital de um veículo, se esvai pelo ralo dos
preconceitos. O jornalismo precisa recuperar a vibração da vida, o cara a cara,
o coração e a alma.”
Eis, portanto, mais páginas contendo importantes,
adequadas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise
de liderança de nossa história – que é de ética,
de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas
educacionais, governamentais, jurídicas,
políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de
modo a promovermos a inserção de nosso País no concerto das potências mundiais
livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente
desenvolvidas...
Assim, urge ainda a efetiva problematização de
questões deveras cruciais como:
a) a
educação – universal e de qualidade, desde
a educação infantil (0 a 3 anos de
idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo
da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira
série do ensino fundamental, independentemente
do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação
(especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade
absoluta de nossas políticas públicas;
b) o
combate, implacável e sem trégua,
aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente,
competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares
civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da
vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária
ordem; III – o desperdício, em todas
as suas múltiplas modalidades, também a
ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;
c) a
dívida pública brasileira, com
projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e
insuportável desembolso de cerca de R$ 1
trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos
(apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir igualmente uma
imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...
Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão
descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a
nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta
a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e
regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores
como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias,
hidrovias, portos, aeroportos); a educação;
a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos
sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana
(trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às
commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência
social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas;
polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência,
tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer;turismo; comunicações;
qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –,
transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade,
produtividade, competitividade); entre outros...
São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que,
de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem
arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta
grande cruzada nacional pela cidadania e
qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada,
civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e
solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas,
oportunidades e potencialidades com todas
as brasileiras e com todos os
brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários
previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016;
as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da
era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do
conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um
possível e novo mundo da justiça, da
liberdade, da paz, da igualdade – e com
equidade –, e da fraternidade
universal...
Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a
nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...
O
BRASIL TEM JEITO!...