quarta-feira, 14 de maio de 2014

A CIDADANIA, A INTELIGÊNCIA NAS RELAÇÕES HUMANAS E A COPA DAS CIVILIDADES

“Inteligência relacional

       No início da história da humanidade, a ideia de valor esteve ligada a algo, objeto de escolha ou de preferência, sem que houvesse nenhuma discussão mais detalhada sobre o que era isso. Estava vinculada a quando algo era desejado. Depois disso, a palavra foi usada na Antiguidade para indicar a utilidade e o preço dos bens materiais e a dignidade e o mérito das pessoas. Por não suscitar muitos problemas de natureza filosófica, a palavra foi aceita dessa forma em todas as culturas, com uma ou outra observação feita pelas escolas filosóficas. Tais observações foram desde aqueles que a queriam vincular exclusivamente às transações comerciais, até os que a viam com total subjetividade, estabelecendo-a como sinônimo de virtude.

          De forma geral acabou-se por entendê-la como os conteúdos significativos das coisas em suas características objetivas, por exemplo, raridade, escassez, o verdadeiro, o honesto, o heroico e o prazeroso. Nessa discussão, os psicólogos e sociólogos do fim do século 19, embora afirmassem que não se poderia ter uma lei universal de conduta, julgavam que era possível determinar a ordem dos valores que devem ser preferidos nas escolhas individuais. Nessas escolhas estão, por exemplo, coisas de caráter afetivo e sentimental, o que fez com que os teóricos do assunto postulassem a necessidade de classificar os valores em termos de internos e externos. Internos aqueles que se referem ao que é significativo para a pessoa em decorrência de suas experiências, afetos e vínculos. Externos aqueles que a sociedade legitima e declara, nem sempre sendo capaz de realizá-lo. Por isso, muito do que se tem como valor externo fica no domínio da utopia.

          No entanto, aquilo que é digno de escolha deve ser preferido em termos coletivos, antes que em termos individuais. Tal postulado levou à construção do entendimento de que os valores têm naturezas obrigatórias e preferenciais. As obrigatórias estão associadas às virtudes defendidas a partir da lei da moral universal – verdade, honestidade, vida, coragem, integridade, dignidade – e são determinantes da relação dos indivíduos consigo mesmos e com a sociedade e que servem de forma objetiva, às avaliações que se fazem deles. As preferenciais, associadas à identidade da pessoa, dizem respeito a saúde, beleza, força, riqueza, fama, nobreza. Essas, de caráter pessoal, podem ser diferentes de pessoa para pessoa, mas não devem intervir na “virtude” dos relacionamentos. Dessa forma, a ideia de valor, do ponto de vista objetivo, manteve-se vinculada a uma visão econômica e sobre tal não há muito a ser dito, porque o senso comum é suficiente. No entanto, na perspectiva da subjetividade, valor está ligado à quantidade de significado que atribuo às coisas da minha vida em particular: o relógio do vovô, o sapatinho da primeira filha, a foto do batizado, aquela concha colhida na primeira viagem com a namorada etc.

          No filme Riquinho (Rich Rich, Warner Bros, 1994, dirigido por Donald Petrie), uma ficção infantil que conta a história do menino mais rico do mundo, há um caso bem ilustrativo da ideia de valor. O vilão da história tenta roubar o cofre da família Rico. Ao abri-lo, descobre que dentro só tem quinquilharias do tipo carrinho de bebê, a primeira chupeta, o dentinho de leite etc. Ao confrontar o Sr. Rico, pai do Riquinho, o vilão pergunta onde estão os dólares, as cartas de crédito, as ações, as jóias etc. O Sr. Rico responde: “Nos bancos. Aqui no caixa-forte doméstico só guardamos o que tem valor para nós”.

          Valor é o reconhecimento do que é significativo. Em muitos anos de atendimento às pessoas, como coaching, escuto histórias de quem que se queixa da ausência dos pais, do cônjuge etc. Trabalhamos tanto para dar “coisas” aos nossos filhos e aos demais que nos cercam, mas no esquecemos de doar-nos a nós mesmos. Assim é que não me lembro de escutar histórias em que as pessoas lembrem-se da roupa de grife, das viagens ao exterior, etc. Aí me pergunto: quanto trabalho excessivamente, onde está meu senso de valor? Quando não tenho tempo, nem para mim mesmo, onde está meu senso de valor? É preciso lembrar que revelo meus valores nas escolhas que faço.

          Muitas pessoas anseiam por altos salários, posições sociais expressivas, frequentar lugares importantes, serem reconhecidas etc. Diante disso, há que se perguntar a que propósito tais anseios atendem. Estar disposto a lutar por “um lugar ao sol” é uma premissa válida, mas fazer qualquer coisa para isso é não ter valor.

          O que se espera de cada um e de todos nós é que sejamos capazes de construir uma vida com integridade e dignidade que se reconheçam nas práticas da vida e nos relacionamentos que a sustentam. Espera-se que busquemos uma justiça para todos e não apenas para nós; que busquemos qualidade de vida para todos, e não apenas para nós; que lutemos por melhores condições de trabalho para todos, e não apenas para nós. Espera-se honestidade na sociedade, mas que também atuemos com honestidade; que sejamos alvos das benfeitorias sociais, mas que as façamos também; que todos reconheçam seus valores e que também reconheçam os valores dos outros. Que as atitudes mais simples estejam cheias de significado, e não apenas os grandes atos. Que a microvida seja a sustentação das grandes políticas públicas, de modo tal, que nos orgulhemos daquilo que somos e do que fazemos, a ponto de desejar que seja público e que reverta para nós mesmos.”

(HOMERO REIS. Coach, em artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 11 de maio de 2014, caderno MEGACLASSIFICADOSADMITE-SE, coluna MERCADO DE TRABALHO, página 12).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no mesmo veículo, edição de 9 de maio de 2014, caderno OPINIÃO, página 7, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral transcrição:

“Copa das civilidades

       Estamos vivendo a catástrofe do surto de incivilidades, avalanche de barbáries que está assolando nossa sociedade. Constata-se a perda irracional dos limites e, sobretudo, de referências, sem as quais tudo é possível, inclusive escolhas que estão na contramão da cidadania. Aos rosários de lamentações inevitáveis diante dessa cenário desolador, é preciso acrescentar uma efetiva atitude reativa. Somente assim não se permitirá que esse tempo de conquistas admiráveis da inteligência humana se sucumba diante das irracionalidades que geram violências, corrupção, eleições “sujas”, insanidade nas relações interpessoais e uma série de outros desafios que expõem o avanço da desumanização.

          Os números e estatísticas são indispensáveis como instrumento de conscientização e sensibilização. Mas o determinante nessa necessária postura reativa é a identificação das raízes e causas produtoras desses preocupantes cenários. O que se está vivendo é um grande drama social, com perdas de rumo na busca da verdade, no gosto pelo bem e pela justiça. Certamente, aí está um gargalo produtor de situações caóticas. Cada um estabelece e busca impor o seu próprio critério. Os resultados têm sido terríveis, como mostram os episódios em que se busca fazer “justiça com as próprias mãos”. Infelizmente, vivemos um tempo de linchamentos, desentendimentos com desfechos violentos, que muitas vezes resultam em perdas irreversíveis.

          A ordem, enquanto justiça e garantia de respeito irrestrito à dignidade humana, tem um percurso e balizamentos éticos próprios. A perda dessa referência é grave e torna-se um grande desafio chegar às raízes dos males contemporâneos. Fixar o olhar nas bases que instauram a desordem é o passo determinante para promover grandes mudanças. E alcançá-las não se faz sem o que é próprio da fé, como experiência e como caminho para a fonte perene dos valores essenciais. Ela é um patrimônio insubstituível da pessoa, da família e da sociedade, capaz de corrigir rumos e recompor o tecido da cultura.

          É hora de percorrer o caminho da fé. O colapso que se abate sobre nós é uma séria crise de valores em razão da superficialidade que emoldura o viver humano contemporâneo. Só dá conta de alcançar o equilíbrio e a seriedade quem se alimenta diariamente de sólidas referências. A dinâmica da cultura contemporânea tem empurrado a sociedade para o esquecimento de um princípio básico inegociável. Trata-se da justa compreensão de que o essencial está na interioridade, vem das raízes, e não se resume nas coisas colocadas ao nosso redor. Ao ignorar esse princípio, a humanidade alimenta a tempestade que tem gerado naufrágios no percurso da vida. Todos precisam compreender que o essencial está na interioridade. Caso contrário, perde-se o rumo, não se consegue a força necessária para superar adversidades, perde-se o balizamento da ética, escorregando-se na direção de todo tipo de imoralidades. A cultura contemporânea está ficando cega para esse princípio, que se cultiva com a fé.

          Compartilho a experiência vivida por nós, bispos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), reunidos na Assembleia Geral que será concluída hoje. Neste último dia, viveremos um tempo dedicado ao investimento na fundamental experiência da fé. A conclusão da Assembleia será com um retiro, marcado pelas orações, balizando uma carregada pauta de trabalhos, debates, reflexões sobre temas relacionados à evangelização e à construção da sociedade justa e fraterna. Meditaremos à luz de grandes personagens bíblicos, como Abraão, Maria – Mãe de Jesus, Pedro e Paulo. Desse modo, amadureceremos a compreensão  de que é peregrinando na fé que se consegue manter a vida no rumo certo.

          A partir dessa peregrinação, nós, bispos do Brasil, encontramos força e fôlego para produzir, nesses dias de Assembleia, um importante documento que indica o caminho para fortalecer as paróquias e comunidades de fé, presença solidária e comprometida na vida do povo em diferentes realidades, grande capilaridade da Igreja Católica. Também aprovamos rico e corajoso documento sobre a Igreja e a questão agrária brasileira. Não menos importante foi a abertura da reflexão sobre a cidadania de cada cristão na Igreja e sua atuação testemunhal na construção da sociedade. Nessa direção, desenvolvemos nosso Projeto Brasil, cujo coração é a continuação da luta pela reforma política. Em resposta à crescente violência, foi aprovada, por unanimidade, a vivência do Ano da Paz, do dia 30 de novembro de 2014 até o Natal de 2015, quando serão promovidas ações para mudar esse triste cenário de desumanidades.

          O grande volume de assuntos tratados, encaminhamentos e compromissos assumidos nos confirmam, às vésperas da Copa do Mundo, que é hora de avaliações e escolhas de rumos novos, uma prolongada copa de civilidades. Se não jogarmos essa copa, não venceremos. É hora de chutar a bola que desfigura a civilidade. Caso contrário, perderemos o jogo pela vida. Os cenários que horrorizam nossa sociedade só serão vencidos se conseguirmos, com a graça da fé alimentando nossa cidadania e o respeito à dignidade humana, jogar uma copa de civilidades.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

a)    a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;

c)    a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que permita a partilha de suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...

O BRASIL TEM JEITO!...

segunda-feira, 12 de maio de 2014

A CIDADANIA, A CURA PLANETÁRIA E A DEMOCRACIA DE ESPECTADORES

“Existe um trabalho de cura planetária
        
          Há algum tempo, estava passando uns dias em uma grande cidade, onde o rumor de fundo é constante e as pessoas andam pelas ruas preocupadas. A certa altura comecei a sentir algo estranho, como se houvesse um peso sobre mim, provocando certa pressão.
         A princípio não entendi a origem nem o significado daquilo. Essa sensação durou alguns dias até que, em certo momento, procurei interiorizar-me. A pressão aumentava, entretanto prossegui na concentração até sentir meu centro interno – que não é um lugar, mas um “ponto” na consciência, onde se fica quieto, em silêncio. Ali permaneci. Por fim, comecei a ter clareza sobre o que estava acontecendo. Vi que a pressão vinha de fora, não era provocada por coisas minhas. Decorre do estado psíquico coletivo, de uma condição geral, era algo que “estava no ar”.
         “Fazer o que, diante disso?”, perguntei-me. O que estava a me pressionar era a situação planetária – a situação dos povos e nações, algo que não dizia respeito a um lugar específico, mas ao planeta todo.
         No quarto em que me encontrava entravam os tons do crepúsculo, enquanto a cidade, longe de se acalmar, emitia rumores ainda mais fortes. De repente, percebi que havia uma forma de ser útil nessa situação. Vi que o amor pelos que me cercavam naquela cidade, pelos que ali se locomoviam em inúmeras direções, a ligação com a essência eterna presente em todos, trazia-me nova força e clareza.
         Ali, em serena quietude, tive a impressão de que não era por vias materiais que os problemas do mundo seriam transformados. Dos níveis concretos, a solução não viria, porque nesses níveis e suas construções mentais, emocionais e físicas estão aí para serem transformados por energias provindas do Alto, que têm função saneadora.
         Conhecia pessoas que não conseguiram sair de estados de angústia enquanto insistiram em resolvê-los concentrando-se apenas nos níveis materiais da existência. Voltados para o mundo denso, não podiam afastar-se da situação caótica em que o planeta se encontra; porém, tão logo começaram a coligar-se com fatos sutis e amplos, foram entrando em harmonia.
         Desde o princípio da Terra houve seres humanos conscientes desses níveis superiores; seres dedicados ao trabalho de colocar a mente, o coração e o próprio modo de viver em sintonia com realidades maiores.
         Uma comunidade espiritual que ainda sobrevive no Monte Athos, na Grécia, na época do seu apogeu tinha aproximadamente 2.000 membros. Então, esse grupo equilibrava o planeta inteiro com sua contemplação profunda. A inconsciência daqueles tempos era transformada pela concentração desses monges na vida além da matéria, na vida Maior, espiritual.
         O que me estava sendo sugerido na experiência daquela tarde era colocar em prática esse trabalho de cura planetária. Na realidade, hoje são necessárias muitas hostes angélicas e milhares de homens para construir canais em proporção e com força suficiente para reduzir as graves adversidades mundiais.
         Quem se dispuser a servir o planeta, sobretudo nos planos internos, saberá o que fazer. A forma de servir revela-se com simplicidade e, quando percebemos, já estamos dentro dela. Seja realizada de maneira solitária, seja em conjunto com outros, a sintonia com níveis de existência espiritual superiores tem enorme força de transformação.”

(TRIGUEIRINHO. Escritor, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 11 de maio de 2014, caderno O.PINIÃO, página 22).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 10 de maio de 2014, caderno PENSAR, coluna OLHAR, página 2, de autoria de JOÃO PAULO, editor de Cultura, e que merece igualmente integral transcrição:

“Democracia de espectadores
        
          O pensador norte-americano Noam Chomsky alcança o mérito incomum de ser respeitado pela esquerda e pela direita, falando mal dos dois lados. Ele não tem compromisso com a ideologia, mas com a razão. Maior crítico da política externa norte-americana desde a época do Vietnã, foi o mais corajoso opositor de Bush em sua “guerra ao terror”. Costuma dizer que os liberais e os comunistas se igualam. Há uma aristocracia da direita e um centralismo da esquerda que desprezam o povo. “Eles” sabem o que é bom para todos.
         Além de pensador político, Chomsky é considerado o maior linguista de nosso tempo, tendo criado a gramática gerativa, a mais ambiciosa teoria sobre a aquisição e funcionamento da linguagem. O filósofo e ativista político é professor no Massachussetts Institute of Tecnology (MIT) e autor de mais de 30 livros nas áreas de filosofia da linguagem, lingüística, ciência política, comunicação e relações internacionais. Intelectual público, quando ele resolve falar, é bom ficar atento.
         É o caso do livrinho Mídia – Propaganda política e manipulação, que está sendo lançado no Brasil pela Editora Martins Fontes. Chega num momento simbólico: ano de eleições, crise nos meios de comunicação (que tem feito o mercado se movimentar em busca de nova inserção econômica e política), expectativa de mobilização social contra a Copa do Mundo e falta de serviços de qualidade. Escrito para a realidade americana, o livro é uma contribuição para nosso momento histórico.
         A reflexão de Chomsky se arma sobre uma antigo problema: qual o papel da média numa democracia? A resposta automática é que, garantida a liberdade de informação, a comunicação é um insumo indispensável para que as pessoas levem vidas autônomas, tomando decisões a partir de fatos. No entanto, é preciso voltar um degrau: afinal, de que democracia estamos falando? Chomsky descreve então, com singeleza, nosso cenário democrático como um regime em que poucos mandam em muitos. Os poucos se julgam melhores e acreditam que sabem o que é melhor para o povo.
         Para o pensador, o que se estabeleceu nas chamadas democracias liberais foi um arranjo de classe, uma democracia de espectadores. O povo, na verdade, nada mais é que um “rebanho desorientado” (a expressão é de Walter Lippmann), carente da palavra ordenadora dos bons. O povo não existe para agir, mas para seguir ordens. E é aí, na garantia da obediência à palavra de poucos (sempre interessados em manter o poder), que a mídia faz seu trabalho antidemocrático.
         Para Chomsky, a “classe especializada” – que Marilena Chauí chamaria de detentores do discurso competente – emite um imperativo moral: a população é simplesmente estúpida e precisa ser guiada. A propaganda (e em parte o jornalismo), é garantidora da moral de rebanho. Para isso, além de princípios gerais, mandam sinais que confundem e distraem. Um exemplo próximo são as manifestações de rua. Todos defendem uma democracia via e vibrante, mas desde que não atrapalhe o trânsito na hora do rush. Como afirma Chomsky, “certifiquem-se que permaneçam, quando muito, espectadores da ação, dando de vez em quando seu aval a um ou outro dos verdadeiros líderes entre os quais podem escolher”.
         Essa democracia de procedimentos formais, da qual a eleição é um fiador mais teatral que verdadeiro – não se fala em distribuir poder ao povo, mas de mudar quem exerce o poder em seu nome –, se encontra em plena vigência em nosso momento eleitoral. Nada mais próximo à lógica da propaganda que buscar bandeiras universais, como combate à corrupção, à incompetência e à falta de produtividade. No entanto, os projetos em jogo não se resumem aos nomes que estão na ponta do processo. Debater política não é escolher pessoas para mandar nas outras. Vem daí, por exemplo, o vício de fazer da vida privada um assunto público em época de campanhas.
         O que está em jogo são projetos de sociedade. Quem reclama das garantias trabalhistas ou dos reajustes do salário mínimo acima da inflação não está defendendo a racionalidade econômica, mas a exploração do trabalho. É preciso que isso fique cada vez mais claro. A mídia, se quiser recuperar seu papel na democracia, tem que fazer esse debate fluir, e não ficar a reboque dos jogos de interesse.
         Chomsky manda dois alertas, ambos incisivos: o primeiro é que o povo não quer mais ser rebanho. Quem pensa em construir consensos a partir daí vai se dar mal.Pode ficar com a pior das consequências para a indústria da informação: a irrelevância. O segundo aviso afeta a própria concepção de democracia que nos envolve. Ninguém está disposto a abrir mão do poder para o outro. A democracia direta, participativa ou que nome se queira dar, é o horizonte de sobrevivência da política. Isso aponta para a mudança de gestão e para novos modelos de ingerência nos rumos da sociedade. O pau vai quebrar. É o melhor que temos para hoje.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, incisivas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas transformações em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis (a propósito, nada menos do que 1,3 bilhão de toneladas de alimentos são perdidos ou desperdiçados por ano no mundo, segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), que recomenda cinco dicas: poupar, reutilizar, reciclar, classificar e preservar...);

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de astronômico e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São gigantescos desafios, e bem o sabemos, mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...

sexta-feira, 9 de maio de 2014

A CIDADANIA, A FORÇA DA BELEZA E O BISPO DOS EXCLUÍDOS

“A beleza é que salvará o mundo do desespero, disse Dostoiévski
        
         Dos gregos aprendemos, e isso atravessou todos os séculos, que todo ser, por diferente que seja, possui três características transcendentais (estão sempre presentes, pouco importa a situação, o lugar e o tempo): ele é “unum, verum et bonum”), o que quer dizer que ele goza de uma unidade interna que o mantém na existência; ele é verdadeiro, porque se mostra assim como de fato é; e é bom porque desempenha bem o seu lugar junto aos demais, ajudando-os a existirem e coexistirem.
         Foram os mestres franciscanos medievais, como Alexandre de Hales, e especialmente são Boaventura, que, prolongando uma tradição vinda de Dionísio Aeropagita e santo Agostinho, acrescentaram ao ser mais uma característica transcendental: o “pulchrum”, vale dizer, o belo. Baseados, seguramente, na experiência pessoal de são Francisco, que era um poeta e um esteta de excepcional qualidade e que, “no belo das criaturas, via o Belíssimo”, enriqueceram nossa compreensão do ser com a dimensão da beleza. Todos os seres, mesmo aqueles que nos parecem hediondos, se os olharmos com afeição, nos detalhes e no todo, apresentam, cada um a seu modo, uma beleza singular, senão na forma, mas na maneira como neles tudo vem articulado com um equilíbrio e harmonia surpreendentes.
         Um dos grandes apreciadores da beleza foi Fiódor Dostoiévski. Para ele a contemplação da Madonna de Rafael era a sua terapia pessoal, pois sem ela desesperaria dos homens de si mesmo, diante de tantos problemas que via. Em seus escritos, descreveu pessoas más e destrutivas, e outras que mergulhavam nos abismos do desespero. Mas seu olhar, que rimava amor com dor compartida, conseguia ver beleza na alma dos mais perversos personagens. Para ele, o contrário do belo não era o feio, mas o utilitarismo, o espírito de usar os outros e, assim, roubar-lhes a dignidade.
         “Seguramente, não podemos viver sem pão, mas também é impossível existir sem beleza”, repetia. Beleza é mais que estética; possui uma dimensão ética e religiosa. Ele via em Jesus um semeador de beleza”. “Ele foi um exemplo de beleza e a implantou na alma das pessoas para que, por meio da beleza, todos se fizessem irmãos entre si”. Ele não se referia ao amor ao próximo; ao contrário: é a beleza que suscita o amor e nos faz ver no outro um próximo a amar.
         A nossa cultura, dominada pelo marketing, vê a beleza como uma construção do corpo, e não da totalidade da pessoa. Então, surgem métodos e mais métodos de plásticas e botoxes para tornarem as pessoas mais “belas”. Por ser uma beleza construída, ela é sem alma. E, se repararmos bem, nessas belezas fabricadas, emergem pessoas com uma beleza fria e como uma aura de artificialidade, incapaz de irradiar. Daí irrompe a vaidade, não o amor, pois beleza tem a ver com amor e comunicação.
         O papa Francisco conferiu especial importância na transmissão da fé cristã à via “pulchritudinis” (a via da beleza). Não basta que a mensagem seja boa ou justa. Ela tem que a mensagem seja boa e justa. Ela tem que ser bela, pois só assim chega ao coração das pessoas e suscita o amor que atrai (“Exortação ‘A alegria do Evangelho’, nº 167). A Igreja não visa o proselitismo, mas a atração que vem da beleza e do amor, cuja característica é o esplendor.
         A beleza é um valor em si mesmo. Não é utilitarista. É como a flor que floresce por florescer, pouco importa se a olham ou não, como diz o místico Angelus Silesius. Mas quem não se deixa fascinar por uma flor que sorri gratuitamente ao universo? Assim devemos viver a beleza no meio de um mundo de interesses, trocas e mercadorias. Então, ela realiza sua origem sânscrita Bet-El-Za, que quer dizer: “o lugar onde Deus brilha”. Brilha por tudo e nos faz também brilhar pelo belo.”

(LEONARDO BOFF. Teólogo, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 2 de maio de 2014, caderno O.PINIÃO, página 14).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 7 de maio de 2014, caderno OPINIÃO, página 7, de autoria de FREI BETTO, escritor, autor de Fome de Deus (Paralela), entre outros livros, e que merece igualmente integral transcrição:

“O bispo dos excluídos
        
         Em fevereiro de 1973, na Penitenciária de Presidente Venceslau (SP), misturados a presos comuns, cinco presos políticos – frei Fernando de Brito, Maurice Politi, Ivo Lesbaupin, Wanderley Caixe e eu – fomos castigados com 15 dias de isolamento em celas individuais, por demonstrar solidariedade ao sexto preso político, Manoel Porfírio, que sofrera punição injusta.
         No domingo, 11 de fevereiro, ao encerrar o período do nosso isolamento, recebemos inesperadamente a visita dos bispos Tomás Balduino, José Maria Pires, Waldyr Calheiros e José Gonçalves. Tinham aproveitado o recesso da assembléia dos bispos do Brasil, em Itaici (SP), para voar até Presidente Venceslau no teço-teco pilotado por Dom Tomás Balduino.
         Relatamos as torturas a que eram submetidos os presos comuns e as sanções injustas impostas a nós, presos políticos. Na tarde do mesmo dia, na reunião de Itaici, os bispos repetiram nossas denúncias em coletiva de imprensa. O diretor da penitenciária ficou irritado e intrigado. Isolados como estávamos, com que recursos havíamos convocado a comitiva episcopal? Teríamos um radiotransmissor dentro da cela? Talvez nunca tenha se convencido de se tratar de mera coincidência.
         Nosso confrade na Ordem Dominicana, dom Tomás Balduino, falecido no último dia 2 de maio, em Goiânia, em decorrência de embolia pulmonar, visitava periodicamente os frades encarcerados e não temia denunciar a ditadura e defender os direitos humanos.
         Nascido em Posse (GO), no último dia de 1922, seu nome de batismo era Paulo Balduíno de Souza Décio. Ao ingressar na vida religiosa, adotou, como era costume na época, o prenome de Santo Tomás de Aquino. Foi o último filho homem de uma família de onze filhos, três homens e oito mulheres. Seu pai, promotor público, encerrou a carreira como juiz.
         Formado em filosofia, dom Tomás fez o mestrado em teologia em Saint Maximin, na França. Em 1957, nomeado superior da missão dominicana na prelazia de Conceição do Araguaia (PA), viveu de perto a realidade indígena e sertaneja. Na época, a pastoral da prelazia acompanhava sete grupos indígenas. Para aprimorar seu trabalho junto aos índios, fez mestrado em antropologia e linguística na Universidade de Brasília (UnB), concluído em 1965. Aprendeu a língua dos índios xicrin, do grupo bacajá-kayapó.
         Para melhor atender a região da prelazia, que abrangia todo o Vale mato-grossense, frei Tomás aprendeu a pilotar avião. Amigos da Itália o presentearam com um teco-teco, com o qual  prestou inestimável serviço, sobretudo na articulação de povos indígenas. Também ajudou a salvar pessoas perseguidas pela ditadura militar.
         Em 1965, foi nomeado pelo papa prelado de Conceição do Araguaia. Lá enfrentou os primeiros conflitos com as grandes empresas agropecuárias que se estabeleciam na região com incentivos fiscais da extinta Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Elas invadiam áreas indígenas, expulsavam famílias sertanejas (posseiros) e traziam trabalhadores braçais de outros estados, sobretudo do Nordeste brasileiro, submetidos, muitas vezes, a regime análogo ao trabalho escravo.
         Nomeado bispo diocesano da cidade de Goiás, em 1967, foi ordenado bispo e ali permaneceu 31 anos, até 1999. Ao completar 75 anos, apresentou sua renúncia e mudou-se, como simples frade, para o convento dominicano de Goiânia. Seu ministério episcopal coincidiu, por longo tempo, com a ditadura militar (1964-1985).
         Movimentos sociais, como o do Custo de Vida e a Campanha Nacional pela Reforma Agrária, contaram com todo o apoio de dom Tomás, que participou ativamente da criação do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), em 1972, e da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 1975. Presidiu o CIMI, de 1980 a 1984, e a CPT, de 1999 a 2005. A Assembleia  Geral da CPT, em 2005, o nomeou conselheiro permanente.
         Agora, seu corpo está enterrado na catedral de Goiás. E seu exemplo de vida perdura na memória de todos que conheceram um homem fiel à proposta do Evangelho de Jesus.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, adequadas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais avassaladores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de exorbitante e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, inovação, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e abundantes riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade – , e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...  

quarta-feira, 7 de maio de 2014

A CIDADANIA, A ENERGIA DA VONTADE E A SACRALIDADE DO TRABALHO

“A energia da Vontade pode nos levar a uma realização maior
        
         A Vontade é uma energia bem diferente do desejo. É ela, e não o desejo, que nos leva à realização interna. A Vontade  também difere do esforço, que vem do lado humano da pessoa. Quando ela começa a fluir, o esforço deixa de existir. A Vontade faz a maior parte, pois é criadora, está conectada com níveis de consciência muito profundos.
         O esforço é necessário para integrarmos a personalidade, para alinharmos o corpo físico, o emocional e o mental e para buscarmos o contato com a alma. Porém, é o fluir da energia da alma que nos desvela a Vontade.
         Entretanto, é por intermédio da mente que exprimimos Vontade. E é a partir da mente que essa energia emite impulsos aos demais corpos. A mente está acima do desejo, que segue instintos, hábitos e emoções. Assim, devemos estar centralizados na mente para receber e perceber a energia da Vontade. Mas, para atuar desse modo, a mente deve estar educada; caso contrário, desce ao nível do desejo e fica envolvida com os movimentos dele.
         A energia da Vontade provém de níveis superiores, sublimes. O núcleo profundo do ser capta-a e transmite-a a alma, e esta, para a mente.
         A fim de colaborarmos com o Plano Evolutivo, o plano de Deus para a humanidade, e prestarmos um serviço universal, precisamos de impulsos que correspondam ao nível de onde esse Plano provém.
         Ao renunciarmos conscientemente ao desejo, começamos a construir um canal que nos liga à energia da Vontade. Quando já não nos sujeitamos ao desejo e fortalecemos nossa ligação com a alma, tornamo-nos instrumentos para que o Plano Evolutivo seja cumprido na vida terrestre.
         A Vontade, quando emerge no ser, surge como uma necessidade de manifestar, e impulsiona algo maior, indefinível, que transcende o âmbito da pessoa. E a própria pessoa vai percebendo que seu desejo aos poucos vai sendo deixado de lado, enquanto uma necessidade maior, que ele não sabe exatamente o que é, vai ganhando relevo.
         Ele passa a ter tendências que nunca teve, em uma direção que já não é pessoal. Diante dessa Vontade não há força, pressão nem influência externa que possa tirá-lo da sua sintonia, que possa demovê-lo do caminho. Agora, indiferente às oscilações do nível humano, em que se sujeitava às influências externas e justificava a sua inércia, ele faz o que deve ser feito apesar do mundo, apesar de si mesmo, apesar de tudo e de todos.
         Atualmente, a humanidade se encontra em uma etapa fundamental de mudança de estado: da consciência mental dedutiva, racional e analítica para a consciência intuitiva, para outro tipo de percepção, enfim, para a mente superior. Precisamos da energia da Vontade nessa transição.
         Essa energia tem de ser criadora, e o requisito para isso é a nossa decisão de transcender o ego humano, de nos liberar das forças que o regem e de estar por inteiro voltados para uma energia mais universal. Só a renúncia ao pequeno eu, a desistência de continuarmos envolvidos em reações de personalidade, só essa decisão tomada profundamente pode desenvolver em nós a energia da Vontade.
         A Vontade de que necessitamos neste ciclo não é a Vontade que já conhecemos nem a que teremos no futuro. É a Vontade que surge agora, que se desenvolve à medida que superamos o apego ao ego humano e a tudo o que dele advém.”

(TRIGUEIRINHO. Escritor, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 13 de abril de 2014, caderno O.PINIÃO, página 18).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 2 de maio de 2014, caderno OPINIÃO, página 7, de autoria de DOM WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO, arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, e que merece igualmente integral transcrição:

“Sacralidade do trabalho
        
         A celebração do dia 1º de maio, pela consideração reverente ao trabalhador, é oportunidade para reavivar a compreensão do trabalho como necessidade e dom de Deus. A concepção cristã do trabalho tem suas raízes numa articulada e teológica. Deus, criador onipotente, Pai de todos, cria o homem e a mulher à sua imagem e semelhança e lhes confia o cultivo da terra. O Pai sublinha a primazia da humanidade em relação às outras criaturas, que devem merecer cuidados e respeitos. Cultivar a terra, como ponto especial na narrativa da missão do homem e da mulher no conjunto da obra da criação, significa não abandoná-la. E exercer domínio sobre ela significa comprometimento com o seu cuidado e com sua guarda, como um pastor deve cuidar de seu rebanho. Esse horizonte inspirador é determinante nos rumos escolhidos para a dinâmica da economia com seus desdobramentos incisivos sobre a questão social e política.
         Nesse sentido, no atual momento político e econômico, os construtores da sociedade pluralista devem superar a lógica perversa do lucro. Precisam buscar uma efetiva sustentabilidade, necessária para se alcançar o equilíbrio social. Imprescindível é deixar-se iluminar por um horizonte com princípios antropológicos inequívocos. Isso é um enorme desafio para quem se orienta por parâmetros de funcionamentos mecanicistas e, consequentemente, não consegue compreender o que se pode chamar de subjetividade do trabalho. O conjunto de recursos, atividades, instrumentos e técnicas que permite a cada pessoa o exercício adequado de suas tarefas não pode sobrepor-se ou minar a dimensão subjetiva do trabalho humano. O respeito a essa perspectiva é a consideração insubstituível de cada ser humano e de sua vocação pessoal. Assim, alcança-se a compreensão de que todo trabalho é imagem e extensão da ação criadora de Deus, de que o homem e a mulher, em suas muitas tarefas, participam da obra da criação.
         A doutrina social da Igreja enfatiza, por isso mesmo, que o trabalho não somente procede da pessoa, mas também é ordenado a ela e a tem por finalidade. Assim sendo, todo ofício, mesmo aquele mais humilde, é caminho para que cada pessoa tenha preservada a sua dignidade. Consequentemente, o trabalho se torna uma necessidade e ao mesmo tempo um dever de todos. Trabalhar refere-se ao respeito moral ao próximo e, por desdobramento, é reverência à própria família e à sociedade. Abominável, pois, é o enquadramento do trabalhador na condição de escravo. Trata-se de um verdadeiro atentado contra a dignidade, ferida na cultura solidária e civilizada, com consequências nefastas também para escravocratas.
         A sacralidade do trabalho implica compreendê-lo, na escala de valoração e prioridade, como superior a todo e qualquer fator de produção, inclusive o capital. No horizonte largo e diversificado sobre a sua abordagem como importante chave social, é prioritário considerá-lo como direito. A necessidade do trabalho não se refere apenas ao sustento familiar e pessoal, prioridade incontestável, mas, particularmente, ao bem que promove a cada pessoa. Trata-se de direito fundamental. Por isso, a Igreja considera o desemprego uma perversa calamidade social. E sublinha que uma sociedade orientada para o bem comum tem sua capacidade avaliada, também, com base nas perspectivas de trabalho que ela pode oferecer.
         Com a oferta do trabalho, caminha a exigência de se promover a capacitação, já que a manutenção do emprego depende cada vez mais da competência profissional. O Estado, então, é chamado à responsabilidade, por seu dever de promover políticas ativas de trabalho, particularmente pela regulação do funcionamento econômico, convocando as corporações a cumprirem seu papel social. As empresas têm o dever de garantir a oferta adequada de emprego. O tratamento desse desafio não pode prescindir de uma correta visão antropológica e cristã, pelo respeito à sacralidade do trabalho.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, adequadas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de variada ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos;

     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de astronômico e insuportável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir igualmente uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Isto posto, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities;sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que possa partilhar suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...

segunda-feira, 5 de maio de 2014

A CIDADANIA, O SAL DA TERRA E OS RESÍDUOS DA EDUCAÇÃO (59/1)

(Maio = mês 59; falta um mês para a Copa do Mundo)

“O sal da terra
        
         Está escrito em Mateus, capítulo 5, versículo 13, que Jesus teria dito a seus seguidores: “Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal perde o sabor, para que há de servir?”.
Nos dias atuais, nunca foi tão necessário rever conceitos, reavivar valores esquecidos, desenterrar as lições que nos foram dadas de graça pelas pessoas ilibadas com quem encontramos nesta vida. Reinventar o homem, eis a missão! E o que cabe a nós, advogados, operadores do direito e aqueles que na academia almejam tal distinção? Somos convidados a fazer justiça e, como o sal da terra, nos tornamos necessários!
A Constituição de 1988, com a sabedoria do povo, nos diz: sois vós, advogados, indispensáveis à administração da justiça (Artigo 133). Ora, me pergunto: se o advogado perde a noção do que é reto, como se efetivará a sociedade justa e solidária que a Constituição promete no seu Artigo 3?
A justiça, parafraseando santo Agostinho, se me perguntarem o que é, não saberei responder, mas com certeza sei o que não é. E é como o que não é que devemos nos preocupar. Se nos dispusermos a trabalhar para construir uma sociedade justa, aspiração coletiva do povo brasileiro e inconsciente de toda a humanidade, e se, por força da lei maior, nos tornamos essenciais a esse exercício, resta-nos pedir a Deus que nos dê sabedoria e ponha freios em nossas iniquidades para que possamos dar alma à lei e traduzir em ação na vida corriqueira aquilo que entendemos ser justiça. Não é decorando códigos que se dá vida à lei, mas compreendendo as suas entrelinhas, olhando nos olhos das pessoas  que esperam de nós que a justiça se faça.
Há muitos que se impressionam pelos discursos eloquentes dos tribunais, pela linguagem esmerada dos textos jurídicos, pela indumentária elegante dos juristas, pela pompa das Cortes ou pelas possibilidades financeiras, as reverências e salamaleques. Não. Decididamente, a justiça não se faz com tais adereços. Antes, os dispensa pela simplicidade do oprimido, pelo desespero do encarcerado, pela dor das vítimas, pela fragilidade do desamparado, pela fome, pelo medo, pela angústia. Não é de aparências que vive a justiça. Aqui, vale de novo uma paráfrase: desta vez, recorro a são Paulo para afirmar que a justiça não se ensoberbece, não vocifera, não grita. É mansa e prudente. Quando ela acontece, ainda que em silêncio, todos nós a percebemos. É como um bálsamo, um fino perfume. Tudo o que vier além é pirotecnia desnecessária.
Na verdade, a sociedade justa que almejamos precisa muito do advogado-conselheiro, equilibrado, estudioso, que fala a língua de gente, que conhece as dificuldades das pessoas e se dispõe a ser serviço. Com facilidade troca-se a gritaria, o estardalhaço, a velhacaria pela compreensão, pelo zelo, pela concórdia, pela boa-fé. Há duas portas para se entrar para a história, e uma delas é a porta dos fundos, notadamente mais fácil. A nossa vida é feita de escolhas, e, não raro, somos aquilo que escolhemos ser. Do direito romano herdamos a máxima que deveria nos direcionar: “Honest vivere, alterum non laedere, suum cuique tribuere” (viver honestamente, não prejudicar ninguém, dar a cada um o que é seu). Essa é a prática da justiça. Todo o resto é literatura!”

(Israel Quirino. Professor e advogado, em artigo publicado no jornal O TEMPO Belo Horizonte, edição de 3 de maio de 2014, caderno O.PINIÃO, página 15).

Mais uma importante e oportuna contribuição para o nosso trabalho de Mobilização para a Cidadania e Qualidade vem de artigo publicado no jornal ESTADO DE MINAS, edição de 26 de abril de 2014, caderno OPINIÃO, página 9, de autoria de ALELUIA HERINGER LISBOA TEIXEIRA, doutora em educação pela UFMG e diretora do Colégio Santo Agostinho – Contagem, e que merece igualmente integral transcrição:

“Resíduos da educação
        
         Toda atividade humana produz seus resíduos, pois nosso processos são lineares. Entretanto, não é essa a sábia e longeva lógica da natureza, na qual os processos são cíclicos. Se a instituição escolar abriga uma atividade humana, logo, também produz seus resíduos Em quais contextos são produzidos? Para responder a essa pergunta é preciso observar toda a “cadeia produtiva”, que se inicia com o processo de seleção de alunos, até sua conclusão no ensino médio.
         A produção da excelência escolar está em relação direta com a produção do resíduo escolar. Essa metáfora pode nos ajudar a entender os bastidores dessa relação que é tão pouco explicitada. Hoje, nos damos por satisfeitos com a posição da escola no ranking que é elaborado e divulgado anualmente pela grande mídia, com base nos resultados do Enem e disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep).
         Ressalto que uma avaliação sistêmica como essa é de fundamental importância para o fornecimento de dados que irão subsidiar as políticas públicas e os projetos pedagógicos das escolas. É preciso, sim, analisar os resultados, cruzar informações, identificar e agir nas deficiências. Entretanto, a ligeira apropriação realizada, sem a observância de outras variáveis, é ago empobrecedor e não nos ajuda a melhorar o nível da educação brasileira. Isto porque, na ânsia de “sair bem na fita”, mais e mais o foco e o interesse das escolas se voltam para aqueles estudantes que poderão oferecer retorno rápido em menos tempo; e menos valor e interesse se tem em trabalhar aqueles com dificuldades de aprendizagem em algumas áreas e métodos. Aquilo que deveria ser uma responsabilidade compartilhada da sociedade, que é a melhoria da educação de todo o seu povo, segue, de forma perigosa e egoísta, ofuscada pela necessidade atlética de subir no pódio.
         A produção de resíduo da excelência escolar se dá antes mesmo da largada, no processo de seleção, que, no passado, era temido e conhecido como exame de admissão. Quantos tentam uma vaga? Quantos irão conseguir? Quanto mais disputado for esse processo, melhor será a composição do alunado.
         Em nossa pesquisa sobre o Colégio Estadual de Minas Gerais, escola com 100% de aprovação nos vestibulares, no período de 1956 a 1964, prevalecia o critério de admissão por mérito de cada candidato, ou seja, garantia da igualdade de condições para a competição. De fato, todos podiam se inscrever, e a prova seria a mesma para todos, contudo identificamos que, antes da competição, outras variáveis, além dos pressupostos acima, influenciavam de forma significativa o resultado, tais como o grupo escolar de origem, a possibilidade ou não de fazer um bom curso preparatório, a origem social do aluno e o capital cultural herdado na família. Dessa elite escolar era possível exigir sempre mais, o que redundava em um alto nível de aprovação no vestibular. Esse ciclo virtuoso fortalecia a representação da escola como lugar da excelência acadêmica.
         Os alunos residuais desse exame, provavelmente os com maiores dificuldades de aprendizagem e que iriam exigir mais dos professores, desistiam ou buscavam escolas “mais fracas”. Para o sociólogo francês François Dubet, uma escola justa não pode se limitar a selecionar os que têm mais mérito; ela deve também se preocupar com a sorte dos vencidos.
         Em 1963, já dentro da política nacional de ampliação do número de vagas para o ensino secundário, encabeçada pelo então presidente João Goulart, o Colégio Estadual de Minas Gerais abriu escolas anexas e diminuiu o rigor do exame de admissão. O que aconteceu? A excelência escolar foi diluída e se perdeu em poucos anos, fazendo-nos entender que a excelência só existiu por causa de sua raridade. Era uma escola para poucos, e poucos bons, uma elite escolar.
         Podemos encontrar outro nicho de produção do resíduo relacionado à produção da excelência escolar quanto levantamos os índices de reprovação, de evasão ao longo do ano letivo e de transferidos no final do ano motivados pela dificuldade em acompanhar o ritmo da escola. O que acontece? Há ensino e não há aprendizagem? Se for de qualidade e de excelência, porque não se aprende? Como a escola lida com isso? Se não deu conta, foi porque o aluno não se esforçou? Pode ser. Exceto para alguns poucos privilegiados, aprender exige um grande investimento de tempo e dedicação por parte do estudante. Entretanto, nem todos vão mal por falta de esforço. Conforme Dubet, “o jogo escolar é mais propício aos mais favorecidos”.
         Constato com satisfação os avanços alcançados com a aplicação e os resultados do Enem. Todos precisam se mexer. Entretanto, não podemos perder de vista o quanto é de valor social o trabalho de tantas escolas e professores que não desistem de seus alunos com baixo aproveitamento escolar. Com propostas metodológicas interessantes, abrem mão do pódio, mas não de seus projetos, e suportam bravamente a competição bruta e a pressão do mercado. Estamos desvirtuando a grande oportunidade de alavancarmos a nossa educação. O conceito de educação de qualidade ou de excelência educacional inclui, necessariamente, um bom resultado no Enem, mas é empobrecedor reduzi-lo a esse único dado.”

Eis, portanto, mais páginas contendo importantes, pedagógicas e oportunas abordagens e reflexões que acenam, em meio à maior crise de liderança de nossa história – que é de ética, de  moral, de princípios, de valores –, para a imperiosa e urgente necessidade de profundas mudanças em nossas estruturas educacionais, governamentais, jurídicas, políticas, sociais, culturais, econômicas, financeiras e ambientais, de modo a promovermos a inserção do País no concerto das potências mundiais livres, civilizadas, soberanas, democráticas e sustentavelmente desenvolvidas...

Assim, urge ainda a efetiva problematização de questões deveras cruciais como:

     a)     a educação – universal e de qualidade –, desde a educação infantil (0 a 3 anos de idade, em creches; 4 e 5 anos de idade, em pré-escolas) – e mais o imperativo da modernidade de matricularmos nossas crianças de 6 anos de idade na primeira série do ensino fundamental, independentemente do mês de seu nascimento –, até a pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado), como prioridade absoluta de nossas políticas públicas;

     b)    o combate, implacável e sem trégua, aos três dos nossos maiores e mais devastadores inimigos que são: I – a inflação, a exigir permanente, competente e diuturna vigilância, de forma a manter-se em patamares civilizados, ou seja, próximos de zero; II – a corrupção, como um câncer a se espalhar por todas as esferas da vida nacional, gerando incalculáveis prejuízos e comprometimentos de vária ordem; III – o desperdício, em todas as suas modalidades, também a ocasionar inestimáveis perdas e danos, inexoravelmente irreparáveis;
  
     c)     a dívida pública brasileira, com projeção para 2014, segundo o Orçamento Geral da União, de astronômico e intolerável desembolso de cerca de R$ 1 trilhão, a título de juros, encargos, amortização e refinanciamentos (apenas com esta rubrica, previsão de R$ 654 bilhões), a exigir uma imediata, abrangente, qualificada e eficaz auditoria...

Destarte, torna-se absolutamente inútil lamentarmos a falta de recursos diante de tão descomunal sangria que dilapida o nosso já combalido dinheiro público, mina a nossa capacidade de investimento e de poupança e, mais contundente ainda, afeta a credibilidade de nossas instituições, negligenciando a justiça, a verdade, a honestidade e o amor à pátria, ao lado de abissais desigualdades sociais e regionais e de extremas e sempre crescentes necessidades de ampliação e modernização de setores como: a gestão pública; a infraestrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos); a educação; a saúde; o saneamento ambiental (água tratada, esgoto tratado, resíduos sólidos tratados, macrodrenagem urbana, logística reversa); meio ambiente; habitação; mobilidade urbana (trânsito, transporte, acessibilidade); minas e energia; emprego, trabalho e renda; agregação de valor às commodities; sistema financeiro nacional; assistência social; previdência social; segurança alimentar e nutricional; segurança pública; forças armadas; polícia federal; defesa civil; logística; pesquisa e desenvolvimento; ciência, tecnologia e inovação; cultura, esporte e lazer; turismo; comunicações; qualidade (planejamento – estratégico, tático e operacional –, transparência, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, criatividade, produtividade, competitividade); entre outros...

São, e bem o sabemos, gigantescos desafios mas que, de maneira alguma, abatem o nosso ânimo nem arrefecem o nosso entusiasmo e otimismo nesta grande cruzada nacional pela cidadania e qualidade, visando à construção de uma Nação verdadeiramente participativa, justa, ética, educada, civilizada, qualificada, livre, soberana, democrática, desenvolvida e solidária, que permita a partilha de suas extraordinárias e generosas riquezas, oportunidades e potencialidades com todas as brasileiras e com todos os brasileiros. Ainda mais especialmente no horizonte de investimentos bilionários previstos e que contemplam eventos como a Copa do Mundo; a Olimpíada de 2016; as obras do PAC e os projetos do pré-sal, à luz das exigências do século 21, da era da globalização, da internacionalização das organizações, da informação, do conhecimento, da inovação, das novas tecnologias, da sustentabilidade e de um possível e novo mundo da justiça, da liberdade, da paz, da igualdade – e com equidade –, e da fraternidade universal...

Este é o nosso sonho, o nosso amor, a nossa luta, a nossa fé, a nossa esperança... e perseverança!...


O BRASIL TEM JEITO!...